REl - 0600501-75.2020.6.21.0044 - Divirjo do(a) relator(a) - Sessão: 11/10/2022 às 14:00

VOTO-VISTA

Des. Eleitoral Caetano Cuervo Lo Pumo:

Em relação ao Recurso Eleitoral na Representação n. 0600524-21.2021.6.21.0044, interposto pelo Ministério Público Eleitoral, estou de pleno acordo com a conclusão do Relator sobre a insuficiência probatória sobre o suposto oferecimento de cargo público para Ângela da Silva Galvão em troca de seu voto e de seus familiares.

No tocante ao Recurso Eleitoral do Partido Social Democrático, Luis Henrique Machado de Lima e Alcides Meneghini, na AIJE n. 0600501-75.2020.6.21.0044, igualmente, acompanho o Relator, nada acrescentando à criteriosa análise contida no voto.

Apenas em relação ao Recurso Eleitoral interposto por Osvaldo Froner e Anselmo Fracaro Cardoso na AIJE n. 0600501-75.2020.6.21.0044 e na Representação n. 0600036-32.2021.6.21.0044, com as devidas vênias, divirjo do Relator quanto ao mérito, pois entendo que os apelos comportam provimento.

No aspecto, a sentença condenou os recorrentes às sanções previstas para a prática dos ilícitos previstos no art. 30-A e art. 41-A da Lei das Eleições, em razão de alegada oferta e distribuição de combustíveis em troca de votos dos eleitores (captação ilícita de sufrágio), bem como, a partir dos mesmos fatos, ter deixado de declarar os valores gastos com os abastecimentos na prestação de contas dos candidatos e, paralelamente, ter simulado a origem de valores desembolsados com pagamento de despesas advocatícias, por meio de pessoas interpostas às doações (captação e gastos ilícitos de recursos financeiros em campanha).

Vejamos.

 

Da Captação Ilícita de Sufrágio

 

Entende o Tribunal Superior Eleitoral ser indispensável, para caracterização do ilícito em apreço, a verificação cumulativa dos seguintes requisitos: (i) a prática das condutas de doar, oferecer, prometer ou entregar bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza ao eleitor, capituladas no art. 41-A da Lei n. 9.504/97, pelo candidato ou por terceiro; (ii) a finalidade eleitoral da conduta; e (iii) a participação, direta ou indireta, do candidato ou, ao menos, seu consentimento, anuência, conhecimento ou ciência quanto aos fatos que resultaram na prática do ilícito eleitoral (TSE - Recurso Ordinário n. 185866, Relator: Min. Luís Roberto Barroso, DJE de 20.02.2019.).

No caso em tela, a prova da imputação de captação ilícita de sufrágio ancora-se no depoimento extrajudicial prestado pelos frentistas Alceu Adílio Girardi e Bianca Nascimento Pereira, realizado em apuratório administrativo instaurado pelo Ministério Público, conforme transcrevo (Grifei.):

BIANCA NASCIMENTO PEREIRA

 

Promotora de Justiça: Bianca, tu trabalha aqui no Posto Agrossolo, né?

Bianca: Sim.

Promotora de Justiça: Hoje a gente fez a apreensão aqui, de alguns materiais, e eu gostaria que tu me falasse um pouquinho sobre essa troca de combustível por voto. Como é que foi isso daí?

Bianca: Na verdade eles vieram aqui comprar combustível, mas a princípio a gente sabia que era pra comissão encarregada de trabalhar na campanha. Eles não falaram nada sobre compra de voto, essas coisas. Daí a gente não sabia. Daí ele veio, passou o cartão e comprou 500 litros de gasolina. Daí a gente deu desconto pra eles, né. E daí a gente fez os valezinhos, que a gente entregou pra ele. E daí, conforme quem era responsável por trabalhar na campanha, eles entregavam e eles vinham abastecer.

Promotora de Justiça: Quem que foi que veio aqui?

Bianca: Foi o responsável da comissão. É o ROBSON.

Promotora de Justiça: O ROBSON que veio aqui?

Bianca: Aham.

Promotora de Justiça: Ele tratou isso com quem?

Bianca: Pra comprar?

Promotora de Justiça: É.

Bianca: Ele falou comigo, daí eu liguei lá pra Santiago, né, pra matriz, daí a gente conseguiu.

Promotora de Justiça: Tá. Os tickets que a senhora se refere são esses daqui? [folha mostrada para a câmera, a 1min23seg da gravação]

Bianca: Sim.

Promotora de Justiça: E essa assinatura que tem atrás do ticket, de quem é?

Bianca: É minha.

Promotora de Justiça: É tua. E tinha a assinatura de mais alguém?

Bianca: Tinha de uma frentista, que ela me ajudou, porque era bastante.

Promotora de Justiça: Esse procedimento de tickets foi feito com mais alguém na cidade ou não?

Bianca: Não.

Promotora de Justiça: Então tudo o que tiver de ticket foi em função desse tratado com o ROBSON?

Bianca: Sim.

Promotora de Justiça: A senhora disse que foi dado desconto. Por quanto que foi feito?

Bianca: Foi 4,80.

Promotora de Justiça: A senhora lembra quando que foi isso?

Bianca: A primeira vez eu lembro que foi dia 09.

Promotora de Justiça: 09 de outubro?

Bianca: Isso.

Promotora de Justiça: Então teve outras vezes além dessa vez?

Bianca: Teve. Eles pagaram mais. Daí o LEANDRO deu um cheque no nome dele. E daí ele comprou mais.

Promotora de Justiça: E o LEANDRO também fez isso em nome do partido?

Bianca: É, isso. Ele comprou os vales, né. Ele comprou gasolina, no caso.

Promotora de Justiça: Então eles pagavam e daí que vocês davam os vales? O pagamento era antes?

Bianca: No caso, os vales eram pra gente poder ter controle, porque eles não iam retirar tudo no mesmo dia. Daí a gente tinha o valezinho que daí a gente colocava no nosso caixa e retirava o dinheiro, no caso, que eles já tinham retirado o vale.

Promotora de Justiça: Foi, então, a primeira vez o ROBSON fez pagamento em dinheiro?

Bianca: Em cartão.

Promotora de Justiça: Em cartão. O cartão era dele?

Bianca: Não percebi.

Promotora de Justiça: Na segunda vez o LEANDRO fez com cheque?

Bianca: Isso.

Promotora de Justiça: E daí teve mais alguma vez?

Bianca: Pois o meu colega falou que teve três vezes, mas eu não tô lembrada. Mas acredito que se tem três vezes, foi de cartão.

Promotora de Justiça: Contigo, então, que eles trataram, foram duas vezes?

Bianca: Duas vezes.

Promotora de Justiça: E esses tickets foram utilizados? Pelas pessoas?

Bianca: As pessoas vinham abastecer, aham.

Promotora de Justiça: E não eram só pessoas relacionadas com a campanha?

Bianca: É, a gente acreditava que eles tavam trabalhando. A gente não sabia, não conhecia todos que tavam envolvido na campanha, sabe? Mas eles falaram que era combustível pra eles trabalharem na campanha.

Promotora de Justiça: E era bastante gente?

Bianca: É, mais ou menos. É que às vezes não pegava o meu horário, porque eu faço horário comercial.

Promotora de Justiça: Esses tickets que tu deu daria mil litros. Tu sabe se foram usados?

Bianca: Foram.

Promotora de Justiça: Tu chegou a perceber um aumento na movimentação do posto depois desse período que tinham os tickets?

Bianca: Ah, sim

Promotora de Justiça: Teve mais movimento do que antes?

Bianca: É, até o pessoal em si mesmo assim, teve mais movimento, sem vale, né, no caso.

Promotora de Justiça: Sim. Aqui tem um caderno que foi apreendido em que constam algumas anotações. Essas anotações seriam com relação a quê?

Bianca: É o fechamento de caixa.

Promotora de Justiça: E aqui, por exemplo, nessa página, consta “recibo eleição R$ 144,00”. Isso significa que foi abastecido R$ 144,00 mediante apresentação dos tickets?

Bianca: Sim.

Promotora de Justiça: Aqui é no dia 09 de novembro de 2020, que foi o dia, então, que foram adquiridos os tickets?

Bianca: Isso.

Promotora de Justiça: De acordo com o seu colega, teriam sido feitas, então, mais compras?

Bianca: É, só que eu não tô lembrada dessa terceira.

Promotora de Justiça: Qual é o nome do seu colega?

Bianca: Alceu.

Promotora de Justiça: Tem mais alguma coisa que a senhora gostaria de falar?

Bianca: Não. É só isso que a gente sabe.

Promotora de Justiça: Então tá bom.

 

[…].

 

ALCEU ADÍLIO GIRADI

 

Promotora de Justiça: O senhor trabalha aqui no Posto Agrossolo?

Alceu: Isso.

Promotora de Justiça: O que o senhor poderia me relatar em relação a esse período das eleições, de fornecimento de combustível?

Alceu: Foi feito três compras de 500 litros. Daí foi pegado os valezinhos e eles distribuíam pros cabos eleitorais e, acredito eu, para as pessoas que iam pedir combustível. Vales de 5, de 10 e de 20 litros.

Promotora de Justiça: O senhor presenciou o pagamento alguma vez?

Alceu: Sim.

Promotora de Justiça: Essas três vezes que o senhor falou o senhor presenciou?

Alceu: Duas vezes.

Promotora de Justiça: E essas duas vezes que o senhor presenciou o pagamento, quem que fez o pagamento?

Alceu: Foi o senhor LEANDRO e o ROBSON.

Promotora de Justiça: O senhor sabe se essas duas vezes que o senhor presenciou o pagamento foram as mesmas duas vezes que a BIANCA presenciou?

Alceu: Sim.

Promotora de Justiça: E como é que o ROBSON fez o pagamento?

Alceu: Foi feito com cartão. Cartão acho que até do LEANDRO. O ROBSON acompanhado.

Promotora de Justiça: E o LEANDRO, quando fez o pagamento, fez de que forma?

Alceu: Com cartão.

Promotora de Justiça: E com quem que foi o combinado esse de eles pagarem e dar os tickets?

Alceu: Foi combinado, feito o pagamento, com a BIANCA. Daí a BIANCA se informou com a empresa como é que seria a melhor forma, daí foi feito os ticketzinhos.

Promotora de Justiça: Isso só foi feito com eles?

Alceu: Sim.

Promotora de Justiça: Então todo e qualquer ticket que foi utilizado foi em função desse combinado?

Alceu: Isso.

Promotora de Justiça: Não tem outra pessoa com quem foi combinado isso?

Alceu: Não, foi só com o LEANDRO e com o ROBSON.

Promotora de Justiça: E esses pagamentos foram de quantos litros? O senhor lembra?

Alceu: De 500 litros.

Promotora de Justiça: E os tickets fornecidos eram vales de quantos litros?

Alceu: De 5, de 10 e de 20.

Promotora de Justiça: O senhor disse que viu dois pagamentos, então foram pelo menos 1000 litros?

Alceu: É. A compra total foi de 1.500 litros, só que a outra eu não assisti, não presenciei.

Promotora de Justiça: E quando eles fizeram essa compra, eles disseram para que finalidade que era?

Alceu: Não. Eles falaram que iam entregar os ticketzinhos e daí quem vinha com o ticketzinho, com o vale, daí retirava.

Promotora de Justiça: E o senhor observou quem que vinha com esses vales?

Alceu: Vinha o pessoal que tava na campanha, o pessoal deles, que tava na campanha, e pessoas que... aqui tem muito costume, né, de pessoas que nem tavam em campanha pedirem combustível pros candidatos também.

Promotora de Justiça: Então vieram eleitores também?

Alceu: Eleitores.

Promotora de Justiça: Gente comum que não tava trabalhando pra eles?

Alceu: É, isso.

Promotora de Justiça: E daí que surgiu a suspeita de que era compra de voto?

Alceu: Imagino que uhum.

Promotora de Justiça: O que o LEANDRO é?

Alceu: O LEANDRO é presidente do partido PP.

Promotora de Justiça: E o ROBSON?

Alceu: O ROBSON era um dos coordenador da campanha.

Promotora de Justiça: Então os dois vinculados com essa chapa que foi eleita?

Alceu: Isso, isso. O LEANDRO, além de ser o presidente, também era coordenador, era um dos coordenador.

Promotora de Justiça: Faz quanto tempo que o senhor trabalha aqui?

Alceu: Tá indo pra quatorze anos.

Promotora de Justiça: E o senhor percebeu se aumentou o movimento no posto nesse período de campanha?

Alceu: Aumentou.

Promotora de Justiça: E isso dá pra ver nos registros de vocês?

Alceu: Isso.

Promotora de Justiça: O senhor saberia me dizer, só se o senhor souber, o nome de algum eleitor que veio aqui querendo trocar o ticket por combustível?

Alceu: Veio bastante, mas nome, assim, eu não sei lhe informar.

Promotora de Justiça: Mas bastante gente?

Alceu: Bastante gente que não tava em campanha.

Promotora de Justiça: E daí eles simplesmente apresentavam o ticket?

Alceu: É, apresentavam o ticket pra nós e nós liberava a quantidade de litro que tinha autorização.

Promotora de Justiça: Esses tickets tinham umas assinaturas. De quem eram as assinaturas?

Alceu: Assinatura do ROBSON, autorizando, e nas costas do ticket tinha a assinatura da BIANCA e da LAURA, minha outra colega.

Promotora de Justiça: Ah, tá. Então na frente tinha do ROBSON e atrás da BIANCA e da outra colega?

Alceu: É, é. Não as duas assinaturas no mesmo papelzinho. Uma foi fazendo uma parte e a outra, a outra.

Promotora de Justiça: Ah, entendi.

Alceu: Tinha o carimbo e assinado. E na frente só a assinatura do ROBSON.

Promotora de Justiça: E os tickets foram feitos aqui?

Alceu: Isso.

Promotora de Justiça: E daí entregues pra quem fez o pagamento?

Alceu: Isso.

Promotora de Justiça: Então uma vez foi entregue pro ROBSON e uma vez pro LEANDRO?

Alceu: Eles sempre tavam juntos. Nas negociações vinham os dois.

Promotora de Justiça: Ah, eles vieram juntos. E veio alguém de nome LUCIANO?

Alceu: LUCIANO? Não, nessas duas vezes comigo, não.

Promotora de Justiça: Nas duas vezes vieram o LEANDRO e o ROBSON?

Alceu: É.

Promotora de Justiça: Tem mais alguma coisa importante que o senhor se lembra de me falar?

Alceu: Eu acho que não.

Promotora de Justiça: Era isso. Então tá bem, muito obrigada.

 

Embora os depoimentos sejam convergentes no sentido de que Leandro, Presidente do Progressistas (PP), e Robson, tesoureiro do partido, tenham adquirido vários litros de combustíveis e os tenham distribuído por meio de vales a pessoas que atuavam na campanha, não há afirmação séria, cabal e induvidosa de que houve a cooptação de eleitores em troca de voto.

Bianca asseverou que, segundo sabia, os abastecimentos eram direcionados ao pessoal de campanha, mas que não conhecia todos os envolvidos, ou seja, a depoente não indicou que pessoas de fora da campanha recebiam os abastecimentos.

Por sua vez, Alceu, embora relate que eleitores de fora da campanha também tenham buscado o vale-combustível, fragiliza a sua afirmação ao justificá-la com uma presunção ou suposição: "aqui tem muito costume, né, de pessoas que nem tavam em campanha pedirem combustível pros candidatos também”.

Ao serem ouvidos na fase judicial, Alceu e Bianca superaram a dubiedade do depoimento prestado extrajudicialmente e negaram que eleitores também tenham abastecido seus veículos com os vales-combustíveis destinados ao pessoal de campanha.

Portanto, a entrega dos vales a eleitores não envolvidos na campanha dos candidatos não foi confirmada pelas testemunhas em fase judicial e sequer é suficientemente assertiva no relato prestado em âmbito extrajudicial, pois Leandro diz que “acredita” que eram distribuídos a outras pessoas.

Ou seja, trata-se de especulação ou presunção estabelecida pelo frentista, o qual, embora não se cogite em sua má-fé na declaração, não se pode supor que teria condições de diferenciar cabalmente as razões individuais para cada vale entregue.

Assim, a circunstância motivaria o oferecimento de declarações mais objetivas e precisas perante a autoridade judicial, conferindo razoabilidade à aparente mudança de versões entre o calor das diligências investigatórias conduzidas pelo Ministério Público Eleitoral e o depoimento judicial.

Cabe ressaltar, também, que o TSE já se pronunciou pela impossibilidade de acolhimento das declarações prestadas exclusivamente em fase extrajudicial e não confirmadas no processo, em virtude da inobservância ao princípio do contraditório:

RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. VALORAÇÃO DE PROVAS. DECLARAÇÕES COLHIDAS NA FASE EXTRAJUDICIAL, SEM CABAL CONFIRMAÇÃO EM JUÍZO. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO PROVIDO.

1. As peculiaridades do caso revelam que a prova oral, produzida na fase extrajudicial, sem o crivo do contraditório, não pode embasar cassação de mandato.

2. Os depoimentos colhidos judicialmente e citados no aresto regional não são conclusivos quanto à captação ilícita de sufrágio.

3. Recurso especial provido.

(TSE - RESPE: 28456 RN, Relator: CARLOS AUGUSTO AYRES DE FREITAS BRITTO, Data de Julgamento: 26.02.2008, Data de Publicação: DJ - Diário de justiça, Data: 12.3.2008, Página 10)

 

Não se trata, aqui, de se defender qualquer espécie de tarifação da prova, com prevalência apriorística de uma determinada espécie sobre outra, tese que certamente não se coaduna como o princípio da livre apreciação motivada do julgador.

Porém, sob a perspectiva do devido processo legal constitucional, o depoimento extrajudicial somente prevalece em relação à retratação judicial quando houver outros elementos de prova capazes de determinar que o primeiro depoimento seja o verdadeiro (TSE - AI: 3801520/GO; Relator: Min. Hamilton Carvalhido, monocrática, DJE de 03.5.2010.), o que, entendo, não ocorre no caso em questão, porquanto o relato extrajudicial já se evidencia duvidoso e inseguro por si só.

Portanto, entre os depoimentos prestados de forma inquisitorial perante o Ministério Público Eleitoral e os prestados em juízo, sobressai um único aspecto convergente e confirmado pelas demais provas do processo: que Leandro e Robson, responsáveis pela campanha eleitoral da agremiação, adquiriram vales-combustíveis para distribuição àqueles que atuavam nos atos de campanha, mediante um mecanismo de autorização e controle.

O fato de Bianca e Alceu terem sido demitidos alguns dias após o ajuizamento da ação não faz prova de que teria havido pressões e coações que lhes induziram à troca de versões, sequer os frentistas, ouvidos em audiência judicial, relacionam a demissão aos fatos em análise, não justificando o descarte do que esclarecido perante o magistrado de primeiro grau.

No aspecto, a jurisprudência está consolidada no sentido de ser lícito o financiamento de combustível para que o pessoal de campanha e militantes de determinado candidato participem de atos da jornada e de propaganda, principalmente por se estar diante de simpatizantes que já realizaram sua escolha eleitoral e esgotam o benefício conseguido no próprio apoio à candidatura.

Nessa ordem de ideias, os seguintes julgados:

RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES 2016. VEREADOR. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL (AIJE). ABUSO DE PODER ECONÔMICO. ART. 22 DA LC N. 64/90. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. ART. 41-A DA LEI N. 9.504/97. DISTRIBUIÇÃO. COMBUSTÍVEL. VÉSPERA DO PLEITO. JUSTIFICATIVA. CARREATA. QUANTIDADE. NÚMERO DE VEÍCULOS. COMPATIBILIDADE. INTUITO ELEITOREIRO. AUSÊNCIA DE PROVAS. "CAIXA DOIS" . TEMA NÃO ANALISADO. NEGATIVA DE SEGUIMENTO.

(…).

2. A teor da jurisprudência desta Corte, distribuir combustível a eleitores, visando à participação em carreata, somente configurará captação ilícita de sufrágio se houver, conjuntamente, pedido explícito ou implícito de votos.

3. Na espécie, consoante a moldura fática regional, não se demonstrou de forma indene de dúvidas que o abastecimento dos veículos estava direcionado à obtenção do voto ou que fora revertido em benefício da candidatura recorrido.

4. Na verdade, apurou-se que a carreata ocorrida na véspera do pleito justificou a distribuição de 24 litros por carro, pois, no caso específico dos autos, a maior parte dos correligionários deslocou-se de distrito vizinho, cuja distância de Nova Andradina/MS, somando-se os percursos de ida e volta, totaliza 120 km.

5. Segundo um dos votos proferidos na Corte a quo, numa perspectiva realista, considerando-se a média de 8 km/l, o volume entregue revelou-se plausível. De todo modo, conforme se assentou em outro voto, não se sabe qual tipo de combustível foi oferecido, se álcool ou gasolina, o que também repercute na autonomia.

6. Nesse diapasão, ante o reconhecimento pelo TRE/MS de que a oferta de combustível estava atrelada à carreta e de que não houve provas do intuito eleitoreiro da benesse, não cabe reconhecer a incidência do ilícito de compra de votos nesta sede extraordinária, pois concluir sobre eventual desvirtuamento do ato, como almeja o recorrente, esbarrara no óbice da Súmula 24/TSE.

(…).

9. Recurso especial a que se nega seguimento.

(TSE - RESPE: 5386520166120005 Nova Andradina/MS 80042017, Relator: Min. Jorge Mussi, Data de Julgamento: 22.10.2019, Data de Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico - 24.10.2019 - Página 8-15) (Grifei.)

 

ELEIÇÕES 2008. AGRAVO REGIMENTAL. CAPTAÇÃO DE SUFRÁGIO. ABUSO DE PODER. NÃO CARACTERIZAÇÃO. DISTRIBUIÇÃO DE COMBUSTÍVEL PARA CARREATA. AUSÊNCIA DE PEDIDO DE VOTOS. IMPROCEDÊNCIA DA REPRESENTAÇÃO. DESPROVIMENTO.

1. O entendimento desta Corte firmou-se no sentido de que a prática de distribuição de combustível a eleitores, visando à participação em carreata, somente configurará captação ilícita de sufrágio se houver, conjuntamente, pedido explícito ou implícito de votos. Precedentes.

2. Conforme assentado na decisão agravada, ao contrário do que afirmado no voto condutor do decisum regional, mesmo que demonstrado o caráter eleitoreiro da doação de combustíveis, faz-se necessária a aferição da potencialidade do ato em influir no resultado da eleição para a configuração do abuso de poder econômico, de acordo com a jurisprudência desta Corte Eleitoral.

3. Não infirmados os fundamentos da decisão agravada, impõe-se a aplicação do Enunciado 182 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça.

4. Agravo regimental desprovido.

(TSE - AgR-AI: 11434 RJ, Relator: Min. LAURITA HILÁRIO VAZ, Data de Julgamento: 07.11.2013, Data de Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 29, Data: 11.02.2014, Página 36-37) (Grifei.)

 

RECURSO ESPECIAL - JULGAMENTO - MATÉRIA FÁTICA.

Por ser recurso de natureza extraordinária, a apreciação do especial esteia-se, sob o ângulo dos permissivos específicos de recorribilidade, nas premissas constantes do acórdão impugnado, ou seja, na verdade formal mediante ele revelada.

DOAÇÃO DE COMBUSTÍVEL - CAMPANHA ELEITORAL VERSUS CAPTAÇÃO DE VOTOS.

A doação de combustível visando à presença em comício e ao apoio a campanha eleitoral não consubstancia, por si só, captação vedada pelo artigo 41-A da Lei n. 9.504/97.

ABUSO DO PODER ECONÔMICO - ELUCIDAÇÃO.

A configuração, ou não, do abuso do poder econômico faz-se, considerado o recurso especial, a partir dos parâmetros fáticos constantes do acórdão proferido.

(Recurso Especial Eleitoral nº 25474, Acórdão, Relator(a) Min. Marco Aurélio, Publicação: DJ - Diário de justiça, Data 07.8.2006, Página 136)

 

Igualmente, relaciono julgados de outros Tribunais Regionais:

ELEIÇÕES 2016 - RECURSO ELEITORAL - REPRESENTAÇÃO. ARTIGO 41-A DA LEI N. 9.504/97. IMPROCEDÊNCIA - PRÁTICA DE CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO POR CANDIDATO AO PLEITO MAJORITÁRIO - PROMESSA DE POSSIBILIDADE DE O ELEITOR SER CONTEMPLADO, DADAS SUAS CONDIÇÕES PESSOAIS E FAMILIARES, COM IMÓVEL EM PROGRAMA HABITACIONAL POPULAR A SER IMPLEMENTADO - ENTREGA DE COMBUSTÍVEL - ELEITOR QUE TRABALHAVA NA CAMPANHA ELEITORAL - PROMESSA DE EMPREGO - AUSÊNCIA DA COMPROVAÇÃO DA FINALIDADE ELEITORAL DA CONDUTA. CONJUNTO PROBATÓRIO FRÁGIL PARA CONFIGURAR A COMPRA DE VOTO - REJEIÇÃO DO PEDIDO DE CONDENAÇÃO EM LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ DO RECORRENTE - RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

1. Promessa do candidato ao eleitor em ato de campanha segundo a qual, caso eleito, o incluiria em programa de habitação popular a ser implementado, desde que preenchidos os requisitos e condição social familiar, não se configura, neste caso concreto, como captação ilícita de sufrágio, porquanto não demonstrada a finalidade eleitoral.

2. A entrega de combustível a eleitor para uso na campanha eleitoral na qual trabalha, não configura, de per si, ilícito descrito no artigo 41-A da Lei nº 9.504/97.

3. Para caracterizar a captação ilícita de sufrágio, é necessário que a oferta de emprego não se trate de mera conjectura, mas que tenha liame com a finalidade de corromper o eleitor ou obter ilicitamente o voto, o que não se configurou no caso dos autos.

4. Deixa-se de acolher pedido de condenação do recorrente em litigância de má-fé, porquanto ausentes em sua conduta processual quaisquer dos requisitos elencados no art. 79 e 80 do Código de Processo Civil que maculem a boa-fé processual.

5. Recurso conhecido, contudo, desprovido.

(TRE-PR - RE: 4002 CAMPINA DA LAGOA - PR, Relator: ANTÔNIO FRANCO FERREIRA DA COSTA NETO, Data de Julgamento: 03.6.2019, Data de Publicação: DJ - Diário de justiça, Data: 10.6.2019.) (Grifei.)

 

RECURSOS ELEITORAIS. AÇÕES DE INVESTIGAÇÕES JUDICIAIS ELEITORAIS. JULGAMENTO CONJUNTO. PRELIMINARES REJEITADAS. DISTRIBUIÇÃO DE CESTAS BÁSICAS, VALES-COMBUSTÍVEL E OFERECIMENTO DE VANTAGEM A ELEITOR. PROVAS VÁLIDAS. CONJUNTO FIRME E COESO. ABUSO DE PODER ECONÔMICO E CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. DESPROVIMENTO E PROVIMENTO PARCIAL. INELEGIBILIDADE E PENALIDADE DE MULTA.

(…).

Não se vislumbra ilegalidade em levar a efeito a entrega de tíquetes combustíveis a simpatizantes de candidatura, que se apresentavam conduzindo veículos com adesivos demonstrando apoio e simpatia. A entrega de tíquetes combustíveis, em apoio a candidato de sua preferência, consubstancia-se em gasto lícito, mormente quando do conjunto probatório não se vê em qualquer momento que houve pedido de voto em contrapartida à entrega de tíquete combustível ou mesmo identificação dos eleitores que teriam recebido o combustível durante a campanha eleitoral.

(…).

(TRE-MS - RE: 55741 MIRANDA - MS, Relator: ABRÃO RAZUK, Data de Julgamento: 22.4.2019, Data de Publicação: DJE - Diário da Justiça Eleitoral, Tomo 2177, Data: 26.4.2019, Página 03/29) (Grifei.)

 

Portanto, é pacífico que, quando o fornecimento de combustível se restringir a abastecer veículos de apoiadores e pessoal de campanha, em quantidade razoável à realização dos atos de mobilização e propaganda, não há prática de ilícitos.

Na hipótese, consta que os vales eram de baixo volume, entre 5, 10 a 20 litros, e que teriam sido potencialmente abastecidos 63 automóveis, com cerca de 945 litros de combustível no seu total.

De seu turno, a sentença fornece subsídios para que se compreenda a dimensão do município em questão (Grifei.):

(...)

O depoimento do Policial Militar LEANDRO SANTOS ALMEIDA nada acresceu para a análise dos fatos descritos na representação:

Disse o município tem uma área total de 1.022km quadrados e entre estradas e corredores e ruas em torno de 1.800 Km de estradas e nas localidades que começa na esquina palmeira até o Iacapetum uns 80 Km de extensão, a área é bem grande, com maior parte de população rural, com quatro assentamentos e 575 propriedades rurais em Capão do Cipó. Disse que estavam bem preparados para as eleições, pois receberam reforço de policiais e de outras institucionais policiais. Destacou que foram efetuadas várias revistas nos carros e não foram encontrados vales combustíveis nos carros.

(…).

Capão do Cipó conta atualmente com 3.651 habitantes e 2.815 eleitores, sendo o 11º Município em PIB per capita do Rio Grande do Sul (89491,93), segundo o IBGE.

 

Assim, tendo em conta a considerável extensão de estradas da localidade, o volume de combustível para mobilização de campanha não se mostra desproporcional, considerando, ainda, que o abastecimento não deve se delimitar ao trajeto do ato eleitoral em si, mas envolve também a ida e retorno do apoiador para sua residência.

Do mesmo modo, muito embora a jurisprudência não exija a identificação do eleitor para a caracterização da conduta do art. 41-A da Lei das Eleições, bastando que seja identificável, a ausência dos nomes dos supostos cooptados demanda um maior rigor sobre a prova produzida, consoante diretriz refletida no seguinte julgado:

RECURSO ESPECIAL. REPRESENTAÇÃO. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. ART. DA LEI Nº NÃO-CARACTERIZADO. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. NÃO-CONFIGURADO. DESPROVIMENTO.

O recurso especial tem natureza restrita, assim qualquer solução jurídica que se pretenda dar ao recurso deverá ter como base a moldura fática desenhada pelo acórdão regional. Para aplicação do art. 41-A da Lei n. 9.504/97 deve ficar demonstrado, sem sombra de dúvida, que houve o oferecimento de bem ou vantagem pessoal, em troca do voto. A jurisprudência desta Corte não exige a identificação do eleitor para caracterizar a conduta do art. 41-A da Lei das Eleições. Todavia, nessa hipótese, deve ter cautela redobrada. Ausência na decisão regional de elementos que permitam inferir a captação ilícita de sufrágio. Recurso especial desprovido.

(TSE - RESPE: 28441 SP, Relator: JOSÉ AUGUSTO DELGADO, Data de Julgamento: 06.3.2008, Data de Publicação: DJ - Diário da Justiça, Data 29.4.2008, Página 10)

 

Torna-se imprescindível, então, além da prova da distribuição de combustíveis, a demonstração inequívoca do dolo específico da conduta e do pedido de voto, sendo certo que o ônus da prova cabe ao do autor da ação.

Entretanto, os depoimentos prestados e demais provas acostadas são insuficientes para tanto, pois não demonstram de forma cabal e robusta o dolo da captação ilícita de sufrágio, qual seja, de tolher a liberdade de escolha do eleitor mediante a oferta de benesses, restringindo-se a ilações e presunções de que parte dos agraciados seriam eleitores não militantes da campanha.

Cumpre ressaltar, igualmente, que, consoante orientação do TSE, “a condenação por captação ilícita de sufrágio (Lei 9.504/97, art. 41-A) exige a demonstração da participação ou anuência do candidato, que não pode ser presumida” (TSE - RESPE: 00004494420166050132/BA, Relator: Min. Sergio Silveira Banhos, DJE de 12.08.2019).

Sobre o tema, explica a lição de Rodrigo López Zilio:

A captação ilícita de sufrágio se perfaz quando houve prova da conduta ou participação (direta ou indireta) do candidato e, ainda, a partir da mera anuência do candidato no ato praticado por terceiro. Por anuência, compreenda-se a adesão consciente e voluntária do candidato na conduta ilícita praticada por outrem. Para configurar a infração ao art. 41-A da LE é indispensável a prova da responsabilidade subjetiva do candidato – seja por meio de sua conduta, participação (direta ou indireta) ou anuência explícita na conduta de terceiro. Assim, não é possível a responsabilização do candidato pelo art. 41-A da LE na condição de mero beneficiário da conduta. Se terceiro comprar votos para beneficiar determinado candidato, este somente será responsabilizado quando houve prova suficiente da sua participação ou anuência no ilícito cometido. (ZILIO, Rodrigo López. Direito Eleitoral. 8. ed. São Paulo: Editora Juspodivm, 2020, p. 727-728. (Grifei.)

 

No caso dos autos, ainda que se conclua pela ilicitude dos fatos, toda a prova produzida envolve apenas as figuras do Leandro e Robson. Desse modo, a conclusão de que teria havido anuência dos candidatos se baseou em mera presunção, a partir da atuação e importância dos efetivos gestores da campanha, com o que não se contenta a previsão do art. 41-A da Lei das Eleições.

Mesmo sendo incontroverso o fato de que houve distribuição de combustível a correligionários, as provas testemunhais e demais elementos indiciários não são suficientes para embasar um decreto condenatório, ante os efeitos gravíssimos previstos no art. 41-A da Lei das Eleições, que reclama um acervo probatório íntegro, robusto e coeso sobre o oferecimento de bem ou vantagem em troca do voto, produzido sob o contraditório judicial, contexto que não se percebe nos autos.

 

Da Captação e Gastos Ilícitos de Recursos Financeiros em Campanha

 

No que se refere ao recurso interposto na representação n. 0600036-32.2021.6.21.0044, são dois os fatos discutidos sob a perspectiva do art. 30-A da Lei n. 9.504/97:

a) a omissão, nas contas de campanha, de gastos com combustíveis, no valor de R$ 4.800,00; e

b) o recebimento de doações em dinheiro para pagamento de honorários advocatícios de forma simulada em relação à sua origem, por intermédio de Dariane, Ângela, Débora, Gislaine e Francieli, apenas com a intenção de fechar as contas do partido, perfazendo a quantia de R$ 4.250,00 recebidos por meio de “laranjas”.

Quanto ao primeiro item, é incontroverso que houve a omissão de despesas, no montante de R$ 4.800,00, com combustíveis utilizados para a mobilização de pessoal de campanha.

É igualmente incontroverso que as aquisições ocorreram por Leandro Melo Pereira, presidente partidário, e Robson Brum Jorge, tesoureiro partidário, e pagas, em parte, por meio do cartão de crédito do primeiro e, outra parte, em dinheiro, sempre junto ao Posto Agrosolo, em Capão do Cipó.

Com relação à segunda ordem de gastos, os depoimentos de Dariane Donaduzzi de Souza, Ângela Cristina Zucolotto Dietrich, Gislaine Bazzan Tamiosso, Francieli Campanaro Beck, Aldrim Pizzolato, Paulo Ricardo Pereira Genro, Leandro Melo Pereira e Robson Messias Brum Jorge são convergentes no sentido de que, diante da necessidade de arcar com custos maiores em assessoria jurídica, Paulo Genro se propôs a emprestar os valores, que foram rateados entre as diversas correlegionárias, os quais vieram a ser repassados por doações individuais ao partido político.

Por sua vez, as conversas extraídas dos aparelhos celulares de Robson e Leandro dão conta que, em verdade, os valores foram efetivamente pagos por Paulo Genro, vindo a ser distribuídos entre as diferentes doadoras a fim de atender aos limites legais impostos para as transações, consoante reproduzido na sentença:

Passo a transcrever a conversa telefônica realizada entre os Srs. Robson e Leandro no dia 01/12/2020 que comprova os fatos acima postos:

ROBSON: Precisamos resolver aquela questão do adv.

Ficou em 5450

E eu restante vamos abatendo da contribuição dos CCs

Mas este Valor vai ter que passar pela conta

E o tempo está passando

Quando vê se foi o prazo e já viu a encrenca

A solução é essa foi o melhor que pude fazer

LEANDRO: Paulo falou com ele?

Tivermos q pagar

Não temos compromisso com ele

Foi invenção do Paulo contratar ele

ROBSON: O Paulo disse que realmente deu o valor

Mas que não deveria ter dado

 

A conversa entre Robson e Dariane no dia 08/12/2020:

Robson:

Dariane Preciso de sua colaboração

Dariane: Oi

Fale

Robson:

Paulo Genro precisa passar um din

Dariane:

????

Robson:

Gostaria de saber se pode ser pra sua conta

E depois vc passa para a conta do partido como doadora

Não é muito

É 4250 dividido em quatro doadores

Vc Angela Débora e Gislaine

Pode ser?

Dariane:

Esses 4250 divido em 4?

Sim

Robson: Sim

Dariane: (responde com a seguinte figura concordando)

Robson: 1200 pra Gislaine e 1050 para os outros doadores

Dariane: Ok

Robson: Então me mande o número da sua conta Banrisul

Dariane: Já te passo

Robson: Aí de pois só preciso do comprovante de transferência pra enviar ao contador

Aí pagamos o Adv. Com esse recurso e fechamos a conta de Campanha do partido

Dariane: Agência 0360 Cc: 3507746809

Robson: Valeu

 

O Sr. Paulo ao receber as contas bancárias efetua o depósito e o valor é repassado ao partido.

 

Robson, ao verificar que o valor depositado para Gislaine é maior, entra em contato com ela referindo que ela terá que conseguir outro CPF para fazer parte da “doação”, pois o limite é de R$ 1.069,00. Assim, Gislaine faz duas transferências usando seu nome e o nome de Francieli sendo então o depósito no valor de R$ 1.200,00.

 

Conversa entre Robson e Gislaine, in verbis:

Robson: Laine seu depósito vai ter que ser um pouco com outro CPF Pois tem limite de depósito 1069.

 

Na sequência para completar o valor Robson “doa” R$ 1.064,09 em seu nome e efetua um depósito de doação de R$ 135,91 em nome de Leandro,

 

In verbis mensagem passada de Robson a Leandro:

 

Robson: Tive que fazer um depósito com teu CPF pois tinha limite de depósito

 

Leandro: (responde com o seguinte “emoji” de positivo)

 

Sim.

 

Posteriormente ao tomarem conhecimento das investigações efetuadas pelo Ministério Público Dariane, Ângela, Débora, Gislaine e Francieli efetuaram a devolução dos valores ao Sr. Paulo buscando comprovar o pagamento.

 

Pois bem.

Consultando-se os dados registrados na prestação de contas eleitorais do Partido Progressista de Capão do Cipó (https://divulgacandcontas.tse.jus.br/divulga/#/partido/2020/2030402020/89141/4/11/integra/despesas), a agremiação quitou o valor total de R$ 5.450,00, por serviços advocatícios prestados por Aldrim Pizzolato, por meio de um único TED realizado em 10.12.2020, sendo R$ 3.450,00 referentes à campanha de vereadores e R$ 2.000,00 dedicados ao pleito majoritário.

Nas contas eleitorais prestadas por Osvaldo Froner (https://divulgacandcontas.tse.jus.br/divulga/#/candidato/2020/2030402020/89141/210000746201/integra/receitas) consta a respectiva doação estimável em direito, de serviços de advocacia, na monta de R$ 2.000,00.

Vale dizer, a doação por meio de “intermediárias” ocorreu nas contas e em favor do partido político, a fim de adimplir despesas realizadas tanto em prol de seus candidatos a vereador quanto dos concorrentes ao Poder Executivo.

Além disso, diferentemente do que constou na sentença, a mascaração do doador originário não representa “caixa 2”, figura que se caracteriza pela movimentação de recursos não declarados nas contas, bem como não há indicativos de Paulo Genro se constitua em fonte vedada de receitas.

Logo, a simulação realizada, pelo que se depreende dos autos, visou à burla ao limites legais de transferências de valores.

Outrossim, sequer é possível discriminar a parcela do montante questionado que efetivamente foi usada para a doação estimável ao candidato majoritário, tendo em vista que há uma diferença de R$ 1.200,00 (R$ 5.450,00 – R$ 4.250,00), pagos ao advogado, sem qualquer impugnação, utilizados indistintamente para a quitação global dos serviços prestados a todos aos concorrentes para todos os cargos, prefeito e vereador.

De toda forma, o alegado ilícito seria o recebimento de doação de serviços estimáveis em dinheiro, em, no máximo, R$ 2.000,00, cujo doador originário restou dissimulado por interpostas pessoas nas contas da agremiação doadora, ou seja, o fato sequer pode ser relacionado a alguma ação direta ou que estivesse sob a órbita de conhecimento do candidato.

Salienta-se que as irregularidades foram havidas nas contas eleitorais do partido, por ação de seus dirigentes, e não na contabilidade dos candidatos.

No aspecto, não seria razoável que o candidato mantivesse uma diligência tamanha a fiscalizar todas as fontes de arrecadação do partido político e formas pelas quais os recursos ingressaram em campanha antes de receber a doação estimável em suas próprias contas.

Ressalta-se, novamente, que as práticas foram executadas por Robson e Leandro, com participação de Paulo Genro e das “doadoras” interpostas, não havendo comprovação da participação ou anuência dos candidatos recorrentes nas ações perpetradas.

A configuração da ilicitude na arrecadação e despesas de campanha pelo candidato não se evidencia tão somente pela existência de uma cadeia de doações, em contabilidade alheia, que lhe confiram algum proveito final.

A previsão contida no art. 30-A da Lei das Eleições não comporta a modalidade objetiva de responsabilidade na apuração do lícito, sendo necessário demonstrar a responsabilidade subjetiva do beneficiário, ao menos, por culpa grave, circunstância que escapa dos autos.

Somando-se a omissão de despesas com combustíveis (R$ 4.800,00) e a quantia máxima passível de envolver a doação estimável em dinheiro (R$ 2.000,00), alcança-se a cifra de R$ 6.800,00, que equivale a 9,7% do total de recursos, financeiros e estimáveis, movimentados em campanha (R$ 69.506,50).

Dessa forma, reduzida expressão percentual dos fatos sequer autorizaria a desaprovação das contas, tendo em conta a diretriz jurisprudencial estabelecida no TSE e nesta Corte Regional no sentido de que falhas inferiores ao percentual de 10% do recursos manejados não tem o condão de macular a integridade e fidedignidade da contabilidade como um todo.

Igualmente, no espectro mais amplo da igualdade entre os candidatos, os aportes de recursos em tela não configuram mácula capaz de vulnerar a legitimidade e a regularidade do pleito.

Logo, embora a não contabilização dos valores relativos aos combustíveis e a dissimulação da origem dos valores utilizados com honorários advocatícios sejam indubitáveis, tenho que não constam dos autos elementos de prova idôneos dos quais se possa extrair a relevância das condutas inquinadas ou, ainda, a existência de dolo ou má-fé por parte dos candidatos recorrentes.

A jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral é no sentido de que a omissão de receitas e despesas de campanha não enseja a cassação do diploma, prevista no art. 30-A da Lei n. 9.504/97, se não ficar comprovado o uso de recursos de fontes vedadas ou a prática de "caixa dois" com relevância jurídica sobre a legitimidade do pleito.

Nesse sentido, as seguintes ementas:

RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÃO 2010. DEPUTADO ESTADUAL. REPRESENTAÇÃO. LEI N. 9.504/97, ART. 30-A. DIPLOMA. CASSAÇÃO. PROVIMENTO.

1. O recurso cabível contra a decisão que envolve a perda do diploma em eleições federais e estaduais é o ordinário. Na espécie, é admissível o recebimento do recurso especial como ordinário, por aplicação do princípio da fungibilidade. Precedentes.

2. Na linha da jurisprudência firmada por esta Corte, para a incidência do art. 30-A, § 2º, da Lei n. 9.504/97, é necessária a aferição da relevância jurídica do ilícito, porquanto a cassação do mandato ou do diploma deve ser proporcional à gravidade da conduta e à lesão ao bem jurídico protegido pela norma.

3. In casu, a quantia movimentada irregularmente corresponde a apenas 2,7% (dois vírgula sete por cento) do total de recursos, utilizados na campanha eleitoral, não sendo suficiente para ensejar a cassação do diploma.

4. Recurso ordinário provido.

(TSE - REspe nº 6-82/MS, Rel. Min. Dias Toffoli, DJe de 14.3.2014.) (Grifei.)

 

Ação de investigação judicial eleitoral. Captação ilícita de recursos. Abuso do poder econômico.

1. Segundo a jurisprudência do Tribunal, para que seja imposta a sanção de cassação em razão da prática do ilícito previsto no art. 30-A da Lei n. 9.504/97, faz-se necessária a comprovação da proporcionalidade da conduta em relação à penalidade a ser imposta.

2. Ademais, para a configuração do abuso do poder econômico, faz-se necessária, em se tratando de eleições municipais de 2008, a comprovação do requisito de potencialidade.

3. Ainda que reconhecida a utilização de linha de telefone pertencente a sindicato - cujo número foi informado para fins de comunicações processuais da Justiça Eleitoral -, não ficaram evidenciadas outras circunstâncias a indicar a gravidade ou potencialidade da conduta, de modo a configurar os ilícitos dos arts. 30-A da Lei das Eleições ou 22, caput, da Lei Complementar n. 64/90.

Agravo regimental não provido.

(TSE - AgR-REspe nº 9565164-06/CE, Rel. Min. Arnaldo Versiani, DJe de 09.10.2012.) (Grifei.)

 

RECURSO ORDINÁRIO. ELEIÇÃO 2010. REPRESENTAÇÃO. LEI N. 9.504/97. ART. 30-A. DEPUTADO ESTADUAL. CONTAS DE CAMPANHA. CASSAÇÃO. DIPLOMA. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. PROVIMENTO.

1. Na representação instituída pelo art. 30-A da Lei n. 9.504/97, deve-se comprovar a existência de ilícitos que possuam relevância jurídica para comprometer a moralidade da eleição.

2. No caso dos autos, as omissões relativas a determinados gastos de campanha não possuem gravidade suficiente para ensejar a cassação do diploma do recorrente, na medida em que não ficou comprovada a utilização de recursos de fontes vedadas ou a prática de caixa dois.

3. Recurso ordinário provido.

(TSE - RO 39322/AM, Rel. Min. Dias Toffoli, DJe de 21.8.2014.) (Grifei.)

 

Ante o exposto, divirjo do douto Relator apenas para dar provimento aos recursos interpostos por Osvaldo Froner e Anselmo Fracaro Cardoso na AIJE n. 0600501-75.2020.6.21.0044 e na Representação n. 0600036-32.2021.6.21.0044, a fim de julgar improcedentes ambas as ações.