REl - 0600508-94.2024.6.21.0022 - Voto Relator(a) - Sessão: 24/07/2025 00:00 a 25/07/2025 23:59

VOTO

O recurso é tempestivo e, presentes os demais pressupostos de admissibilidade, merece conhecimento.

LUANE EBERTZ interpõe recurso contra a sentença que desaprovou sua prestação de contas relativa ao cargo de vereadora nas Eleições 2024, em virtude de realização de três depósitos efetuados em espécie, em mesma data, em total de R$ 1.543,00 (mil quinhentos e quarenta e três reais) - quantia a ser recolhida ao Tesouro Nacional, conforme comando sentencial.

Com efeito, as doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação ou cheque cruzado e nominal, sujeitando-se aqueles que receberem recursos fora dessas especificações ao recolhimento dos valores, na sua integralidade, ao Tesouro Nacional, conforme disciplinado na Resolução TSE n. 23.607/19, art. 21, inc. III, § 1º:

Art. 21. As doações de pessoas físicas e de recursos próprios somente poderão ser realizadas, inclusive pela internet, por meio de:

I - transação bancária na qual o CPF do doador seja obrigatoriamente identificado;

II - doação ou cessão temporária de bens e/ou serviços estimáveis em dinheiro, com a demonstração de que o doador é proprietário do bem ou é o responsável direto pela prestação de serviços;

III - instituições que promovam técnicas e serviços de financiamento coletivo por meio de sítios da internet, aplicativos eletrônicos e outros recursos similares.

§ 1º As doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação ou cheque cruzado e nominal.

§ 2º O disposto no § 1º aplica-se também à hipótese de doações sucessivas realizadas por um mesmo doador em um mesmo dia.

§ 3º As doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo não podem ser utilizadas e devem, na hipótese de identificação do doador, ser a ele restituídas ou, se isso não for possível, devem ser consideradas de origem não identificada e recolhidas ao Tesouro Nacional, na forma prevista no caput do art. 32 desta Resolução.

§ 4º No caso da utilização das doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo, ainda que identificado o doador, os valores devem ser recolhidos ao Tesouro Nacional, na forma do disposto caput do art. 32 desta Resolução.

Pois bem.

A prestadora admite a realização de depósito que teria ultrapassado o limite legal, mas sustenta que as operações foram identificadas, o que redundaria em prática de autofinanciamento. Destaca que o excesso consubstancia R$ 478,90 (quatrocentos e setenta e oito reais e noventa centavos).

Adianto que não assiste razão à recorrente.

Como expressamente constante no § 1º supracitado, as doações em montante igual ou superior a R$ 1.064,10 devem ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação ou cheque cruzado e nominal. Além disso, os valores de depósitos sucessivos realizados por um mesmo doador, em um mesmo dia, devem ser somados para fins de aferição do limite legal de R$ 1.064,10.

Nesse diapasão, deve-se compreender o conjunto dos três depósitos efetuados no dia 27.9.2024 como operações únicas, em espécie, no valor de R$ 1.543,00 (mil quinhentos e quarenta e três reais).

E não é à toa a determinação legal. A exigência tem motivo: viabilizar de modo seguro a verificação da origem da contribuição, o que somente é possível se atendidas as formas de transferências legais, as quais permitem o cruzamento de informações entre dados da Receita Federal e outros órgãos, possibilitando, modo seguro, a identificação do doador.

A título de exemplo, um candidato poderia receber dinheiro em espécie de uma empresa interessada em sua eleição. Munido do maço de notas, esse hipotético candidato se dirigiria até a agência bancária e depositaria em sua conta de campanha, informando, como doador, CPF de pessoa física - ou ele mesmo, candidato.

É esse tipo de situação que a legislação intenta coibir primordialmente, muito embora acabe alcançando também candidatos desconhecedores dos regramentos de contabilidade eleitoral. Nessa linha, é firme o posicionamento do e. Tribunal Superior Eleitoral no sentido de que o depósito identificado se revela meio inábil à comprovação da efetiva origem dos recursos, ante a ausência do trânsito prévio das quantias depositadas pelo sistema bancário, bem como pela natureza essencialmente declaratória do ato. Exemplificativamente:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES 2016. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CAMPANHA ELEITORAL. VEREADOR. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. INCONFORMISMO. RESSARCIMENTO. VALORES DE DOAÇÃO. TESOURO NACIONAL.

1. A atual jurisprudência deste Tribunal é no sentido de que as doações acima de R$ 1.064,10 devem ser feitas mediante transferência eletrônica, nos exatos termos do art. 18, § 1º, da Res.-TSE 23.463, e o descumprimento da norma regulamentar não é reputado como falha meramente formal. Nesse sentido, já se assentou que "a aceitação de doações eleitorais em forma diversa da prevista compromete a transparência das contas de campanha, dificultando o rastreamento da origem dos recursos" (AgR-REspe 313-76, rel. Min. Luís Roberto Barroso, DJE de 3.12.2018).

2.  O Tribunal a quo assentou que "foram realizados dois depósitos em espécie realizados diretamente na conta de campanha, acima do limite legal, em desobediência ao art. 18, § 1º, da Resolução TSE n. 23.463/15" (fl. 143), acrescentando que tal irregularidade representou 74,95% do somatório dos recursos financeiros arrecadados e que seria inviável atender ao pleito de devolução da quantia aos pretensos doadores, em detrimento do seu recolhimento ao Tesouro Nacional, diante da falibilidade da identificação da origem desses recursos.

3. Em face da jurisprudência consolidada no tema, se não se admite a realização de depósito na "boca do caixa" para fins de prova da origem de doação, também a mera emissão do recibo eleitoral pelo candidato não possibilita, por si só, comprovar tal fato, o que ocorre justamente pela providência alusiva à transferência eletrônica entre contas bancárias, modalidade preconizada na resolução destinada a possibilitar a confirmação das informações prestadas.

Agravo regimental a que se nega provimento.

(Recurso Especial Eleitoral n. 25476, Acórdão, Relator Min. Sergio Silveira Banhos, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônica, Data 02.8.2019). (Grifei.)

 

AGRAVO REGIMENTAL. ELEIÇÕES 2016. PREFEITO. CONTAS DE CAMPANHA DESAPROVADAS. DOAÇÃO. PESSOA FÍSICA. DEPÓSITO. ART. 18, §§ 1º E 3º, DA RES.-TSE 23.463/2015. PERCENTUAL EXPRESSIVO. PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. NÃO INCIDÊNCIA. DESPROVIMENTO.

1. A teor do art. 18, §§ 1º e 3º, da Res.-TSE 23.463/2015, doações de pessoas físicas para campanhas, em valor igual ou superior a R$ 1.064,10, devem ser obrigatoriamente realizadas por meio de transferência eletrônica, sob pena de restituição ao doador ou de recolhimento ao Tesouro Nacional na hipótese de impossibilidade de identificá-lo.

2. Na espécie, é incontroverso que os candidatos, a despeito da expressa vedação legal, utilizaram indevidamente recursos financeiros R$ 5.000,00, o que corresponde a 16% do total de campanha oriundos de depósito bancário, e não de transferência eletrônica, o que impediu que se identificasse de modo claro a origem desse montante.

3. A realização de depósito identificado por determinada pessoa é incapaz, por si só, de comprovar sua efetiva origem, haja vista a ausência de trânsito prévio dos recursos pelo sistema bancário. Precedentes, com destaque para o AgR-REspe 529-02/ES, Rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJe de 19.12.2018.

4. Concluir em sentido diverso especificamente quanto à alegação de que as irregularidades não comprometeram a lisura do ajuste ou de que houve um erro formal do doador demandaria reexame do conjunto probatório, providência inviável em sede extraordinária, a teor da Súmula 24/TSE.

5. Inaplicáveis os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, pois se trata de falha que comprometeu a transparência do ajuste contábil. Precedentes.

6. Descabe conhecer de matéria alusiva ao desrespeito aos princípios da isonomia e legalidade (art. 5º, caput e II, da CF/88), porquanto cuida-se de indevida inovação de tese em sede de agravo regimental.

7. Agravo regimental desprovido.

(TSE – AgR-REspe n. 251-04, Relator Min. Jorge Mussi, julgado em 19.3.2019, publicado no DJE, tomo 66, de 05.4.2019, pp. 68-69). (Grifei.)

Ademais, na hipótese dos autos não há comprovação sobre a origem dos recursos ou, ainda, dos motivos pelos quais tais depósitos não foram realizados mediante transferências bancárias de modo conjunto. É inviável que a falha seja relevada, impondo-se, portando, o dever de recolhimento aos cofres públicos as importâncias irregularmente auferidas, porquanto empregada pela recorrente em sua campanha, tese corroborada pelo seguinte precedente deste Tribunal:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. ELEIÇÕES 2020. VEREADOR. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. RESOLUÇÃO TSE N. 23.607/19. DEPÓSITOS SUCESSIVOS EM ESPÉCIE, NO MESMO DIA, NA CONTA DE CAMPANHA, PELO MESMO DOADOR. MONTANTE ACIMA DO LIMITE LEGAL. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. DESPROVIMENTO.

1. Insurgência contra sentença que desaprovou as contas, em razão do recebimento de recursos em espécie em montante superior a R$ 1.064,10, através de dois depósitos na conta de campanha, realizados na mesma data, pelo mesmo depositante.

2. Depósitos em espécie na conta de campanha do candidato, realizados por um único doador, na mesma data e em duas diferentes operações, excedendo o patamar de R$ 1.064,10, em afronta ao disposto nos §§ 1º e 2º do art. 21 da Resolução TSE n. 23.607/19. Não se trata de erro formal, mas de afronta à previsão legal cujo objetivo é assegurar a transparência das origens dos recursos que alimentam as campanhas eleitorais. Falha que caracteriza o recurso, na sua totalidade, como de origem não identificada, conforme se depreende do disposto no art. 32, § 1º, inc. IV, da Resolução TSE n. 23.607/19, devendo o valor correspondente ser recolhido ao Tesouro Nacional.

3. Provimento negado.

(REl n. 0600603-39.2020.6.21.0031, Relator Des. Eleitoral Oyama Assis Brasil de Moraes, julgado em 20.5.2021). (Grifei.)

A falha de R$ 1.543,00 representa 89,81% do total de recursos financeiros recebidos (R$ 1.718,00 ); mostra-se inviabilizada também a aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade como forma de atenuar sua gravidade perante o conjunto das contas,

Diante do exposto, VOTO para negar provimento ao recurso de LUANE EBERTZ.