MSCiv - 0600197-43.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 29/08/2022 às 14:00

VOTO

Eminentes Colegas, trata-se de mandado de segurança em que o impetrante afirma a existência de decisão violadora de direito líquido e certo, a qual reconheceu a ilegalidade de artefato de publicidade, porém a autoridade coatora entendeu-se despida de competência para o exercício do poder de polícia eleitoral.

Como afirmado na inicial, a teor do que dispõe o art. 54, § 3º, da Resolução TSE n. 23.608/19, o “mandado de segurança é a via jurisdicional cabível contra atos comissivos e omissivos praticados pela juíza ou pelo juiz eleitoral no exercício do poder de polícia”.

A fim de evitar tautologia, transcrevo a decisão que examinou o pedido de tutela provisória, de lavra do eminente Des. Eleitoral Francisco José Moesch, meu antecessor na condução do processo:

Decido.

O mandado de segurança é remédio constitucional colocado à disposição do jurisdicionado quando seu direito líquido e certo estiver sendo violado ou ameaçado de lesão por ato de autoridade, na esteira do que dispõe o art. 5º, inc. LXIX, da CF/88.

É pacífica no âmbito deste Tribunal que as decisões prolatadas no âmbito do poder de polícia conferido aos juízes eleitorais não têm caráter jurisdicional, mas eminentemente administrativo, de modo que devem ser impugnadas por meio de mandado de segurança.

No mesmo sentido, o parágrafo 3º do artigo 54 da Resolução TSE n. 23.608/19 estabelece que “o mandado de segurança é a via jurisdicional cabível contra atos comissivos e omissivos praticados pela juíza ou pelo juiz eleitoral no exercício do poder de polícia”.

Na hipótese, o mandamus é impetrado em face de decisão proferido pela Juíza Eleitoral da 132ª Zona lavrada nos seguintes termos:

Vistos, etc.

Trata-se de representação ajuizada pelo Ministério Público Eleitoral aduzindo que na data de 26 de abril de 2022, diligenciou e constatou a existência de propaganda eleitoral extemporânea, veiculada por meio de outdoor em favor de notório pré-candidato ao cargo de Presidente da República Jair Messias Bolsonaro, requerendo sua imediata retirada, com base no poder de polícia.

Inicialmente deve-se traçar algumas considerações sobre o tema em questão.

De acordo com a Lei das Eleições (Lei 9.504/97), na Justiça Eleitoral, o exercício do poder de polícia é privativo da autoridade judiciária, que, no âmbito local, é representada pelo Juiz Eleitoral.

Conforme Rodrigo López Zilio[1], "o poder de polícia, na esfera especializada, consubstancia-se em atividade que regulamenta a prática de atos ocorridos no processo eleitoral, com vista a evitar dano ou prejuízo a candidato, partido ou coligação."

Portanto, trata-se de função predominantemente administrativa, mas, também, atividade jurisdicional de natureza cautelar, na medida em que é desempenhado pelo Juiz Eleitoral, visando a evitar dano irreparável, em face da natural demora no desenvolvimento regular do procedimento devido.

Conforme Frederico Franco Alvim:

No âmbito eleitoral, o poder de polícia constitui ferramenta jurídica de ampla aplicação, sobretudo no que diz respeito à propaganda eleitoral, em que muitas vezes, em defesa da normalidade das eleições, a retirada de expediente irregular urge, não se podendo aguardar a burocracia do trâmite processual, ou mesmo a provocação de parte interessada, que aqui se dispensa pelo fato que a atividade administrativa, ao revés da jurisdicional, não se submete ao princípio da inércia.

[…] A titularidade do poder de polícia, então, é conferida aos juízes eleitorais, bem como aos juízes designados pelos Tribunais Regionais Eleitorais, no caso de eleições gerais (os chamados juízes auxiliares), ou, também, de eleições municipais nas cidades que detenham mais de uma zona eleitoral.

No mesmo sentido, a Consolidação Normativa Judicial Eleitoral – CNJE do Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Sul, prevê:

Art. 56. São atribuições exclusivas do juiz eleitoral:

I – exercer o poder de polícia, que consiste na adoção de medidas preventivas e repressivas julgadas pertinentes para assegurar a regularidade do pleito; CE, art. 249;Lei n. 9.504/97, art. 41

Portanto, o poder de polícia é exclusivo desta justiça especializada, e se dá por meio de atos privativos dos magistrados que estão investidos da função eleitoral.

Sendo assim, sempre que necessário, o magistrado poderá exigir uma ação (conduta positiva) ou uma omissão (conduta negativa) do candidato, partido, coligação ou de seus correligionários, de forma a limitar, restringir ou disciplinar direitos e atividades, com o fim de inibir práticas que atentem contra a normalidade e a regularidade da eleição.

Note-se que poder de polícia consiste, em grande parte, na prevenção e repressão da propaganda realizada à margem da lei.

A Lei das Eleições traz inserto no seu texto o que segue, in verbis:

Art. 41. A propaganda exercida nos termos da legislação eleitoral não poderá ser objeto de multa nem cerceada sob alegação do exercício do poder de polícia ou de violação de postura municipal, casos em que se deve proceder na forma prevista no art. 40.

Importante ressaltar que a Lei n. 12.034/2009 acrescentou os § 1º e 2º ao artigo 41 da referida Lei das Eleições, consolidando o entendimento dominante no TSE no que diz respeito à propaganda eleitoral e aos atos jurisdicionais. In verbis:

Art. 41 […]

§ 1º O poder de polícia sobre a propaganda eleitoral será exercido pelos juízes eleitorais e pelos juízes designados pelos Tribunais Regionais Eleitorais.

§ 2º O poder de polícia se restringe às providências necessárias para inibir práticas ilegais, vedada a censura prévia sobre o teor dos programas a serem exibidos na televisão, no rádio ou na internet.

Dessa forma, é possibilitado ao magistrado a abertura de procedimento administrativo para, por exemplo, fazer cessar uma propaganda irregular ou evitar o abuso do poder econômico ou político, determinando medidas diretas que desfaçam ou impeçam o ato ilícito que possa desvirtuar ou esteja desvirtuando o processo eleitoral.

Ainda cabe referir, que o plenário do TSE considera promoção pessoal de imagem em outdoor ato de propaganda eleitoral antecipada, conforme notícia do site do TSE.

Porém, é importante que seja verificado o período em que o suposto abuso e/ou irregularidade esta ocorrendo, se durante o período eleitoral, ou antes do período eleitoral, e quem é a autoridade ou suposto candidato/partido beneficiado.

Levando-se em conta que estamos no período que antecede a campanha eleitoral, sendo hoje 28/04/2022, trata-se de propaganda extemporânea, motivo pelo qual, foge a competência desta magistrada a análise da regularidade ou irregularidade do caso em tela, principalmente em se tratando de provável candidato a presidente da república, cuja competência é do TSE.

Por certo que se estivéssemos em 16/08/2022, esta magistrada poderia e deveria atuar, conforme Resolução TSE 23.608/19 que abaixo se transcreve:

Art. 54. A competência para o processamento e julgamento das representações previstas no Capítulo II não exclui o poder de polícia sobre a propaganda eleitoral e as enquetes, que será exercido pelas juízas ou pelos juízes eleitorais, por integrantes dos tribunais eleitorais e pelas juízas ou pelos juízes auxiliares designados.

§ 1º O poder de polícia sobre a propaganda eleitoral é restrito às providências necessárias para inibir ou fazer cessar práticas ilegais, vedada a censura prévia sobre o teor dos programas e das matérias jornalísticas ou de caráter meramente informativo a serem exibidos na televisão, na rádio, na internet e na imprensa escrita.

Corroborado a isso, a jurisprudência do TRE assim entende:

RECURSO. REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA ELEITORAL EXTEMPORÂNEA. SEDE DE PARTIDO POLÍTICO. ELEIÇÃO PRESIDENCIAL. COMPETÊNCIA DO JUIZ ELEITORAL NO ÂMBITO DO PODER DE POLÍCIA. RESTRIÇÃO. SÚMULA 18 DO TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL. PROSSEGUIMENTO DA INSTRUÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL. ART. 96, III, DA LEI N. 9.504/97. NULIDADE DA SENTENÇA. ART. 485, INC. IV, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. ELEIÇÕES 2018.

1. O poder de polícia, no âmbito da Zona Eleitoral, no caso de eleição geral, tem caráter preventivo quando visa ao impedimento da veiculação de propaganda, e repressivo quando comporta a determinação de cessação e retirada de propagandas ilegais ou abstenção de condutas que possam atentar contra o equilíbrio e o perfeito andamento do processo eleitoral. Contudo, não tem legitimidade para instaurar procedimento com vistas à imposição de multa, conforme Súmula 18 do Tribunal Superior Eleitoral.

2. Na espécie, o Juiz Eleitoral processou e julgou improcedente a representação proposta, a qual foge do seu âmbito de atuação, pois versa sobre suposta propaganda extemporânea em eleição presidencial, cuja competência é do TSE, conforme previsão inserta no art. 96, inc. III, da Lei n. 9.504/97.

Nulidade da sentença. Extinção do feito sem resolução do mérito.

(Recurso Eleitoral n 1586, ACÓRDÃO de 05/12/2017, Relator(aqwe) JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 220, Data 07/12/2017, Página 8). Grifei.

Sendo assim, deixo de analisar o mérito por flagrante incompetência, determinado a remessa do presente ao TRE-RS, para que este tome as medidas que entender necessárias para o envio ao TSE.

Seberi, 28 de abril de 2022.

LISIANE CESCON CASTELLI

Juíza Eleitoral da 132ª Zona

Trata-se, no presente momento processual, de examinar o pedido de concessão de medida liminar.

Conforme prevê o art. 300 e seguintes do Código de Processo Civil, a tutela de urgência exige a presença da probabilidade do direito e do perigo de dano ou de risco ao resultado útil do processo.

Conforme se depreende da decisão impugnada, a Magistrada deixou de analisar a licitude ou não do outdoor em questão, com fundamento na sua incompetência para conhecer de representação alusiva ao pleito presidencial, nos termos do art. 96, inc. III, da Lei n. 9.504/97, e porque não se está no período oficial de campanhas.

Em realidade, caso o pedido descrito na petição inicial oferecida no processo n. 0600004-20.2022.6.21.0132 tivesse por objeto a aplicação de multa em face dos candidatos beneficiados ou do responsável pela promoção de outdoor, a competência para o julgamento da demanda, por envolver pré-candidato à Presidência da República, seria do TSE, conforme expressamente regulado pelo art. 96, inc. III, da Lei n. 9.504/97.

A incompetência para o julgamento de representação eleitoral não retira do juiz eleitoral o dever de atuar no exercício do poder de polícia, com eventual decretação de medidas que visem coibir a prática de propaganda ilícita.

Nesse sentido está o próprio julgado cuja ementa é trazida na decisão impugnada (REl n. 1586, Relator: DES. FEDERAL JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, DEJERS de 07.12.2017), que bem enuncia ser regular “o poder de polícia, no âmbito da Zona Eleitoral, no caso de eleição geral”, apenas excluindo a legitimidade para o procedimento tendente à imposição de multa.

Na hipótese, trata-se, inequivocamente, de provocação ao exercício do poder de polícia sobre a propaganda eleitoral, cujo pedido delimita-se a que “seja adotada providência hábil para se realizar a remoção da propaganda em prazo exíguo” (ID 105073669 do processo n. 0600004-20), com amparo expresso no art. 41, §§ 1º e 2º, da Lei n. 9.504/97, que transcrevo:

Art. 41. (...).

§ 1º O poder de polícia sobre a propaganda eleitoral será exercido pelos juízes eleitorais e pelos juízes designados pelos Tribunais Regionais Eleitorais.

§ 2º O poder de polícia se restringe às providências necessárias para inibir práticas ilegais, vedada a censura prévia sobre o teor dos programas a serem exibidos na televisão, no rádio ou na internet.

Como se extrai dos dispositivos citados, cabe aos juízes eleitorais, no exercício do poder de polícia, fazer cessar a prática de propaganda eleitoral contrária à lei, inclusive em relação àquela praticada fora do prazo legalmente estabelecido, ou seja, anteriormente ao dia 16 de agosto do ano da eleição (art. 36 da Lei n. 9.504/97).

Na lição de Luiz Carlos dos Santos Gonçalves e Rodrigo López Zilio (Comentários às Súmulas do TSE. Editora JusPodivm, 2017, p. 98):

(...) a previsão do emprego do pode de polícia para "inibir práticas ilegais (art. 41, § 1º, da LE) e para "evitar os atos viciosos das eleições" (art. 35, inciso XVII, CE) confere uma dimensão material extremamente larga para sua aplicação, convergindo que a finalidade última desse instrumento é servir como uma ferramenta essencial ao controle de legalidade do processo eleitoral.

Logo, o poder de polícia conferido a todos os juízes eleitorais, em suas respectivas Zonas Eleitorais, não se delimita ao período legalmente permitido ou à distribuição de competências previstas no art. 96 da Lei n. 9.504/97, mas abarca, também, as manifestações de propaganda eleitoral ocorridas no período pré-eleitoral, independentemente do cargo em disputa.

Assim, julgo presente a plausibilidade do direito invocado.

De seu turno, a urgência da medida é extraída da própria negativa de análise do outdoor, possibilitando que eventual propaganda eleitoral antecipada se esquive da fiscalização da Justiça Eleitoral e de eventuais providências corretivas, com possível prejuízo à isonomia na disputa eleitoral.

Assim, impõe-se que a Juíza Eleitoral se manifeste fundamentadamente sobre o mérito da provocação deduzida pelo Ministério Público Eleitoral, avaliando a regularidade da peça publicitária e a necessidade de medidas repressivas, caso verificada a caracterização de propaganda eleitoral irregular.

DIANTE DO EXPOSTO, defiro o pedido de tutela provisória, determinando que Juízo Eleitoral da 132º Zona pronuncie-se sobre o mérito da provocação ao exercício do poder de polícia deduzida pelo Ministério Público Eleitoral, analisando, de forma fundamentada, a presença de elementos caracterizadores da propaganda eleitoral irregular e as medidas eventualmente cabíveis para o caso.

Igualmente, suspendo a determinação de remessa da Rp n. 0600004-20.2022.6.21.0132 a este Tribunal Regional, devendo os respectivos autos permanecerem na origem até o deslinde do caso.

Comunique-se ao Juízo impetrado para cumprimento, bem como para prestar as informações que entender pertinentes no prazo previsto no art. 7°, inc. I, da Lei n. 12.016/09.

Dê-se ciência do feito à Advocacia-Geral da União, enviando-lhe cópia da inicial sem documentos, para que, querendo, ingresse no feito, no prazo de 5 (cinco) dias, na forma do art. 7º, inc. II, da Lei n. 12.016/09.

Após, abra-se vista dos autos à Procuradoria Regional Eleitoral nos termos do art. 12 da Lei n. 12.016/09.

Cumpra-se.

Desembargador Eleitoral FRANCISCO JOSÉ MOESCH,

Relator.

Registro que, comunicada a decisão, a autoridade apontada como coatora proferiu decisão nos autos da Rp n. 0600004-20.2022.6.21.0132, determinando a remoção do outdoor com base no exercício do poder de polícia eleitoral.

Assim, a tutela concedida teve caráter satisfativo.

Na linha dos precedentes do Superior Tribunal de Justiça e desta Corte, seja de natureza satisfativa, seja de natureza cautelar, a tutela provisória concedida incidentalmente não afeta a necessidade de julgamento do mérito do pedido no mandado de segurança. Vejamos:

PROCESSO CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. MANDADO DE SEGURANÇA. ALEGADA NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO CARACTERIZADA. APELAÇÃO. PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE. ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE ORIGEM EM CONSONÂNCIA COM A JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE. CUMPRIMENTO DE LIMINAR. PERDA DE OBJETO. NÃO CARCATERIZADA. SÚMULA 568/STJ. EMPREENDIMENTO IMOBILIÁRIO. INOBSERVÂNCIA DOS PRECEITOS LEGAIS DE PROTEÇÃO À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. REVISÃO. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO INTERNIO NÃO PROVIDO.

[...]

3. A Jurisprudência desta Corte está consolidada no sentido de que o cumprimento da medida liminar concedida em mandado de segurança, ainda que tenha natureza satisfativa, não acarreta a perda do objeto do writ, permanecendo o interesse do impetrante no julgamento do mérito.

[...]

5. Agravio interno não provido.

(STJ, AgInt no AREsp n. 1.903.949/MG, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 14/2/2022, DJe de 17/2/2022.)

 

MANDADO DE SEGURANÇA. DECISÃO INTERLOCUTÓRIA. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO AO REGISTRO DE CANDIDATURA # AIRC. ELEIÇÕES 2020. JUÍZO ELEITORAL QUE DETERMINOU A OITIVA DE TESTEMUNHAS. LIMINAR DEFERIDA. ENCERRAMENTO DA INSTRUÇÃO PROBATÓRIA. ABERTURA DO PRAZO PARA ALEGAÇÕES FINAIS E PRONUNCIAMENTO DA SENTENÇA. CONFIRMADA A LIMINAR. CONCESSÃO DA ORDEM.

1. Mandamus impetrado em face de decisão interlocutória proferida pelo Juízo Eleitoral que, com o fito de instruir Ação de Impugnação contra Registro de Candidatura # AIRC, ordenou a oitiva de testemunhas.

2. Deferida liminar determinando o encerramento do prazo de dilação probatória e o seguimento do rito previsto na Lei Complementar n. 64/90.

3. Seja de natureza satisfativa, seja de natureza cautelar, a tutela provisória concedida incidentalmente tem de ser confirmada ou revogada no mérito, consoante prevê o art. 4º do Código de Processo Civil, inclusive porque a não confirmação da tutela provisória pode ensejar a responsabilidade da parte prejudicada pela efetivação da tutela, nos termos do art. 302, inc. I, do CPC.

4. Confirmação integral dos fundamentos deduzidos na decisão que apreciou o pedido liminar.

5. Concessão da ordem.

(Mandado de Segurança n. 060043885 , Relator Des. Eleitoral GUSTAVO ALBERTO GASTAL DIEFENTHÄLER, Publicado em Sessão, Data 01/12/2020)

Passo então ao exame do mérito, adiantando que a decisão liminar merece ser confirmada.

O caso dos autos difere ligeiramente dos mandados de segurança que têm sido apreciados recentemente por este Tribunal Regional. Aqui, não se trata de postulação para verificar licitude ou ilicitude de conteúdo de outdoor; a inicial pleiteou que fosse determinado o exercício do poder de polícia pela juíza eleitoral, ainda que em período anterior ao início da campanha eleitoral e sem ter em conta a natureza do cargo em disputa.

O impetrante ainda esclareceu que não pretende com a presente ação constitucional ver declarada a ilegalidade da propaganda, mas apenas que se realize o efetivo exame do pleito nos autos da Rp n. 0600004-20.2022.6.21.0132, onde postulou “pedido de providências com fundamento do poder de polícia, consistentes em medidas hábeis para a retirada, em prazo a ser determinado pelo Juízo, do versado Outdoor”.

Sabe-se que o controle da propaganda eleitoral é realizado pela Justiça Eleitoral tanto no âmbito do poder de polícia quanto no âmbito jurisdicional. O exercício do poder de polícia sobre a propaganda eleitoral, nos limites da atividade administrativa e consideradas restrições pontuais (como é o caso da propaganda na internet – art. 8º da Resolução TSE n. 23.610/19), é prerrogativa dos juízes eleitorais, tanto que são disponibilizadas orientações procedimentais às Zonas Eleitorais pelo TRE-RS nas Eleições Gerais e, em particular, pela Corregedoria deste Regional, no condizente ao exercício do poder de polícia no âmbito do primeiro grau.

José Jairo Gomes ensina que:

A restauração do bem, adequação e retirada de propaganda irregular podem ser determinadas administrativamente pelo juiz eleitoral, já que são providências atinentes ao poder de polícia. Significa dizer que não é preciso que se ajuíze ação eleitoral, com todas as formalidades envolvidas nesse ato, para que tais sanções sejam aplicadas. Sendo ferido direito líquido e certo em razão de ilegalidade ou abuso de poder decorrentes de atos praticados por autoridade eleitoral, pode-se cogitar a impetração de mandado de segurança.

No que concerne à aplicação de sanções ou penalidades como multa, suspensão de programação de emissora de televisão ou rádio, só podem ser impostas pelo poder jurisdicional, após regular processo judicial, assegurado o devido processo legal, em que sejam oportunizados à parte o contraditório e a ampla defesa. Sobre isso, dispõe a Súmula n. 18 do TSE:

“Conquanto investido de poder de polícia, não tem legitimidade o juiz eleitoral para, de ofício, instaurar procedimento com a finalidade de impor multa pela veiculação de propaganda eleitoral em desacordo com a Lei n. 9.504/97.”

[…]

Nas eleições federais e estaduais, a CFPE é instituída para atuar na capital do Estado, embora não haja empecilho legal a que seja criada em outras circunscrições.

No interior, a fiscalização da propaganda e o exercício do poder de polícia são cometidos aos juízes eleitorais.

(Direito eleitoral – 16. ed. – São Paulo: Atlas, 2020) (Grifei.)

Raquel Cavalcanti Ramos Machado também enumera as atividades realizadas pelos juízes eleitorais de primeira instância mesmo em eleições gerais:

Nas várias espécies de eleições (seja para Presidente, gerais ou municipais), todos os órgãos da Justiça Eleitoral atuam. Questões, por exemplo, relacionadas a crimes eleitorais, que não sejam praticados por autoridades com prerrogativa de foro, serão julgadas pelo juiz eleitoral, independentemente de que tipo de eleição se trate. Mesmo que se cuide, por exemplo, de eleição presidencial, o crime de boca de urna praticado por eleitor não titular de cargo político será julgado por juiz eleitoral. Além disso, os juízes eleitorais exercem poder de polícia sobre a propaganda de um modo geral. Nas eleições municipais, acumulam a função administrativa de poder de polícia à função jurisdicional, quanto ao julgamento das representações que tenham por objeto a aplicação de multas. Nas eleições gerais, o poder de polícia é exercido pelos juízes eleitorais e pelos juízes auxiliares do TRE, sendo que as representações são julgadas pelos juízes auxiliares atuantes junto ao TRE.

Machado,

(Direito eleitoral – 2. ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Atlas, 2018)

Na esteira das lições doutrinárias e como já mencionado na decisão liminar transcrita, a “incompetência para o julgamento de representação eleitoral não retira do juiz eleitoral o dever de atuar no exercício do poder de polícia, com eventual decretação de medidas que visem coibir a prática de propaganda ilícita […] apenas excluindo a legitimidade para o procedimento tendente à imposição de multa”.

Nesse sentido, e mais uma vez me valendo das palavras do Des. Eleitoral Francisco José Moesch, “o poder de polícia conferido a todos os juízes eleitorais, em suas respectivas Zonas Eleitorais, não se delimita ao período legalmente permitido ou à distribuição de competências previstas no art. 96 da Lei n. 9.504/97, mas abarca, também, as manifestações de propaganda eleitoral ocorridas no período pré-eleitoral, independentemente do cargo em disputa”.

Por esses fundamentos, merece ser confirmada a decisão liminar e concedida a segurança, nos termos da fundamentação.

 

Dispositivo

DIANTE DO EXPOSTO, voto por confirmar a liminar deferida e por conceder a segurança em caráter definitivo.