MSCiv - 0600389-73.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 21/09/2022 às 14:00

VOTO

Eminentes Colegas.

De início, sublinho o cabimento hipotético de mandado de segurança contra decisão de juízo eleitoral proferida em exercício de poder de polícia, atividade administrativa, conforme já assentado por esta Corte. Exemplificativamente, trago emanta de decisão recente no Recurso Eleitoral n. 0600185-73, Rel. Des. Francisco José Moesch, julgado em 03.5.2022:

RECURSO INOMINADO. REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA ELEITORAL ANTECIPADA. DETERMINADA A REMOÇÃO DE OUTDOOR. EXERCÍCIO DO PODER DE POLÍCIA. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. NÃO CONHECIDO. 1. Insurgência contra decisão que acolheu o pedido do órgão ministerial e determinou a remoção de outdoor, por considerar caracterizada a propaganda eleitoral antecipada por meio vedado pela legislação. O juízo sentenciante, após descumprimento da ordem de retirada da propaganda, determinou que o Município realizasse a remoção do outdoor, autorizando a cobrança de valores dispendidos com a retirada do artefato. Acolhido ainda, pedido para a extração de cópia integral da representação e instauração de expediente criminal, para análise da eventual prática de crime de desobediência. 2. O parágrafo 3º do artigo 54 da Resolução TSE n. 23.608/19, estabelece que o mandado de segurança é a via cabível contra atos comissivos e omissivos praticados pela juíza ou pelo juiz eleitoral no exercício do poder de polícia. 3. No caso dos autos, trata-se de procedimento administrativo em que o Ministério Público Eleitoral invocou o exercício do poder de polícia pela Juíza Eleitoral do local do fato para a remoção de propaganda eleitoral antecipada por meio de outdoor. As decisões prolatadas no âmbito do poder de polícia, conferido aos juízes eleitorais, não têm caráter jurisdicional, mas eminentemente administrativo, de modo que devem ser judicialmente impugnadas por meio de mandado de segurança. 4. Recurso manifestamente incabível para o controle jurisdicional dos atos praticados no exercício do poder de polícia sobre a propaganda eleitoral, razão pela qual é inviável o seu conhecimento. 5. Não conhecido.

Passo ao mérito.

O PARTIDO DOS TRABALHADORES – PT DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL impetrou mandado de segurança, com pedido de concessão de antecipação de tutela, contra ato praticado pelo Magistrado Titular do Juízo da 34ª Zona Eleitoral, sediado em Pelotas, que indeferiu requerimento nos autos da Notícia de Irregularidade em Propaganda Eleitoral n. 0600047-55.2022.6.21.0164 e manteve outdoor situado em propriedade localizada na BR116, km 519,5, próximo à barragem de captação de água do Município de Pelotas, ao argumento central de que o artefato não veicula propaganda eleitoral.

O objeto do presente mandado de segurança consiste na determinação para a remoção da propaganda irregular.

Adianto que entendo a necessidade de rever meu posicionamento externado quando do indeferimento do pedido liminar.

Explico.

Na oportunidade, assim me pronunciei:

(...)

Contudo, antecipo, o pedido de concessão de tutela antecipada sob forma liminar é de ser indeferido. A decisão não se mostra, à primeira vista, ilegal ou teratológica.

Explico.

De fato, identifico grande controvérsia na utilização dessa espécie de painel para a veiculação de mensagens de apoio a este ou aquele pré-candidato, tanto que atualmente há, perante e. Tribunal Superior Eleitoral, ao menos quatro representações envolvendo o tema para as vindouras eleições de 2022, ainda sem data precisa para julgamento. A fronteira é tênue, sendo árdua a tarefa de separar em linhas exatas o que é “conteúdo eleitoral”, expressão constante no art. 3º-A da Resolução TSE n. 23.610/2019, acrescentado pela Resolução TSE n. 23.671/21, daquilo que constitui apoio ou legítima manifestação política de parte dos cidadãos.

Nesse norte, incumbe ao julgador valer-se de dois grupos de balizas.

O primeiro grupo é principiológico, seja porque no Estado Democrático de Direito a liberdade de expressão é regra, e seu tolhimento, exceção (art. 5º, inc. IV e inc. IX da Constituição Federal), seja porque à Justiça Eleitoral incumbe sempre uma postura minimalista (Recurso Especial Eleitoral n. 16996, Ac., rel. Min. Luiz Fux, DJE de 08.03.2018, p. 28-30).

O segundo grupo é composto pelas regras positivadas específicas sobre o tema. É certo que os outdoors consubstanciam modo proibido de veiculação de propaganda eleitoral (art. 39, § 8º, da Lei n. 9.504/97) e, portanto, também há a vedação de realização de pré-campanha sob tais meios, bem como o art. 36-A da Lei das Eleições traz regra expressa no sentido de que não configura propaganda eleitoral antecipada a mensagem que não envolva pedido explícito de voto.

E é exatamente porque não há pedido de voto, ou sequer menção periférica às eleições, é que a decisão do juízo impetrado não se mostra ilegal ou teratológica como quer fazer crer a agremiação impetrante. Da leitura da mensagem e da visualização do artefato, concluo de que se trata de manifestação de apoio ao Presidente da República de modo que, repito, em análise superficial são inaplicáveis à situação o art. 36, § 1º, bem como o art. 39, § 8º, ambos da Lei n. 9.504/97.

Por fim, indico que parece haver distinção do caso posto do precedente regional citado pelo impetrante na peça inicial, e cito que em 2018 o Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Sul, de fato, determinou a retirada de outdoors (rápida pesquisa indicou o número de treze decisões em tais termos), mas em casos de menção a “político honesto” ou de frase com o nome do pré-candidato e o ano da eleição, aqui inocorrentes, configurando situações diversas.

Circunstância adicional que dificulta a concessão de medida gravosa requerida em sede de antecipação de tutela é a pretensa responsabilização do Partido Liberal, ao qual é filiado o Presidente Jair Bolsonaro, diante da inexistência de indício de envolvimento da referida agremiação na fixação do artefato, sendo inviável atribuir ônus ou responsabilizar o partido político, até mesmo porque o mandado de segurança é espécie de demanda que exige prova pré-constituída.

Diante do exposto, indefiro o pedido de concessão de medida liminar.

 

Contudo, diante da deflagração do período permitido para propaganda eleitoral em 16.8.2022, não remanesce dúvida quanto à vedação do meio outdoor para veiculação de imagem de candidato aos cargos em disputa no pleito de 2022.

Nesse norte, entendo que os elementos apresentados no artefato publicitário apontado nos autos são característicos de propaganda eleitoral, pois, ainda que não tragam pedido explícito de voto, remetem inequivocamente ao atual Presidente República, Jair Messias Bolsonaro, concorrente à reeleição, inclusive pela menção à “família” e a “Deus”, temas constantes nos discursos e integrantes do próprio lema de campanha. Ademais, o apoio se torna explícito na expressão “estamoscontigobolsonaro”, presente no outdoor.

Portanto, no concernente ao conteúdo da mensagem e ao meio pelo qual foi publicizada, outdoor, entendo que resta caracterizada a irregularidade, em afronta ao disposto no art. 39, § 8º, da Lei das Eleições:

Art. 39 […]

§ 8o É vedada a propaganda eleitoral mediante outdoors, inclusive eletrônicos, sujeitando-se a empresa responsável, os partidos, as coligações e os candidatos à imediata retirada da propaganda irregular e ao pagamento de multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a R$ 15.000,00 (quinze mil reais). (Redação dada pela Lei nº 12.891, de 2013)

 

Destaco que o impetrante requereu, na NIP, a instauração de procedimentos para identificar os responsáveis pela criação, confecção e instalação do outdoor, enquanto que, no presente mandado de segurança, requer a notificação do Partido Liberal, agremiação do pré-candidato beneficiado com a propaganda, por seus Diretórios Nacional, Estadual e Municipal, para que realizem a remoção da propaganda irregular.

Este Tribunal tem se deparado com inúmeros casos de publicidade irregular em outdoor, dos quais não há certeza a respeito do responsável pela elaboração e fixação do artefato. Por outro lado, da permanência da publicidade com propaganda eleitoral manifestamente irregular decorreria prejuízos na quebra da isonomia entre os candidatos.

Nesse norte, tem-se que o mais adequado é a notificação ao Juízo de origem para que dê efetividade à decisão que determina a retirada do outdoor.

Desse modo, embora mereça ser mantida a decisão quanto ao enquadramento da publicidade como propaganda eleitoral irregular, entendo deva ser rejeitado o pedido de determinação para a retirada do outdoor pelo Partido Liberal, considerando a ausência de elementos nos autos que indiquem ser a agremiação a responsável pela propaganda.

Diante o exposto, VOTO pela concessão parcial da segurança, revogando a decisão liminar, para determinar a retirada do outdoor localizado na BR116, km 519,5, próximo à barragem de captação de água do Município de Pelotas.

Notifique-se a autoridade coatora para dar eficácia e efetividade à retirada do artefato, na BR116, km 519,5, próximo à barragem de captação de água do Município de Pelotas, podendo ser realizada por Oficial de Justiça acompanhado por força policial e/ou servidores da Prefeitura.