AJDesCargEle - 0600029-41.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 06/09/2022 às 14:00

VOTO

Antes de analisar o mérito, cumpre referir que os órgãos Regional e Municipal de Viamão do PTB arguiram a preliminar de extinção do processo, sem a apreciação do mérito, por perda do objeto, porque ao tempo da contestação já havia encerrado o prazo de filiação partidária para o requerente concorrer às eleições de 2022, dia 2.4.2022.

A alegação foi rejeitada no despacho saneador do ID 44964436, sob o fundamento de que “persiste o interesse do requerente em ver reconhecida justa causa para a desfiliação sem perda do mandato, a despeito do escoamento do prazo de filiação para a eleição de 2022”.

Quanto ao mérito, a ação se fundamenta no art. 17, § 6°, da Constituição Federal e no art. 22-A, incs. I e II, da Lei n. 9.096/95, que estabelecem como hipóteses de justa causa para a desfiliação partidária sem perda do cargo eletivo, a anuência do partido, a mudança substancial ou o desvio reiterado do programa partidário, e a grave discriminação política pessoal.

Passo ao exame dos fatos e provas.

 

a) Cartas de anuência de desfiliação.

A Emenda Constitucional n. 111/21 incluiu o § 6º no art. 17 da Constituição Federal, dispondo que os candidatos eleitos pelo sistema proporcional podem se desfiliar do partido pelo qual foram eleitos, sem perda do mandato eletivo, caso a legenda expresse anuência com a desfiliação:

Art. 17. É livre a criação, fusão, incorporação e extinção de partidos políticos, resguardados a soberania nacional, o regime democrático, o pluripartidarismo, os direitos fundamentais da pessoa humana e observados os seguintes preceitos:

(…)

§ 6º Os Deputados Federais, os Deputados Estaduais, os Deputados Distritais e os Vereadores que se desligarem do partido pelo qual tenham sido eleitos perderão o mandato, salvo nos casos de anuência do partido ou de outras hipóteses de justa causa estabelecidas em lei, não computada, em qualquer caso, a migração de partido para fins de distribuição de recursos do fundo partidário ou de outros fundos públicos e de acesso gratuito ao rádio e à televisão.

 

Sobre o tema, este Tribunal tem entendimento consolidado no sentido de que “para aceitar o consentimento do partido como justa causa, a anuência deve ser ‘qualificada’, expressando uma declaração de que o partido não tem interesse no cargo eletivo” (Petição n 060020554, ACÓRDÃO de 05/04/2022, da minha relatoria, DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Data 11/04/2022).

No caso em apreço, a ação foi ajuizada em 27.01.2022 e, com a inicial, o requerente juntou carta de anuência genérica, sem menção ao cargo eletivo, subscrita em 01.12.2021 pela então presidente do Diretório Nacional do PTB, Graciela Nienov, na qual esta consigna que “manifesta sua expressa anuência quanto a desfiliação do Vereador de Viamão/RS WILLIAM RODRIGUES PEREIRA” (ID 44905881).

Contudo, em 10.3.2022, antes mesmo da expedição do mandado de citação dos órgãos partidários, o parlamentar peticionou renovando o pedido de antecipação de tutela, com fundamento na juntada de outra carta de anuência com a desfiliação, subscrita em 18.02.2022, data anterior ao ajuizamento da ação, pela mesma dirigente nacional.

No documento, a dirigente afirma que “manifesta posição de não utilizar as prerrogativas da Resolução n. 22.610, do TSE c/c art. 26 da Lei 9.096/95, que trata da fidelidade partidária e consigna anuência a sua desfiliação, nos termos do expresso Art. 1o, da Emenda Constitucional 111, de 28 de setembro de 2021, que acrescentou o § 6o, ao art. 17, da Constituição Federal, não postulando perante a Justiça Eleitoral quanto à desfiliação do Vereador de Viamão/RS, WILLIAM RODRIGUES PEREIRA”.

Na decisão do ID 44940634, referi que a segunda declaração de aquiescência com a desfiliação “é indício de prova que será devidamente valorado, mas não possui presunção absoluta para se comprovar a justa causa para a desfiliação requerida sem oportunidade de exercício da ampla defesa”.

Embora o requerente não tenha justificado porque a carta de anuência específica de 18.1.2022, introduzida tardiamente no processo em 10.3.2022, não foi juntada com a inicial em 27.1.2022, entendo que, neste caso específico, o seu conhecimento não viola o disposto no art. 435 e parágrafo único do CPC.

Essa carta é datada de 01.12.2021, foi juntada aos autos em 10.3.2022, após o ajuizamento da ação ocorrido em 27.1.2022, mas os mandados de citação foram expedidos somente em data posterior, em 14.3.2022 (ID 44941137) e 16.3.2022 (ID 44942354), e a contestação apresentada pelos requeridos expressamente enfrenta a prova (ID 44954885).

Desse modo, considero que o documento comporta conhecimento.

No caso dos autos, todavia, o teor da carta de anuência foi infirmado pelos requeridos e pelas provas juntadas aos autos, as quais infirmam a fidedignidade das declarações nela contidas.

Extrai-se, de início, que, embora o requerente ocupe o cargo de vereador no Município de Viamão, no qual há diretório partidário constituído e vigente, a anuência específica foi concedida em 18.1.2022 pela então Presidente do Diretório Nacional do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), Graciela Nienov.

Contudo, é fato público e notório, amplamente divulgado pela mídia, que, em 11.2.2022 o Ministro Edson Fachin do TSE, nos autos do SEI n. 2021.00.000010465-6 (referido no MSCiv n. 0600153-09.2022.6.00.0000, também da relatoria do Min. Edson Fachin), acolheu o pedido do partido e determinou a inclusão de Marcus Vinícius de Vasconcelos Ferreira como representante da legenda perante o TSE, tendo sido no mesmo período aberto um Processo Disciplinar no Conselho de Ética do PTB contra a referida dirigente, que culminou com sua expulsão em 15.6.2022 (https://g1.globo.com/rj/rio-de-janeiro/eleicoes/2022/noticia/2022/03/11/presidente-do-tse-fachin-reconhece-marcus-vinicius-neskau-como-presidente-nacional-do-ptb.ghtml).

Esses elementos de prova indicam que a anuência com a desfiliação do vereador foi concedida pela antiga Presidente do Diretório Nacional ao alvedrio dos demais dirigentes partidários em nível Nacional, circunstância corroborada com o fato de que as esferas Estadual e Municipal do partido estão a vindicar o mandato nestes autos.

A falta de fidedignidade da concordância com a desfiliação foi apurada também pela prova oral.

As testemunhas Maria Rosane da Rosa Fagundes e Vitório Krampe, que prestam serviços ao PTB, declararam em juízo que a Presidente do PTB Nacional, Graciela Nienov, deu carta de anuência em nome próprio aos vereadores, a pedido do Deputado Federal Maurício Dzedrick, mas que só quem detém a competência para tal deliberação estatutária é a Comissão Executiva Nacional, a qual não se reuniu para tratar do tema.

O informante Jefferson Oléa Homrich, vereador de São Borja, Presidente do PTB de São Borja, Vice-Presidente do PTB Estadual e 1o Secretário de Finanças do Diretório Nacional do partido, afirmou não ter conhecimento da entrega das cartas de anuência, referiu que o PTB Nacional não se envolve nas questões municipais e alegou que, nos últimos anos, não houve alteração no programa partidário e na ideologia do partido.

Verifiquei que o Estatuto do PTB não prevê a competência do Presidente do Partido Nacional em matéria de desfiliação. O art. 67, inc. I, al. “f” dispõe que, ao Presidente, cabe dirigir o partido de acordo com as resoluções de seus órgãos, assim como editar, no que couber, resoluções normativas e complementares ao presente Estatuto, ad referendum do Diretório Nacional.

Nas atribuições dos presidentes no nível nacional ou municipal (artigos 67, I, e 68, I), não se verifica a emissão de cartas de anuência para desfiliação:

SUBSEÇÃO V - DA COMPETÊNCIA PRIVATIVA DOS MEMBROS DAS COMISSÕES EXECUTIVAS

Art. 67. Compete privativamente aos membros da Comissão Executiva Nacional, além das atribuições decorrentes do Plano Nacional de Ação Partidária:

I. Compete ao Presidente:

a. Representar o partido, nas instâncias judiciais e extrajudiciais, pessoalmente ou por meio de procurador devidamente constituído;

b. Convocar a convenção, o diretório e a comissão executiva, na forma do Estatuto;

c. Presidir a convenção, as reuniões do diretório e da própria comissão executiva;

d. Convocar os suplentes, em caso de vacância, impedimento ou ausência dos membros efetivos;

e. Autorizar a realização de despesas ordinárias;

f. Dirigir o partido de acordo com as resoluções de seus órgãos, assim como editar, no que couber, resoluções normativas e complementares ao presente Estatuto, ad referendum do Diretório Nacional, com exceção das atribuições definidas nos incisos III, IV, V, IX e XVII do artigo 44;

g. Orientar a implementação do Plano Nacional de Ação Partidária;

h. Orientar as atividades administrativas do diretório;

i. Implementar, em conjunto com os secretários, os projetos específicos de suas respectivas áreas;

j. Coordenar as atividades administrativas do diretório e dos secretários;

k. Admitir e dispensar pessoal administrativo;

l. Coordenar e supervisionar as atividades de articulação partidária.

(…)

Art. 68. Compete privativamente aos membros das Comissões Executivas Estaduais, Municipais, no âmbito de sua circunscrição partidária:

I. Compete ao Presidente:

a. Representar o partido, nas instâncias judiciais e extrajudiciais, pessoalmente ou por meio de procurador devidamente constituído;

b. Convocar a convenção, o diretório e a comissão executiva, na forma do Estatuto;

c. Presidir a convenção, as reuniões do diretório e da própria comissão executiva;

d. Convocar os suplentes, em caso de vacância, impedimento ou ausência dos membros efetivos;

e. Autorizar a realização de despesas ordinárias;

f. Dirigir o partido de acordo com as resoluções de seus órgãos.

Os artigos referentes aos processos de suspensão, expulsão e cancelamento de filiação estabelecem que essa deliberação será realizada pela comissão executiva ou comissão de ética, ou seja, órgãos colegiados, e não individualmente, pelo Presidente Nacional do PTB (art. 113, art. 114, art. 122, art. 134):

SEÇÃO IV - DA DESTITUIÇÃO DE CARGO PARTIDÁRIO

Art. 113. Aplica-se a medida de destituição de cargo partidário ao filiado que:

I. Faltar com a exação no cumprimento dos deveres pertinentes às funções partidárias;

II. Deixar injustificadamente de comparecer a 3 (três) reuniões consecutivas do órgão partidário a que pertencer;

III. Conduzir o partido contrariamente aos dispositivos estatutários e programáticos;

IV. Sofrer medida de suspensão ou expulsão com cancelamento da filiação.

SEÇÃO V - DO DESLIGAMENTO TEMPORÁRIO DA BANCADA

Art. 114. Ao parlamentar, aplica-se o desligamento temporário da bancada conjuntamente com a medida de suspensão e pelo tempo que perdurar esta sanção disciplinar.

Parágrafo único - O desligamento temporário da bancada não isenta o parlamentar do cumprimento de seus deveres estatutários.

(…)

Art. 122. O processo disciplinar se desenvolve nas seguintes fases:

I. Instauração, por meio de resolução da comissão executiva;

II. Inquérito partidário, compreendendo instrução, defesa e relatório;

III. Julgamento.

§ 1º Instaurado o processo disciplinar, o acusado será notificado para, querendo, acompanhá-lo e respondê-lo em todos os seus termos.

§ 2º Como medida cautelar e a fim de que o acusado não venha a influir na apuração da irregularidade, a comissão executiva poderá determinar o afastamento do acusado do exercício de cargo partidário, pelo prazo que durar o processo, considerando, inclusive, o período da fase recursal.

(…)

Art. 134. Verificada a existência de vício insanável, decorrentes de atos tendenciosos, a comissão executiva declarará a nulidade total ou parcial do processo e nomeará uma Comissão de Ética Provisória, com o fim especial de instaurar novo processo.

A corroborar o entendimento pela ausência de competência da Presidente do partido para firmar individualmente a carta de filiação, destaco a previsão estatutária no sentido de que é da exclusiva competência colegiada das comissões executivas toda matéria não incluída na competência privativa de seus respectivos membros (art. 58, parágrafo único):

Art. 58. As comissões executivas organizar-se-ão de modo a exercer efetiva administração colegiada, podendo baixar resoluções para cumprimento de suas atribuições.

Parágrafo único - É da exclusiva competência colegiada das comissões executivas toda matéria não incluída na competência privativa de seus respectivos membros.

Da análise conjunta e sistêmica das disposições previstas no Estatuto do PTB, considero que a Presidente Nacional pode praticar atos ordinários e gerais de gestão, os quais não compreendem as questões afetas à filiação, para as quais o normativo vincula a atuação dos órgãos colegiados, comissão executiva ou de ética.

Concluo, desse modo, que o Estatuto do PTB não conferia à Sra. Graciela Nienov, na condição de Presidente Nacional, poderes para autorizar a desfiliação do requerente sem perda do mandato eletivo.

Sobreleva notar que, após o partido contestar a ação e produzir prova oral alegando a ausência de validade da carta de anuência, o parlamentar não se manifestou no feito, deixando de apresentar alegações finais.

Desse modo, neste caso específico, a mera carta de anuência subscrita pela Presidente Nacional da legenda não se afigura suficiente para justificar a desfiliação sem perda o cargo eletivo.

No caso em tela, em que duas esferas partidárias, mais próximas ao mandato de vereador, comparecem nos autos e contestam os fatos narrados na inicial, refutando a validade da dita declaração, insurgindo-se contra o desligamento do mandatário com manutenção do mandato, e no qual o parlamentar sequer se manifesta para se contrapor aos argumentos da defesa, não há como se entender atendida a hipótese de justa causa prevista no § 6o, ao art. 17, da Constituição Federal.

b) A direção nacional do PTB é contra os métodos de distanciamento social, promovendo aglomerações, e negando a existência da pandemia.

Quanto a este fundamento, tem-se que o requerente não se desincumbiu do ônus de demonstrar que a posição do PTB quanto às medidas de distanciamento social verificadas no momento do ajuizamento da ação, janeiro de 2022, diferem das adotadas pela agremiação no ano de 2020, quando a crise sanitária se iniciou e o parlamentar buscava a sua eleição como vereador pelo PTB, postulando registro de candidatura e realizando a campanha eleitoral.

A insurgência do parlamentar quanto ao fato de o então Presidente do Diretório Nacional do PTB, Roberto Jefferson, ter promovido ou participado aglomerações, não se mostra suficiente para legitimar a saída do partido sem perda do mandato, porque no curso do ano de 2020, durante a campanha eleitoral em que buscava ser eleito pelo PTB, a sigla já externava posição contrária às medidas sanitárias de combate à pandemia.

É fato público e notório, inclusive divulgado em 22.10.2020 pelo partido em seu site de internet, antes da eleição do requerente como vereador pelo PTB, que a legenda ingressou com ação no STF para impedir vacinação obrigatória da população (notícia divulgada em: https://ptb.org.br/ptb-ingressa-com-acao-no-stf-para-impedir-vacinacao-obrigatoria/).

Com efeito, em outubro de 2020, o Partido Trabalhista Brasileiro tomou posição, por meio da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6587, contra a obrigatoriedade da vacina.

Ressalto que, segundo o art. 374, inc. I, do CPC, não dependem de prova os fatos notórios, isto é, aqueles perceptíveis por qualquer homem médio e disponíveis mediante ampla divulgação. Além disso, o art. 375 do CPC estabelece que o juiz aplicará as regras de experiência comum subministradas pela observação do que ordinariamente acontece, enquanto o art. 23 da LC n. 64/1990 prevê, para as ações de investigação judicial eleitoral, que o Tribunal formará sua convicção pela livre apreciação dos fatos públicos e notórios, dos indícios e presunções e prova produzida, atentando para circunstâncias ou fatos, ainda que não indicados ou alegados pelas partes, mas que preservem o interesse público de lisura eleitoral:

Código de Processo Civil:

Art. 374. Não dependem de prova os fatos:

 

I - notórios;

(…)

Art. 375. O juiz aplicará as regras de experiência comum subministradas pela observação do que ordinariamente acontece e, ainda, as regras de experiência técnica, ressalvado, quanto a estas, o exame pericial.

Lei Complementar n. 64/1990

Art. 23. O Tribunal formará sua convicção pela livre apreciação dos fatos públicos e notórios, dos indícios e presunções e prova produzida, atentando para circunstâncias ou fatos, ainda que não indicados ou alegados pelas partes, mas que preservem o interesse público de lisura eleitoral.

 

Realmente, há notícias que não se caracterizam como inéditas porque já foram divulgadas pela imprensa em geral, que refutam a tese de surpresa ou nas ações invocadas pelo autor que fundamentariam a justa causa para a desfiliação.

Nesse sentido, tem-se que, em 22.4.2020, o Jornal El País divulgou manchete “Bolsonaro recorre a condenados no mensalão e réus na Lava Jato para romper isolamento político e pressionar Maia”, noticiando jantar para celebrar acordos políticos no qual Roberto Jefferson, então Presidente do PTB, se fez presente. A matéria aponta que “Oficialmente, Bolsonaro pediu integração dos partidos para superar as crises sanitária e econômica da covid-19” (https://brasil.elpais.com/brasil/2020-04-23/bolsonaro-recorre-a-condenados-no-mensalao-e-reus-na-lava-jato-para-romper-isolamento-politico-e-pressionar-maia.html).

Portanto, não se mostra razoável que durante a campanha e a prática de atos contrários a medidas de orientação sanitária afetos à pandemia o requerente tenha se mantido filiado ao partido, alcançando um mandato eletivo enquanto vigentes os posicionamentos da legenda sobre a pandemia, e após mais de 1 ano e 3 meses da sua eleição, busque a saída do partido sem perda do cargo de vereador.

Assim, tendo em conta que o vereador não demonstrou ter sido surpreendido com uma alteração da posição adotada pelo partido quanto à pandemia no momento posterior à sua eleição, não se mostra razoável a procedência do pedido neste ponto.

 

c) Guinada do PTB à extrema direita.

No que se refere à alegação de que o então Presidente do Diretório Nacional do PTB, Roberto Jefferson, utiliza-se de estratégias para “bolsonarizar” o partido, é preciso ter presente que a sigla, desde a campanha de segundo turno das eleições de 2018, ou seja, desde antes da eleição do autor como vereador, se posicionou como apoiadora da campanha do Presidente da República Jair Messias Bolsonaro.

Faço aqui um registro de que expressões como “bolsonarizar” e “extrema direita” ou outras que denotam ideologias são de autoria do recorrente e também empregadas pela mídia eis que, por óbvio, este magistrado examina com a absoluta imparcialidade e equidistância de qualquer debate de caráter subjetivo, ideológico, seja de que matiz for.

Pois bem.

A matéria do G1 divulgada em 9.10.2018 refere: “Partido de Roberto Jefferson, PTB anuncia apoio a Jair Bolsonaro. Anúncio foi feito na tarde desta terça. Segundo o partido, projeto de Bolsonaro visa um país 'eficiente e competitivo'. Além disso, PTB diz que candidato trabalhará pela 'pacificação' do Brasil” (https://g1.globo.com/politica/eleicoes/2018/noticia/2018/10/09/partido-de-roberto-jefferson-ptb-anuncia-apoio-a-jair-bolsonaro.ghtml).

O requerente ajuizou a ação somente em 27.1.2022, cerca de 1 ano e 3 meses após sua eleição como vereador do PTB, ocorrida em 15.11.2020, verificando-se também pela consulta a fatos públicos e notórios, disponíveis a acesso de toda a população, que em 2018 e ao longo do ano de 2020 e durante a campanha, antes da eleição, o PTB externou amplo apoio à atuação política do Presidente da República Jair Bolsonaro.

Em notícia de 20.4.2020, o Jornal Metrópolis divulgou a manchete “Bolsonaristas justificam aliança com mensaleiro Roberto Jefferson”, afirmando “Para militantes do presidente, apenas alguém que conhece as entranhas da corrupção política, como o presidente do PTB, pode desmascará-las” (https://www.metropoles.com/brasil/politica-brasil/bolsonaristas-justificam-alianca-com-mensaleiro-roberto-jefferson).

Em 21.4.2020, o Jornal Correio Braziliense publicou matéria intitulada “'Para derrubar Bolsonaro, só se for a bala'', afirma Roberto Jefferson” (https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/politica/2020/04/21/interna_politica,846756/para-derrubar-bolsonaro-so-se-for-a-bala-afirma-roberto-jefferson.shtml).

O Jornal Nexo, em manchete publicada em 13.5.2020, informa: “A trajetória de Roberto Jefferson, o novo aliado de Bolsonaro” (https://www.nexojornal.com.br/expresso/2020/05/13/A-trajet%C3%B3ria-de-Roberto-Jefferson-o-novo-aliado-de-Bolsonaro).

Em 31.5.2020, o site UOL publicou notícia “Ato contra STF e pró-intervenção tem Bolsonaro com criança e uso de cavalo”, narrando que “A ex-deputada federal Cristiane Brasil, filha do presidente nacional do PTB, Roberto Jefferson, foi outra a participar das manifestações. Jefferson é o mais novo aliado de Bolsonaro, após movimento do Palácio do Planalto para se aproximar do bloco de partidos do Centrão, do qual o PTB faz parte, na tentativa de construir uma base aliada ao presidente da República” (https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2020/05/31/protestos-brasilia-31-de-maio.htm).

Em notícia de 30.9.2020, o site Congresso em Foco divulgou a matéria “Exclusivo: os 12 partidos que formam a base fiel do governo na Câmara”, narrando que dos 24 partidos com representação na Câmara dos Deputados, 12 são aliados fiéis de Jair Bolsonaro, e que “Estão neste grupo: PSL, Patriota, DEM, PSC, Novo, PSDB, MDB, PP, Republicanos, PL, PSD e PTB” (https://congressoemfoco.uol.com.br/area/governo/exclusivo-os-12-partidos-que-formam-a-base-fiel-do-governo-na-camara/).

Assim, a narrativa de que o PTB está alinhado ao atual Presidente da República não tem força suficiente para conduzir à procedência do pedido, pois já em 2018 e no decorrer do ano de 2020, antes da eleição do requerente como vereador, tal circunstância era de seu conhecimento, inclusive de conhecimento público e notório com extensa divulgação midiática.

Noutro giro, a mera alegação de que Roberto Jefferson estava lançando ‘indiretas’ sobre posicionamentos políticos e de gestão do órgão do partido no Rio Grande do Sul, não justifica a grave consequência de permitir a desfiliação por justa causa, dada a falta de esclarecimento sobre a relevância de indiretas, as quais sequer foram especificadas, no cenário encartado nos autos.

O outro fundamento do pedido é e que Roberto Jefferson interferiu na gestão dos diretórios municipais do PTB em São Paulo e na Bahia, causando a desfiliação de dirigentes partidários.

Contudo, esse descontentamento também não se mostra grave o bastante para a procedência da ação, pois a situação narrada também é anterior à eleição do autor como vereador pelo PTB em 2020.

A matéria jornalística do Jornal Gazeta do Povo, referida na inicial, afirma “Em 2020, ao intervir nos diretórios municipais e anular convenções partidárias nas eleições municipais, Jefferson levou os ex-deputados federais Benito Gama (BA) e Alex Canziani (PR), o ex-senador Armando Monteiro (PE) e o deputado estadual Campos Machado (SP) a deixarem o partido” (https://www.gazetadopovo.com.br/republica/roberto-jefferson-ptb-bolsonarismo-bolsonaro/).

Veja-se que em 17.9.2020, antes do período dos registros de candidatura e do início da campanha para os cargos de prefeito e vereador, o PTB anunciou a edição de Resolução anulando convenções que descumpriram diretrizes da Executiva Nacional sobre coligações (https://ptb.org.br/resolucao-do-ptb-anula-convencoes-municipais-que-descumpriram-diretrizes-da-executiva-nacional-sobre-coligacoes/).

Em 28.9.2020, também antes do início da campanha para vereador, o Jornal Correio Braziliense publicou notícia informando que Roberto Jefferson promoveu uma intervenção nos diretórios municipais e anulou as convenções partidárias nas cidades onde a sigla apoiaria candidatos de outros partidos, que fazem oposição ao Palácio do Planalto, ocasião em que destituiu o diretório do PTB em São Paulo (https://www.correiobraziliense.com.br/politica/2020/09/4878611-roberto-jefferson-destitui-diretorio-do-ptb-em-sao-paulo.html).

A Revista Istoé de 28.9.2020 divulgou que “Roberto Jefferson destitui diretório do PTB em São Paulo” após o ex-deputado ter promovido, em 17.9.2020, uma “intervenção nos diretórios municipais e anulado as convenções partidárias nas cidades onde a sigla apoiaria candidatos de outros partidos, que fazem oposição ao Palácio do Planalto. Foram registrados casos em São Bernardo do Campo, Osasco e Presidente Prudente, em São Paulo, Salvador (BA) e Fortaleza (CE)” (https://istoe.com.br/roberto-jefferson-destitui-diretorio-do-ptb-em-sao-paulo/).

E mesmo com as intervenções nos diretórios municipais o autor decidiu permanecer no partido, fazendo campanha pelo PTB até alcançar a sua eleição, e após o início do exercício do mandato, em nenhum momento demonstrou concretamente ter tido prejuízos para atuar como vereador.

Assim, considerando que o requerente não aponta nenhum ato pessoal de discriminação e permaneceu na campanha concorrendo pelo partido mesmo após os fatos invocados na inicial, ocorridos antes da sua eleição como vereador, não vejo como entender que tais posições do diretório nacional sirvam de justa causa para a manutenção do mandato por desfiliação, uma vez que esta foi pleiteada somente em agosto de 2021.

 

d) Prisão do então presidente do partido, Roberto Jefferson, por afronta ao Estado Democrático de Direito, publicação de pedido de intervenção militar, ataque a integrantes de instituições públicas, descrédito do processo eleitoral brasileiro e dos Poderes da República, e oposição à utilização de cannabis medicinal para o tratamento de doenças.

O requerente insurge-se contra a postura do então Presidente Nacional do PTB, Roberto Jefferson, o qual teve a prisão preventiva decretada pelo STF em 12.08.2021, em razão da divulgação de ações antidemocráticas, mediante questionamento sistemático do processo eleitoral e tentativas de intimidação das autoridades públicas investidas nas funções de resguardo da Constituição e de promoção das eleições.

Nesse ponto, ressalto que este Tribunal já assentou o entendimento de que o envolvimento de filiados de determinada agremiação em ações penais e processos envolvendo casos de corrupção, ainda que praticados por dirigentes partidários, não caracteriza desvio reiterado do programa partidário:

Ação de decretação de perda de cargo eletivo por desfiliação partidária. Vereador. Resolução TSE n. 22.610/07. Pretensão da agremiação peticionante de reaver o cargo de vereador que se desligou da sua legenda para filiar-se a partido diverso. Tese defensiva alegando o desvio ou a mudança substancial do programa partidário.

O fato de filiados de determinada agremiação estarem envolvidos no cometimento de crimes e casos de corrupção, ainda que operados por figuras proeminentes da legenda, não configura desvio reiterado do programa partidário. Para tanto, necessário que o estatuto sofra alterações substanciais em seu programa e sua ideologia. Justa causa não vislumbrada. Corolário é a decretação da perda do mandato eletivo. Procedência do pedido.

(TRE-RS, PET n. 17311, Acórdão de 15.3.2016, Relatora Dra. Maria de Lourdes Galvão Braccini de Gonzalez, DEJERS 17.3.2016) Grifei.

 

Além disso, as atitudes impugnadas, encampadas por Roberto Jefferson, não iniciaram em 2021, tendo sido divulgadas muito antes da campanha eleitoral de 2020 na qual o requerente foi eleito vereador pelo PTB.

Sobre esse argumento, anoto que este Tribunal entendeu, em situação análoga, nos autos do processo PET n. 0603532-12, que: “O alegado desconforto com relação aos casos de corrupção e escândalos revelados pela ‘Operação Lava Jato’”, associados a filiados e figuras proeminentes da legenda da qual migrou, não caracteriza o desvio reiterado do programa partidário” (TRE-RS, PET n. 0603532-12.2018.6.21.0000, Rel. Des. El. Gustavo Alberto Gastal Diefenthaler, Publicado no PJE em 19.8.2019).

O acórdão do processo PET n. 0603532-12 foi confirmado pelo TSE, que assentou: “Os escândalos de corrupção em que se envolveu a legenda no plano nacional, considerados de forma objetiva, não podem representar contexto que assegure, por si só, a imediata desfiliação de um mandatário” (TSE, AI n. 0603532-12.2018.6.21.0000, Rel. Min. Sergio Silveira Banhos, DJE 05/08/2020).

Noutro norte, a mera oposição ao uso de cannabis medicinal para o tratamento de doenças não dá causa suficiente para a desfiliação do partido sem perda do mandato.

O TSE já assentou que “a alteração de posicionamento do partido em relação à matéria polêmica dentro da própria agremiação não constitui, isoladamente, justa causa para desfiliação partidária” (TSE, PET n. 3019, Ac. de 25.8.2010, Relator Min. Aldir Passarinho).

Também importa acrescentar que o TSE entende que o pedido de desfiliação por desvio reiterado do programa partidário e demais hipóteses previstas no ar. 22-A da Lei n. 9.096/95 somente é procedente quando ocorre dentro de prazo razoável, o que não se verifica nos autos:

[ ... ] 3. Não se justifica a desfiliação de titular de cargo eletivo quando decorrido lapso temporal considerável entre esse fato e a alteração estatutária que teria motivado sua saída, em virtude da produção de efeitos jurídios pelo decurso do tempo. [...]

(AgR-RO 51783-12/PI, Rel.\IVJ/n. Marcelo Ribeiro, DJE de 11.2.201 1) (Sem destaque no original.)

 

[ ... ] 2. Para o reconhecimento das hipóteses previstas na Res.-TSE 22.61 012006, deve haver prazo razoável entre o fato e o pedido de reconhecimento da justa causa. [ ... ]

(AgR-AC 1984-641SP, Rei. Mm. Arnaldo Versiani, DJEde 3.11.2010) (Sem destaque no original.)

 

[ ... ] 1. Para o reconhecimento das hipóteses previstas na Resolução 22.610/2006-TSE deve haver um prazo razoável entre o fato e o pedido de reconhecimento da justa causa.

2. Fusão partidária ocorrida há mais de dez meses do pedido de declaração de justa causa impossibilita seu deferimento por não configurar prazo razoável. [ ... ]

(RO 2.352/BA, Rei. Mm. Ricardo Lewandowski, DJEde 18.11.2009) (sem destaque no original)

 

Na hipótese em apreço, o requerente permaneceu no partido, logrando eleição, permaneceu no exercício do mandato apesar da postura do então presidente nacional, não sendo razoável compreender que somente em janeiro de 2022 e após a eleição, houve uma surpresa, uma guinada de pensamento que, por ser inédita, justifique a desfiliação.

O transcurso de longo período entre os fatos narrados comprova também que os pensamentos externados não trouxeram maiores transtornos para a convivência intrapartidária durante esse período considerável de tempo.

Por essas razões, de todo o panorama que gira em torno das alegações da inicial e do que se observa do exame de fatos públicos, de notória divulgação nos meios de comunicação, não me parece razoável ou proporcional que o autor tenha obtido o mandato filiado a um partido que a todo o momento apresentou de forma clara a sua posição ideológica e política, e que, 9 meses após as eleições, se desfilie levando consigo o cargo eletivo alcançado sob uma égide partidária há muito estabelecida e externada.

 

e) Ameaça à liberdade para o exercício do mandato eletivo, tal como ocorrido com o vereador do Município de Curitiba/PR, Pierpaolo Petruzziello, que foi ameaçado de expulsão por parte de Roberto Jefferson;

Ao contrário do que o requerente referiu quanto ao vereador de Curitiba/PR Pierpaolo Petruzziello, ameaçado de expulsão do PTB por Roberto Jefferson por relatar projeto favorável a lockdown durante a pandemia, o autor não aponta qualquer ato pessoal de grave discriminação política pessoal quanto a si ou contra o exercício do seu mandato, até porque não se sabe que outros motivos, até de ordem pessoal, poderiam existir em relação ao então presidente do partido e aquele vereador paranaense.

O mero receio de se ver atacado pela direção partidária nacional não se afigura bastante para a procedência do pedido de desfiliação sem perda do cargo.

Verifiquei, quanto ao caso do Vereador Pierpaolo Petruzziello invocado pelo autor, que o TSE, ao decidir pela possibilidade de Pierpaolo se desligar do partido sem perda do mandato, foi expresso ao consignar que “a pessoalidade da discriminação está clara nos autos, já que é citado expressamente o nome do requerente. Veja-se que não se trata de meros aborrecimentos, frustrações em projetos pessoais, mas de insatisfação pública do presidente do partido quanto à atuação do vereador. E mais: com ameaça de expulsão” (AgREspE 0600020-54.2021.6.16.0000, Rel. Min. Carlos Horbach, DJE 17. 12. 2021).

Portanto, a situação dos autos difere do caso invocado pelo requerente para fundamentar seu pedido de desfiliação por justa causa.

Para a caracterização da justa causa, deveria ter sido demonstrada uma situação objetiva de discriminação.

Como já decidido pelo TSE “a hipótese de discriminação pessoal que caracteriza justa causa para desfiliação exige a demonstração de fatos certos e determinados que tenham o condão de afastar o mandatário do convívio da agremiação ou revelem situações claras de desprestígio ou perseguição”.

Ação de perda de cargo eletivo. Deputado estadual. Desfiliação partidária. (…) 5. A hipótese de discriminação pessoal que caracteriza justa causa para desfiliação exige a demonstração de fatos certos e determinados que tenham o condão de afastar o mandatário do convívio da agremiação ou revelem situações claras de desprestígio ou perseguição. 6. Fatos posteriores à desfiliação não podem ser invocados como motivo justificador do desligamento, pois óbvio que o motivo não pode ser posterior à consequência. 7. Eventual dificuldade ou resistência da agremiação em lançar o ocupante do cargo como candidato em eleições futuras não é fato suficiente para a aferição de grave discriminação pessoal. 8. A hipótese de mudança substancial do programa partidário, prevista na alínea d do art. 1º da Res.-TSE 22.610/2007, diz respeito, como a própria definição estabelece, à alteração do programa partidário, que, por definição constitucional, tem caráter nacional (CF, art. 17, I). Para a caracterização da hipótese, é necessário que se demonstre o desvio reiterado de diretriz nacional ou de postura que a legenda historicamente tenha adotado sobre tema de natureza político-social relevante. O mero rumor ou discussão sobre a possibilidade futura de alinhamento político com partido de oposição não constitui mudança substancial de diretriz partidária. 9. Eventuais discordâncias locais sobre o posicionamento da agremiação diante da administração de um único município não caracterizam desvirtuamento do programa ou da diretriz partidária, os quais, dada a natureza e circunscrição do cargo em questão, deveriam ter, no mínimo, caráter estadual. Recursos ordinários desprovidos. Ação cautelar improcedente, com revogação da liminar concedida, e respectivo agravo regimental julgado prejudicado.

(Ação Cautelar n. 18578, Acórdão de 13.3.2014, Relator Min. Henrique Neves da Silva, DJE 31.3.2014) Grifei

 

Além disso, conforme julgado acima referido, “Eventual dificuldade ou resistência da agremiação em lançar o ocupante do cargo como candidato em eleições futuras não é fato suficiente para a aferição de grave discriminação pessoal”.

Portanto, o pedido não procede quanto à alegação de ameaça à liberdade para o exercício do mandato eletivo.

 

f) Alteração substancial das diretrizes partidárias, pois concorreu como vereador na vigência do estatuto de 2016, mas em 18.11.2020, após sua eleição, o Presidente Nacional “alterou cores, símbolos e pôs abaixo o que fora solidificado por décadas”, modificando princípios, a temática de simpósios e das vice-presidências exclusivas.

Nesse último ponto, a primeira questão a ser analisada diz com a alegação do PTB de que o estatuto e o programa partidário de 2016 está revogado desde 2018.

A afirmativa do PTB é verdadeira, e o autor sequer se manifestou ou refutou esse argumento.

A ação se fundamenta na mudança substancial entre o estatuto e programa partidário de 2016 e o de 2020, desconsiderando as alterações promovidas em 2018, que sequer foram indicadas na inicial.

Além disso, o partido alega que as mudanças ocorridas em 2020 já constavam do estatuto de 2018, e a Procuradoria Regional Eleitoral confirmou a alegação:

Cotejados os dispositivos listados na inicial, o que se observa é que, com exceção da alteração ocorrida no inciso XI do art. 3º, referente à exclusão do princípio da “humanização dos processos de automação”, e da inclusão dos termos “conservadora e liberal” no inciso III do art. 84, todas as alterações mencionadas pelo autor já estavam em vigor no estatuto partidário aprovado em 2018. E ao contrário do por ele afirmado, o debate previsto no art. 84, III do estatuto não era amplo e irrestrito, mas limitado à temática trabalhista.

É possível observar, ademais, que o programa partidário instituído no ano de 2018 já previa todas as políticas que o autor alega terem sido inseridas em 2020, como, por exemplo: privatização, limitação do estado na oferta de saúde e educação gratuita, além de exploração racional do meio ambiente.

 

Também aqui, conforme concluiu o Parquet, dever ser considerado que o autor se candidatou ao cargo de Vereador em 2020, quando já estava vigente o estatuto de 2018, contendo em considerável medida, as alterações objeto de seu inconformismo.

Nesse sentido, acompanho o raciocínio ministerial de que “Ainda que se reconheça a modificação no princípio atinente à preocupação com os processos de automação da produção e no conteúdo de simpósios e ciclos de estudos, trata-se de alterações pontuais, alinhadas com as ocorridas em 2018 e insuficientes, por isso, para caracterização de justa causa”.

Não é cabível, desse modo, sustentar que houve uma alteração substancial nas diretrizes do PTB em 2020, no curso do mandato eletivo, seja porque o estatuto de 2016, que fundamenta o pedido, estava revogado, seja porque o estatuto de 2018, que deveria ter sido tomado como paradigma e foi desconsiderado pela inicial, já previa a maioria das alterações impugnadas.

Com essas considerações, diante do caso concreto, não verifico, do exame dos autos, as hipóteses previstas no art. 22-A da Lei n. 9.096/95 para a declaração de justa causa a amparar a desfiliação.

 

Uma vez não comprovadas as premissas que autorizam a desfiliação sem perda do mandato, o juízo de improcedência do pedido é medida impositiva.

 

Ante o exposto, afasto a matéria preliminar e VOTO pela improcedência do pedido.