REl - 0600300-67.2024.6.21.0004 - Voto Relator(a) - Sessão: 24/07/2025 00:00 a 25/07/2025 23:59

VOTO

Admissibilidade

O recurso é tempestivo e preenche os demais requisitos processuais, razão pela qual dele conheço.

Mérito

Como relatado, LISIANE SALETE MACHIAVELLI interpôs recurso em face de sentença que desaprovou suas contas relativas ao pleito de 2024 e determinou o recolhimento ao erário da quantia de R$ 1.500,00, diante da constatação de emissão de cheque não cruzado para pagamento de despesa com verba oriunda do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC).

Em síntese, a recorrente sustenta que a destinação da verba pública restou suficientemente comprovada, ainda que o cheque utilizado para pagamento não tenha sido cruzado.

À luz dos elementos que informam os autos, rogando a máxima vênia a douta Procuradoria Regional Eleitoral, tenho assistir razão à recorrente.

Nos termos do art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19, é obrigatória a utilização de cheques nominais e cruzados, a fim de permitir a aferição, por esta Justiça Especializada, do real destino dos valores despendidos durante a campanha eleitoral. Isso porque, ao nomear o beneficiário, o emissor identifica o destinatário imediato da cártula; e, ao cruzá-la, garante a rastreabilidade do saque, já que o pagamento apenas pode ser realizado mediante depósito em conta bancária, viabilizando a identificação do sacador final.

E esse é o ponto nodal da controvérsia posta: a identificação do destinatário final da verba pública.

No caso dos autos, tal desiderato foi alcançado.

Com efeito, embora destoe dos usuais casos envolvendo a emissão de cheque sem cruzamento, aqui, entretanto, verifica-se que foi consignado o nome e o CPF do prestador do serviço no verso do cheque, conforme consta do corpo do recurso, a indicar a ausência de posterior endosso da ordem de pagamento.

Ou seja, foi emitido cheque na forma apenas nominal em favor de Gustavo Luis da Silveira, sem o preconizado cruzamento.

Todavia, conquanto persista tal falha, a relativa à falta de cruzamento do cheque, é possível, como se viu, extrair com segurança a conclusão de que a beneficiária do pagamento é a pessoa física contratada.

Em recente julgamento nesta Corte, a propósito, deu-se por superado o vício formal concernente ao não cruzamento de cheque, porquanto identificado o destinatário da ordem de pagamento, cujo venerando acórdão da lavra do eminente Desembargador VOLNEI DOS SANTOS COELHO restou assim ementado:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO NÃO ELEITO. CARGO DE DEPUTADO FEDERAL. ELEIÇÕES 2022. PARECER TÉCNICO PELA DESAPROVAÇÃO DAS CONTAS. FALTA DE COMPROVAÇÃO DA APLICAÇÃO DE RECURSOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA – FEFC. PAGAMENTO DE CHEQUE NÃO CRUZADO. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DO BENEFICIÁRIO. EXISTÊNCIA DE CNPJ DA EMPRESA. AUSÊNCIA DE ENDOSSO. POSSIBILIDADE DE VERIFICAÇÃO. COMPROVADA A UTILIZAÇÃO DO RECURSO. FALHA FORMAL. IRREGULARIDADE DE BAIXO PERCENTUAL. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. AFASTADO O RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. 1. Prestação de contas apresentada por candidato não eleito ao cargo de deputado federal, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos relativos às Eleições Gerais de 2022. 2. Falta de comprovação da aplicação de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC. Existência de cheque debitado, sem a indicação do beneficiário e sem o registro de saque por caixa ou compensação bancária. Demonstrado que o cheque está nominal à empresa (gráfica) mas não está cruzado, em desacordo com o art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19. Entretanto, em que pese a irregularidade, é possível concluir com segurança que a beneficiária do pagamento é a empresa contratada, visto que anotado seu CNPJ no cheque, sem posterior realização de endosso. Falha formal, caracterizadora de ressalva nas contas. Afastado o dever de recolhimento do valor ao erário, pois restou comprovada a utilização do recurso. 3. A impropriedade representa 2,20% dos recursos recebidos na campanha e está dentro dos parâmetros, fixados na jurisprudência desta Justiça Especializada, de aplicação dos princípios de razoabilidade e de proporcionalidade (no patamar de até 10% da arrecadação financeira), para formar o juízo de aprovação com ressalvas da contabilidade. 4. Aprovação com ressalvas. (TRE-RS - PCE: 06026614020226210000 PORTO ALEGRE - RS Relator.: Volnei Dos Santos Coelho, Data de Julgamento: 27/06/2024, Data de Publicação: DJE-129, data 05/07/2024)

Efetivamente, mera falha formal não pode acarretar recolhimento do valor como determinado na sentença, pois, além de indevido, em última análise acarretaria o enriquecimento sem causa do erário e, em contrapartida, o injusto empobrecimento da recorrente.

Em suma, encaminho voto no sentido de reformar a sentença para aprovar as contas com ressalvas, porquanto emitida cártula sem o devido cruzamento, afastando, porém, o recolhimento ao erário porquanto identificada a destinação da verba pública.

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo provimento do recurso para aprovar com ressalvas as contas de LISIANE SALETE MACHIAVELLI nos termos do art. 74, inc. II, da Resolução TSE n. 23.607/19, afastada, porém, a ordem de recolhimento ao erário.

É como voto.