REl - 0600044-47.2020.6.21.0172 - Voto Relator(a) - Sessão: 18/08/2022 às 14:00

 VOTO

Cuida-se de recurso interposto contra sentença que desaprovou a prestação de contas do partido CIDADANIA, Diretório Municipal de Novo Hamburgo/RS, regida pela Lei n. 9.096/95 e Resolução TSE n. 23.546/17, e, no âmbito processual, pela Resolução TSE n. 23.604/19, relativa à arrecadação e aplicação de verbas no exercício financeiro de 2019.

O ponto controvertido na irresignação trata do recebimento e utilização de recursos de origem não identificada, no montante total de R$ 1.293,38, que não transitou na conta bancária do partido.

Em suas alegações, o prestador alega que o valor foi arrecadado informalmente, sem transitar pela conta do partido, pois destinado com o propósito de saldar despesas relacionadas a processo judicial relativo à agremiação.

Aduz, ainda, que não se verifica "intenção de obstar a fiscalização pela Justiça Eleitoral, tanto que a recorrente admitiu a falha, que se deu por puro desconhecimento da forma como deveria pagar aquele compromisso, pelo que, não é caso de desaprovação, nem de devolução dos valores, pois demonstrado o pagamento lícito realizado, não comprometendo a lisura das contas, sendo ainda a falha de valor de pouca expressão, ausentes quaisquer outros apontamentos".

Não assiste razão ao prestador.

Com efeito, a percepção pelo partido político de recursos financeiros deve ser obrigatoriamente identificada com o CPF do doador, segundo preceituam os §§ 1º e 2º do art. 8º da Resolução TSE n. 23.456/17:

Art. 8º As doações realizadas ao partido político podem ser feitas diretamente aos órgãos de direção nacional, estadual ou distrital, municipal e zonal, que devem remeter à Justiça Eleitoral e aos órgãos hierarquicamente superiores do partido o demonstrativo de seu recebimento e respectiva destinação, acompanhado do balanço contábil (Lei n. 9.096/95, art. 39, § 1º).

§ 1º As doações em recursos financeiros devem ser, obrigatoriamente, efetuadas por cheque cruzado em nome do partido político ou por depósito bancário diretamente na conta do partido político (Lei n. 9.096/95, art. 39, § 3º).

§ 2º O depósito bancário previsto no § 1º deve ser realizado na conta "Doações para Campanha" ou na conta "Outros Recursos", conforme sua destinação, sendo admitida a efetivação por qualquer meio de transação bancária no qual o CPF do doador ou contribuinte ou o CNPJ, no caso de partidos políticos ou candidatos, seja obrigatoriamente identificado.

§ 3º Em ano eleitoral, os partidos políticos podem aplicar ou distribuir pelas diversas eleições os recursos financeiros recebidos de pessoas físicas, observando-se o disposto nos arts. 23, § 1º, e 24 da Lei n. 9.504/97 e os critérios definidos pelos respectivos órgãos de direção e pelas normas estatutárias (Lei n. 9.096/95, art. 39, § 5º).

§ 4º Para efeito do disposto no § 3º, a utilização ou distribuição de recursos financeiros recebidos de pessoas físicas em benefício de campanhas eleitorais deve observar as seguintes regras:

I - os valores decorrentes de doações recebidas pelo órgão partidário que forem destinados, total ou parcialmente, à utilização em campanha eleitoral devem ser previamente transferidos para a conta bancária de que trata o inc. II do art. 6º "Doações para Campanha" , com o necessário registro que permita a clara identificação da origem dos valores e do doador originário (STF, ADI nº 5.394);

II - a utilização ou distribuição de recursos decorrentes de doações em favor de campanhas eleitorais é limitada a 10% (dez por cento) do rendimento bruto auferido pela pessoa física no ano anterior ao da eleição;

III - o partido político que aplicar recursos do Fundo Partidário em campanha eleitoral deve fazer a movimentação financeira diretamente na conta bancária estabelecida no art. 43 da Lei n. 9.096/95, vedada a transferência desses recursos para a conta "Doações para Campanha".

§ 5º A apuração dos rendimentos brutos da pessoa física contemplada no inc. II do § 4º é realizada na forma prevista em resolução de prestação de contas das campanhas eleitorais nas eleições em que a doação for utilizada.

§ 6º São isentas do limite referenciado no inc. II do § 4º as doações estimáveis em dinheiro relativas à utilização de bens móveis ou imóveis de propriedade do doador, desde que o valor da doação não ultrapasse R$ 40.000,00 (quarenta mil reais), apurados conforme o valor de mercado.

§ 7º A aferição do limite de doação do contribuinte dispensado da apresentação de declaração anual de ajuste do Imposto de Renda deve ser realizada com base no limite de isenção previsto para o exercício.

§ 8º A remessa do demonstrativo e do balanço contábil previstos no caput deve ser encaminhada:

I - à Justiça Eleitoral, anualmente, no momento da prestação de contas, nos termos desta resolução; e

II - aos órgãos partidários hierarquicamente superiores, na forma e periodicidade estabelecidas nas regras internas do partido político. (grifo nosso)

 

Nesse aspecto, o parecer da douta Procuradoria Regional Eleitoral bem elucida as razões intrínsecas pelas quais se deve seguir os procedimentos constantes na norma eleitoral acima transcrita (ID 44971911):

A ausência de adoção de tais procedimentos impede que a Justiça eleitoral identifique a observância das normas que regulamentam as receitas partidárias, razão pela qual não podem ser consideradas regulares.

 

Assim, esses valores são considerados irregulares, na medida em que não transitaram pela conta bancária do partido previamente à sua utilização, caracterizando recursos de origem não identificada, contrariando as disposições contidas no art. 8º, § 1º, da Resolução TSE n. 23.546/17 e do art. 39, § 5º, da Lei n. 9.096/95, cujo objetivo é salvaguardar a lisura e transparência das contas partidárias.

Por fim, considerando que a irregularidade perfaz valor superior a R$ 1.064,10, e sobretudo por representar 77,57% das receitas arrecadadas pelo prestador no exercício financeiro em comento, inviável a incidência dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.

Portanto, diante da existência da utilização de recursos de origem não identificada, impõe-se o recolhimento da quantia de R$ 1.293,38 ao Tesouro Nacional a tal título.

Ante o exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso, mantendo a sentença de desaprovação das contas e o recolhimento da quantia de R$ 1.293,38 ao Tesouro Nacional, por seus íntegros fundamentos.