MSCiv - 0603355-09.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 10/10/2022 às 14:00

 

VOTO

 

Preliminarmente, registro a viabilidade da impetração do Mandado de Segurança em face das decisões proferidas no âmbito do poder de polícia sobre a propaganda eleitoral, as quais não ostentam caráter jurisdicional, mas eminentemente administrativo, nos termos do art. 54, § 3º, da Resolução TSE n. 23.608/19.

Ainda prefacialmente, anoto que se tratando de propaganda eleitoral irregular em favor de candidato que concorre ao segundo turno das eleições presidenciais, não há de se falar, no presente momento, em perda de objeto.

No mérito, a partir de notícia de irregularidade em propaganda eleitoral, autuada sob o NIP n. 0600020-57.2022.6.21.0169, o Juiz Eleitoral da 169ª Zona, no exercício do poder de polícia, determinou a remoção do outdoor instalado no Município da Caxias do Sul, em decisão assim lavrada (ID 45123435):

Vistos etc.

 

I – RELATÓRIO:

 

Trata-se de pedido de providências com fundamento no Poder de Polícia apresentado pelo Candidato a Deputado Estadual, Juliano Roso, a partir da verificação da existência de outdoor na cidade de Caxias do Sul/RS, contendo propaganda eleitoral em benefício do candidato a Presidente Jair Messias Bolsonaro, representada por imagem do presidenciável com a faixa de presidente da república, sobreposta às cores da bandeira do Brasil, ao lado dos dizeres “amigos de Caxias do Sul/RS apoiam Bolsonaro” e as palavras “Deus – Pátria – Família – Progresso”, dizeres comumente utilizados pelo referido candidato em sua campanha eleitoral.

 

Junta imagem do dispositivo indicando como localização a saída da BR 116 com a Rota do Sol, Bairro Jardim das Hortências, coordenadas geográficas: -29.133398523105356, - 51.12563710247598.

 

Requer seja determinada a remoção imediata do outdoor, diligências para identificação da empresa responsável pela instalação da peça e encaminhamento ao Procurador Regional Eleitoral para conhecimento e adoção das medidas que entender cabíveis junto ao Tribunal Superior Eleitoral.

 

Vieram os autos conclusos para decisão.

 

É O RELATÓRIO. DECIDO.

 

II – FUNDAMENTAÇÃO

 

Preliminarmente à análise do caso em tela, necessário compreender os limites do exercício do poder de polícia pelo Juízo Eleitoral.

 

A intervenção jurisdicional em sede de poder de polícia deve limitar-se aos casos de flagrante práticas ilegais, como a distribuição de cestas básicas, brindes que proporcionem vantagens aos eleitores e eleitoras, bem como no uso de instrumentos de propaganda eleitoral expressamente vedadas pela norma de regência, como uso de outdoors ou showmícios, que interferem na isonomia e igualdade de condições entre aqueles que pretendem angariar votos dos eleitores e das eleitoras.

 

Neste sentido, descabido quaisquer outros procedimentos investigatórios ou acessórios, devendo a análise recair sobre a legalidade ou não do artefato indicado na petição inicial, restando, portanto, prejudicado o pedido para realização de diligência com vistas a identificação dos responsáveis pela confecção da peça, devendo ser demandado, pelos legitimados, por meio de Representação na jurisdição competente para processamento.

 

Assim, delimitado o escopo de atuação jurisdicional no exercício do Poder de Polícia, passo a análise do caso em tela, que adianto, merece intervenção pois o conteúdo fático revela tratar-se de artefato proibido pela norma de regência, ou seja, OUTDOOR.

 

A simples visualização do conteúdo remete a imagem do candidato com a faixa presidencial e a indicação do nome ao qual concorre. Estes elementos já indicam o caráter eleitoral do artefato, corroborado por mensagem de apoio e lemas que são regularmente utilizados em suas manifestações.

 

Portanto, assiste razão ao requerente quando à irregularidade e a necessidade de intervenção imediata para a retirada, conforme recente manifestação do Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Sul em situação idêntica, que, mesmo estando consignada na Petição inicial, ratifico para subsidiar a presente decisão.

 

MANDADO DE SEGURANÇA. ELEIÇÕES 2022. PROPAGANDA ELEITORAL. LIMINAR INDEFERIDA. ARTEFATO PUBLICITÁRIO. OUTDOOR. DEFLAGRADO PERÍODO PERMITIDO DE PROPAGANDA ELEITORAL. VEDAÇÃO. CONCEDIDA A SEGURANÇA.

1. Mandado de segurança impetrado em face de decisão proferida pelo Juízo da Zona Eleitoral que, no exercício do poder de polícia, indeferiu pedido para remoção de artefato publicitário relativo à propaganda eleitoral. Liminar indeferida.

2. Viabilidade de impetração do presente mandado de segurança, uma vez que a decisão do juízo eleitoral fora proferida em exercício de poder de polícia, atividade administrativa, conforme assentado por esta Corte.

3. Deflagrado o período permitido de propaganda eleitoral em 16.08.2022, não remanesce dúvida quanto à vedação do meio outdoor para veiculação de imagem de candidato à Presidência, fixados em rodovias de intenso trânsito.

4. Concessão da segurança.

(Mandado de Segurança n 060042348, ACÓRDÃO de 29/08/2022, Relator

AMADEO HENRIQUE RAMELLA BUTTELLI, Publicação: MURAL - Publicado no Mural, Data 29/08/2022 )

 

Neste sentido, configurada a irregularidade, independe quem foram os responsáveis pela instalação da peça, o candidato é diretamente beneficiário devendo providenciar os meios para sua retirada, cessando os efeitos da propaganda que afronta a legislação.

 

Por fim, no limite do exercício do Poder de Polícia, cabe apenas a determinação da retirada do artefato irregular, nos termos do Art. 7º da Resolução TSE nº 23.610/2019, sem a aplicação da multa correspondente, restando a possibilidade de apuração em Representação própria no Juízo competente.

 

III – DISPOSITIVO

 

Isto posto, recebo a Notícia de Irregularidade em Propaganda Eleitoral e DEFIRO PARCIALMENTE o requerido pelo Candidato a Deputado Estadual Juliano Roso para determinar:

 

i) Intimação, na forma do Art. 18, I, da Resolução TRE-RS nº 347/2020, do Candidato Jair Messias Bolsonaro e dos órgãos de direção Nacional, no Estado do Rio Grande do Sul e no Município do Sul, dos Partidos que compõem sua coligação: Partido Liberal, Republicanos e Progressistas, para que, no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, providenciem a remoção do outdoor com a propaganda eleitoral indicada nos autos, cuja localização consta na saída da BR 116 com a Rota do Sol, Bairro Jardim das Hortências, coordenadas geográficas: - 29.133398523105356, -51.12563710247598;

 

ii) O descumprimento da presente ordem judicial ensejará a apuração do Crime de Desobediência do art. 347 do Código Eleitoral;

 

iii) Em caso de descumprimento, requisite-se meios de terceiros para a imediata retirada do outdoor irregular, utilizando-se a presente decisão como Mandado Judicial, apurandose os custos para posterior cobrança dos requeridos e dos contratantes em solidariedade.

 

iv) Remessa dos autos ao Ministério Público Eleitoral para ciência Prejudicado o requerimento para as diligências com vistas a identificação dos responsáveis pela instalação da peça publicitária que deverá ser peticionado no juízo competente.

 

Publique-se.

Registre-se.

Intimem-se.

Após, transitando em julgado, arquive-se.

Caxias do Sul, 16 de setembro de 2022.

Dr. SÉRGIO FUSQUINE GONÇALVES

Juiz Eleitoral – 169ª ZE

 

Entendo que assiste razão ao Impetrante, pois não constam nos autos originários qualquer elemento concreto que relacione a instalação do outdoor com o Diretório Estadual do Partido Progressistas a justificar a sua responsabilização pelo cumprimento da ordem de retirada do artefato publicitário.

De seu turno, a decisão impugnada embasa a emissão da ordem ao candidato e diretórios mencionados no benefício por eles obtido.

Porém, “conforme preconiza o art. 40-B da Lei das Eleições, a responsabilização pela divulgação de propaganda irregular pressupõe a comprovação da autoria ou do prévio conhecimento do beneficiário, quando este não é o autor da propaganda” (TSE; REC-Rp n. 0600061-48, Relator: Min. Edson Fachin, Acórdão de 23.04.2020).

Mormente em sede de exercício do poder de polícia, que “se restringe às providências necessárias para inibir práticas ilegais” (art. 41, § 2º, da Lei n. 9.504/97), a ordem de remoção dos aparelhos publicitários considerados irregulares deve direcionar-se àqueles com imediatas e evidentes condições materiais de cumprimento da ordem, tais como o realizador do outdoor, seu contratante, o dirigente da empresa exploradora do serviço, o proprietário do terreno utilizado, ou mesmo podem ser efetivadas mediante Oficial de Justiça.

Cabe ressaltar, ainda, o entendimento jurisprudencial no sentido de que o desrespeito da ordem exarada pelo Juiz Eleitoral em poder de polícia pode caracterizar o tipo penal de desobediência eleitoral (art. 347 do Código Eleitoral), a exigir redobradas cautelas em relação ao direcionamento da determinação à pessoa que tenha possibilidade concreta de pronto cumprimento das providências necessárias.

Com este posicionamento, colaciono o seguinte julgado de minha relatoria:

MANDADO DE SEGURANÇA. ELEIÇÃO 2022. PROPAGANDA ELEITORAL. LIMINAR DEFERIDA. OUTDOOR. REMOÇÃO DE APARELHO PUBLICITÁRIO. APARATO INSTALADO POR TERCEIRO, EM PROPRIEDADE ALHEIA. EXISTÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO DO IMPETRANTE. NÃO COMPROVADA PARTICIPAÇÃO NA MONTAGEM DO ARTEFATO. AFASTADO O DEVER DE CUMPRIMENTO. REMOÇÃO POR OFICIAL DE JUSTIÇA. PROPAGANDA IRREGULAR. CONCESSÃO DA SEGURANÇA.

1. Mandado de segurança impetrado em face de decisão proferida pelo Juízo da Zona Eleitoral, que, no exercício do poder de polícia, deferiu requerimento para remoção de artefato publicitário. Liminar deferida.

2. Viabilidade de impetração do presente mandado de segurança, uma vez que a decisão do juízo eleitoral fora proferida no âmbito do poder de polícia sobre a propaganda eleitoral, as quais não ostentam caráter jurisdicional, mas eminentemente administrativo. Entendimento consolidado no art. 54, § 3º, da Resolução TSE n. 23.608/19.

3. Evidenciado o direito líquido e certo do impetrante em não ser compelido ao cumprimento da ordem sobre aparato instalado por terceiros, em propriedade também alheia, ante a ausência de elementos dos quais se depreenda a participação do órgão partidário na realização direta da publicidade.

4. Entretanto, caracterizada a infração ao art. 36-A da Lei 9.504/97, resta acertada a ordem de remoção. Ademais, após o dia 15 de agosto deste ano, a permanência da publicidade também importa violação aos arts. 36, caput, e 39, § 8º, da Lei das Eleições. Manifesta a ilicitude da propaganda, impositiva a determinação de remoção do artefato por oficial de justiça acompanhado de força policial.

5. Concessão da segurança. Embora afastado o dever de cumprimento da medida pelo impetrante, resta mantida a ordem de retirada do artefato, a qual deverá ser realizada por oficial de justiça.

(TRE-RS; MSCiv n. 0600702-34.2022.6.21.0000; Relator: Des. Eleitoral Caetano Cuervo Lo Pumo, julgado em 03.08.2022)

 

No tocante à configuração de propaganda eleitoral irregular, a decisão não apresenta vício ou ilegalidade, uma vez que, com o início do período eleitoral, por imposição do art. 39, § 8º, da Lei das Eleições, ingressamos em um momento de vedação total ao uso de outdoor que promova candidaturas, seja implícito ou explícito o propósito eleitoral, sendo que, na hipótese, consoante bem apontou o Magistrado, “a simples visualização do conteúdo remete a imagem do candidato com a faixa presidencial e a indicação do nome ao qual concorre”.

Consultando-se os autos da NIP n. 0600020-57.2022.6.21.0169, é possível verificar que o operoso Magistrado da origem redirecionou a ordem e promoveu as diligências necessárias à efetiva retirada do outdoor, ocorrida em 21.09.2022, tornando desnecessária qualquer outra consideração sobre o aspecto.

Assim, remanesce o objeto da segurança em relação à ilegitimidade do Impetrante para o cumprimento da ordem em poder de polícia, a fim de afastar-lhe qualquer responsabilidade por suposta desobediência.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pela concessão da segurança, confirmando a liminar deferida, para afastar a responsabilidade do Impetrante pela remoção do outdoor.