REl - 0600443-76.2020.6.21.0075 - Voto Relator(a) - Sessão: 07/10/2022 às 14:00

VOTO

Senhor Presidente,

Eminentes Colegas.

O recurso é tempestivo e atende aos demais pressupostos de admissibilidade, razão pela qual dele conheço.

No mérito, as contas foram desaprovadas em virtude da aplicação de recursos próprios no total de R$ 16.954,33, na campanha dos candidatos aos cargos de prefeito e vice-prefeito, extrapolando em R$ 4.646,59 o limite para o autofinanciamento na campanha eleitoral, estabelecido no art. 27, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Cabe salientar que o teto de gastos definido pelo TSE para o pleito de 2020 na municipalidade foi de R$ 123.077,42, tendo como limite para a aplicação de recursos próprios na campanha 10% deste total, ou seja, R$ 12.307,75.

Na sentença, ao contrário do alegado pelos recorrentes, o magistrado a quo considerou que o limite de aplicação de recursos próprios, previsto no § 1º do art. 27 da Resolução TSE n. 23.607/19, deve ser considerado de forma conjunta, a partir da soma das quantias doadas pelos candidatos a prefeito e vice-prefeito para a campanha.

Transcrevo excerto da decisão recorrida:

Com relação a alegação do prestador acerca do limite de gastos, de fato, na Resolução TSE n. 23.665/21, restou expresso o entendimento compartilhado pelos operadores de direito pela leitura sistemática da legislação vigente, qual seja, não há divisão dos recursos próprios doados pelo candidato a prefeito e seu vice, uma vez que se trata de uma única eleição da chapa majoritária, uma só campanha, onde a prestação de contas do titular abrange a do seu vice, consoante dispõe o art. 45, § 3º da Resolução TSE n. 23.607/19.

 

No parecer ofertado ao recurso, a Procuradoria Regional Eleitoral entende pela correção da sentença, consignando que:

Para as próximas eleições, está expresso no art. 4º, § 2º-A, da Resolução TSE n. 23.607/19, com alterações da Resolução TSE n. 23.665/21, que o limite de gastos fixado para o cargo da eleição majoritária é único e inclui os gastos realizados pela candidata ou pelo candidato ao cargo de vice ou suplente. Nas eleições de 2020, de qualquer modo, já não havia dúvida de que, para verificação da observância do limite de gastos para o autofinanciamento na candidatura majoritária, devem ser computados conjuntamente os recursos próprios doados pelo candidato titular e pelo vice, como se verifica dos dispositivos originários da Resolução TSE n. 23.607/19. Veja-se:

 

- A prestação de contas do titular da chapa abrange a do seu vice, o qual somente pode prestar contas sozinho na inércia do titular (arts. 45, § 3º e 77, caput e parágrafo único, da Resolução TSE n. 23.607/19). Nesse sentido, no extrato da prestação de contas, os recursos próprios do candidato e do vice estão somados na mesma rubrica.

- O candidato a vice não é obrigado a abrir conta bancária, mas, se o fizer, os extratos deverão compor a prestação de contas do titular (art. 8º, § 3º, da Resolução TSE n. 23.607/19).

- No tocante aos recibos eleitorais, a arrecadação realizada pelo candidato a vice utiliza os recibos eleitorais do titular (art. 7º, § 8º, da Resolução TSE n. 23.607/19).

- O candidato a vice não pode constituir fundo de caixa (art. 39, parágrafo único, da Resolução TSE n. 23.607/19).

- Para aferição dos limites de gastos para contratação de pessoal para prestação de serviços referentes a atividades de militância e mobilização de rua são consideradas as contratações realizadas pelo titular e pelo vice (art. 41, § 5º, da Resolução TSE n. 23.607/19).

 

Ressalte-se que, para aferição do limite global de gastos da candidatura majoritária, não se discute que são somadas as receitas do titular e do vice, tanto que este utiliza os recibos do titular. E assim é, pois, como é cediço, a chapa majoritária é una e indivisível (art. 18, § 1º, da Resolução TSE n. 23.609/19).

Nesse sentido, não é estabelecido limite para candidatura de vice, mas apenas de, no que interessa ao caso, Prefeito. Daí que todos os valores arrecadados são somados para verificação da observância do limite global.

 

Com efeito, não há limites individualizados em razão do princípio da unicidade ou indivisibilidade da chapa majoritária, previsto no art. 91 do Código Eleitoral, § 1º do art. 3º da Lei n. 9.504/97 e arts. 77, § 1º, e 28 da Constituição Federal, o qual restringe candidaturas isoladas para os cargos concebidos para ter natureza dúplice.

A lição doutrinária bem explica que o cargo de vice não pode ser considerado isolado do cargo de prefeito, o que corrobora a conclusão pelo acerto da sentença hostilizada ao somar os recursos aplicados na campanha para fins de limite de autofinanciamento:

Em regra, o Vice tem recebido – doutrinária e jurisprudencialmente – tratamento similar ao do Chefe do Poder Executivo respectivo, porquanto é sua atribuição básica e fundamental o exercício das atribuições do titular quando configurada a situação de ausência – seja eventual ou definitiva. Corrobora tal assertiva, aliás, a adoção do princípio da unicidade de chapa, pelo qual o registro dos candidatos ao Executivo “far-se-á sempre em chapa única e indivisível” (art. 91 do CE). No entanto, não se pode olvidar uma elementar distinção: ao contrário do titular do mandato, o Vice não possui inato poder de mando – já que somente exerce as atribuições de governo constitucional e legalmente previstas quando em efetivo exercício no cargo do titular.

Com a edição da EC nº 16/97 (que instituiu a reeleição para os cargos do Poder Executivo) e em face da similitude de tratamento entre o titular ao cargo de Chefe do Poder Executivo e seu respectivo Vice, resta superado o entendimento sumular do enunciado nº 8 do TSE, que dispunha que o Vice-Prefeito é inelegível para o mesmo cargo. Consoante NERI DA SILVEIRA (p. 63), “o TSE adotou jurisprudência no sentido da íntima convicção entre os titulares do Poder Executivo e o respectivo Vice”. Com efeito, é princípio basilar do Direito Eleitoral que o candidato a Vice possui uma relação de dependência com o pretendente ao cargo máximo do Executivo respectivo. Esta regra é excepcionada em situações específicas e pontuais. Assim, v.g., a declaração de inelegibilidade do candidato ao cargo de Chefe do Poder Executivo, se fundada em motivo de cunho pessoal, não atinge a do respectivo Vice (art. 18 da LC nº 64/90). A correta compreensão da relação do Chefe do Poder Executivo e seu Vice pode ser assim delineada: existe relação de dependência no que pertine a submissão a vontade popular, já que o voto é exarado sempre na chapa; inexiste a relação de dependência quando a declaração de inelegibilidade é calcada em motivos pessoais (não, contudo, quando a inelegibilidade decorre de ato de abuso de poder, apurado em regular processo eleitoral, havendo a contaminação da respectiva chapa).

(Zilio, Rodrigo López; Direito Eleitoral. Porto Alegre: Verbo Jurídico. 3.ed, p. 241).

 

Por conta da máxima da indivisibilidade da chapa, a Resolução TSE n. 23.607/19, ao dispor sobre a arrecadação, os gastos e a prestação de contas nas eleições, prevê que o candidato ao cargo de vice deve observar as limitações estabelecidas para o titular em diversas hipóteses: a) no caso de arrecadação realizada pelo vice ou pelo suplente, devem ser utilizados os recibos eleitorais do titular (§ 8º do art. 7o); b) os candidatos a vice e suplente não são obrigados a abrir conta bancária (§ 3º do art. 8o); c) o candidato a vice ou a suplente não pode constituir Fundo de Caixa (parágrafo único do art. 39); d) para a aferição dos limites de gastos com atividades de militância, serão consideradas e somadas as contratações realizadas pelo titular e as realizadas pelo vice ou suplente (art. 41, § 5o); e) a prestação de contas do titular abrangerá o vice ou o suplente (art. 45, § 3º); f) a decisão que julgar as contas abrangerá o vice ou o suplente (art. 77).

Por esses fundamentos, comungo do entendimento de que o § 1º do art. 27 da Resolução TSE n. 23.607/19, que regulamenta o art. 23, § 2º-A, da Lei n. 9.504/97, não estabeleceu um limite de autofinanciamento individualizado para os cargos de prefeito e vice.

Segue acórdão a ilustrar o entendimento aqui adotado:

RECURSO ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2020. PREFEITO. RECURSOS PRÓPRIOS APLICADOS NA CAMPANHA EM VALOR ACIMA DOS 10% DO LIMITE DE GASTOS FIXADO PARA A CANDIDATURA. VALOR EXPRESSIVO. FALHA GRAVE QUE COMPROMETE A REGULARIDADE DAS CONTAS. DESAPROVAÇÃO. APLICAÇÃO DE MULTA. IRRESIGNAÇÃO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA ZONAL. DESPROVIMENTO.

1. A extrapolação do limite de gastos realizados com recursos próprios, previsto no art. 27, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, quando se tratar de montante relevante, é falha de natureza grave que conduz à desaprovação das contas, fazendo incidir a multa prevista no § 4º do referido dispositivo legal.

2. Desprovimento do recurso.

(TRE-PB, RE n 060026075, ACÓRDÃO, Relator ARTHUR MONTEIRO LINS FIALHO, DJE 05.5.2021.)

 

Por fim, quanto ao pedido de aplicação do princípio da razoabilidade para o efeito de reduzir o percentual da multa imposta, de igual modo tenho que não assiste razão aos recorrentes. Isso porque a extrapolação representa 23,64% do total de recursos recebidos pelos candidatos (R$ 16.954,33), mostrando-se dentro da razoabilidade a aplicação da multa no percentual de 100%.

De igual modo, inviável aprovar-se as contas com ressalvas, pois o valor irregular supera o limite de 10% das quantias percebidas na campanha, sendo também bastante superior ao montante utilizado alternativamente como parâmetro pela Justiça Eleitoral (R$ 1.064,10).

Ante o exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso, mantendo integralmente a sentença de primeiro grau.

É como voto, senhor Presidente.