REl - 0600533-77.2020.6.21.0045 - Voto Relator(a) - Sessão: 12/09/2022 às 14:00

VOTO

Senhor Presidente,

Eminentes Colegas.

 

O recurso é tempestivo, e presentes os demais pressupostos de admissibilidade, merece conhecimento.

No mérito, cuida-se de recurso interposto contra sentença que aprovou com ressalvas as contas de BRUNO WALTER HESSE e LUCAS JESKE LIMA GONCALVES, candidatos ao pleito majoritário nas eleições de 2020 no Município de Santo Ângelo/RS, e determinou o recolhimento dos valores irregulares empregados ao Tesouro Nacional, em virtude da utilização de quantia sem demonstração de origem para o adimplemento de despesas omitidas da contabilidade de campanha, e uso indevido de verbas do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC.

A primeira falha diz com a omissão de despesas, combustível e serviços gráficos, as quais foram assim abordadas no parecer conclusivo emitido pela servidão cartorária (ID 44957531):

Efetuada a circularização da empresa Comercial de Combustíveis Londero LTDA, foi juntado aos autos (ID 89438610) declaração da empresa, informando que a nota fiscal eletrônica emitida de número 000.002.232 (ID 67575809), no valor de R$ 1.200,00, refere-se a diversos cupons fiscais, inclusos os 7 (sete) cupons fiscais acima relacionados.

Entretanto, verificou-se que esta nota fiscal foi lançada, conforme grifada na relação em anexo (Item 3 Nota Fiscal valor de R$ 1.200,00), e também foram emitidas as notas fiscais ou recibos acima, omitidas na prestação de contas, no valor de R$ 1.000,05. Juntado ao parecer as cópias das Notas Fiscais, identificadas com seus respectivos números.

Quanto a circularização da empresa Gráfica e Editora Adhara Ltda, o prestador de contas juntou declaração da empresa (ID 89438611), onde a mesma declara que “...as Notas Fiscais números 5491 e 5492 emitidas pela Gráfica e Editora Adhara Ltda em 13/11/2020….foram tiradas em duplicidade com outras notas num ato equivocado da empresa sendo que não temos mais prazo legal para cancelá-las...”. Pode-se verificar que a Nota Fiscal 5492, no valor de R$ 850,00 foi cancelada (em anexo, identificada como NF 5492 Gráfica cancelada). A Nota Fiscal 5491 consta como emitida, e não registrada na prestação de contas, no valor de R$ 3.050,00 (conforme página 3 do Relatório de Notas Fiscais emitidas, em anexo)

 

Sobre os gastos com combustível, os recorrentes sustentam análise equivocada do documento, visto que “houve a emissão de nota fiscal do modelo 55 no valor de R$ 1.200,00 e que corresponde ao agrupamento de cupons fiscais emitidos no modelo 65”.

Ocorre que o documento acostado pelos prestadores não faz prova do alegado, na medida em que os cupons fiscais ali referidos são distintos dos arrolados no parecer conclusivo. Os dispêndios com combustível informados em relatório correspondem aos n. 191729, 195166, 211429, 215909, 219973 e 226255, os quais totalizam R$ 1.000,05, ao passo que a nota eletrônica juntada pelos candidatos se refere aos cupons 215457, 217559, 217751, 217905, 218273, 220139 e 220589, que perfazem R$ 1.200,00.

A declaração emitida pela Comercial de Combustíveis Londera Ltda., no mesmo sentido, não ostenta a força probante pretendida pelos recorrentes, haja vista que, ainda que englobe as notas descritas em parecer, não encontra compatibilidade com o descritivo eletrônico, na medida em que este, como acima referido, não contempla o rol informado em relatório, o qual deu azo à sentença de recolhimento na origem. Desse modo, a mácula persiste, uma vez que o adimplemento do débito se deu com recursos que não transitaram pelo sistema bancário, a caracterizar o uso de valores sem demonstração de origem, nos termos do art. 32, § 1º, inc. VI, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Em circularização, foram encontrados, ainda, gastos com serviços gráficos não informados na prestação de contas.

Quanto ao item, os recorrentes alegam equívoco por parte da empresa contratada, a qual emitiu, em duplicidade, nota fiscal contra o CNPJ dos candidatos. O relatório indica dois documentos pendentes, n. 5491 e 5492. Este, no valor de R$ 850,00, devidamente cancelado; aquele, na cifra de R$ 3.050,00, em situação válida.

A declaração carreada aos autos, firmada por Fernando Diel, sócio-gerente da Gráfica e Editora Adhara Ltda., informa a ocorrência do erro de emissão e a perda de prazo para o cancelamento dos documentos fiscais, solicitando, ao fim, que os mesmos sejam desconsiderados.

O vício persiste, uma vez que a nota foi emitida e quitada com numerário que não transitou por conta bancária específica, e a pessoa jurídica responsável não efetuou seu cancelamento ou pedido de estorno no prazo legal, incorrendo, novamente, em uso de recursos de origem não identificada, os quais devem ser recolhidos ao erário. Sobre o ponto, de modo a concluir, segue excerto do parecer da Procuradoria Regional Eleitoral, ao qual adiro e adoto como razão de decidir:

No que toca às notas fiscais emitidas pela Gráfica e Editora Adhara Ltda, não merece prosperar o argumento de que teria havido a emissão em duplicidade. Os documentos fiscais foram regularmente emitidos contra o CNPJ da campanha, não sendo possível simplesmente desconsiderar um deles, primeiro, por falta de base legal, e, segundo, pelo caráter de confiabilidade e veracidade de que se reveste a emissão do documento fiscal.

Em situações como essa, cabia aos prestadores comprovar o cancelamento da nota fiscal que alegam ter sido emitida erroneamente, conforme exigido pelo art. 92, § 6º, da Resolução TSE n. 23.607/19, verbis:

§ 6º Na situação de eventual cancelamento de notas fiscais eletrônicas após sua regular informação como válidas pelos órgãos fazendários à Justiça Eleitoral, a prestadora ou o prestador deverá apresentar a comprovação de cancelamento, junto com esclarecimentos firmados pela fornecedora ou pelo fornecedor.

Ultrapassado o prazo para cancelamento, ainda seria possível o estorno da NF, nos termos da Instrução Normativa 98/2011 da Subsecretaria da Receita Estadual do Rio Grande do Sul, o que tampouco foi demonstrado.

Assim, na falta de cancelamento ou estorno da nota fiscal, conclui-se que a despesa a ela relativa foi paga com valores que não transitaram pela conta bancária de campanha, configurando recursos de origem não identificada, conforme art. 32, § 1º, inc. VI, da Resolução TSE n. 23.607/19.

 

A segunda irregularidade apontada remete à malversação de verbas públicas – FEFC. Foram realizadas despesas sem a devida comprovação, em afronta aos arts. 35, 53, inc. II, al. “c”, e 60, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Sobre o item, os prestadores sinalizam erro do relatório preliminar ao atribuir expensa a JOÃO DE DEUS DA SILVA, datada de 09.11.2020, ao documento n. 629698, enquanto, na realidade, tal dispêndio se deu com CATIELE DORNELLES MARTINS. No intuito de ver sua tese acolhida, juntam comprovante do Banrisul tendo por correntista do crédito João de Deus.

Com efeito, em verificação no extrato eletrônico disponível no DivulgaCand (https://divulgacandcontas.tse.jus.br/divulga/#/candidato/2020/2030402020/88536/210001128159/extratos), acesso em 12.7.2022, consta transferência bancária de n. 629698, destinada a João de Deus, ao passo que a operação designada a Catiele Martins possui n. 629299, não havendo falar em erro do relatório preliminar quanto ao ponto.

De outro vértice, malgrado não acolhida a hipótese de erro de numeração do exame preliminar, tenho por demonstrada a despesa, porquanto juntado ao feito documentação apta a comprovar o adequado uso dos recursos públicos. O ID 44957493. fls. 22-28, traz, além do contrato firmado com João de Deus, recibo de transferência da instituição bancária, o qual guarda compatibilidade de dados com o extrato eletrônico; enquanto o ID 44957492, p. 12-16, apresenta contrato realizado com Catiele Martins bem como recibo de transferência bancária, da mesma forma, em consonância com o apresentado em extrato.

Entendo, desta feita, sanado o vício.

Entrementes, remanescem as irregularidades quanto às omissões de despesas, as quais perfazem R$ 4.050,05 (R$ 1.000,05 / combustíveis – e R$ 3.050,00 / serviços gráficos), e representam 2,54% das receitas auferidas em campanha, percentual inferior ao parâmetro utilizado por esta Corte, quando cabível a mitigação do juízo sentencial, para, aplicando os postulados da razoabilidade e da proporcionalidade, aprovar as contas com ressalvas, motivo pela qual a decisão a quo deve ser mantida.

 

Ante o exposto, VOTO pelo parcial provimento do recurso, para manter a sentença de aprovação com ressalvas, e reduzir o valor a ser recolhido ao Tesouro Nacional para R$ 4.050,05, nos termos da fundamentação.

É como voto, Senhor Presidente.