ED no(a) RCand - 0601925-22.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 26/09/2022 às 14:00

VOTO

 

 

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, WILSON GUERRA ESTIVALETE opõe embargos de declaração em face do acórdão que indeferiu o seu registro de candidatura por incidência na causa de inelegibilidade do art. 1º, inc. I, al. “e”, da Lei Complementar n. 64/90, consoante a seguinte ementa:

 

REGISTRO DE CANDIDATURA. ELEIÇÕES 2022. DEPUTADO ESTADUAL. VAGA REMANESCENTE. CERTIDÕES CRIMINAIS POSITIVAS. CONDENAÇÃO CRIMINAL. INCIDÊNCIA DE CAUSA DE INELEGIBILIDADE. NÃO ATENDIDAS AS CONDIÇÕES EXIGIDAS PELA NORMA DE REGÊNCIA. INDEFERIMENTO.

1. Pedido de registro de candidatura em vaga remanescente para o cargo de deputado estadual.

2. Ausentes as certidões narratórias (objeto e pé) dos processos em relação aos quais consta com certidão criminal positiva, bem como a certidão criminal da Justiça Federal de 1º Grau. Conforme informações da Secretaria Judiciária, consta o registro de inelegibilidade no cadastro eleitoral do candidato. Embora intimado, não supriu a contento a documentação faltante.

3. Condenação criminal – art. 183 da Lei n. 9.472/97. O TSE tem o entendimento consolidado de que o crime de desenvolvimento clandestino de atividades de telecomunicação, tipificado no art. 183 da Lei n. 9.472/97, atrai a incidência da causa de inelegibilidade do art. 1º, inc. I, al. “e”, da Lei Complementar n. 64/90, por se tratar de crime pluriofensivo, que tutela, concomitantemente, o sistema nacional de telecomunicações, de titularidade da União, e o patrimônio público. Desse modo, considerando que o cumprimento integral da pena ocorreu em 17.3.2017, essa é a data a ser considerada para a incidência da causa de inelegibilidade em questão, que se estende pelo prazo de 8 anos a partir desse marco, ou seja, até 16.3.2025, inviabilizando a pretensão do requerente para o pleito de 2022.

4. Indeferimento.

 

Na primeira alegação contida em suas razões, o embargante sustenta que “participou no pleito de 2020 como candidato a vice-prefeito na Cidade de Bento Gonçalves, tendo sua inelegibilidade tratada e julgada naquele pleito, tendo o MP e a Juíza aceitado a demonstração de ‘inexistência de inelegibilidade”, assim, entende que “está sendo julgado duas vezes pelo mesmo fato, o que contraria o princípio no bis in idem”.

Sem razão o embargante

A referência é feita ao RCand n. 0600109-49.2020.6.21.0008, no qual, embora não se tenha suscitado a inelegibilidade em questão, o pedido de candidatura restou indeferido em razão da ausência de comprovação de oportuna filiação partidária.

Os pretendentes candidatos devem atender aos requisitos de registrabilidade, bem como comprovar as condições de elegibilidade e a ausência de causas de inelegibilidade a cada pleito, sem que se cogite em coisa julgada, direito adquirido ou expectativa de direito entre registros de candidatura para diferentes eleições.

Nessa linha, remansosa jurisprudência:

ELEIÇÕES 2016. REGISTRO DE CANDIDATURA. CARGO. PREFEITO. CANDIDATO NÃO ELEITO. 1º. COLOCADO QUE OBTEVE MAIS DE 50% DOS VOTOS VÁLIDOS. PERDA DE OBJETO DO RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. INTELECÇÃO DO CAPUT DO ART. 224 DO CE. CONDIÇÕES DE ELEGIBILIDADE E CAUSAS DE INELEGIBILIDADE. AFERIÇÃO A CADA ELEIÇÃO. PRECEDENTE. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. Ainda que o Recurso Especial seja analisado e provido e, por conseguinte, validados os votos recebidos pelo recorrente, não haveria resultado prático que lhe beneficiasse, pois se houver qualquer fato posterior que acarrete a cassação do registro, do diploma ou do mandato do 1º. colocado, a hipótese será de realização de novas eleições, por envolver mais da metade da votação válida, aplicando-se o caput do art. 224 do CE (AgR-REspe 252-19/PB, publicado em sessão de 8.11.2016, desta relatoria). 2. As condições de elegibilidade e as causas de inelegibilidade devem ser verificadas a cada eleição e os pedidos de Registro de Candidatura serão apreciados com base na legislação de regência e na documentação que os instruir. 3. Agravo Regimental desprovido.

(TSE - RESPE: 28151 DOMINGOS MOURÃO - PI, Relator: NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Data de Julgamento: 21/02/2017, Data de Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 61, Data 28/03/2017, Página 57-58) Grifei.

 

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. ELEIÇÕES 2012. REGISTRO DE CANDIDATURA. PREFEITO. CONDIÇÕES DE ELEGIBILIDADE. CAUSAS DE INELEGIBILIDADE. AFERIÇÃO A CADA ELEIÇÃO. DESPROVIMENTO. 1. Na espécie, assentou-se na decisão agravada a perda do objeto dos recursos especiais interpostos pela agravante e pelo Ministério Público Eleitoral, visto que a eventual cassação do registro ou do diploma do primeiro colocado - que obteve mais de 50% dos votos válidos - implicaria a realização de novas eleições, nos termos do art. 224 do CE. 2. "As condições de elegibilidade e as causas de inelegibilidade devem ser aferidas a cada eleição, na conformidade das regras aplicáveis no pleito, não cabendo cogitar-se de coisa julgada, direito adquirido ou segurança jurídica" (AgR-REspe 35.880/PI, Rel. Min. Arnaldo Versiani, DJe de 27.5.2011). 3. Inexiste óbice ao reconhecimento de ausência de condição de elegibilidade ou de incidência de causa de inelegibilidade em pedido de registro de candidatura do agravado em eleições futuras. 4. Agravo regimental não provido.

(TSE - AgR-REspe: 21132 RJ, Relator: Min. FÁTIMA NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 21/11/2012) Grifei.

 

Na segunda alegação, o embargante defende que a certidão narratória não foi fidedigna ao que realmente aconteceu no processo, “uma vez que o mesmo iniciou na realidade no ano de 2006 e teve sua sentença transitada em julgado para o MPF em 12.04.2011 e para a defesa em 22.11.2011, portanto o mesmo teve de 2006 até 2011, cinco anos de tramitação sem período de suspenção, ou seja, também já havia ocorrido a prescrição em 2010, uma vez que a pena imposta foi entre 1 ano e 2 anos”.

Ocorre que a certidão narratória expedida pela 22ª Vara Federal de Porto Alegre foi acostada pelo próprio requerente (ID 45078027), sem qualquer impugnação ou ressalva sobre o seu conteúdo, que nada versa em relação à eventual prescrição da pretensão punitiva anterior à publicação da sentença condenatória.

Assim, a partir dos documentos acostados, cabe à Justiça Eleitoral tão somente verificar se a condenação criminal imposta se subsume às hipóteses de condenação criminal que ensejam a incidência da causa de inelegibilidade do art. 1º, inc. I, al. “e”, da Lei Complementar n. 64/90.

Não cabe ao julgador do registro de candidatura reanalisar aspectos da condenação criminal imposta pela Justiça Comum, a fim de verificar, como pretende o embargante, eventual ocorrência ou não da prescrição quando inexistente pronunciamento do órgão jurisdicional competente sobre o tema.

Nessa linha, é o enuncia da Súmula n. 58 do TSE: “Não compete à Justiça Eleitoral, em processo de registro de candidatura, verificar a prescrição da pretensão punitiva ou executória do candidato e declarar a extinção da pena imposta pela Justiça Comum”.

Em sequência, o embargante refere a decisão monocrática do Ministro Ricardo Lewandowski, nos autos da Ação Cautela n. 3541, a partir da qual defende que o STF entende que o crime de rádio clandestina não se amolda à Lei de Inelegibilidades.

Ocorre, porém, que referida decisão não se constitui em precedente para o caso, tendo em vista que a ação cautelar não restou conhecida e houve a revogação da liminar, sem qualquer análise sobre a questão de fundo, consoante se extrai da respectiva ementa:

DIREITO ELEITORAL. AGRAVO REGIMENTAL EM AÇÃO CAUTELAR. CONCESSÃO DE EFEITO SUSPENSIVO A RECURSO EXTRAORDINÁRIO SEM EXAME DE ADMISSIBILIDADE. MANEJO CONCOMITANTE DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO E RECURSO EXTRAORDINÁRIO. JURISDIÇÃO DO TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL AINDA NÃO EXAURIDA. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 634/STF. COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL PARA APRECIAR A AÇÃO CAUTELAR INCIDENTAL NÃO INAUGURADA. PRECEDENTES. Inviável reputar instaurada a jurisdição cautelar do Supremo Tribunal Federal, considerados (i) o manejo de recurso extraordinário do autor ainda pendente de admissibilidade, na origem (ii) a inocorrência de hipótese de excepcionalidade na espécie, e (iii) a interposição concomitante de embargos de declaração no Tribunal Superior Eleitoral de recurso extraordinário. Agravo regimental conhecido e provido para não conhecer da ação cautelar, ficando, pois, revogada a liminar anteriormente concedida.

(STF - AC: 3541 AM, Relator: Min. ROSA WEBER, Data de Julgamento: 30/09/2014, Primeira Turma, Data de Publicação: DJe-200 DIVULG 13-10-2014 PUBLIC 14-10-2014)

 

Na hipótese, o acórdão embargado ampara suas conclusões no entendimento atual e consolidado do TSE no sentido de que o crime tipificado no art. 183 da Lei n. 9.472/97 atrai a incidência da causa de inelegibilidade do art. 1º, inc. I, al. “e”, da Lei Complementar n. 64/90, por se tratar de crime pluriofensivo, que tutela, concomitantemente, o sistema nacional de telecomunicações, de titularidade da União, e o patrimônio público, conforme estampado no REsp n. 060004105, acórdão, Relator: Min. Mauro Campbell Marques, publicado em sessão de 15.12.2020.

Ainda, diversamente do sustentado pelo embargante, é desnecessário que a sentença penal faça expressa menção aos bens jurídicos violados no caso concreto, pois estes resultam da própria previsão legal do crime, bastando que haja o enquadramento da conduta a determinado tipo penal.

Finalmente, o embargante apresentou nova petição (ID 45128709), após o oferecimento de contrarrazões pela Procuradoria Regional Eleitoral, alegando que a sentença enquadrou o fato ao art. 70 da Lei n. 4.117/62, porém o TRF da 4ª Região desclassificou a conduta para o tipo penal do art. 183 da Lei n. 9.472/97, devendo ser considerado aquele primeiro dispositivo, em razão do princípio da congruência.

Tais razões complementares são absolutamente inadequadas e intempestivas, não comportando conhecimento e, ainda que pudessem ser conhecidas, encontrariam óbice nos termos da Súmula n. 41 do TSE, pela qual “não cabe à Justiça Eleitoral decidir sobre o acerto ou desacerto das decisões proferidas por outros órgãos do Judiciário ou dos tribunais de contas que configurem causa de inelegibilidade”.

Como se percebe, embora intimado para manifestação em diversas oportunidades, os argumentos ora deduzidos não foram apresentados durante a instrução do feito e não constituem matérias que deveriam ser apreciadas de ofício, constituindo inovação incabível em sede de embargos declaratórios (TSE - ED-RE n. 13210, Relator: Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJE de 05.04.2017, e ED-AgR-AI n. 96-25, Relator: Min. Og Fernandes, DJe de 5.11.2019).

Outrossim, as questões essenciais para análise da pretensão à candidatura foram suficientemente analisadas no acórdão, não se verificando obscuridade, omissão, contradição ou erro material, nos termos do art. 275, do Código Eleitoral e art. 1.022 do CPC, razão pela qual se impõe a rejeição dos aclaratórios.

 

Diante do exposto, VOTO pela rejeição dos embargos de declaração.