PCE - 0600402-43.2020.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 29/09/2022 às 14:00

VOTO

Eminentes Colegas, o Diretório Regional do PARTIDO COMUNISTA DO BRASIL - PC do B apresentou sua prestação de contas referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos nas eleições municipais de 2020. 

Após o exame de todos os documentos e esclarecimentos apresentados nos autos, o órgão técnico deste Tribunal considerou sanados parte dos apontamentos inicialmente realizados, à exceção da ausência de repasse dos percentuais de recursos que deveriam ser destinados às candidaturas femininas e de pessoas negras. Vejamos (ID 45011255):

3. APLICAÇÃO DO FUNDO PARTIDÁRIO E FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA NAS COTAS DE GÊNERO E RAÇA

3.1. Cota de Gênero e Racial – Fundo Partidário (FP) A aplicação de recursos do Fundo Partidário em campanha eleitoral deverá observar os repasses destinados às cotas de gênero, conforme art. 19, da Resolução n. 23.607/2019 e Ação Direta de Inconstitucionalidade STF n. 5617; bem como às cotas de raça, de acordo com a decisão constante da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental n. 738/DF.

Conforme item 3.1 do Exame de Contas, verificou-se a destinação de R$ 5.000,00 à cota de gênero. Entretanto, restou pendente de comprovação de repasse o valor de R$ 1.429,73, em desacordo com o art. 19, §§ 3º, 4º, 5º, 8º e 9º4, da Resolução TSE nº. 23.607/2019.

Apontou-se no Exame de Contas que não houve o cumprimento dos preceitos da aplicação dos recursos públicos em candidaturas femininas negras e pardas, restando o valor de R$ 1.916,05 em desacordo com a decisão na Medida Cautelar proferida na ADPF nº 738/DF.

De acordo com o apontado no Exame de Contas, não houve o cumprimento dos preceitos da aplicação dos recursos públicos em candidaturas masculinas negras e pardas, restando o valor de R$ 2.852,51 em desacordo com a decisão na Medida Cautelar proferida na ADPF nº 738/DF.

O prestador de contas não se manifestou, mantendo-se as irregularidades quanto à aplicação dos recursos do Fundo Partidário em candidaturas femininas, candidaturas de mulheres pretas e pardas e candidaturas masculinas de pretos e pardos, no montante de R$ 6.198,29.

Embora constatada a manutenção da irregularidade quanto ao repasse de recursos de Fundo Partidário destinado às cotas de gênero e às de raça, cumpre destacar a promulgação da Emenda Constitucional n. 117, de 5 de abril de 2022 (EC n. 117/2022)5, que em seu art. 3º determina que não haverá sanções aos partidos que não preencheram a cota mínima de recursos ou que não cumpriram com os repasses mínimos nas eleições anteriores à promulgação dessa Emenda Constitucional.

3.2. Cota de Gênero e Racial – Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC)

Diferentemente do Fundo Partidário, que tem previsão legal para destinação do recurso em cada esfera partidária, os recursos do FEFC não guardam essa particularidade, sendo a repartição calculada na exata proporção das candidaturas apresentadas pela agremiação a nível nacional.

O repasse de recursos do FEFC destinados ao cumprimento da cota racial será objeto de análise na prestação de contas dos diretórios nacionais, assim como já ocorre com a cota de gênero, não sendo tema para apuração no presente exame de contas.

[…]

Conclusão

A irregularidade de não aplicação do Fundo Partidário em candidaturas femininas, candidaturas de mulheres pretas e pardas e candidaturas masculinas de pretos e pardos no item 3.1, importam no valor total de R$ 6.198,29, o qual representa 0,5%, do total de receita (financeira e estimável) declarada pelo prestador.

Ao final, considerando o resultado dos exames técnicos empreendidos na prestação de contas, recomenda-se a aprovação das contas com ressalva.

Pois bem, a aplicação dos recursos do Fundo Partidário em campanhas eleitorais está regulamentada no art. 19 da Resolução TSE n. 23.607/19, sendo a redação da norma para as eleições 2020 a seguinte:

Art. 19. Os partidos políticos podem aplicar nas campanhas eleitorais os recursos do Fundo Partidário, inclusive aqueles recebidos em exercícios anteriores.

§ 1º A aplicação dos recursos provenientes do Fundo Partidário nas campanhas eleitorais pode ser realizada mediante:

I - transferência bancária eletrônica para conta bancária do candidato, aberta nos termos do art. 9º desta Resolução;

II - pagamento dos custos e das despesas diretamente relacionados às campanhas eleitorais dos candidatos e dos partidos políticos, procedendo-se à sua individualização.

§ 2º Os partidos políticos devem manter as anotações relativas à origem e à transferência dos recursos na sua prestação de contas anual e devem registrá-las na prestação de contas de campanha eleitoral de forma a permitir a identificação do destinatário dos recursos ou do seu beneficiário.

§ 3º Os partidos políticos, em cada esfera, devem destinar ao financiamento de campanhas de suas candidatas no mínimo 30% dos gastos totais contratados nas campanhas eleitorais com recursos do Fundo Partidário, incluídos nesse valor os recursos a que se refere o inciso V do art. 44 da Lei nº 9.096/1995 (Lei nº 13.165/2015, art. 9º).

§ 4º Havendo percentual mais elevado de candidaturas femininas, o mínimo de recursos globais do Fundo Partidário destinados a campanhas deve ser aplicado no financiamento das campanhas de candidatas na mesma proporção.

§ 5º A verba oriunda da reserva de recursos do Fundo Partidário, destinada ao custeio das candidaturas femininas, deve ser aplicada pela candidata no interesse de sua campanha ou de outras campanhas femininas, sendo ilícito o seu emprego, no todo ou em parte, exclusivamente para financiar candidaturas masculinas.

§ 6º O disposto no § 5º deste artigo não impede: o pagamento de despesas comuns com candidatos do gênero masculino; a transferência ao órgão partidário de verbas destinadas ao custeio da sua cota-parte em despesas coletivas; outros usos regulares dos recursos provenientes da cota de gênero; desde que, em todos os casos, haja benefício para campanhas femininas.

§ 7º É vedado o repasse de recursos do Fundo Partidário, dentro ou fora da circunscrição, por partidos políticos ou candidatos:

I - não pertencentes à mesma coligação; e/ou

II - não coligados.

§ 8º O emprego ilícito de recursos do Fundo Partidário nos termos dos §§ 5º e 6º deste artigo sujeitará os responsáveis e beneficiários às sanções do art. 30-A da Lei nº 9.504/1997, inclusive na hipótese de desvio de finalidade, sem prejuízo das demais cominações legais cabíveis.

§ 9º Na hipótese de repasse de recursos do Fundo Partidário em desacordo com as regras dispostas neste artigo, configura-se a aplicação irregular dos recursos, devendo o valor repassado irregularmente ser recolhido ao Tesouro Nacional pelo órgão ou candidato que realizou o repasse tido por irregular, respondendo solidariamente pela devolução o recebedor, na medida dos recursos que houver utilizado. (Grifei.)

Apesar de a redação da resolução prever na ocasião apenas a destinação de percentual de valores ao financiamento de candidaturas femininas, sabe-se que o Tribunal Superior Eleitoral respondeu afirmativamente à Consulta n. 0600306-47.2019.6.00.0000, asseverando a viabilidade do fomento das candidaturas de pessoas negras com recursos oriundos do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC e que o Supremo Tribunal Federal, na ADPF n. 738, determinou a imediata aplicação, ainda nas eleições 2020, desses incentivos às candidaturas de pessoas negras (ADPF 738 MC-Ref, Relator(a): RICARDO LEWANDOWSKI, Tribunal Pleno, julgado em 05/10/2020, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-260 DIVULG 28-10-2020 PUBLIC 29-10-2020).

A redação do dispositivo foi alterada para as eleições 2022, a fim de que o regulamento refletisse essas decisões. Vejamos:

§ 3º Para o financiamento de candidaturas femininas e de pessoas negras, a representação do partido político na circunscrição do pleito deve destinar os seguintes percentuais relativos aos seus gastos contratados com recursos do Fundo Partidário: (Redação dada pela Resolução nº 23.665/2021)

I - para as candidaturas femininas o percentual corresponderá a proporção dessas candidaturas em relação a soma das candidaturas masculinas e femininas do partido, não podendo ser inferior a 30% (trinta por cento); (Incluído pela Resolução nº 23.665/2021)

II - para as candidaturas de pessoas negras o percentual corresponderá à proporção de: (Incluído pela Resolução nº 23.665/2021)

a) mulheres negras e não negras do gênero feminino do partido; e (Incluído pela Resolução nº 23.665/2021)

b) homens negros e não negros do gênero masculino do partido; e (Incluído pela Resolução nº 23.665/2021)

III - os percentuais de candidaturas femininas e de pessoas negras será obtido pela razão dessas candidaturas em relação ao total de candidaturas da representação do partido político na circunscrição do pleito. (Incluído pela Resolução nº 23.665/2021)

§ 4º (revogado)

§ 4º-A A regularidade da aplicação mínima dos percentuais mencionados nos incisos I e II do § 3º deste artigo será apurada na prestação de contas da representação do partido político na circunscrição do pleito. (Incluído pela Resolução nº 23.665/2021)

§ 5º A verba do Fundo Partidário destinada ao custeio das campanhas femininas e de pessoas negras deve ser aplicada exclusivamente nestas campanhas, sendo ilícito o seu emprego no financiamento de outras campanhas não contempladas nas cotas a que se destinam. (Redação dada pela Resolução nº 23.665/2021)

§ 6º O disposto no § 5º deste artigo não impede: o pagamento de despesas comuns com candidatos do gênero masculino e de pessoas não negras; a transferência ao órgão partidário de verbas destinadas ao custeio da sua cota-parte em despesas coletivas, desde que haja benefício para campanhas femininas e de pessoas negras. (Redação dada pela Resolução nº 23.665/2021)

Na hipótese, a análise técnica (ID 44906869) pontuou que o partido, “nas Eleições de 2020, contou com um total de 415 candidatos, dos quais 151 candidaturas femininas, dentre elas, 45 candidaturas de mulheres negras e pardas; e quanto ao gênero masculino identificaram-se 264 candidaturas no total, dentre os quais 67 se autodeclararam negros e pardos".

O parecer conclusivo (ID 45011255) identificou a destinação de R$ 5.000,00 às candidaturas de mulheres, restando pendente de comprovação o repasse de R$ 1.429,73; em relação às candidaturas femininas negras e pardas, deixou de ser comprovada a distribuição de recursos no valor de R$ 1.916,05; e, em relação às candidaturas masculinas negras e pardas, a ausência de comprovação atingiu o montante de R$ 2.852,51.

Tais irregularidades não foram sanadas pelos documentos juntados na prestação de contas e importam no valor total de R$ 6.198,29, 0,5 % da receita (financeira e estimável) declarada pelo prestador.

Embora o § 9º do já mencionado art. 19 da Resolução TSE n. 23.607/19 estabeleça que o repasse irregular de recursos do Fundo Partidário implique recolhimento dos valores equivalentes ao Tesouro Nacional, o art. 3º da Emenda Constitucional n. 117, de 05 de abril de 2022, vedou a aplicação de sanções de qualquer natureza, inclusive de devolução de valores, multa ou suspensão do Fundo Partidário, aos partidos que não preencheram a cota mínima de recursos ou que não destinaram os valores mínimos em razão de sexo e raça em eleições ocorridas antes de sua promulgação.

Nessa linha, a constatação do descumprimento das ações afirmativas em pleitos anteriores à promulgação da EC n. 117 pode ensejar a aposição de ressalvas ou a desaprovação das contas partidárias, ficando afastada, em relação a irregularidades dessa natureza, a imposição de sanções ou da condenação à devolução de valores.

Considerado o montante das máculas não superadas e seu valor irrisório em termos percentuais (0,5 % das receitas declaradas), não havendo nos autos qualquer elemento que ateste má–fé do partido, à luz dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, nos termos da jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, as contas devem ser aprovadas com ressalvas (TSE, Recurso Especial Eleitoral n. 060267574, Acórdão, Relator(a) Min. Tarcisio Vieira De Carvalho Neto, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônico, Tomo 215, Data: 26/10/2020).

Diante da aprovação com ressalvas e das previsões constantes na EC n. 117/22, inaplicáveis quaisquer penalidades adicionais de suspensão do recebimento de verbas do Fundo Partidário ou devolução de valores pelo prestador de contas.

 

DIANTE DO EXPOSTO, voto pela aprovação com ressalvas das contas do Diretório Regional do PARTIDO COMUNISTA DO BRASIL - PC do B, referentes às eleições 2020, nos termos do art. 74, inc. II, da Resolução TSE n. 23.607/19.