PC-PP - 0600244-46.2024.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 24/07/2025 00:00 a 25/07/2025 23:59

VOTO

Trata-se da prestação de contas do DIRETÓRIO ESTADUAL DO CIDADANIA DO RIO GRANDE DO SUL (CIDADANIA/RS), relativa ao exercício de 2023.

Após o exame técnico e a análise dos documentos complementares oferecidos pela agremiação, o órgão técnico emitiu parecer conclusivo identificando as seguintes irregularidades: (1) recebimento de recursos provenientes de fonte vedada, na monta de R$ 720,00; (2) recebimento de recursos do Fundo Partidário no período em que o órgão partidário cumpria sanção de suspensão do recebimento desse tipo de recurso, no valor de R$ 10.000,00; (3) ausência de comprovação de parte dos gastos realizados com recursos do Fundo Partidário, no montante de R$ 238,19; e (4) ausência de demonstração da aplicação mínima de 5% dos recursos do Fundo Partidário na criação e manutenção de programas de promoção e difusão da participação política das mulheres (ID 45959687).

Passo ao exame das falhas apuradas.

1) Do Recebimento de Recursos Provenientes de Fonte Vedada

Conforme registrado no item 2.1 do parecer técnico conclusivo (ID 45959687), constatou-se o ingresso de 12 (doze) doações oriundas de pessoa jurídica inscrita no CNPJ n. 92.829.100/0001-43 - Instituto de Previdência do Estado do Rio Grande do Sul -, através de aporte mensal de R$ 60,00 (sessenta reais), cujo valor total foi de R$ 720,00 (setecentos e vinte reais), conforme a seguinte tabela:

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Com efeito, o art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95 veda o recebimento direto ou indireto de doações procedentes de pessoas jurídicas, in verbis:

Art. 31. É vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de: (...)

II - entes públicos e pessoas jurídicas de qualquer natureza, ressalvadas as dotações referidas no art. 38 desta Lei e as provenientes do Fundo Especial de Financiamento de Campanha;

O partido, por sua vez, alega que os valores se referem a contribuições voluntárias mensais realizadas por servidora pública filiada à agremiação, Solange Massotti da Silva, por meio de desconto em folha de pagamento, anexando declaração firmada pela própria servidora para confirmar a origem das doações (ID 45939931).

Assim, o prestador sustenta que a menção à pessoa jurídica decorre exclusivamente da sistemática operacional da consignação e que a efetiva origem dos recursos é de pessoa física, o que afastaria a incidência da vedação legal.

Contudo, a agremiação não apresentou documento capaz de comprovar a origem dos recursos doados, como extratos bancários da doadora, comprovando a origem e intermediação no fluxo dos valores, ou declaração do IPERGS.

Assim, a declaração apresentada, emitida pela própria suposta doadora indicada pelo partido, caracteriza-se como um documento unilateral, não corroborado por nenhum outro elemento idôneo de prova.

Assim, não tendo havido a devolução ou o recolhimento de tais verbas, subsiste a falha e o consequente dever de transferir o equivalente ao Tesouro Nacional, consoante entendimento manifestado por este Tribunal em caso análogo:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO ESTADUAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2020. PARECER TÉCNICO PELA DESAPROVAÇÃO. RECEBIMENTO DE RECURSOS DE FONTE VEDADA. INGRESSO DE DOAÇÃO PROVENIENTES DE PESSOA JURÍDICA. DEPÓSITOS REALIZADOS POR PESSOAS EXERCENTES DE CARGOS PÚBLICOS DE LIVRE EXONERAÇÃO OU DEMISSÃO. IRREGULARIDADES MANTIDAS. APLICAÇÃO IRREGULAR DE VERBAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. SATISFAÇÃO EM PARTE DO DISPOSTO NO ART. 18 DA RESOLUÇÃO TSE. N. 23.604/19. IRREGULARIDADES DE BAIXO PERCENTUAL. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. Prestação de contas de diretório estadual de partido político, relativa ao exercício financeiro de 2020, disciplinadas quanto ao mérito pela Resolução TSE n. 23.604/19.

2. Recebimento de recursos de fonte vedada. 2.1 Ingresso de doação proveniente de pessoa jurídica. Recebimento de quantia, em onze parcelas iguais, constando no extrato bancário. Acostada declaração firmada pela doadora. Todavia, a mera declaração da parte, mesmo não havendo indícios de fraude ou má-fé, não faz prova da origem do recurso, tal como preceitua o inc. III do art. 36 da Resolução TSE n. 23.604/19. Ausência de elemento probatório objetivamente constituído que respalde o esclarecimento apresentado. 2.2. Realização de 46 depósitos provenientes de pessoas que exercem cargos públicos de livre exoneração ou demissão em diferentes órgão públicos. Vedação expressa pelo art. 31, inc. V, da Lei n. 9.096/95. Ausência de demonstração da incidência da ressalva da parte final do citado dispositivo. Como regra, o partido é proibido de receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive mediante publicidade de qualquer espécie, procedente de pessoas físicas que exerçam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário. A existência de recursos de fonte vedada demanda o recolhimento do seu montante ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 14, § 1º, da Resolução TSE n. 23.604/19.

3. Aplicação irregular de recursos do Fundo Partidário, em desacordo com o art. 18 da Resolução TSE n. 23.604/19. Apresentado pelo partido elementos capazes de elidir parcialmente o apontamento. Demonstrado que algumas despesas efetivamente se referem a serviços de telefonia e internet contratados, conforme se depreende das referidas faturas. Irregularidade sanada nesse ponto. Todavia, não houve demonstração em relação a alguns fornecedores. Inexistência de documento capaz de satisfazer o requisito do citado art. 18, o que inviabiliza o afastamento da irregularidade.

4. As irregularidades apontadas representam 1,58% das receitas declaradas, ficando abaixo do percentual (10%) utilizado como parâmetro para permitir a aprovação das contas com ressalvas, na esteira da jurisprudência desta egrégia Corte.

5. Aprovação com ressalvas. Recolhimento ao Tesouro Nacional.

(PRESTAÇAO DE CONTAS - PARTIDO POLITICO nº060013197, Acórdão, Des. Luis Alberto Dazevedo Aurvalle, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 27/04/2023) (Grifei.)

De toda sorte, ainda que se atestasse com segurança que os valores em questão proveem do desconto em folha de pessoa física, a circunstância não socorreria à agremiação, uma vez que o desconto automático em folha de pagamento não é admitido como forma de contribuição lícita pela jurisprudência do TSE:

EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2017. PARTIDO POLÍTICO. AGRAVO INTERNO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. ACÓRDÃO DE ORIGEM EM CONSONÂNCIA COM A JURISPRUDÊNCIA DO TSE. NÃO PROVIMENTO.

1. Na decisão agravada, negou-se seguimento a agravo interposto contra decisão da Presidência do TRE/RJ que não admitiu recurso especial contra acórdão unânime proferido pela referida Corte, que desaprovou as contas do partido político agravante alusivas ao exercício financeiro de 2017, com determinação de recolhimento de valores ao erário e multa.

2. A jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral posiciona-se no sentido de que os partidos políticos são proibidos de receber doação mediante desconto automático em folha de pagamento, prática conhecida como "dízimo partidário", seja de servidores públicos ocupantes de cargos em comissão, seja de detentores de mandato eletivo, devido ao seu caráter compulsório, incompatível com a natureza livre e espontânea da doação.

3. No caso, a legenda recebeu valores decorrentes de descontos automáticos na folha de pagamento de pessoal relativa à Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (ALERJ). Como bem pontuou a Corte de origem, ainda que essas quantias tenham sido decotadas da remuneração de detentores de mandato eletivo, caracterizou-se a prática ilícita devido à sua compulsoriedade. Precedentes.

[...].

5. O TSE já assentou que detentor de mandato eletivo não se enquadra no conceito de autoridade pública para fins da incidência da vedação do art. 12, IV, da Res.-TSE nº 23.546/2017. No entanto, a irregularidade, no caso, reside na circunstância de se ter tratado de contribuição compulsória, por meio de desconto automático de valor em folha de pagamento.

6. "A doação partidária é ato de vontade própria que não pode contar com intermediários e pode ser realizada somente por ação espontânea do eleitor diretamente direcionada ao partido da sua preferência" (REspEl 1916-45.2009.6.11.0000/MT, Rel. Min. Henrique Neves, DJe de 9/6/2016).

[...].

8. Agravo interno a que se nega provimento.

(TSE; Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial Eleitoral nº060023806, Acórdão, Min. Isabel Gallotti, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 01/07/2024) (Grifei.)

 

Na mesma linha, colaciono julgado deste TRE-RS:

DIREITO ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS ANUAL. DIRETÓRIO ESTADUAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2021 . QUESTÃO DE ORDEM. ART. 4º DA EMENDA CONSTITUCIONAL N. 133/24 . RECEBIMENTO DE DOAÇÕES DE FONTES VEDADAS. APLICAÇÃO IRREGULAR DE RECURSOS DO FUNDO PARTIDÁRIO. DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS . I. CASO EM EXAME 1.1. Prestação de contas de diretório estadual de partido político, relativa ao exercício financeiro de 2021 .

[...]

3.2. Recebimento de Doação de Pessoa Jurídica. 3 .2.1. O art. 31, inc . I, da Resolução TSE n. 23.607/19 veda o recebimento direto ou indireto de doações procedentes de pessoas jurídicas. 3 .2.2. Recursos provindos de órgão público fazendário. Falha que não há como ser superada, uma vez que o desconto automático em folha de pagamento não é admitido como forma de contribuição lícita, conforme jurisprudência do TSE . 3.2.3. Falha que subsiste, pois não houve esclarecimentos e tampouco a devolução das verbas recebidas de fontes vedadas . Dever de transferir o equivalente ao Tesouro Nacional. 3.3. Contribuições de Pessoas Físicas Não Filiadas a Partido Político . 3.3.1. Recebimento de contribuições de pessoas físicas detentoras de cargos ou funções públicas demissíveis ad nutum e não filiadas ao partido político . Doadores considerados fontes vedadas de arrecadação, uma vez que não estão abrangidos na ressalva contida no art. 31, inc. V, da Lei n. 9 .096/95. Dever de recolhimento.

[...].

(TRE-RS - PC-PP: 06002407720226210000 PORTO ALEGRE - RS 060024077, Relator.: Mario Crespo Brum, Data de Julgamento: 13/12/2024, Data de Publicação: DJE-365, data 18/12/2024) (Grifei.)

 

Diante do exposto, reconhece-se a permanência da irregularidade, devendo a quantia de R$ 720,00 ser recolhida ao Tesouro Nacional, na forma do art. 14, § 1º, da Resolução TSE n. 23.604/19.

 

2) Do Recebimento de Recursos do Fundo Partidário Durante Período de Cumprimento de Suspensão

A segunda irregularidade apontada pela unidade técnica, constante do item 4.1 do parecer conclusivo, envolve o recebimento, no exercício de 2023, de R$ 10.000,00 provenientes do Fundo Partidário, no período de 1º de janeiro a 1º de fevereiro, quando ainda vigente sanção de suspensão do repasse desse tipo de recurso.

A penalidade em tela foi imposta no julgamento da prestação de contas do exercício de 2019 (Processo n. 0600278-60.2020.6.21.0000), por decisão transitada em julgado, e teve seu cumprimento registrado no Sistema de Informação de Contas – SICO Web.

A agremiação, em sua defesa, sustentou que a penalidade teria sido automaticamente executada no mês de setembro de 2022, mês subsequente ao trânsito em julgado da condenação, ocorrido em 29.8.2022. Para tanto, invocou o art. 36 da Resolução TSE n. 23.709/22, que assim dispõe:

Art. 36. A execução da sanção de suspensão ou de desconto de cotas do Fundo Partidário, independentemente da esfera partidária, ocorrerá no mês subsequente ao do trânsito em julgado da decisão, salvo se diversamente estabelecer o título executivo ou no caso de contas de campanha (Lei nº 9.504/1997, art. 25).

A argumentação, contudo, não merece acolhida.

A Resolução TSE n. 23.709/22, invocada pela agremiação, somente entrou em vigor na data de sua publicação, ocorrida em 23 de março de 2023 (DJE-TSE n. 48, de 23.3.2023, p. 75-90), conforme expressamente estabelecido em seu art. 58. Assim, à luz do princípio do tempus regit actum, não é possível aplicar retroativamente norma superveniente a fato jurídico já consumado, sobretudo quando se trata da execução de sanção de natureza material, como é o caso da suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário.

Além disso, embora o trânsito em julgado da decisão sancionatória tenha ocorrido em agosto de 2022, a intimação do diretório nacional do partido, necessária para viabilizar a execução da sanção, nos termos do art. 37, § 3º-A, da Lei n. 9.096/95, somente foi efetivada em 19 de outubro de 2022, conforme certidão lavrada nos autos do cumprimento de sentença da prestação de contas de 2019 (Processo n. 0600278-60.2020.6.21.0000, ID 45147043).

Nessas circunstâncias, é cronologicamente impossível que o cumprimento da sanção tenha ocorrido no mês de setembro daquele ano, como sustentado pela agremiação.

Adicionalmente, ao consultar os autos da prestação de contas do exercício de 2022 do mesmo órgão partidário (Processo n. 0600183-25.2023.6.21.0000), verificou-se, por meio de extrato bancário anexado na página 32 do ID 45607085, que houve o repasse de recursos do Fundo Partidário ao diretório estadual no dia 1º de setembro de 2022, no valor de R$ 20.000,00. O lançamento bancário identifica como remetente o diretório nacional do partido, inscrito no CNPJ n. 29.417.359/0001-40, e aponta a conta de destino como sendo vinculada à movimentação de recursos públicos.

Esse repasse, ocorrido justamente no mês em que o partido alega ter ocorrido o cumprimento da sanção de suspensão, contradiz de forma objetiva a alegação defensiva.

Ademais, nos termos do art. 37, § 9º, da Lei n. 9.096/95, suspende-se a execução de sanções relativas ao Fundo Partidário durante o segundo semestre de anos eleitorais, como foi o caso de 2022. Nessas condições, ainda que houvesse intenção de cumprimento espontâneo e imediato, a sanção imposta no julgamento das contas de 2019 poderia ter sido efetivamente executada somente a partir de janeiro de 2023, primeiro mês subsequente ao período de suspensão legal da medida.

Diante disso, a justificativa apresentada pela agremiação não se sustenta, impondo-se a manutenção do apontamento da irregularidade indicado pelo órgão técnico de análise.

Portanto, o repasse da quantia de R$ 10.000,00 ao diretório estadual, ocorrido exatamente em janeiro de 2023, configura descumprimento da sanção de suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário, determinada em decisão transitada em julgado, do qual decorre o dever de recolhimento da quantia indevidamente recebida ao Tesouro Nacional, na linha da jurisprudência deste Tribunal Regional:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO ESTADUAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2021. RECEBIMENTO DE RECURSOS DE FONTE VEDADA. DOAÇÕES DE PESSOA JURÍDICA. DOAÇÃO DE AUTORIDADE PÚBLICA. USO INDEVIDO DO FUNDO PARTIDÁRIO. RECEBIMENTO INDEVIDO DE REPASSES DO FUNDO PARTIDÁRIO. UTILIZAÇÃO DO FUNDO PARTIDÁRIO SEM COMPROVAÇÃO. NÃO APLICAÇÃO DE PERCENTUAL DO FUNDO PARTIDÁRIO EM AÇÕES AFIRMATIVAS. DESPESAS IRREGULARES COM VERBAS DO FUNDO PARTIDÁRIO DESTINADA AO INCREMENTO DA PARTICIPAÇÃO POLÍTICA FEMININA. PERCENTUAL ELEVADO DAS IRREGULARIDADES. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL, ACRESCIDO DE MULTA. RECOLHIMENTO AO FUNDO PARTIDÁRIO MULHER. AFASTADA A SUSPENSÃO DO REPASSE DE QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. DESAPROVAÇÃO.

Prestação de contas de diretório estadual de partido político, referente ao exercício financeiro do ano de 2021. [...]. Uso indevido do Fundo Partidário. 3.1. Recebimento indevido de repasses do Fundo Partidário. O § 1º do art. 23 da Resolução TSE n. 23.604/19 veda a utilização do Fundo Partidário quando defeso ao partido a percepção de seu repasse. A unidade técnica registra o aporte de duas parcelas em período em que a agremiação não poderia perceber valores dessa rubrica, pois vedado em decorrência de sanções judiciais. Portanto, os referidos repasses ocorreram no decorrer do cumprimento das sanções impostas à grei, e, por conseguinte, devem ser devolvidos ao Tesouro Nacional. [...]. Desaprovação. Recolhimento ao Tesouro Nacional e ao Fundo Partidário Mulher, acrescidos de multa.

(TRE-RS; PRESTAÇÃO DE CONTAS ANUAL n. 060024162, Acórdão, Relator: Des. Nilton Tavares Da Silva, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 10/09/2024) (Grifei.)

 

3) Da Ausência de Comprovação de Gastos Realizados com Recursos do Fundo Partidário

A terceira irregularidade apurada, conforme descrito no item 4.2 do parecer técnico conclusivo, refere-se à realização de despesas com recursos do Fundo Partidário em desacordo com os arts. 18, 29, inc. V, e 36, § 2º, da Resolução TSE n. 23.604/19.

 Inicialmente, os valores glosados totalizavam R$ 8.233,83, conforme relatório de exame de contas (ID 45848429).

Após a devida intimação, o partido apresentou manifestação acompanhada de documentação complementar (IDs 45939930 a 45939938).

A unidade técnica, ao reavaliar os elementos juntados, reconheceu a redução significativa das inconsistências inicialmente apontadas, remanescendo, contudo, irregularidades em despesas no valor de R$ 238,19, sem comprovação documental, conforme registrado na tabela 1 do parecer conclusivo abaixo colacionada:

TabelaO conteúdo gerado por IA pode estar incorreto.

Importa ressaltar que, em suas alegações finais, o partido não apresentou manifestação específica quanto às irregularidades em tela, limitando-se a reiterar fundamentos já anteriormente expostos e devidamente enfrentados pela unidade técnica, os quais não se mostraram aptos a afastar os apontamentos formulados.

Diante disso, persiste a ausência de comprovação regular da aplicação da quantia de R$ 238,19, impondo-se, em observância ao disposto no art. 58, § 2º, da Resolução TSE n. 23.604/19, a devolução do referido montante ao erário, tendo em vista a natureza pública dos recursos envolvidos.

 

4) Da Ausência de Aplicação Mínima de Recursos na Promoção da Participação Feminina na Política

A quarta irregularidade apurada, conforme item 4.5 do parecer técnico conclusivo, refere-se à inobservância da obrigação legal de destinar, no mínimo, 5% dos recursos do Fundo Partidário à criação e manutenção de programas de promoção e difusão da participação política das mulheres, nos termos do art. 44, inc. V, da Lei n. 9.096/95.

No exercício de 2023, o partido recebeu o montante de R$ 30.000,00 a título de Fundo Partidário, o que impunha a aplicação mínima de R$ 1.500,00 para esse fim. Todavia, conforme apurado pela unidade técnica, não houve qualquer movimentação na conta bancária específica vinculada à cota de gênero, tampouco foi comprovada a destinação direta dos recursos à finalidade legalmente exigida.

Embora intimada para manifestação, a agremiação permaneceu inerte quanto a essa irregularidade, não tendo apresentado qualquer esclarecimento específico, seja em sua petição de defesa (ID 45939930), seja nas alegações finais (ID 45967259), o que evidencia omissão relevante e reforça o descumprimento do dever legal.

Dessa forma, deverá o partido aplicar, no exercício financeiro subsequente ao trânsito em julgado desta decisão, o valor de R$ 1.500,00 exclusivamente em ações de promoção da participação política feminina, vedada a destinação para finalidade diversa, sob pena da aplicação do acréscimo de 12,5%, nos termos do § 5º do art. 44 da Lei n. 9.096/95.

5) Das Cominações Legais

As irregularidades identificadas no presente feito totalizam R$ 12.458,19, valor que abrange: (i) o recebimento de recursos oriundos de fonte vedada (R$ 720,00); (ii) o ingresso de recursos do Fundo Partidário durante o período de cumprimento de sanção de suspensão (R$ 10.000,00); (iii) a ausência de comprovação de gastos com recursos do Fundo Partidário, no montante de R$ 238,19; e (iv) a não comprovação da destinação mínima de 5% do Fundo Partidário para a promoção e difusão da participação política das mulheres no exercício de 2023, na quantia de R$ 1.500,00.

Esse montante representa aproximadamente 31,75% da arrecadação do partido em 2023 (R$ 39.235,33). Tais cifras ultrapassam os parâmetros alternativos adotados pela jurisprudência para aprovar com ressalvas as contas, mediante aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, quais sejam, o limite absoluto de R$ 1.064,10 ou percentual de 10% do total da arrecadação (TSE – RespEl n. 060169270/MA, Relator: Min. EDSON FACHIN, Data de Julgamento: 19.11.2020, Data de Publicação: 25.11.2020), tornando impositiva a desaprovação das contas.

Nos termos do art. 48 da Resolução TSE n. 23.604/19, a desaprovação das contas acarreta, adicionalmente, a imposição de sanção pecuniária de até 20% do montante passível de recolhimento ao Tesouro Nacional, nos moldes do art. 48 da Resolução TSE n. 23.604/19:

Art. 48. A desaprovação das contas do partido implicará a sanção de devolução da importância apontada como irregular, acrescida de multa de até 20% (vinte por cento) (art. 37 da Lei nº 9.096/95).

 

Na linha dos julgados desta Casa, a multa deve ser fixada de forma proporcional à relação entre as falhas verificadas e o total de receitas auferidas pelo partido político (TRE-RS; REl n. 0600051-61, Acórdão, Relator: Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 07.02.2024).

Considerando tais parâmetros, fixo a multa no percentual de 6% sobre o montante irregular, equivalente a R$ 747,49.

Outrossim, deve ser imposta a suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário como consequência específica do recebimento de recursos de fonte vedada, nos termos do art. 36, inc. II, da Lei n. 9.096/95.

Nesse ponto, cabe prestigiar a interpretação conferida ao dispositivo pelo Tribunal Superior Eleitoral e adotada por este Tribunal Regional Eleitoral no sentido de que "incidem os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade na hipótese da sanção prevista no art. 36, inc. II da Lei n. 9.096/95, especialmente com base na repercussão das falhas no conjunto das contas" (TSE, Recurso Especial Eleitoral n. 3804, Acórdão, Relator Min. Alexandre de Moraes, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo n. 142, Data: 03.8.2021).

No caso em exame, a irregularidade referente ao recebimento de recursos de fonte vedada alcançou o montante de R$ 720,00, equivalente a aproximadamente 1,83% do total de recursos arrecadados pelo partido no exercício de 2023 (R$ 39.235,33). Considerando a reduzida representatividade do valor no conjunto das contas, mostra-se proporcional a imposição da sanção de suspensão do repasse das quotas do Fundo Partidário pelo período de 1 (um) mês, nos termos do art. 36, inc. II, da Lei n. 9.096/95.

Em relação à cota de gênero, deverá o partido aplicar, no exercício financeiro subsequente ao trânsito em julgado desta decisão, o valor de R$ 1.500,00 exclusivamente em ações de promoção da participação política feminina, vedada a destinação para finalidade diversa, sob pena da aplicação do acréscimo de 12,5%, conforme previsão do § 5º do art. 44 da Lei n. 9.096/95.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pela desaprovação das contas do exercício financeiro de 2023 do DIRETÓRIO ESTADUAL DO CIDADANIA, nos termos do art. 45, inc. III, da Resolução TSE n. 23.604/19, e determino ao órgão partidário, nos termos da fundamentação:

a) o recolhimento ao Tesouro Nacional do montante total de R$ 10.958,19, dos quais R$ 720,00 referem-se à utilização de recursos de fonte vedada (art. 14, § 1º da Resolução TSE n. 23.604/19), R$ 10.000,00 são relativos ao descumprimento de sanção de suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário e R$ 238,19 são referentes à ausência de comprovação da aplicação de recursos do Fundo Partidário (art. 58, § 2º, da Resolução TSE n. 23.604/19);

b) a suspensão do recebimento de quotas do Fundo Partidário pelo período de 1 (um) mês, com esteio no art. 46, inc. I, da Resolução TSE n. 23.604/19;

c) o pagamento de multa de 6% sobre o montante irregular, perfazendo a quantia de R$ 747,49, com fundamento nos arts. 37 da Lei n. 9.096/95 e 48, caput, da Resolução TSE n. 23.604/19; e

d) a transferência do valor de R$ 1.500,00 à conta do Fundo Partidário Mulher, a ser aplicado na promoção e difusão da participação política das mulheres, no exercício subsequente ao trânsito em julgado desta decisão, sob pena do acréscimo de 12,5% previsto no § 5º do art. 44 da Lei n. 9.096/95, a ser aplicado no mesmo fim.