REl - 0600393-61.2020.6.21.0039 - Voto Relator(a) - Sessão: 29/09/2022 às 14:00

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, adianto que assiste razão à recorrente.

A matéria relativa à propaganda eleitoral gratuita está disciplinada no inc. IV do art. 51 da Lei das Eleições:

Art.51. Durante o período previsto no art. 47 desta Lei, as emissoras de rádio e televisão e os canais por assinatura mencionados no art. 57 desta Lei reservarão setenta minutos diários para a propaganda eleitoral gratuita, a serem usados em inserções de trinta e de sessenta segundos, a critério do respectivo partido ou coligação, assinadas obrigatoriamente pelo partido ou coligação, e distribuídas, ao longo da programação veiculada entre as cinco e as vinte quatro horas, nos termos do § 2o do art. 47 desta Lei, obedecido o seguinte: (Redação dada pela Lei nº 13.488, de 2017)

[...]

IV - na veiculação das inserções, é vedada a divulgação de mensagens que possam degradar ou ridicularizar candidato, partido ou coligação, aplicando-se-lhes, ainda, todas as demais regras aplicadas ao horário de propaganda eleitoral, previstas no art. 47. (Redação dada pela Lei nº 12.891, de 2013)

 

A lição de Rodrigo López Zílio (2022, p. 480) nos ensina que é “preocupação do legislador uma proteção à honra e à imagem dos atores do processo eleitoral”, de modo que não haja excesso por parte de algum deles no exercício da liberdade de manifestação do pensamento. Da mesma forma, leciona que “o descumprimento dessa regra pode acarretar a concessão do direito de resposta e, em sendo o caso, a responsabilidade penal”.

Trata-se o direito de resposta de garantia constitucional prevista no art. 5º, inc. V, da CF, que assegura seu exercício proporcional ao agravo, sem prejuízo da indenização por dano material, moral ou à imagem.

No plano infraconstitucional, dispõe o art. 58 da Lei n. 9.504/97:

Art. 58. A partir da escolha de candidatos em convenção, é assegurado o direito de resposta a candidato, partido ou coligação atingidos, ainda que de forma indireta, por conceito, imagem ou afirmação caluniosa, difamatória, injuriosa ou sabidamente inverídica, difundidos por qualquer veículo de comunicação social.

§ 1º O ofendido, ou seu representante legal, poderá pedir o exercício do direito de resposta à Justiça Eleitoral nos seguintes prazos, contados a partir da veiculação da ofensa:

I - vinte e quatro horas, quando se tratar do horário eleitoral gratuito;

II - quarenta e oito horas, quando se tratar da programação normal das emissoras de rádio e televisão;

III - setenta e duas horas, quando se tratar de órgão da imprensa escrita.

IV - a qualquer tempo, quando se tratar de conteúdo que esteja sendo divulgado na internet, ou em 72 (setenta e duas) horas, após a sua retirada. (Incluído pela Lei nº 13.165, de 2015)

§ 2º Recebido o pedido, a Justiça Eleitoral notificará imediatamente o ofensor para que se defenda em vinte e quatro horas, devendo a decisão ser prolatada no prazo máximo de setenta e duas horas da data da formulação do pedido.

§ 3º Observar-se-ão, ainda, as seguintes regras no caso de pedido de resposta relativo a ofensa veiculada:

I - em órgão da imprensa escrita:

a) o pedido deverá ser instruído com um exemplar da publicação e o texto para resposta;

b) deferido o pedido, a divulgação da resposta dar-se-á no mesmo veículo, espaço, local, página, tamanho, caracteres e outros elementos de realce usados na ofensa, em até quarenta e oito horas após a decisão ou, tratando-se de veículo com periodicidade de circulação maior que quarenta e oito horas, na primeira vez em que circular;

c) por solicitação do ofendido, a divulgação da resposta será feita no mesmo dia da semana em que a ofensa foi divulgada, ainda que fora do prazo de quarenta e oito horas;

d) se a ofensa for produzida em dia e hora que inviabilizem sua reparação dentro dos prazos estabelecidos nas alíneas anteriores, a Justiça Eleitoral determinará a imediata divulgação da resposta;

e) o ofensor deverá comprovar nos autos o cumprimento da decisão, mediante dados sobre a regular distribuição dos exemplares, a quantidade impressa e o raio de abrangência na distribuição;

II - em programação normal das emissoras de rádio e de televisão:

a) a Justiça Eleitoral, à vista do pedido, deverá notificar imediatamente o responsável pela emissora que realizou o programa para que entregue em vinte e quatro horas, sob as penas do art. 347 da Lei nº 4.737, de 15 de julho de 1965 - Código Eleitoral, cópia da fita da transmissão, que será devolvida após a decisão;

b) o responsável pela emissora, ao ser notificado pela Justiça Eleitoral ou informado pelo reclamante ou representante, por cópia protocolada do pedido de resposta, preservará a gravação até a decisão final do processo;

c) deferido o pedido, a resposta será dada em até quarenta e oito horas após a decisão, em tempo igual ao da ofensa, porém nunca inferior a um minuto;

III - no horário eleitoral gratuito:

a) o ofendido usará, para a resposta, tempo igual ao da ofensa, nunca inferior, porém, a um minuto;

b) a resposta será veiculada no horário destinado ao partido ou coligação responsável pela ofensa, devendo necessariamente dirigir-se aos fatos nela veiculados;

c) se o tempo reservado ao partido ou coligação responsável pela ofensa for inferior a um minuto, a resposta será levada ao ar tantas vezes quantas sejam necessárias para a sua complementação;

d) deferido o pedido para resposta, a emissora geradora e o partido ou coligação atingidos deverão ser notificados imediatamente da decisão, na qual deverão estar indicados quais os períodos, diurno ou noturno, para a veiculação da resposta, que deverá ter lugar no início do programa do partido ou coligação;

e) o meio magnético com a resposta deverá ser entregue à emissora geradora, até trinta e seis horas após a ciência da decisão, para veiculação no programa subseqüente do partido ou coligação em cujo horário se praticou a ofensa;

f) se o ofendido for candidato, partido ou coligação que tenha usado o tempo concedido sem responder aos fatos veiculados na ofensa, terá subtraído tempo idêntico do respectivo programa eleitoral; tratando-se de terceiros, ficarão sujeitos à suspensão de igual tempo em eventuais novos pedidos de resposta e à multa no valor de duas mil a cinco mil UFIR.

IV - em propaganda eleitoral na internet: (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)

a) deferido o pedido, o usuário ofensor deverá divulgar a resposta do ofendido em até quarenta e oito horas após sua entrega em mídia física, e deverá empregar nessa divulgação o mesmo impulsionamento de conteúdo eventualmente contratado nos termos referidos no art. 57-C desta Lei e o mesmo veículo, espaço, local, horário, página eletrônica, tamanho, caracteres e outros elementos de realce usados na ofensa; (Redação dada pela Lei nº 13.488, de 2017)

b) a resposta ficará disponível para acesso pelos usuários do serviço de internet por tempo não inferior ao dobro em que esteve disponível a mensagem considerada ofensiva; (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)

c) os custos de veiculação da resposta correrão por conta do responsável pela propaganda original. (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)

§ 4º Se a ofensa ocorrer em dia e hora que inviabilizem sua reparação dentro dos prazos estabelecidos nos parágrafos anteriores, a resposta será divulgada nos horários que a Justiça Eleitoral determinar, ainda que nas quarenta e oito horas anteriores ao pleito, em termos e forma previamente aprovados, de modo a não ensejar tréplica.

§ 5º Da decisão sobre o exercício do direito de resposta cabe recurso às instâncias superiores, em vinte e quatro horas da data de sua publicação em cartório ou sessão, assegurado ao recorrido oferecer contra-razões em igual prazo, a contar da sua notificação.

§ 6º A Justiça Eleitoral deve proferir suas decisões no prazo máximo de vinte e quatro horas, observando-se o disposto nas alíneas d e e do inciso III do § 3º para a restituição do tempo em caso de provimento de recurso.

§ 7º A inobservância do prazo previsto no parágrafo anterior sujeita a autoridade judiciária às penas previstas no art. 345 da Lei nº 4.737, de 15 de julho de 1965 - Código Eleitoral.

§ 8º O não-cumprimento integral ou em parte da decisão que conceder a resposta sujeitará o infrator ao pagamento de multa no valor de cinco mil a quinze mil UFIR, duplicada em caso de reiteração de conduta, sem prejuízo do disposto no art. 347 da Lei nº 4.737, de 15 de julho de 1965 - Código Eleitoral.

§ 9o Caso a decisão de que trata o § 2o não seja prolatada em 72 (setenta e duas) horas da data da formulação do pedido, a Justiça Eleitoral, de ofício, providenciará a alocação de Juiz auxiliar. (Incluído pela Lei nº 12.891, de 2013)

Art. 58-A. Os pedidos de direito de resposta e as representações por propaganda eleitoral irregular em rádio, televisão e internet tramitarão preferencialmente em relação aos demais processos em curso na Justiça Eleitoral. (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)

 

No mesmo sentido, o art. 31 da Resolução TSE n. 23.608/19:

Art. 31. A partir da escolha de candidatas ou candidatos em convenção, é assegurado o exercício do direito de resposta à candidata, ao candidato, ao partido político, à federação de partidos ou à coligação atingidos, ainda que de forma indireta, por conceito, imagem ou afirmação caluniosa, difamatória, injuriosa ou sabidamente inverídica, difundidos por qualquer veículo de comunicação social, inclusive provedores de aplicativos de internet e redes sociais (Lei nº 9.504/1997, arts. 6º-A e 58, caput e Lei nº 9.096/1995, art. 11-A, caput e § 8º). (Redação dada pela Resolução nº 23.672/2021)

Parágrafo único. Se o pedido versar sobre a utilização, na propaganda eleitoral, de conteúdo reputado sabidamente inverídico, inclusive veiculado originariamente por pessoa terceira, caberá à representada ou ao representado demonstrar que procedeu à verificação prévia de elementos que permitam concluir, com razoável segurança, pela fidedignidade da informação.

 

Superadas essas questões conceituais e doutrinárias acerca das hipóteses de cabimento do direito de resposta e do arbitramento de multa para a eventualidade de descumprimento de decisão, passo à análise do caso concreto.

A decisão de origem reconheceu a perda do objeto do pedido de direito de resposta, em razão do término do período de propaganda eleitoral, bem como considerou ter havido descumprimento da liminar concedida, motivo pelo qual manteve a sanção pecuniária, no valor de R$ 10.000,00 por dia de descumprimento, aplicada aos representados Movimento Democrático Brasileiro - MDB de Rosário do Sul e Andrea Flores Irion Ribeiro.

A mencionada decisão liminar (ID 23962383), cujo conteúdo o juízo a quo reputou violar o teor do art. 243, inc. IX, do Código Eleitoral, limitou-se a proibir a veiculação do áudio de ID 26932033, que segue:

(Voz do Locutor) Ouça o candidato Marcos Paulo, na CPI do Lixo (início da fala parcialmente retirada do depoimento) Nunca me interei 100% me dediquei 100% àquilo ali, funcionava assim e eu dei sequencia realmente ao sistema que já funcionava, (Voz do Locutor) Quem teve a missão de cuidar desse contrato que gerou um prejuízo de um milhão e meio aos cofres públicos, será que tem condições de cuidar de uma cidade inteira? Isso é a renovação? Ou a sequência do que está aí? Pense bem na hora de votar. Segundo o Candidato Marcos Paulo, o chefe do controle interno Carlos Oneide é o mesmo contador da empresa que deixou um rombo de um milhão e meio aos cofres públicos, isso não é legal! (novo trecho da fala parcialmente retirada do depoimento) A gente sempre soube lá que o Carlos Oneide é o contador da Empresa. (Voz do Locutor) E mesmo sabendo disso o candidato não fez nada? Isso é a renovação? Ou a sequência do que está aí? Pense bem na hora de votar. Vota 15 meu Rosário.

 

Após o deferimento da liminar, sobreveio petição dos representantes (ID 23962983) noticiando o descumprimento da ordem judicial, em virtude da veiculação dos áudios de IDs 23963033, 23963083 e 23963133, abaixo transcritos:

ÁUDIO – 01
(Voz do Locutor) Quando ficou sabendo das irregularidades no Lixo a Sra. Carla Monteiro da Silva, chefe do departamento de licitações fez a seguinte orientação ao Senhor Marcos Paulo (início da fala parcialmente retirada do depoimento de Carla) Orientei ele a proceder a abertura do processo administrativo para averiguação e investigação que é o correto né, verificar como é que funciona, e desde aí eu nunca mais fiquei sabendo, fiquei sabendo que desde que foi aberta a CPI que tava acontecendo, (Voz do Locutor) E na CPI foi perguntado se este processo foi aberto (fala parcialmente retirada do depoimento de Carla) ele não foi aberto, nunca recebi nada, o senhor secretário que era o executor do contrato ele foi orientado a abrir um processo e até o momento pelo que sei ele não procedeu a abertura. (Voz do Locutor) Isso é a renovação? Pense bem na hora de votar.


ÁUDIO – 02
(Voz do Locutor) Ouça e tire você mesmo as conclusões do que diz o Sr. Abelino na CPI do Lixo. Perguntado se ele era o Secretário de Planejamento ou se só assinava a pasta. (início da fala parcialmente retirada do depoimento de Abelino) Mesmo eu estando na secretaria de obras do interior eu assinava a pasta do meio ambiente. (Voz do Locutor) Perguntado se ele tinha controle da secretaria ouça bem o que ele diz. (fala parcialmente retirada do depoimento de Abelino) Não não tinha controle nenhum, praticamente assinava algum papel só que me pediam, que era mais coordenado pelo Marcos Paulo. (Voz do Locutor) E mais grave ainda, perguntado quem fazia os relatórios para pagamento ouça
com atenção a verdade que diz o senhor Abelino. (fala parcialmenteretirada do depoimento de Abelino) Era o Marcos Paulo o Adriano os que  tavam na linha de frente. (Voz do Locutor) Isso é a renovação? Pense bem na hora de votar.


ÁUDIO – 03
(Voz do Locutor) Na CPI do lixo, uma coisa ficou bem clara, sobre o Senhor Adriano Dorneles, dito pelo senhor Abelino quem é que mandava. (início da fala parcialmente retirada do depoimento de Abelino) Era ele, ali quem resolvia era ele e o Marcos Paulo. (Voz do Locutor) E quem pedia para assinar. (fala parcialmente retirada do depoimento de Abelino) Eu chegava as vezes tinha um papel pra assinar o Adriano dizia assim, assina aqui que eu tenho que mandar lá pro meio ambiente, pronto, era isso que eu fazia, mais nada. (Voz do Locutor) Para ficar bem claro novamente. (fala parcialmente retirada do depoimento de Abelino) Marcos Paulo encaminhava os papel pra mim assinar lá e eu chegava lá o Adriano pedia a minha assinatura, só isso. (Voz do Locutor) E Só para finalizar em quem o Sr. Abelino confiava. (fala parcialmente retirada do depoimento de Abelino) É no Marcos Paulo, Marcos Paulo. (Voz do Locutor) Isso é a renovação? Pense bem na hora de votar.

 

Ocorre que, comparando-se o áudio cuja veiculação foi proibida pela decisão judicial e os que foram veiculados subsequentemente, verifica-se não se tratar do mesmo áudio, não havendo, assim, descumprimento da decisão judicial.

Ainda que os dois áudios tratem do mesmo assunto, “CPI do Lixo”, por meio da exploração de material inserto na investigação, constituem propagandas eleitorais distintas. Observe-se que o tema dos áudios apresenta identidade, porém, trazem conteúdo distinto, cada propaganda veiculada expõe diferentes testemunhos incluídos na investigação.

Importa esclarecer que a vedação constante na decisão liminar recaiu sobre a veiculação de áudio específico contra o qual o representante se insurgiu, e não sobre a abordagem do assunto “CPI do Lixo”. Ademais, aquele áudio não foi novamente transmitido, tampouco foi demonstrado que uma versão alterada tenha sido elaborada a fim de burlar a proibição judicial.

Com esses fundamentos, o recurso comporta provimento, para que seja afastada a multa cominada.

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo conhecimento e provimento do recurso, ao efeito de afastar a imposição da multa, nos termos da fundamentação.