ED no(a) AJDesCargEle - 0600109-05.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 29/07/2022 às 13:30

VOTO

Os embargos de declaração são regulares, tempestivos e comportam conhecimento.

Inicialmente, relembro que os embargos de declaração são recurso sui generis, uma vez que não possuem a finalidade de anular ou reformar, e sim integrar a decisão recorrida, no sentido de torná-la precisa, completa.

Quanto ao cabimento do recurso, os aclaratórios servem para afastar obscuridade, omissão, contradição ou erro material, conforme previsto no art. 1.022 do CPC.

O embargante, irresignado com o acórdão, interpôs embargos de declaração, sustentando que a decisão embargada foi contraditória no que se refere à jurisprudência dos demais Tribunais Regionais Eleitorais, assim como se manteve omisso quanto a dispositivo expresso da Lei n. 9096/95.

 No caso dos autos, mostra-se evidente a ausência dos requisitos para a oposição dos presentes embargos. O que pretende o embargante é rever a justiça da decisão, entendendo possuir argumentos suficientes para alterar o resultado do julgamento. Ocorre que os embargos de declaração não servem para rediscutir o mérito do julgado, sendo “incabível a inovação de teses recursais no âmbito dos embargos de declaração” (TSE-EDAgR-AI n. 69-63/RS – j. 08.05.2014 – Dje 09.06.2014).

Dessarte, a omissão/contradição apontada não está presente na decisão embargada, pois não expressa dissonância flagrante entre a vontade do julgador e a sua exteriorização.

Primeiramente, com relação à dissonância da decisão embargada diante da “jurisprudência pacífica” de outros Tribunais Regionais Eleitorais, consigno que as decisões de outros Regionais não possuem efeito vinculativo. Aliás, a divergência jurisprudencial é normal num sistema em que há pluralidade de órgãos judicantes, os quais decidem semelhantes questões de direito, podendo ocorrer que num mesmo contexto histórico e cultural a mesma regra jurídica seja aplicada de forma diferente pelos Tribunais. E, ao contrário do afirmado nos embargos, até o momento não há “jurisprudência pacífica” a respeito do tema.

Ademais, não há decisão do Tribunal Superior Eleitoral – TSE sobre o assunto.

 O posicionamento exarado na decisão embargada é no sentido de que a justa causa deve ser objetivamente comprovada nos autos, ou seja, que a fusão não gera automaticamente hipótese de justa causa a autorizar a desfiliação.

Transcrevo trecho do acórdão de minha lavra:

Nesse cenário, ainda que seja razoável a argumentação trazida na inicial quanto à mudança programática decorrente da fusão, não menos razoável é a circunstância de que a fusão, por si só, não é justa causa para autorizar a desfiliação do mandatário.

Isso porque o art. 22-A da Lei n. 9.096/95, acrescentado pela Lei 13.165/15, revogou tacitamente o art. 1º, § 1º, I da Res. TSE 22.610/07, que previa, de forma expressa, a hipótese de incorporação ou fusão de partido político como justa causa para a desfiliação partidária.

O vigente art. 22-A da Lei n. 9.096/95 não prevê a incorporação ou fusão partidária como justa causa para a desfiliação partidária.

Dessa forma, reitero: a mera fusão ou incorporação de partidos não significa necessariamente uma mudança substancial do programa partidário, sem que isso seja objetivamente aferido nos autos.

 

Aliás, com a devida licença do entendimento firmado pelos Tribunais mencionados pelo embargante, considerar que toda fusão acarreta mudança substancial no programa do partido equivale a inovar, criando uma regra objetiva de que a fusão é motivo de desfiliação partidária por justa causa. Não é o que a lei dispõe, pois a inserção do art. 22-A na Lei n. 9096/95 revogou tacitamente o § 1º do art. 1º da Resolução TSE n. 22.610/07, o qual trazia a fusão/incorporação como causa objetiva de desfiliação (precedente do STF - ADI: 4583 DF).

Em contrapartida, o embargante sustenta que “a fusão de partidos, é por si só, uma mudança significativa de seu programa partidário” e que o próprio acórdão reconhece a possibilidade de mudança substancial do programa do partido poder justificar a desfiliação em casos de fusão.

De fato, o acórdão reconhece a possibilidade de haver mudança substancial do programa por motivo de fusão de partidos, mas expressamente declara não haver prova da alegada alteração substancial no programa partidário pelas razões de decidir já explanadas no corpo do acórdão como também pelos fundamentos que repito: “quando há a fusão de dois partidos ou mais, em tese, não há uma alteração substancial do programa partidário, já que o novo programa é fruto de um consenso entre os integrantes das agremiações em processo de fusão. Conforme se verifica na legislação que disciplina os processos de fusão e incorporação, art. 29, §1º, I e II da Lei 9096/95”.

Ao contrário do afirmado pelo embargante, o acórdão não desconsiderou nem se quedou inerte diante dos argumentos trazidos pelo recorrente, tão somente considerou as exposições insuficientes a comprovar objetivamente a hipótese de justa causa.

Quanto à alegação de decisão contra expressa disposição legal ao que se refere à interpretação do art. 22-A da Lei n. 9.096/95 e do art. 17, § 6º, da CF, o embargante recorrente argui que o entendimento constante no acórdão encerra a existência de uma questão federal controvertida, no que tange à expressões “partido pelo qual foi eleito” (art. 22-A, caput ) e “partido pelo qual tenham sido eleitos” (art. 17, § 6°, da CF).

Ab initio, percebe-se que o art. 22-A da Lei n. 9.096/95, inserido pela Lei n. 13.165/15, ao dispor de forma taxativa e exaustiva sobre as hipóteses de justa causa para a desfiliação partidária, revogou tacitamente o § 1º do art. 1º da Resolução TSE n. 22.610/07, restando aplicável a mencionada resolução apenas aos aspectos processuais.

A superveniência do art. 22-A acrescentou ao inc. III como hipótese de justa causa a “janela partidária” e definiu taxativamente nos incs. I e II, respectivamente, a mudança substancial ou o desvio reiterado do programa partidário e a grave discriminação política pessoal.

Note-se que não mais se encontra na legislação como motivo de justa causa a fusão ou incorporação de partidos. Como a redação do art. 22-A excluiu a fusão e a incorporação, a interpretação da expressão “partido pelo qual foi eleito”, por óbvio, somente pode se reportar aos motivos de justa causa dos incs. I, II e III cujo teor não se refira a hipóteses de fusão ou incorporação.

Explico.

No caso específico da fusão, o partido pelo qual o parlamentar foi eleito está extinto, passando sua filiação automaticamente a pertencer ao novo partido como se a ele pertencesse desde sempre, tanto que a ação foi interposta contra o UNIÃO, e não contra o “partido pelo qual foi eleito”. No momento do pedido de desfiliação, o partido fundido não existe mais, de modo que essa expressão deve ser compreendida e dirigida ao novo partido fruto da fusão, tanto que o pedido de desfiliação é dirigido a ele.

Ademais, indico que a expressão “pelo qual foi eleito”, presente no art. 22-A da Lei n. 9.096/95 e, em patamar constitucional, constante no art. 17, § 6º, da CF, não possui força para conceder justa causa a priori àquele desertor de partido que sofreu fusão, sob pena de que passemos a tratar a exceção como regra.

Desta feita, se a justa causa é exceção, e se justa causa por fusão partidária não foi objeto de regra constitucional ou ordinária, a melhor hermenêutica há de levar à exegese de que o legislador ao indicar a expressão “pelo qual foi eleito” legislou para um grupo determinado de parlamentares, os quais pretendem se desfiliar do partido pelo qual foram eleitos, não contemplando obviamente os trânsfugas por fusão partidária. De modo que o caput do art. 22-A da Lei das Eleições não favorece o desertor que pretende sair do novo partido.

Ademais, o embargante, ao trazer à baila essas questões interpretativas com relação à expressão do contido no caput do art. 22-A da Lei n. 9.096/95, também afirma a existência de questão federal controvertida, caracterizada pela existência de interpretações divergentes, dadas por tribunais diversos, acerca de um mesmo dispositivo de lei federal, demonstrando que pretende a reforma da decisão que lhe foi desfavorável, mediante alteração do entendimento esposado no acórdão. Em verdade, busca ver seu direito subjetivo tutelado sob as vestes de uniformização interpretativa acerca de um mesmo dispositivo de lei federal, pretensão que não se amolda aos aclaratórios.

Com essas considerações, VOTO pela rejeição dos embargos de declaração.