REl - 0600396-05.2024.6.21.0062 - Voto Relator(a) - Sessão: 24/07/2025 00:00 a 25/07/2025 23:59

VOTO

Tempestividade

O recurso é tempestivo.

Da documentação juntada em grau recursal

No âmbito dos processos de prestação de contas de campanha, este Tribunal tem admitido, em casos excepcionais e com respaldo no art. 266, caput, do Código Eleitoral, a aceitação de documentos novos apresentados em sede recursal, ainda que não submetidos ao crivo do juízo de primeiro grau, mesmo quando o interessado tenha sido oportunamente intimado para manifestação. Tal entendimento se firma especialmente nos casos em que a simples leitura dos documentos é suficiente para sanar a irregularidade apontada, prescindindo de nova análise técnica (TRE-RS, REl n. 0600288-60.2020.6.21.0047, Rel. Des. Eleitoral Caetano Cuervo Lo Pumo, j. 01.02.2023).

Potencializa-se, com isso, o direito de defesa, notadamente quando a juntada da nova documentação demonstra capacidade de influenciar positivamente no exame da contabilidade, de modo a prestigiar o julgamento pela regularidade da gestão dos recursos utilizados na campanha.

No caso, com o intuito de comprovar a destinação da verba pública, foram juntados com o apelo contrato de prestação de serviços, recibos de pagamento, declaração da agremiação e relatório de serviços prestados pela assessoria jurídica contratada.

Por essa razão, conheço da documentação apresentada com o recurso.

Mérito

Como relatado, ROSANE CRISTINA CUCOLOTTO interpôs recurso em face da sentença que desaprovou sua prestação de contas de campanha e determinou o recolhimento ao erário de R$ 5.497,84, ante a ausência de comprovação quanto à destinação do numerário oriundo do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) — verba vinculada ao fomento das candidaturas femininas —, bem como de seu recolhimento ao Tesouro Nacional.

Em apertada síntese, a recorrente sustenta a regularidade da transferência dos valores recebidos à agremiação partidária, a fim de custear serviços advocatícios de caráter coletivo, em benefício de todos os candidatos do partido. Aduz, ainda, que eventual valor remanescente foi recolhido ao erário. Junta documentação comprobatória e pleiteia a aprovação das contas, ainda que com ressalvas, ou, subsidiariamente, a substituição da desaprovação por multa proporcional.

À luz dos elementos que informam os autos, assiste razão parcial à recorrente, apenas para fins de redução do valor a ser recolhido ao Tesouro Nacional, ponto em que peço vênia para divergir do parecer da douta Procuradoria Regional Eleitoral.

O regramento eleitoral estabelece que parte dos recursos do FEFC deve ser obrigatoriamente destinada à promoção das candidaturas femininas, autorizando-se, no entanto, que as candidatas repassem tais valores ao partido para o custeio de despesas coletivas, conforme dispõem os §§ 4º e 7º do art. 17 da Resolução TSE n. 23.607/19.

No caso, a recorrente, na condição de candidata, repassou à agremiação R$ 5.497,84, de um total de R$ 6.500,00 recebidos do FEFC.

De fato, a documentação carreada aos autos confirma a contratação de serviços de assessoria jurídica coletiva. Segundo declaração da agremiação, corroborada pelas advogadas contratadas, foi realizado o rateio do valor de R$ 5.000,00 entre os quatro candidatos do partido e a própria sigla, de modo que a cota-parte da recorrente corresponderia a R$ 1.000,00.

Entretanto, não foi juntada aos autos prova do recolhimento ao erário do valor remanescente pela agremiação.

Depreende-se, assim, que permanece sem comprovação de uso o montante de R$ 4.497,84 (R$ 5.497,84 – R$ 1.000,00), razão pela qual deve ser recolhido ao Tesouro Nacional.

Dessa forma, diante da ausência de comprovação do uso da verba pública, incide o disposto no § 5º do art. 50 da Resolução TSE n. 23.607/19, que impõe o recolhimento ao erário dos valores cuja destinação não tenha sido devidamente comprovada.

E outro não é o entendimento deste Tribunal quanto à necessidade de recolhimento de recursos do FEFC não aplicados na campanha eleitoral:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATA NÃO ELEITA. CARGO DE DEPUTADA ESTADUAL. PARECER TÉCNICO PELA DESAPROVAÇÃO DAS CONTAS. EXISTÊNCIA DE DÍVIDA DE CAMPANHA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE ASSUNÇÃO PELO PARTIDO. FALHA CARACTERIZADA . DESNECESSIDADE DE RECOLHIMENTO. AUSÊNCIA DE RESPALDO NORMATIVO. PRECEDENTES. RECEBIMENTO DE RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA – RONI . PAGAMENTO DE DESPESA SEM O TRÂNSITO NAS CONTAS DE CAMPANHA. OMISSÃO DE NOTAS FISCAIS. IMPOSSIBILITADA A VERIFICAÇÃO DA ORIGEM DOS RECURSOS E DO SEU ADIMPLEMENTO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE GASTOS COM RECURSOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA – FEFC . PAGAMENTO DE PUBLICIDADE IMPRESSA À PESSOA DIVERSA. IRREGULARIDADE MANTIDA. SOBRA DE RECURSOS NÃO UTILIZADOS. AUSÊNCIA DE TRANSFERÊNCIA AO ERÁRIO. IRREGULARIDADES DE ALTO PERCENTUAL. INAPLICABILIDADE DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. DETERMINADO O RECOLHIMENTO DOS JUROS E DA CORREÇÃO MONETÁRIA AO TESOURO NACIONAL. DESAPROVAÇÃO . 1. Prestação de contas apresentada por candidata não eleita ao cargo de deputada estadual, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos relativos às Eleições Gerais de 2022. 2. Existência de dívida de campanha desacompanhada da comprovação de assunção de dívida pelo partido político, de acordo com o formalizado para quitação do débito, e do cronograma de pagamento, em desconformidade com os §§ 2º e 3º dos arts . 34 e 53, inc. II, al. e, da Resolução TSE n. 23 .607/19. Ausência de autorização do órgão nacional para assunção da dívida pelo órgão partidário da respectiva circunscrição, conforme exigido no art. 33, §§ 2º e 3º, da resolução citada. Falha caracterizada . Desnecessidade de recolhimento. Inexistência de respaldo normativo para determinar o recolhimento de dívida de campanha ao Tesouro Nacional como se de recursos de origem não identificada se tratasse (REspEl n. 0601205–46/MS, rel. designado Min . Luís Roberto Barroso, julgado em 8.02.2022, DJe de 30.3 .2022). 3. Recebimento de Recursos de Origem não Identificada –RONI. Pagamento de despesas por meio diverso das contas registradas . Gastos realizados em benefício da campanha. Omissão de notas fiscais na prestação de contas, fator que impossibilita a verificação da origem dos recursos e do seu adimplemento. Ainda, os documentos fiscais não restaram cancelados junto ao órgão tributário correspondente, conforme exige o art. 59 da Resolução TSE n . 23.607/19, e nem há prova de que a prestadora de contas tenha realizado esforço para corrigir as notas fiscais junto ao fisco. Dever de recolhimento. 4 . Ausência de comprovação de gastos com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC. 4.1 Produção de vídeo sem detalhamento do serviço na nota fiscal. Apresentada a descrição detalhada do gasto . Falha sanada. 4.2. Publicidade impressa paga à pessoa diversa . Irregularidade mantida, uma vez impossibilitada a identificação da real destinação dos recursos, o que impede a fiscalização da gestão (e do gasto) dos recursos públicos destinados à promoção da candidatura. Realizada transferência de valores para conta bancária de terceiro (via PIX), o gasto se configura irregular, devendo ser restituído ao erário, em cumprimento ao § 1º do art. 79 da Resolução TSE n. 23 .607/19. 4.3. Ausência de transferência de sobras de recursos não utilizados do FEFC ao Tesouro Nacional, na forma comandada pelo art . 50, § 5º, da Resolução TSE n. 23.607/19. Comprovação de que o efetivo saldo de campanha não foi direcionado ao erário . 5. A soma das irregularidades representa 44,22% do total de recursos recebidos pela candidata em sua campanha, e extrapola os parâmetros fixados na jurisprudência desta Justiça Especializada, de aplicação dos princípios de razoabilidade e de proporcionalidade, para formar juízo de aprovação com ressalvas da contabilidade (montante superior a R$ 1.064,10 e excedente a 10% da arrecadação financeira). 6 . Desaprovação. Determinado apenas o recolhimento ao Tesouro Nacional dos juros e da correção monetária incidente sobre o valor recolhido pela candidata. (TRE-RS - PCE: 06026423420226210000 PORTO ALEGRE - RS 060264234, Relator.: Patricia Da Silveira Oliveira, Data de Julgamento: 02/07/2024, Data de Publicação: DJE-128, data 04/07/2024) (Grifei.)

Desse modo, persiste a irregularidade no valor de R$ 4.497,84, cifra que representa 69,19% do total arrecadado na campanha (R$ 6.500,00), superando, tanto em termos absolutos quanto percentuais, os parâmetros usualmente adotados por esta Corte para, mediante a aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, atenuar o juízo de desaprovação das contas.

Em suma, encaminho voto no sentido de reformar parcialmente a sentença de desaprovação tão somente, entretanto, para reduzir o valor a ser recolhido ao erário, uma vez demonstrada a destinação de fração da verba pública.

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo provimento parcial do recurso para, mantida a desaprovação das contas, reduzir o valor a ser recolhido ao Tesouro Nacional para R$ 4.497,84, a título de valores não utilizados do Fundo Especial de Financiamento de Campanha.

É como voto.