RecCrimEleit - 0000017-36.2019.6.21.0112 - Voto Relator(a) - Sessão: 01/09/2022 às 16:00

VOTO

Senhor Presidente,

Eminentes Colegas:

 

1. Tempestividade

O recurso é tempestivo (intimação pessoal em 05.02.2021 – ID 44929226, fl. 20; interposição do recurso em 08.02.2021 – ID 44929224, fl. 11), visto que ofertado dentro do prazo de 10 dias previsto no art. 362 do Código Eleitoral, estando preenchidos os demais requisitos de admissibilidade, razão pela qual dele conheço.

 

2. Preliminares

2.1. Falta de justa causa e nulidade processual

Em irresignação, o candidato atribui, em tese vertida desde a sua primeira defesa, a autoria da divulgação do fato - injúria - ao Jornal Cidade Online, o qual teria retirado o conteúdo, ocorrido em conversa do recorrente com poucos amigos em página no Facebook, chamada Movimento do povo Brasileiro, e o publicizado, dando visibilidade, a partir daí, do diálogo ao público em geral.

O autor, no entender do réu, não imputou, de maneira precisa, a culpa da conduta ao recorrente, no mesmo sentido, não municiou a demanda com provas técnicas suficientes a atestar a prática a ele imposta, prejudicando, diante da generalidade dos fatos descritos, sua defesa, de sorte que o argumento de falta de justa causa para o prosseguimento do feito deve ser acatado e a nulidade do processo declarada.

Ocorre que os requisitos para a justa causa estão presentes, visto que o conjunto de elementos probatórios razoáveis sobre a existência do crime e a autoria constam dos autos e a sentença, de forma fundamentada e exauriente, cita os documentos aptos a ilustrar o ilícito bem como sua responsabilidade incontroversa.

No mesmo norte, a exposição da conduta pelo Parquet mostra-se adequada e suficiente, contemplando todas as circunstâncias essenciais à persecução penal, em atendimento ao art. 41 do CPP.

Nessa toada, presentes subsídios mínimos a lastrear a denúncia, não há amparo para o argumento de ausência de justa causa.

A corroborar o entendimento aqui expendido, segue doutrina de Afrânio Silva Jardim (Direito processual penal, 11.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 147-148):

É preciso deixar claro que a justa causa pressupõe um mínimo de lastro probatório, mas não prova cabal. É necessário que haja alguma prova, ainda que leve. Agora, se esta prova é boa ou ruim, isto já é questão pertinente ao exame do mérito da pretensão do autor, até porque as investigações policiais não se destinam a convencer o juiz, tendo em vista o sistema acusatório e garantia constitucional do contraditório, mas apenas viabiliza a ação penal.

 

Desta feita, rejeito as preliminares de falta de justa causa e nulidade do processo.

 

3. Mérito

3.1. Prejudicial de prescrição retroativa da pretensão punitiva

O recorrente assevera a ocorrência da prescrição retroativa da prestação punitiva, na medida em que entre a consumação do crime e o recebimento da denúncia ou sentença foi ultrapassado o período definido como pena máxima (6 meses) para o ilícito de injúria disposto no art. 326 do CE.

Defende o réu que a única pena aplicada foi de 40 dias-multa em sentença proferida em 18.10.2020, ao passo que a denúncia se deu em 30.7.2019 e o fato que originou a demanda ocorreu em 23.4.2018, ultrapassados, assim, os 6 meses constantes do tipo e alcançada a prescrição definida no art. 114, inc. II, do CP.

Por seu turno, a Procuradoria Regional Eleitoral, em parecer, indica que não se operou a prescrição retroativa, ao argumento de que para sua ocorrência deve haver sentença condenatória irrecorrível para a acusação. O marco inicial, considerando a ciência pelo MP da decisão, se verificou em 20.11.2020 (ID 44919224, p. 5), data que deveria ser utilizada como base, diante da conformação do Parquet com o julgado. A magistrada impôs ao réu somente pena de multa, devendo, na forma do art. 114, inc, I, prescrever em 2 anos, lapso não transcorrido entre o recebimento da denúncia e a publicação do juízo exarado na origem.

Passo à análise.

O crime de injúria, na seara eleitoral, encontra previsão no art. 326 do CE e tem como pena até 6 meses de detenção ou de 30 a 60 dias-multa:

Art. 326

Injuriar alguém, na propaganda eleitoral, ou visando a fins de propaganda, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro:

Pena - detenção até seis meses, ou pagamento de 30 a 60 dias-multa. (Grifei.)

 

O dispositivo sentencial seguiu assim grafado:

Isso posto, julgo procedente a pretensão punitiva para condenar Naor da Silva Severo nas sanções do art. 326 c/c art. 327, inc. III, ambos do Código Eleitoral. Passo à aplicação da pena.

Circunstâncias judiciais: o réu não registra antecedentes; a conduta social e a personalidade mostram-se ajustadas, não havendo nenhum desvio apto a desvalorar o réu; as circunstâncias não lhe desfavorecem, pois não ultrapassaram às inerentes ao tipo penal; consequências são normais ao tipo penal; o comportamento da vítima em nada contribuiu para o delito; a culpabilidade do réu não é acentuada; e os motivos são normais à espécie.

Diante da possibilidade legal de opção pelo tipo penal de restrição estatal aplicável, opta-se pela aplicação da pena pecuniária em detrimento da pena restritiva de liberdade, mais benéfica ao réu, restando fixada a pena pecuniária em 30 dias-multa, considerando as circunstâncias judiciais.

Nos termos do art. 327, inc. III, do Código Eleitoral, aumento a pena em um terço, restando a pena total de 40 dias-multa, na base de 1/30 do salário mínimo vigente ao tempo do fato, considerando a condição econômica do réu. (Grifei.)

 

A sanção aplicada ao caso concreto, pena pecuniária, se deu em alternativa à restritiva de liberdade. Tal possibilidade de escolha, conforme entendimento do julgador, entre a privação de liberdade e multa, disposta no art. 326 CE, no que toca à prescrição da multa, encontra seus contornos no art. 114, inc. II, CP:

Art. 114 - A prescrição da pena de multa ocorrerá: (Redação dada pela Lei nº 9.268, de 1º.4.1996)

I - em 2 (dois) anos, quando a multa for a única cominada ou aplicada; (Incluído pela Lei nº 9.268, de 1º.4.1996)

II - no mesmo prazo estabelecido para prescrição da pena privativa de liberdade, quando a multa for alternativa ou cumulativamente cominada ou cumulativamente aplicada. (Incluído pela Lei nº 9.268, de 1º.4.1996) (Grifei.)

 

O apelo advoga no sentido desta adequação (art. 114, inc. II, do CP), contudo defende a ocorrência da prescrição no ínterim de 6 meses, prazo máximo da pena estabelecida para o crime de injúria no CE.

Com efeito, a moldura do ilícito mostra-se compatível com o referido inc. II, entretanto, da leitura não se depreende que a extinção da punibilidade terá como prazo o período definido para pena privativa de liberdade, mas sim o prazo estabelecido para sua prescrição, esse disposto no art. 109, inc. VI, do CP e verificado em 3 anos, porquanto estipulada em até 6 meses a punição para o delito objeto da lide.

Dito isto, temos que entre a data do fato ocorrido (23.4.2018), a denúncia (30.7.2019) e a sentença (18.10.2020) não transcorreu o lapso prescricional definido pela norma, calhando frisar que, nos termos do art. 117 do CPB, interrompe-se a prescrição com o recebimento da denúncia.

Destarte, ainda que por fundamento diverso ao emitido pela Procuradoria Regional Eleitoral, afasto a prejudicial de mérito de prescrição retroativa da pretensão punitiva.

 

3.2. Da Injúria

 

O Ministério Público na origem ingressou com ação penal em virtude da ocorrência de episódio de injúria contra Paulo Roberto Severo Pimento, via site do Jornal da Cidade Online, e que restou replicada na página do Movimento do Povo Brasileiro no Facebook.

Na esfera da Justiça Eleitoral, o crime de injúria esta definido, como dito alhures, no art. 326 do Código Eleitoral.

A norma penal eleitoral, assim como na injúria simples, busca resguardar a chamada honra subjetiva do indivíduo, ou seja, a dignidade pessoal (respeitabilidade ou amor-próprio) ou o decoro (correção moral ou compostura) de alguém. Aqui, o insulto atinge o conceito que a vítima possui de si mesma (Nucci, Guilherme de Souza, Código Penal Comentado, Ed. Revista dos Tribunais, 8ª edição, p. 654).

O réu, em apelo, suscita a existência de dúvida quanto à autoria e à culpabilidade diante da fragilidade das provas colacionadas, de forma a autorizar, em aplicação do princípio in dubio pro reo, o juízo de absolvição.

Ocorre que, em nenhum momento da irresignação, o recorrente nega a autoria do crime, de modo que resta demonstrada, indubitavelmente, a sua execução pelo réu.

No que atina à materialidade, da mesma forma, está encartada nos registros de postagens, os quais trabalham contra o recorrente, ao indicar, modo estreme de dúvidas, os comentários ofensivos e de caráter eleitoral em desabono da vítima, Paulo Roberto Severo Pimenta, Deputado Federal (ID 44929193 e 44929193).

Consigno que, não obstante a tese recursal vá no sentido de que a divulgação das mordazes críticas, atribuídas ao réu, tenha sido empreendida pelo Jornal da Cidade Online e reproduzida, de forma a dar maior publicidade, na página no Facebook do Movimento do Povo Brasileiro, o que está sob análise é a autoria do crime e não a sua difusão na internet.

A realidade, alicerçada no acervo carreado ao feito, é diametralmente oposta à hipótese vertida no recurso, na medida em que as ponderações redigidas pelo réu se encontram em site de acesso público, sem qualquer restrição de visualização, podendo ser observadas por qualquer pessoa na internet, e não em conversa com amigos, a qual, devido à índole restrita desse tipo de diálogo, seria fechada aos demais.

Quanto ao ponto, calha frisar trecho da sentença:

Nestes autos o objeto é a apuração da ocorrência de injúria eleitoral, a qual após proferida em meio de comunicação eletrônica foi publicizada pelos meios de comunicação informados pelo réu. Ou seja, a divulgação da injúria do réu pelos meios informativos/jornalísticos é o efeito da sua conduta em consideração com o meio que escolheu para materializá-la

Desta feita, inviável a imputação a terceiros pelo ilícito dolosamente praticado pelo réu.

O conteúdo ácido da redação, proferido por familiar da vítima, direcionado a parlamentar visando à reeleição para a Câmara dos Deputados, ainda que oriundo de parente do ofendido, não descaracteriza o crime de injúria, nos termos do parecer ofertado pela Procuradoria Regional Eleitoral, o qual salienta que “eventual parentesco não configura excludente da tipicidade, ilicitude ou culpabilidade, não se prestando, pois, para afastar o juízo condenatório pela prática do delito imputado ao recorrente”.

Portanto, o conjunto probatório colhido leva à conclusão, inquestionável, de que a conduta do réu é típica, consubstancia injúria, pois teve o condão de ofender a dignidade e o decoro da vítima.

A título de desfecho, caracterizada a figura da injúria eleitoral, prevista no art. 326 do CE, no que se refere à pena, a qual foi aumentada na forma do inc. III do art. 327 do CE, tenho que a veiculação das ofensas mediante utilização de site de jornal na internet potencializou sobremaneira a disseminação dos conceitos pejorativos irrogados à vítima, de sorte que não merece reparo a bem-lançada sentença.

Em relação ao prequestionamento da matéria, com vistas à eventual reexame pelos Tribunais Superiores, tenho que os dispositivos restam prequestionados por força do art. 1.025 do CPC.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo conhecimento e desprovimento do recurso, nos termos da fundamentação.

 

É como voto, senhor Presidente.