RCand - 0600545-61.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 09/09/2022 às 14:00

VOTO

Preliminarmente, em relação à prova oral postulada, reitero que a matéria controvertida nestes autos, é eminentemente de direito e objetiva, razão pela qual, não comporta produção de prova testemunhal.

O Ministério Público Eleitoral impugnou o pedido de registro de candidatura de VERA LÚCIA FERREIRA DA SILVA. Aduz o impugnante que a candidata está inelegível, pois não transcorreu o prazo de 08 (oito) anos subsequentes ao término da legislatura relacionada ao mandato para o qual fora eleita, conforme previsto no art. 1º, inc. I, al. “k”, da LC n. 64/90, com a redação da LC n. 135/10 (Lei da Ficha Limpa).

A matéria está prevista no art.. 1º, inc. I, al. "k", da LC n. 64/90:

art. 1º. São inelegíveis:

I - para qualquer cargo:

[...]

k) o Presidente da República, o Governador de Estado e do Distrito Federal, o Prefeito, os membros do Congresso Nacional, das Assembleias Legislativas, da Câmara Legislativa, das Câmaras Municipais, que renunciarem a seus mandatos desde o oferecimento de representação ou petição capaz de autorizar a abertura de processo por infringência a dispositivo da Constituição Federal, da Constituição Estadual, da Lei Orgânica do Distrito Federal ou da Lei Orgânica do Município, para as eleições que se realizarem durante o período remanescente do mandato para o qual foram eleitos e nos 8 (oito) anos subsequentes ao término da legislatura; (Incluída pela LC n. 135/10, de 04.6.2010)

 

A respeito do aludido dispositivo, merece transcrição a doutrina de Rodrigo López Zilio (Direito Eleitoral, 8.ed.rev.ampl. e atual. São Paulo:Editora Juspodivm, 2022, p. 313):

[…]

Ao estabelecer a inelegibilidade por renúncia, o dispositivo – ao estatuir a inelegibilidade por renúncia – faz uma avaliação negativa da conduta do agente político que, ante a possibilidade de cassação, opta por abandonar o compromisso assumido com a conquista do mandato, privilegia a preservação da sua vida político-eleitoral. O legislador tenciona evitar que o mandatário – premido por conduta que possa acarretar o início de processo que tenha como consequência a cassação do mandato, com o efeito anexo da inelegibilidade (als. "b" e "c") –, através de renúncia, possa burlar o objetivo da norma por meio da renúncia, preservando seu direito de elegibilidade para um pleito futuro. Daí porque a inelegibilidade da alínea k visa à proteção da moralidade para o exercício do mandato, na forma prevista pelo art. 14, §9º, da CF.

 

A norma restritiva, portanto, aplica-se ao titular de mandato eletivo que renuncia ao cargo após oferecida representação que possa levar à sua condenação por infração a normas Constitucionais ou Orgânicas, frustrando assim as causas de inelegibilidade previstas nas als. “b” e “c”.

A inelegibilidade do candidato perdura do momento da renúncia até 08 (oito) anos após o término da legislatura em que se deu o afastamento do parlamentar.

Assim, a hipótese dos autos se amolda ao texto legal.

Constata-se no documento de ID 4503150, da Câmara Municipal de Rio Pardo/RS que, em 27.12.2019, às 10:24:52, foi protocolado junto ao Poder Legislativo (protocolo n. 995/19): “Pedido de cassação de mandato de vereador por exercício de cargo de gestão de coordenadora de emergência em empresa concessionária de serviço público”, imputando à requerida violação do art. 21, inc. II, al. “b”, c/c o art. 23, inc. I, da Lei Orgânica Municipal de Rio Pardo, em desfavor da impugnada.

A impugnada apresenta renúncia ao cargo eletivo de vereadora em 03.01.2020 (ID 45032151), ou seja, em momento posterior à petição apta a gerar abertura de processo de perda de mandato.

É inequívoco que o pedido de cassação protocolado configura-se “petição capaz” a gerar abertura de processo de perda de mandato, uma vez que o parecer jurídico (ID 45067936, p. 12-13) elaborado no âmbito da Câmara de Vereadores de Rio Pardo, posicionou-se nessa direção, afirmando que: “No presente caso, verifica-se preenchidos os requisitos essenciais para admissibilidade do pedido de cassação”.

Nesse sentido é o posicionamento da Corte Superior Eleitoral:

ELEIÇÕES 2020. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. REGISTRO DE CANDIDATURA. PREFEITO. PRIMEIRO COLOCADO. INELEGIBILIDADE. ART. 1º, INC. I, AL. "k", da LC N. 64/90. SÚMULAS 24 E 28/TSE. DESPROVIMENTO.

1. A inelegibilidade prevista no art. 1º, inc. I, al. "k", da LC n. 64/90 possui critério objetivo para sua incidência, ou seja, basta a renúncia do cargo eletivo em momento posterior ao oferecimento de qualquer petição apta a gerar abertura de processo político–administrativo de perda de mandato.

2. A argumentação recursal traz versão dos fatos diversa da exposta no acórdão, de modo que o acolhimento do recurso passa necessariamente pela revisão do conjunto fático–probatório. Incidência da Súmula 24 desta CORTE.

3. Agravo Regimental desprovido.

(TSE - REspEl: 06001637620206160162 NOVA PRATA DO IGUAÇU - PR 060016376, Relator: Min. Alexandre de Moraes, Data de Julgamento: 11.3.2021, Data de Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônica, Tomo 52) (grifo nosso)

 

Ademais, descabem quaisquer ilações da tese defensiva sobre o exercício de cargo de gestão ou não pela impugnada, eis que o processo de cassação, imputa à requerida violação do art. 21, inc. I, al. “b”, c/c art. 23, inc. I, da Lei Orgânica Municipal de Rio Pardo, que não faz essa distinção. A Lei Orgânica do Município de Rio Pardo veda que os vereadores aceitem qualquer cargo, função ou emprego remunerado, inclusive os de que sejam demissíveis ad nutum.

Para isso, transcrevo os referidos artigos da lei Orgânica do Município de Rio Pardo:

Art. 21 Os Vereadores não poderão:

I - desde a expedição do diploma:

a) firmar ou manter contrato com pessoa jurídica de direito público, autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista ou empresa concessionária de serviço público, salvo quando o contrato obedecer a cláusulas uniformes;

b) aceitar ou exercer, no município, cargo, função ou emprego remunerado, inclusive os de que sejam demissíveis “ad nutum”, nas entidades constantes da alínea anterior.

II - desde a posse:

a) ser proprietários, controladores ou diretores de empresa que goze de favor decorrente de contrato com pessoa jurídica de direito público, ou nela exercer função remunerada;

b) ocupar cargo ou função de que sejam demissíveis “ad nutum”, nas entidades referidas no inciso I, a;

c) patrocinar causa em que seja interessada qualquer das entidades a que se refere o inciso I, a;

d) ser titulares de mais de um cargo ou mandato público eletivo.

 

Art. 23 Perderá o mandato o Vereador que:

I - incidir nas vedações previstas no art. 21;

(grifo nosso)

 

De outra banda, não comporta à Justiça Eleitoral discussões acerca da natureza jurídica da ABRASSI, pois a essa justiça especializada somente compete analisar os aspectos formais da representação.

Contudo, apenas para que se esclareça, desimporta que a ABRASSI tenha personalidade jurídica de direito privado, pois o exercício de cargo, função ou emprego remunerado a que se destina a vedação legal diz respeito tanto à Administração Pública como às empresas concessionárias de serviço público. Além disso, o enquadramento da ABRASSI em uma categoria ou outra, caberia à Câmara de Vereadores de Rio Pardo, por ocasião do julgamento da representação.

No que atine à interpretação do termo “empresas concessionárias de serviço público” me filio ao entendimento do Ministério Público de que não está restrito apenas à concessão de serviço público, mas atinge as demais formas de transferência da execução de serviços públicos, a exemplo das permissões, autorizações e contratos de gestão.

In casu, verifica-se que a candidata impugnada está inelegível, tendo em vista que ainda não transcorreu o prazo de 08 (oito) anos subsequentes ao término da legislatura relacionada ao mandato para o qual fora eleita (2018-2022), conforme previsto no art. 1º, inc. I, al. “k”, da LC n. 64/90.

Dessa forma, a pretensa candidata encontra-se inelegível até 31.12.2030.

ANTE O EXPOSTO, julgo PROCEDENTE a impugnação e VOTO pelo INDEFERIMENTO do pedido de registro de candidatura para o cargo de deputado federal formulado pelo partido REPUBLICANOS em favor de VERA LÚCIA FERREIRA DA SILVA, com fundamento no art.1º, inc. I, al. “k” da LC n. 64/90.