REl - 0600230-62.2020.6.21.0013 - Voto Relator(a) - Sessão: 26/07/2022 às 16:00

VOTO

I - Da Admissibilidade.

O recurso é tempestivo e, preenchidos os demais requisitos de admissibilidade, comporta conhecimento.

 

II – Da Ilicitude das Gravações de Áudio e Vídeo Realizadas de Forma Clandestina.

De acordo com a narrativa trazida na petição inicial, a Prefeitura de Candelária, com o fito de favorecer as candidaturas dos recorridos, realizou, nas semanas antecedentes ao pleito de 2020, a distribuição massiva de cascalhos, terras, canos de esgoto e mangueiras de água, em propriedades urbanas e rurais do município, caracterizando a prática de captação ilícita de sufrágio (art. 41-A da Lei das Eleições), conduta vedada (art. 73, § 10, da Lei das Eleições) e abuso do poder político e econômico (art. 22 da LC n. 64/90).

A exordial está acompanhada de gravações de vídeo (ID 41340983) em que um interlocutor interpela alguns munícipes, em frente às suas propriedades, e questiona sobre a origem e o recebimento de cascalhos, britas e tubulações em suas residências, além de fotos que teriam sido produzidas no mesmo contexto (ID 41340933).

O Magistrado sentenciante, porém, considerando que as conversas foram captadas de modo clandestino, ou seja, sem que os interlocutores soubessem que estavam sendo gravados e os fins pretendidos com a medida, concluiu pela ilicitude da prova, acolhendo análise exposta no parecer do Ministério Público Eleitoral em primeiro grau, nos seguintes termos:

A propósito, o Tribunal Superior Eleitoral “firmou orientação no sentido da ilicitude da prova colhida por meio de gravação ambiental clandestina, sem autorização judicial e em violação à privacidade e à intimidade dos interlocutores (REspe nº 577-90, rel. Min. Henrique Neves, DJe de 07.08.2014; AgR-REspe nº 515-51, rel. Min. Luciana Lóssio, DJe 15.04.2014; AgR-RO nº 2614-70, rel. Min. Luciana Lóssio, DJe de 07.04.2014). 4. A exceção à regra da ilicitude da gravação ambiental feita sem o conhecimento de um dos interlocutores e sem autorização judicial ocorre quando a mídia registra fato que ocorreu à luz do dia, em local público desprovido de qualquer controle de acesso, pois, nesse caso, não há violação à intimidade ou quebra da expectativa de privacidade (REspe nº 1660-34, rel. Min. Henrique Neves, DJe de 14.05.2015), o que não se aplica ao caso dos autos.

 

Irresignada, a Coligação recorrente sustenta que as gravações juntadas com a exordial não podem ser consideradas como provas ilícitas e devem ser analisadas no conjunto probatório, referenciando, ainda, precedentes do TSE que ratificariam a tese exposta.

No ponto, entendo que agiu com acerto o Magistrado a quo, uma vez que as gravações foram realizadas de modo unilateral pela própria parte demandante, por meio da atuação de interlocutor não identificado nos autos, que ora se apresentava como representante da Coligação recorrida, ora se dizia morador local, ora falava ser visitante interessado na compra de artigos rurais, e induziu o direcionamento da conversa, formulando indagações que já sugeriam o encaminhamento da resposta por ele pretendida, tal como “foi o Rim que conseguiu?”, “foi em troca do voto”, etc.

É inequívoco, igualmente, que os supostos eleitores não tinham conhecimento de que estavam sendo gravados e foram enganados sobre a verdadeira identidade do seu interlocutor, bem como de suas intenções com o direcionamento da conversa.

O diálogo, portanto, foi estimulado e produzido de forma unilateral pela parte demandante, por meio de ardil e fraude, com evidente abuso de confiança, violação à boa-fé e infringência ao art. 369 do CPC, que condiciona a prova a meios moralmente legítimos.

Além disso, os cidadãos foram abordados em suas residências e mantiveram a conversa “do portão de casa para dentro”, a atrair as garantias inerentes à intimidade, à privacidade e à inviolabilidade do domicílio.

Em relação ao tema, para as eleições anteriores a 2016, nos feitos cíveis-eleitorais, o TSE reconhecia a ilicitude da prova obtida mediante gravação ambiental realizada por um dos interlocutores sem o conhecimento dos demais e desacompanhada de autorização judicial, considerando-a lícita somente nas hipóteses em que captada em ambiente público ou desprovido de qualquer controle de acesso.

Desde as eleições de 2016, inclusive, em atenção à compreensão do STF firmada no RE n. 583.937/RJ (Tema 237), a Corte Superior Eleitoral passou a entender, em regra, como lícita a gravação ambiental realizada por um dos interlocutores sem o conhecimento do outro e sem autorização judicial em ambiente público ou privado (TSE, REspe n. 408-98, Relator: Min. Edson Fachin, julgado em 09.05.2019).

Um novo elemento foi agregado ao debate com a instituição da Lei n. 13.964/19, denominada de “Pacote Anticrime”, inserindo-se o art. 8-A na Lei n. 9.296/96, que regulamenta o inc. XII, parte final, do art. 5° da Constituição Federal.

A partir disso, a questão foi novamente analisada no âmbito do TSE, em 07.10.2021, no julgamento de três recursos eleitorais (processos ns. 0000293-64.2016.6.16.0095, 0000634-06.2016.6.13.0247, 0000385-19.2016.6.10.0092), nos quais se firmou o entendimento de que são ilícitas as provas obtidas por meio de gravação ambiental clandestina feita em ambiente privado, sem autorização judicial e sem o conhecimento dos interlocutores.

Cito, por elucidativa, a ementa pertinente a primeiro julgado acima relacionado:

ELEIÇÕES 2016. AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL REPRESENTAÇÃO. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. CANDIDATOS A PREFEITO E A VEREADOR. GRAVAÇÃO AMBIENTAL EM AMBIENTE PRIVADO. ILICITUDE DA PROVA. PROVIMENTO.

1. Nos termos do artigo 8°-A da Lei n° 9.296/96, introduzido pela Lei n° 13.964/2019. a gravação ambiental é possível para fins de investigação ou instrução criminal, por determinação judicial mediante requerimento da autoridade policial ou do Ministério Público, demonstrando que por outro meio a prova não poderia ser realizada e houver elementos probatórios razoáveis do cometimento de crime cuja pena máxima supere quatro anos.

2. Nos termos do § 4°, do artigo 8°-A da Lei n° 9.296/96, introduzido pela Lei n° 13.964/2019, a gravação ambiental realizada por um dos interlocutores sem o prévio conhecimento das autoridades legitimadas no caput do mesmo artigo somente poderá ser utilizada em matéria de defesa, no âmbito de processo criminal e desde que comprovada a integridade de seu conteúdo.

3. Num ambiente caracterizado pela disputa, como é o político, notadamente acirrado pelo período eleitoral o desestímulo a subterfúgios espúrios voltados a tumultuar o enlace eleitoral resguardando assim a privacidade e intimidade constitucionalmente asseguradas, deve ser intensificado, de modo que reuniões políticas privadas travadas em ambientes residenciais ou inequivocamente reservados não se aprazem com gravações ambientais plantadas e clandestinas, pois vocacionadas tão só ao uso espúrio em jogo político ilegítimo, recrudescendo a possibilidade de manipulações.

4. São clandestinas e, portanto, ilícitas as gravações ambientais feitas em ambiente privado, ainda que por um dos interlocutores ou terceiros a seu rogo ou com seu consentimento, mas sem o consentimento ou ciência inequívoca dos demais, dada inequívoca afronta ao inciso X, do art 5°, da Constituição Federal Ilícitas, do mesmo modo, as provas delas derivadas, não se prestando a fundamentar condenação em representação eleitoral.

5. A compreensão aqui firmada não se afigura incompatível com a tese firmada pelo E. STF no RE n° 583.937 (QO-RG/RJ, Rel. Min. Cezar Peluso, j. em 19.11.2009 -Tema 237), que teve como perspectiva o prisma da instrução criminal sobremodo distinto do aqui tratado por força de expressa norma constitucional (art. 5°, XII, parte final) e legal.

6. E tanto há distinção de enfoques que o próprio STF, no RE 1040515 (Rel. Ministro Dias Toffoli - Tema 979), afetou a discussão da necessidade de autorização judicial para legitimar gravação ambiental realizada por um dos interlocutores ou por terceiro presente à conversa, para fins de instrução de ação de impugnação de mandato eletivo, à luz do art. 5°, incs. II e XII da Constituição da República.

7. Agravo Interno provido para julgar improcedente a Representação proposta com base no art. 41-A da Lei 9.504/1997.

(Agravo de Instrumento nº 29364, Relator: Min. Alexandre de Moraes, Publicação:  DJE - Diário da justiça eletrônica, Tomo 206, Data: 09/11/2021) (Grifei.)

 

Nos referidos julgamentos, por maioria (4x3), prevaleceu o entendimento esposado pelo Ministro Alexandre de Moraes, no sentido de serem provas ilícitas as gravações clandestinas de conversas ante o primado da privacidade e da intimidade, direitos fundamentais garantidos pela Constituição, mormente quando colhidas em ambiente privado, sob o risco de incentivar práticas ardilosas e violadoras de direitos fundamentais em cenário de disputa acirrada como o eleitoral.

Não se trata de uma ampla e irrestrita proscrição de gravações clandestinas de qualquer espécie como meio de prova nas diversas searas do Direito. Consoante apontado expressamente no voto e na ementa do acórdão, o reconhecimento da ilicitude se delimita à captação e gravação de conversa pessoal realizadas a fim de formar provas sobre supostos ilícitos cíveis de cunho eleitoral, consideradas as repercussões sociais e políticas do processo eleitoral, não abrangendo, assim, outras hipóteses de captura de sons e imagens e nem se estendendo à seara processual penal comum.

Sobre o aspecto, reproduzo, por pertinente, trecho do voto proferido pelo Ministro Alexandre de Moraes no caso em comento:

No que toca à prova obtida por meio de gravação ambiental, diversamente da posição firmada na decisão agravada, entendo como clandestinas aquelas em que a captação e gravação da conversa pessoal ambiental ou telefônica se dá no mesmo momento em que a conversa se realiza, feita por um dos interlocutores, ou por terceira pessoa com seu consentimento, sem que haja conhecimento dos demais interlocutores, implicando inequívoca afronta ao inciso X, do art. 5°, da Constituição Federal.

 

Isto porque a tutela constitucional das comunicações pretende tomar inviolável a manifestação de pensamento que não se dirige ao público em geral, mas a pessoal ou pessoas determinadas. Consiste, pois, no direito de escolher o destinatário da transmissão.

 

Num ambiente caracterizado pela disputa, como é o político, notadamente acirrado pelo período eleitoral o desestímulo a subterfúgios espúrios voltados a tumultuar o enlace eleitoral resguardando assim a privacidade e intimidade constitucionalmente asseguradas, deve ser intensificado.

 

Reuniões políticas privadas travadas em ambientes residenciais ou inequivocamente reservados não se aprazem com gravações ambientais plantadas s clandestinas. pois vocacionadas tão só ao uso espúrio em jogo político ilegítimo, recrudescendo a possibilidade de manipulações, com supressão de trechos, elaboração de sofisticadas montagens, trucagens cada vez mais sofisticadas viabilizadas por equipamentos moderníssimos que ao fim podem alterar completamente o sentido de determinadas conversas.

 

Como afirma Luiz Flávio Gomes, "o que cabe realçar na gravação clandestina é a sua surpresa, o que a toma moralmente reprovável. Uma coisa é expressar o pensamento sem saber da gravação, outra bem distinta é quando se toma conhecimento dela. Não se nega que existe uma escolha da pessoa a quem se confia o conteúdo de uma comunicação. Mas o comunicador, até essa altura, tem controle da informação" (GOMES, Luiz Flávio; MACIEL, Silvio. Interceptação Telefônicas: comentários à Lei n° 9.296, de 24.07.1996. 2° edição. São Paulo: RT, 2013, p. 29).

 

E uma vez mais realçando o respeito a eventual posição divergente, impõe-se destacar que a compreensão aqui firmada não se afigura incompatível com a tese firmada pelo E. STF no RE n° 583.937 (QO- RG/RJ, Rel. Min. Cezar Peluso, j. em 19.11.2009 -Tema 237), que teve como perspectiva o prisma da instrução criminal sobremodo distinto do aqui tratado por força de expressa norma constitucional (art. 5°, XII, parte final), ainda que também sob este enfoque guardemos reservas quanto à posição assentada.

 

[...].

 

E tanto há distinção de enfoques que o próprio STF, no RE 1040515 (Rel. Ministro Dias Toffoli - Tema 979), afetou a discussão da necessidade de autorização judicial para legitimar gravação ambiental realizada por um dos interlocutores ou por terceiro presente à conversa, apta a instruir ação de impugnação de mandato eletivo, à luz do art. 5°, incs. II e XII da Constituição da República, (...).

(Grifei.)

 

A orientação havida não consiste em mero casuísmo, mas representa efetiva modificação da orientação jurisprudencial da Corte Superior, a partir do julgamento de três processos afetos ao tema, envolvendo o pleito de 2016, oriundos de São Pedro da Água Branca (MA), Santa Inês (PR) e São José da Safira (MG), e do confronto do entendimento jurisprudencial até então majoritário com as novas disposições da Lei n. 13.964/19 (Pacote Anticrime), que inseriu o art. 8-A na Lei n. 9.296/96, expressamente restringindo o alcance da captação ambiental clandestina como prova processual, in verbis:

Art. 8º-A. Para investigação ou instrução criminal, poderá ser autorizada pelo juiz, a requerimento da autoridade policial ou do Ministério Público, a captação ambiental de sinais eletromagnéticos, ópticos ou acústicos, quando: (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)

I - a prova não puder ser feita por outros meios disponíveis e igualmente eficazes; e (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)

II - houver elementos probatórios razoáveis de autoria e participação em infrações criminais cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos ou em infrações penais conexas. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)

§ 1º O requerimento deverá descrever circunstanciadamente o local e a forma de instalação do dispositivo de captação ambiental. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)

§ 2º (VETADO).

§ 2º A instalação do dispositivo de captação ambiental poderá ser realizada, quando necessária, por meio de operação policial disfarçada ou no período noturno, exceto na casa, nos termos do inciso XI do caput do art. 5º da Constituição Federal. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)

§ 3º A captação ambiental não poderá exceder o prazo de 15 (quinze) dias, renovável por decisão judicial por iguais períodos, se comprovada a indispensabilidade do meio de prova e quando presente atividade criminal permanente, habitual ou continuada. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)

§ 4º A captação ambiental feita por um dos interlocutores sem o prévio conhecimento da autoridade policial ou do Ministério Público poderá ser utilizada, em matéria de defesa, quando demonstrada a integridade da gravação. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)

§ 5º Aplicam-se subsidiariamente à captação ambiental as regras previstas na legislação específica para a interceptação telefônica e telemática. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)

(Grifei.)

 

Posteriormente, o tema foi revisitado pelo Plenário do TSE, que, novamente, asseverou a nova orientação jurisprudencial decorrente das alterações legais trazidas pela Lei n. 13.964/19, consoante a seguinte ementa:

ELEIÇÕES 2020. CARGOS PROPORCIONAIS. COTA DE GÊNERO. SUPOSTA FRAUDE. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO (AIME). AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL (AIJE). CASSAÇÃO DOS REGISTROS DE CANDIDATURA NA AIJE. MANUTENÇÃO PELA CORTE REGIONAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROVIMENTO PARA IMEDIATO JULGAMENTO DO ESPECIAL. GRAVAÇÃO AMBIENTAL. PROVA ILÍCITA. ORIENTAÇÃO VIGENTE NA JURISPRUDÊNCIA DO TSE. PROVAS REMANESCENTES. AUSÊNCIA DE ROBUSTEZ. PROVIMENTO. IMPROCEDÊNCIA DA AIJE. RECURSO ESPECIAL NA AIME. DETERMINAÇÃO, PELO JUIZ ELEITORAL, DE APENSAMENTO AOS AUTOS DA AIJE. REMESSA À INSTÂNCIA SUPERIOR. IMPOSSIBILIDADE. ART. 55, § 1º, DO CPC. VIOLAÇÃO. PROVIMENTO. RESTITUIÇÃO AO JUÍZO DE PRIMEIRO GRAU PARA REGULAR INSTRUÇÃO E JULGAMENTO.1. A orientação jurisprudencial vigente neste Tribunal Superior é no sentido da ilicitude da gravação ambiental como meio de prova para fins de comprovação da prática de ilícito eleitoral, ainda que captado o áudio por um dos interlocutores, mas sem a aceitação ou ciência dos demais partícipes do diálogo (AgR–AI n. 0000293–64/PR, Rel. Min. Alexandre de Moraes, DJe de 9.11.2021, por maioria). 2. No que concerne à AIJE, as provas remanescentes, consideradas conforme a moldura do acórdão regional, não se revestem da robustez necessária à confirmação do decreto condenatório por suposta fraude à cota de gênero, razão pela qual a improcedência do pedido se impõe.3. O apensamento dos feitos eleitorais por conexão, à luz do disposto no art. 96–B da Lei n. 9.504/97, deve obedecer à diretriz processual estabelecida no art. 55, § 1º, do CPC, de modo a ser inviável a remessa à superior instância de autos de ação em curso no primeiro grau de jurisdição.4. No caso, portanto, viola o art. 55, § 1º, do CPC, a determinação, pelo juiz eleitoral e confirmada pelo TRE, de apensamento dos autos da AIME, pendente de instrução, aos da AIJE, devidamente sentenciada e relativamente à qual tramitava recurso eleitoral na Corte Regional.5. Agravo e recurso especial formalizados por Eliel Prioli e outro providos para julgar improcedentes os pedidos formulados na Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE), determinando–se, independentemente da publicação do acórdão, o restabelecimento da totalização das eleições proporcionais de Monte Azul Paulista/SP, computando–se como votos válidos os votos recebidos pelos partidos e por seus candidatos a vereador. Recurso especial formalizado por Fabio Aparecido Balarini e outro provido, para determinar o desapensamento da Ação de Impugnação de Mandato Eletivo (AIME) e seu retorno ao juízo eleitoral para regular processamento e julgamento.

(RECURSO ESPECIAL ELEITORAL nº 060053094, Acórdão, Relator(a) Min. Sergio Silveira Banhos, Relator(a) designado(a) Min. Carlos Horbach, Publicação:  DJE - Diário da justiça eletrônico, Tomo 59, Data: 01/04/2022.) (Grifei.)

 

No mesmo caminho, tem sido proferidas decisões monocráticas no âmbito do TSE, reconhecendo a ilicitude de gravação ambiental em ações eleitorais envolvendo o pleito de 2020, a exemplo do pronunciamento do Ministro Alexandre de Moraes nos autos do REspEl n. 060028872, de 04.5.2022, no qual assim consignado:

Como tenho assentado, são clandestinas as gravações em que a captação da conversa pessoal, ambiental ou telefônica se dão no mesmo momento em que a conversa se realiza, feita por um dos interlocutores, ou por terceira pessoa, com seu consentimento, sem que haja conhecimento dos demais interlocutores, implicando inequívoca afronta ao inciso X do art. 5º da Constituição Federal.

 

A tutela constitucional das comunicações pretende tornar inviolável a manifestação de pensamento que não se dirige ao público em geral, mas a pessoal ou pessoas determinadas. Consiste, pois, no direito de escolher o destinatário da transmissão.

 

Num ambiente caracterizado pela disputa, como é o político, notadamente acirrado pelo período eleitoral, o desestímulo a subterfúgios espúrios voltados a tumultuar o enlace eleitoral deve ser intensificado, resguardando, assim, a privacidade e a intimidade constitucionalmente asseguradas.

 

Não ignoro que este Tribunal Regional tem entendido por manter o posicionamento pelo reconhecimento da licitude da gravação ambiental realizada por um dos interlocutores, ou por terceiro presente à conversa, sem o conhecimento dos demais e sem autorização judicial prévia, sob o argumento principal de que o STF ainda definirá a questão nos autos do Recurso Extraordinário n. 1.040.515, da relatoria do Ministro Dias Toffoli, interposto em sede de Ação de Impugnação de Mandato Eletivo (AIME).

Nessa linha estão os seguintes julgados relativos às eleições de 2020: REl 0600412-08, relator: Des. Eleitoral Gerson Fischmann, julgado em 10.08.2021; REl 0600581-56, relator: Des. Eleitoral Oyama Assis Brasil de Moraes, da sessão do dia 20.10.2021; e REl 0600469-75, relator: Des. Federal Luis Alberto D’Azevedo Aurvalle, sessão de 28.11.2021, dentre outros.

Entretanto, rogando vênias ao respeitável entendimento manifestado nos aludidos precedentes, tenho que o tema já se encontra pacificado para as eleições de 2020 no âmbito do TSE, independentemente do eventual resultado no enfrentamento da matéria no STF, de modo que cumpre a este Tribunal Regional compatibilizar a sua jurisprudência com a orientação agora reiterada em diversos julgados na instância superior.

Nesse passo, é necessário conferir aplicação imediata do novo entendimento firmado pelo TSE para os feitos de 2020, ainda que já decididos casos anteriores nesta Corte Regional para o mesmo pleito com a adoção do posicionamento agora superado.

Como se percebe, o reconhecimento da ilicitude das gravações clandestinas como meio de prova tem por base a violação de normas e princípios constitucionais fundamentais, como a intimidade, o sigilo das comunicações, a inviolabilidade do domicílio e a própria integridade e dignidade da pessoa humana.

Desse modo, não cabe ao órgão jurisdicional endossar a agressão a tais princípios sob o argumento de violação aos postulados da estabilidade e coerência da jurisprudência, da isonomia ou da segurança jurídica, sob pena de inversão dos pesos e valores constitucionais atribuídos aos direitos fundamentais.

Nesses termos, diversos Tribunais Regionais têm adequado sua jurisprudência à nova orientação da Corte Superior, consoante ilustram os seguintes julgados:

Recurso Eleitoral. Ação de Investigação Judicial Eleitoral. Prefeito e Vice–Prefeito eleitos. Eleições 2020. Improcedência na primeira instância. 1) Preliminar de coisa julgada (suscitada de ofício) AIJE com as mesmas partes, fatos, causa de pedir e pedido parcialmente coincidente com AIME já transitada em julgado. Petições iniciais análogas. Reconhecimento de coisa julgada parcial em relação ao pedido de cassação do mandado eletivo. Jurisprudência do TSE. Necessidade de prosseguimento da ação quanto à possibilidade de condenação dos investigados à inelegibilidade. Extinção parcial do feito sem resolução do mérito. 2) Preliminar de cerceamento de defesa (suscitada pelo recorrente) Alegação de que o indeferimento dos pedidos preliminares de tutela antecipada para determinar a busca e apreensão de aparelhos telefônicos e documentos e a quebra de sigilo telefônico foram indeferidos em primeira instância, prejudicando as provas e cerceando o direito de defesa do recorrente. Medidas excepcionais, de extrema gravidade, que só devem ser deferidas se demonstrado indícios razoáveis de autoria do ilícito e a imprescindibilidade da medida. Caso concreto que não se amolda aos requisitos exigidos para concessão da medida pleiteada Preliminar rejeitada 3) Mérito 3.1) Da ilicitude da prova (suscitada de ofício) Juntada de áudios sem maiores informações no sentido de se verificar em quais circunstâncias os áudios foram obtidos pelo investigante. Gravação ambiental realizada por pessoa desconhecida, sem conhecimento dos interlocutores A gravação ambiental é ilícita, nos termos do art. 5º, X, da CRFB, pois foi feita de forma clandestina, por um dos interlocutores, sem o conhecimento dos demais. Alterações na jurisprudência do TSE sobre a licitude da gravação ambiental. Precedentes. Autos nº 0000293–64.2016.6.16.0095, 0000634–06.2016.6.13.0247 e 000385–19.2016.6.10.0092. Retorno ao entendimento pela ilicitude das gravações realizada por um dos interlocutores sem o conhecimento do outro, agora com base no art. 8º–A, da Lei nº 9.296/96, incluído pela Lei nº 13.964/2019, e em maior extensão. Configuração de gravação clandestina. Ilicitude. Declaração da Ilicitude e Afastamento da Gravação Ambiental 3.2 – Abuso de poder econômico e corrupção consistente na distribuição de dinheiro e vantagem em troca de votos. (...). Conduta que não ocorreu no período abrangido pela vedação da legislação eleitoral e não configura abuso ou corrupção. Recurso a que se nega provimento.

(TRE-MG - REl: 06006662020206130247 JOSÉ RAYDAN - MG 060066620, Relator: Des. Patricia Henriques Ribeiro, Data de Julgamento: 31/05/2022, Data de Publicação: 07/06/2022.) (Grifei.)

 

RECURSO ELEITORAL. ELEIÇÕES 2020. REPRESENTAÇÃO. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. ART. 41 -A DA LEI 9.504/97. CANDIDATO A VEREADOR. GRAVAÇÃO AMBIENTAL EM AMBIENTE PRIVADO. ILICITUDE DA PROVA. RECONHECIMENTO. AUSÊNCIA DE PROVAS ROBUSTAS. PROVA TESTEMUNHAL EXCLUSIVA. ART. 368 -A DO CÓDIGO ELEITORAL. PROVIMENTO.

1 - Nos termos da jurisprudência do TSE, são "ilícitas as gravações ambientais feitas em ambiente privado, ainda que por um dos interlocutores ou terceiros a seu rogo ou com seu consentimento, mas sem o consentimento ou ciência inequívoca dos demais, dada inequívoca afronta ao inciso X, do art 5º, da Constituição Federal Ilícitas, do mesmo modo, as provas delas derivadas, não se prestando a fundamentar condenação em representação eleitoral". (Agravo de Instrumento nº 29364).

2 - A jurisprudência do TSE exige, "cumulativamente, para a configuração da captação ilícita de sufrágio, o cumprimento dos seguintes requisitos: (a) capitulação expressa da conduta no tipo legal descrito no art. 41-A da Lei nº 9.504/1997; (b) realização da conduta no período eleitoral; (c) prática da conduta com o especial fim de agir, consubstanciado na vontade de obter o voto do eleitor ou de grupo determinado ou determinável de eleitores; (d) existência de conjunto probatório robusto acerca da demonstração do ilícito, considerada a severa penalidade de cassação do registro ou diploma". Precedentes.

3 - A única prova remanescente, testemunho da autora da gravação, que teria sido cooptada pelo recorrente, esbarra no art. 368-A do Código Eleitoral, que veda a utilização da prova testemunhal singular e exclusiva nos processos que possam levar à perda do mandato. Precedentes.

4 - Recurso Provido.

(TRE-GO - RECURSO ELEITORAL nº 060072521, Acórdão, Relator (a) Des. Márcio Antônio De Sousa Moraes Júnior, Publicação: DJE - DJE, Tomo 67, Data: 19/04/2022.) (Grifei.)

 

Por outro lado, a ilicitude das gravações clandestinas não contamina as demais provas produzidas pela parte autora, consistente em vídeos de maquinários, em fotografias e no depoimento testemunhal de Omar Vanilo Rehbein, pois sobrevindas aos autos de forma autônoma e independente das gravações em tela.

Desse modo, reconheço a ilicitude das gravações ambientais clandestinas realizadas unilateralmente pela parte demandante, sem autorização judicial e sem o conhecimento dos interlocutores, razão pela qual não admitido os referidos vídeos como meio de prova no processo.

 

DESTACO.

 

CASO ACOLHIDO O DESTAQUE, PROSSIGO COM O MÉRITO (a partir da folha 39);

 

OU,

 

CASO VENCIDO O DESTAQUE, PROSSIGO COM O MÉRITO (texto na sequência).

 

III – Do Mérito.

No mérito, a prova carreada aos autos, a respeito dos fatos narrados na petição inicial, produzida pela parte demandante, consiste em vídeos de tratores da Prefeitura em atividade, gravações de conversas travadas por eleitores com interlocutor ignorado, aqui consideradas como prova lícita, fotografias e o depoimento da testemunha Omar Vanilo Rehbein.

Do acervo probatório, há um conjunto de vídeos que não envolvem a captação de diálogos, mas imagens de maquinário da Prefeitura em trabalho, extraídas, aparentemente, a partir da via pública, quais sejam:

1) “Video obras Claudio Frey 23-10-2020”, “Video obras Claudio Frey 23-10-2020 2”, “Vídeo Claudio Frey”, nos quais se visualiza uma retroescavadeira, identificada com o brasão da Prefeitura, revolvendo o terreno, diante de uma casa;

2) “Video com distribuição de cascalhos” e “Video Claudio Frey 4”, em que é exibida uma edição de jornal impresso e enfocados montes de terras depositados na via pública;

3) “Vídeo demonstrando entrega de cascalhos na Rua Silvio Pinto, 189”, no qual, após exibição de um exemplar de jornal publicado em 23.10.2020, é focalizada uma casa verde de madeiro, com cascalho e terra no chão da parte interna da entrada e da passagem e veículos;

4) “Vídeo extração cascalhos pela Prefeitura”, mostrando uma edição de jornal de 28.10.2020, com imagens aéreas de máquinas e caminhões, extraindo e transportando terra do leito de um rio; e

5) “Depósito prefeitura com cascalhos”, iniciando com o destaque de um jornal de 23.10.2020 e seguindo para um terreno vazio, com diversos montes de terras e cascalhos.

Observa-se que os vídeos em questão foram captados de maneira descontextualizada, não sendo possível aferir a data em que produzidos ou suas circunstâncias fáticas.

Desse modo, há somente imagens de tratores e caminhões em trabalho, o que não permite que se estabeleça se as atividades e depósitos de materiais apresentados consistiriam em obras ou serviços lícitos e ordinários da Prefeitura, de interesse geral, ou o favorecimento indevido de eleitores determinados com fins eleitorais.

Portanto, não é possível extrair indícios de utilização eleitoreira do aparelhamento da Administração Pública, pois o prosseguimento de obras e manutenção de vias públicas pela Prefeitura, mesmo em ano eleitoral, não caracteriza, por si, qualquer ilegalidade na esfera eleitoral.

Por sua vez, o segundo conjunto de vídeos apresentados consiste em diálogos travados com moradores locais, gravados de forma sub-reptícia, os quais eram abordados em suas próprias residências, por interlocutor cuja identidade não é explicitada nos autos.

Por pertinente, colho a transcrição da prova como trazida no parecer da Procuradoria Regional Eleitoral:

[vídeo com título “LINHA BRASIL CASCALHOS Propriedade Lisandro Staffen e Adriana Staffen” - No início do vídeo é mostrado jornal de sexta-feira, 30.10.2020, e mais adiante, a partir do minuto 2:40, o interlocutor chega entregando santinho a uma mulher, em cujo rosto a câmera fica focada]

Interlocutor: Eu sei que a senhora já tem, mas... Se não tem não quer dizer. Dia bonito hoje. Como é que tá atendido aí o Prefeito, tá bem?

Beneficiária: É (inaudível) mas é que o tempo não ajuda também.

Interlocutor: Não ajuda né?

Beneficiária: Eu não tenho do que reclamar, mas (inaudível) e logo chove e coisa, né. Tem tudo isso

Interlocutor: E o que eu ia dizer. Cascalho veio certinho ali para a senhora?

Beneficiária: Sim, veio.

Interlocutor: Quem mandou?

Beneficiária: O Lisandro pediu pro Rim. Meu marido pediu pro Rim

né. Acho que foi ... lá na Prefeitura que ele pediu né.

Interlocutor: Mas ele não cobrou nada.

Beneficiária: Não, aqui não.

Interlocutor: É, que bom que tão ajudando né.

Beneficiária: Sim, a gente precisava pra fazer o caminho, as estradas né, alagou muito com essa chuvarada e não tem como vim com trator né.

Interlocutor: E eles vão espalhar pra senhora, botar tudo direitinho?

Beneficiária: Não (Inaudível) meu marido (inaudível) para a lavoura e aí aos poucos ele vai espalhando daí.

Interlocutor: Tô só passando pra ver se estão sendo atendido (inaudível) Eles pedem para a gente passar pra ver se as coisas vieram, tudo direitinho.

Beneficiária: Não, ele pediu e no outro dia já estava aí (…)

Interlocutor: Foi o Rim que mandou isso ali?

Beneficiária: Acho eu que tem a ver com ele porque eu não sei bem certo, porque eu não tava, eu sei que foi no sábado que entregaram, foi sábado de tarde que eles entregaram. Ele pediu na Prefeitura e eles entregaram.

Interlocutor: Tá, mas se não cobraram tá bom.

Beneficiária: Não, não cobraram nada. Pelo que eu sei não cobraram nada.

 

[vídeo com título “Ivo Carlos (Adão) Boeck – Picada Ross – cascalho e brita” – sem data apontada, os participantes já aparecem conversando, com a câmera focada no rosto de um dos beneficiários]

Interlocutor: É isso é o Rim que manda, daí não pode cobrar, né?!

Beneficiário: Não, mas tava aqui.

Interlocutor: Mas ele tava aí o Rim?

Beneficiário: Sim.

Interlocutor: E ele pediu voto né?

Beneficiário: Sim, sim.

Interlocutor: E o senhor disse que vai votar nele?

Beneficiário: Capaz que não.

Interlocutor: Tem que votar, se ele deu…

Beneficiário: A minha família toda cara, meu irmão, cunhado.

Beneficiária: A família toda, só no Rim que eu ouço falar .

Beneficiário: Daqui esse redor, que eu sei mesmo…

Beneficiária: Tem um aqui no canto que não é.

Beneficiário: Aquele que tem uma casa bem em cima ali. Esse ali não.

Interlocutor: Não, se ele não cobrou nada (inaudível)

Beneficiário: Não

Beneficiária: Não

Beneficiário: Aí, ele teve aí, e eu disse: tá meio molhado, não sobe o auto aí, que eu tenho um auto né. Daí, a retro tinha me ajeitado aí [câmera mostra um declive]. Diz ele mas então ajeitemo um cascalho, e eu disse: mas tem que ser um cascalho fino homem, um ano eles me trouxeram, mas já faz anos, logo que eu vim aí de muda.

Beneficiária: Eu queria muito uma carga de brita (inaudível)

Beneficiário: Ó, pedem assim. Ó, tá ali ó [apontando]. Daí, as mais grossa o guri levou pra roça, né, que não tinha como deixar aqui

Interlocutor: Não, mas eu tô dando uma mão pra eles, eu tô vendo se eles tão trazendo as coisas certo. O Rim não teve aqui ainda depois que eles trouxeram o cascalho?

Beneficiário: Não, ainda não.

Interlocutor: Não, eu falo pra ele. Como é o seu nome bem certo

Beneficiário: Ivo Adão Boeck

Interlocutor: Ivo Adão Boeck?

Beneficiário: É. Mas eles conhecem nós, levava o filho sempre pra Santa Cruz

Interlocutor: Mas eu digo que tive aqui, que foi bem servido.

Beneficiário: sim

Interlocutor: Eles te falaram que já veio a brita?

Beneficiário: Sim [sacudindo a cabeça]

Beneficiária: Pra ele ali veio, o filho. Mas eu também queria uma carga de brita, mas agora (inaudível) que não dá mais.

Interlocutor: E eles não cobraram a brita também.

Beneficiário: Não, não. Não cobraram.

Beneficiária: Até falaram que iam trazer depois da eleição, aí a mulher foi bem franca a minha nora: se é pra ser depois da eleição então não quero porque sei que não vem mais. Dito e feito. Um olhou pro outro (...)

Beneficiário: Não, amanhã nós vamos trazer. E veio. Cedo. Oito horas tavam ali

Beneficiária: Ela disse que iam (inaudível) cedo pra adiantar.

Interlocutor: Que bom que eles pediram voto. Mas o Rim pede voto.

Beneficiário: Mas capaz homem, é nosso, eu perguntei, nós perguntemo pros conhecido ali pra cima né, aí ele disse essa vez é impossível né. Eu vou dizer a única coisa que eu tenho medo é aquele loteamento lá, porque aquele velho, dizem, não sei né, dizem que ele vai lascar dinheiro.

Interlocutor: Hein, mas do seu filho eles não cobraram a brita também?

Beneficiário: Não, não. Nada. Que nem eu disse pro Rim aquela vez, vamo ajeitar as minhas água aí, mandou, o cara veio aí, fez tudo aí, aí tava verde (…) aí ela que disse, eu não tenho cara pra pedir as coisas. Aí eu consegui a retro, pra ajeitar a água não precisava pagar e eu disse: mas eu pago, sempre paguei né? Aí agora dei cem pila pro Adãozinho (inaudível) Perguntei quanto é que deu? (inaudível) aí eu falei tá bom. Aí fiquei quieto, ele vai ter que se acusar né. Não, tô brincando. Se quiser dá alguma coisa dá, senão (inaudível). Aí ó cem, pro senhor tomar (inaudível). Mas ele não toma né.

Interlocutor: Não, tá bom, que eu vou fazer. O senhor tá feliz que não lhe cobraram nada.

Beneficiário: Olha, mas ele pode, olha, eu e o meu guri dissemos pro Rim: se nós levantar bandeira vamos largar uns foguete.

Interlocutor: Pro Rim?

Beneficiário: Pro Rim. Nessa picada...

Interlocutor: Ele ajudou, ele deu as coisas.

Beneficiário: Sim, sempre. Mas é sempre, homem. A minha família.

Interlocutor: Sempre deu as coisas.

Beneficiário: Sempre, sempre.

Interlocutor: E nunca cobrou?

Beneficiário: Nunca, nunca.

[…]

Interlocutor: É, mas vocês também dão. Ele pediu voto.

Beneficiário: Sim, mas tem que ver. É a mesma coisa o senhor agora ajuda nós, nós temos que lhe ajudar, não adianta dizer ah, eu tô aqui, numa boa, eles lá nem tô né. A única coisa que eu peço pro Rim, que tem que mudar um pouco, eles tem que ficar mais atento é essa (inaudível) né.

Interlocutor: Ajudar mais?

Beneficiário: É, dá uma melhoria num caminho da roça, não custa né, ninguém quer dado, mas ao menos tem aquela máquina, né fulano, daí faz aqui na picada, nós precisamos de uma melhoria ou tapar um buraco, ou tirar uma pedra da roça, né? Ficar mais atento. Ele fala agora na rádio. O senhor pode ver. Ele fazendo isso não precisa mais ganhar eleição.

Interlocutor: É, o importante é que ele não tá cobrando nada

Beneficiário: Não, não não. Não cobra. Tô satisfeito, tô feliz.

Interlocutor: É, ainda mais nessa época eles dão

Beneficiária: Eu disse pra um cara que chegou esses dias: eu sei que se a gente pedir uma calçada, o meu guri pediu a brita ali pra eles, ele veio e ganhou, e eu: se tu não ganhar, se tu não for eleito, vocês não vão dar dinheiro pra nós, nós não vamo repartir. Não, isso não tem ele disse, que fazer o que a gente precisa, fazer um caminho, poço, valeta, tudo (inaudível)

(...)

 

[vídeo com título “Marcos Padilha – Vandi e Marlon – Sesmaria do Cerro” - No início do vídeo é mostrado jornal de sexta-feira, 30.10.2020, e mais adiante, a partir do minuto 1:20, o interlocutor entra em contato com o morador, cujo rosto aparece apenas em uns raros momentos, de relance]

Interlocutor: Boa tarde. Tudo bom?

Beneficiário: Tudo.

Interlocutor: Essa época (inaudível). Não, eu tô dando uma passada por aí. Como é que tão, bem atendido aí?

Beneficiário: Tá tranquilo, graças a Deus.

Interlocutor: Quem será que ganha?

Beneficiário: Olha, eu espero que seja o Rim.

Interlocutor: Pois é. Mas eleição é coisa braba né? A gente não sabe nunca. Tão trabalhando bem, né?

Beneficiário: Tão trabalhando bem.

Interlocutor: E veio todo o material direitinho, o cascalho direito?

Beneficiário: Tá faltando ali no nosso corredor, nós temos uma terrinha ali embaixo, que pode trazer mais umas carga e não trouxeram ainda.

Interlocutor: Mas eles mandaram certinho?

Beneficiário: Última vez me deram uma carguinha pra botar lá (inaudível)

Interlocutor: Quem foi que mandou essa ali

Beneficiário: Ó

Interlocutor: Não foi o Pedro?

Beneficiário: Não, foi o… o Vandi, acho que foi.

Interlocutor: Não cobrou nada?

Beneficiário: Não.

Interlocutor: Tah certo então. No mais, não precisa mais nada?

Beneficiário: Por enquanto tamo tranquilo graças a deus né.

Interlocutor: E aquelas mangueiras o senhor vai usar onde?

Beneficiário: Aquelas mangueira são da rede d’água. A Prefeitura fez uma rede d’água pra nós aqui. Nós arrumamo uma vertente e eles deram uma mão né. E daí aquela ali eu tenho que atravessar aquele campo lá ó, embaixo daquela terra com um monte de eucalipto e levar pro outro morador lá.

Interlocutor: Não, eu tô visitando pra ver como é que tá o pessoal, se tá sendo bem atendido né, o quarenta

Beneficiário: É o que nós precisamos é o cascalho

Interlocutor: E eles prometeram trazer?

Beneficiário: Prometeram de trazer.

Interlocutor: Quem prometeu?

Beneficiário: O Marlon.

Interlocutor: Marlon. O Rim não prometeu nada aí?

Beneficiário: Não. Não prometeu nada.

(…)

 

[vídeo com título “RINCÃO DE FORA - VALDIR SOARES CASCALHO” - No início do vídeo é mostrado jornal de quintafeira, 05.11.2020, e mais adiante, a partir do minuto 1:09, é mostrado um pequeno monte de cascalho depositado junto a um poste de luz, na entrada que dá para uma casa. No minuto 1:40 o interlocutor entra em contato com os moradores, lançando o foco da imagem sobre os seus rostos]

Interlocutor: Com licença vizinho.

Beneficiário 1: E a nossa chuva quando é que vai vir?

Interlocutor: Vai vim logo. Boa tarde.

Beneficiário 1: Diz que tá chovendo em Porto Alegre.

Interlocutor: Mas tudo bem.

Beneficiário 1: E o que deseja?

Interlocutor: Eu tô dando uma passada por aí, ver como é que tá o quarenta por aí.

Beneficiário 1: Quarenta?

Interlocutor: [risos] Quem ganha a eleição, senhor?

Beneficiário 1: Eu tô pensando pro Bernardi e a Léia, a mulher. Tu acha que é? Eu acho que vai ganhar.

Interlocutor: Tá bom também.

(...)

[chega outra pessoa]

(…)

Interlocutor: Onde o senhor conseguiu aquele cascalho ali?

Beneficiário 1: Aquilo foi uma caçambada que eles trouxeram pra nós aí.

Interlocutor: Com quem que o senhor falou aí?

Beneficiário 1: Ô Valdir, com quem tu falou pra conseguir aquela caçambada de terra ali?

Interlocutor: Onde é que ele consegue ali

Beneficiário 2: Agora é a hora que tu consegue cascalho.

Interlocutor: Tá, mas com quem que eu falo lá?

Beneficiário 2: (inaudível) Chega com o secretário de obras e vão te dar cascalho. De onde tu é?

Interlocutor: Eu moro ali (inaudível), há poucos dias que vim morar ali. Não conheço ninguém.

Beneficiário 1: Quer dizer que bom eles ganhar a eleição, então?

Interlocutor: Não, eu não conheço na verdade nenhum.

Beneficiário 2: Tá, mas o carro tá adesivado quarenta.

Interlocutor: Não, mas os guri botaram ali eu nem sei. Até quis tirar e não consegui.

Beneficiário 1: Pra gente o que ganhar leva hein. Não é mesmo?

Beneficiário 2: (inaudível) Se tu quiser botar pedra, a hora é agora.

Interlocutor: Mas com quem será que eu falo lá?

Beneficiário 2: Fala com o Secretário de Obras.

Interlocutor: Eles que tão dando? Mas será que eles não cobram?

Beneficiário 2: A troco de voto não né. Época de eleição é assim.

Beneficiário 1: (Inaudível)

Interlocutor: De graça?

Beneficiário 2: O Secretário de Obras disse pra mim que eles tavam dando pedra pra quem eles quisessem.

Interlocutor: É? Não cobraram nada?

Beneficiário 2: Aí eu disse: não, e a minha carga que eu pedi há três mês. Bá, agora eu não tenho essa carga. Aí eu liguei pra um caminhoneiro amigo meu e no outro dia (inaudível)

Interlocutor: Como é o nome dele lá? Do Secretário de Obras?

Beneficiário 2: Eu nem sei qual é que é lá agora. Eu acho que é o Marlon. Eu acho que é Marlon.

Interlocutor: Eu vou falar com ele lá. Como é que é o teu nome?

Beneficiário: Valdir.

Interlocutor: Valdir do que?

Beneficiário: Soares.

(…)

 

[vídeo com título “SENHOR NILSON BRAATZ – LINHA BERNARDINO – CANOS DE ESGOTO” - No início do vídeo é mostrado jornal de sexta-feira, 23.10.2020, e mais adiante, a partir do minuto 5:20, o interlocutor entra em contato com o morador, lançando o foco da imagem sobre o seu rosto]

(...)

Interlocutor: Ele não tá em casa? Então eu volto outra hora, de repente amanhã cedo. Eu tive aqui ontem. Tem umas roda velha, aquele trator velho ali é dele?

Beneficiário: Não, esse é meu.

Interlocutor: Ah, o senhor não quer vender?

Beneficiário: (inaudível)

Interlocutor: E aquelas roda de ferro grande ali? Ali atrás, que o neto dele mostrou?

Beneficiário: Essa ali acho que é pra enfeite.

Interlocutor: Ah tá. Mas, lugar bonito aqui né?

Beneficiário: É. Aqui tá meio abandonado (inaudível)

Interlocutor: O senhor é irmão dele?

Beneficiário: O Márcio?

Interlocutor: É

Beneficiário: Não, meu sogro, meu genro.

Interlocutor: Ah, o Márcio é seu genro.

Beneficiário: É

Interlocutor: A entrada eu deixei o carro lá ontem, achei que não dava pra entrar, daí eles vão botar cano ali, vai melhorar daí, né?

Beneficiário: É, vão parear até depois pra lá (inaudível)

Interlocutor: Eu comprei uma chacrinha aqui em Linha do Rio e eu quero arrumar uns cano eu falei com o neto dele, um rapazinho, que tiver uns cano. Com quem será que eu falo pra arrumar uns cano?

Beneficiário: Secretaria.

Interlocutor: Com quem que ele arrumou aquele ali?

Beneficiário: Aquele ali o Rim arrumou.

Interlocutor: O Rim? Quem é o Rim esse?

Beneficiário: É o vice-prefeito.

Interlocutor: Eu queria arrumar dois só.

Beneficiário: Não, ali ele arruma.

Interlocutor: Eu até ia perguntar se não vendia. Mas o seu neto disse que bom que eles tão dando, porque eles têm que fazer isso mesmo né?

Beneficiário: É que ele é prefeito há muitos anos já. Mas é assim, um empurrando pro outro, o outro empurrando pra outro

Interlocutor: É que se tem que comprar sai tudo muito caro. Ainda bem que eles dão.

Beneficiário: Mas é. Eles tão fazendo o direito deles, o dever deles né?

Interlocutor: E um cano daquele ali sai caro?

Beneficiário: É, uns cento e poucos real né.

Interlocutor: Se tem que comprar. Mas eles dão colocado?

Beneficiário: É, aqui vão colocar né. Vão colocar

Interlocutor: E daí esse Rim eu encontro onde? É que eu sou novato ali em Linha do Rio, moro há pouco tempo, não conheço muita gente.

Beneficiário: O Rim mora aqui, do outro lado ali da escola. Pega a escolinha ali da entrada do outro lado ali da estrada. Tem a mecânica ali, do lado.

Interlocutor: E agora na época da campanha eles dão né?

Beneficiário: Dão [risos]

Interlocutor: Esse aí o seu neto falou que ele deu

Beneficiário: Deu, e vão colocar também né. E aterrar também, de fora a fora (inaudível) mas muita água né (inaudível)

Interlocutor: E se não pedir agora né...

Beneficiário: Depois nunca mais

Interlocutor: Depois nunca mais

Beneficiário: Aqui vão colocar mas nós coloquemo amanhã ou depois

Interlocutor: Ah ali já tá bom né.

Beneficiário: Ali já tá bom né. Ao menos a experiência já tem né.

Interlocutor: É, já poupou uns setecentos contos se for ver né, comprar aquilo ali

Beneficiário: É, acho que até mais

Interlocutor: Mas eles dão, mas não é deles

Beneficiário: É (inaudível)

Interlocutor: Dinheiro do governo né?

Beneficiário: É, tem dinheiro, abundante do governo

Interlocutor: E eles gastam tudo agora

Beneficiário: Tem que aproveitar né (inaudível)

Interlocutor: Pessoal tem que aproveitar. Mas eu volto amanhã ou depois. Quanto o senhor pede nesse trator ali senhor

(…)

Beneficiário: Esse aqui ó.

Interlocutor: E o seu nome por causa do trator

Beneficiário: Meu é Nilson.

(...)

Interlocutor: É que é fácil agora eu acho. Mas Rim isso é apelido

eles não podem

Beneficiário: É Arnaldo ali

Interlocutor: É como é que eu vou chegar lá chamar ele de Rim.

Beneficiário: É Arnaldo. Não, é conhecido por Rim

Interlocutor: Capaz de ficar brabo né

Beneficiário: Não. Vice dele é o Becker

Interlocutor: Mas eu vou ter que dizer que voto nele, senão eu não ganho as coisa

Beneficiário: Ah, mas tem que dizer, senão não ganha

Interlocutor: E daí o senhor vai votar nele

Beneficiário: Ah, eu vou

Interlocutor: Ah é que ganhou os cano né?

Beneficiário: Não, mas eu é meu amigo né. Sempre tá aí tomando chimarrão com nós né. Eu tenho um (inaudível) quando precisar ele me leva eu vou lá ligeiro

Interlocutor: Pois é.

(…)

[interlocutor sai e, quando retorna, pessoa entra volta de dentro da casa com um papel, entregando ao interlocutor]

Interlocutor: E não cobra nada

Beneficiário: Não, não cobra nada. É uma vez por mês ele me leva pra baixo (inaudível). Na minha terra lá (inaudível) e daí os cara lá os seis hectare querem doze mil né pra botar ela em dia. Aí eu falei com o Rim né, que a escritura é velha né. Olha eu vou gastar menos da metade eu vou gastar. Senão vou ter que gastar dois mil por hectare né. Fazer tudo novo né (inaudível). Tem o Cristiano ele é advogado né ele disse olha, quanto é que eles te cobraram eu disse que esse advogado disse doze mil né. Minha irmã pagou doze eu também por seis hectare e aí ele disse olha, tu vai gastar uns dois três conto por ali, mais ou menos. Tu vai gastar o atrasado, o atrasado não, é multa né (inaudível), mas dá uns dois conto a multa né (inaudível) mas de doze pra dois né, dá dez conto. Uma mão na roda né

Interlocutor: Mas eu acho que eu nem vou falar pra ele que eu tive aqui

Beneficiário: Não, não fala nada

Interlocutor: Que o senhor ganhou os cano. Vou chegar assim

Beneficiário: (inaudível) Vai lá ele dá

Interlocutor: Ele dá, agora ele dá?

Beneficiário: Dá. Nem fala nada ...

Interlocutor: Eu vou chegar lá e dizer que soube que aqui mora o candidato a prefeito

Beneficiário: … ah, mas tu deu pro fulano, deu pro sicrano, e pra mim não deu né

Interlocutor: Eu chego lá então, dou uma mão pra ele também

Beneficiário: Tem uma mecânica do lado ali

Interlocutor: Acho que tem umas bandeira ali

Beneficiário: Aí tu chega ali, tem uma mecânica, mas acho que hoje não tão. Mas dia de semana tu chega ali. Mecânica do lado (inaudível)

Interlocutor: Então tá, obrigado aí.

 

[vídeo com título “Ilko Thiesen 30-10-2020 canos Linha Brasil, interior Candelaria” - No início do vídeo são mostrados canos depositados na via e, a partir do minuto 0:50, o interlocutor entra em contato com o morador, lançando o foco da imagem sobre o seu rosto]

Interlocutor: Tô aqui de novo vizinha. Como é que é o seu nome pra eu dizer lá. Que eles tem que vir colocar esse cano. Não adianta dar os canos e deixar atirado aí. Eu até tirei uma foto ali aí eu mostro e falo com o ...

Beneficiário: Eles até vieram, quando eles largaram esses cano aí, aí eles vieram pra botarem na entrada, aí disseram “esses cano têm que ser trocado, é muito fino, não adianta”

Interlocutor: Milton?

Beneficiário: Ilko Thiesen.

Interlocutor: Ilko?

Beneficiário: É. Thiesen.

Interlocutor: Tá. Quanto tempo faz que o Rim mandou esse ali?

Beneficiário: É, acho que uns dois mês.

Beneficiária: Tem já uns dois três mês faz que ele mandou esses cano ali. Mas tinha que ter botado uns cano grosso ali

Beneficiário: Aí veio os cara da prefeitura largar o cano, aí eles disseram “não, esse cano não adianta, tem que botar um quarenta aí”, um cano mais grosso né, aí eles “não, pode ficar com esse cano que eu vou mandar outro aí”. Porque eu tenho a minha entrada ali que também não tem cano né. Aí o Rim disse “não, fica com esses cano fino (inaudível)

Interlocutor: Não, aí eu vou falar direto com ele. Quem que lhe mandou mesmo?

Beneficiário: O Rim.

Interlocutor: Tá.

Beneficiária: O Rim e o Gilvan vieram aí.

Interlocutor: (inaudível)

Beneficiária: É cascalho, o que nós pedimo pra ele fazer, porque o (inaudível) tá sem entrada (inaudível)

Beneficiário: Ele mora ali. Ele tá trabalhando hoje.

Interlocutor: Mas se ele não lhe cobrou tá bom. Daí agora eles não vão ter que botar. Mas aí eu vou lá e vou falar pra eles lá. Tá bom. Obrigado senhor.

 

[vídeo com título “CAMINHO DE CASCALHO Marcos Rosa – Rua Silvio Pinto, 189” - No início do vídeo é mostrado jornal de quarta-feira, 28.10.2020, e mais adiante, após o interlocutor andar e passar por uma casa verde e outra branca, chega a uma casa verde, e, novamente, volta-se para a casa branca, em cuja direção bate palmas, a partir do minuto 2:45, entra em contato com o morador, propondo a compra de um banquinho, e, após conversa, no minuto 4:21 introduz o assunto]

Interlocutor: E falou com o rapaz ali?

(...)

Interlocutor: Se soubesse alguma coisa, mês que vem eu acho que vou botar um negócio lá, aí qualquer coisa dá um pulo aí. Querendo voltar a trabalhar aprende né.

Beneficiário: Não, mas é. [chama o vizinho]

(...)

Interlocutor: Mas ele não tá (...) Tá, mas eu vou voltar aí [mostra a casa verde da entrada]

Beneficiário: (inaudível) aí eu pergunto já pra ele aí (…) [dirigem-se para uma casa branca mais à frente]

Beneficiário: Qualquer coisa me dá um toque aí se precisar de mim tá?

(...)

[6min16seg]

Interlocutor: Mas é bem boa essa pedra aqui viste.

Beneficiário: É boa, choveu não vem nenhum barrinho

Interlocutor: O Rim tá fazendo sucesso então.

Beneficiário: Tá fazendo um sucesso, ele tem que ganhar (inaudível) do outro lado né, tem que fazer alguma coisa agora

Interlocutor: E ele não fica brabo de chamar de Rim?

Beneficiário: Não, não, é o apelido dele né?

Interlocutor: Tu trabalha pra ele?

Beneficiário: Não, não. Só sou conhecido aqui. Não tão conhecido...

Interlocutor: Ele gosta de dar as coisa assim?

Beneficiário: Tem que falar com ele.

Interlocutor: Mas de repente ele não vai me negar.

Beneficiário: Não, agora na política eles não vão negar.

Interlocutor: Eles dão né?

Beneficiário: Eles dão. Eu vou chamar o senhor que o senhor deve saber onde (inaudível) na Prefeitura

[começam a caminhar]

Interlocutor: Eu guardei o papel que tu me deu. Eu vou lá amanhã ou depois

Beneficiário: Quem acha que ganha a eleição?

Interlocutor: Mas nem sei.

Beneficiário: Ô, Telmo. Chega aí, por favor. Tava dormindo, rapaz? É hora de dormir? [a câmera dirige-se para uma casa verde de madeira, de onde sai

uma pessoa]

Interlocutor: Boa tarde

Beneficiário 2: Boa tarde.

Beneficiário: Não sabe de onde surgiu esse cascalho? É da Prefeitura né?

Beneficiário 2: É da Prefeitura.

Beneficiário: Falar com o Rim né?

Beneficiário 2: É.

Interlocutor: Eu vim olhar um banquinho ali que de repente ia gostar. Teu parente?

Beneficiário: Não.

Interlocutor: E, é o candidato a prefeito mesmo que arruma?

Beneficiário 2: É.

Interlocutor: Como é que é o nome dele?

Beneficiário: É o Rim.

Beneficiário 2: O Rim.

Interlocutor: E ele tá dando será ou tem que pagar?

Beneficiário 2: Não, ele tá dando.

Interlocutor: Será?

Beneficiário 2: Aham

Beneficiário: É época de eleição né. Eu falei pra ele.

Interlocutor: Será que ele deu isso aqui?

Beneficiário 2: É dado

Interlocutor: Mas com é que é o nome dele mesmo. Pra não chamar de Rim.

Beneficiário 2: É eu conheço ele por Rim.

Beneficiário: É Nestor alguma coisa né? Nestor Rim

Beneficiário 2: Alguma coisa assim

Interlocutor: Chamar de Rim mesmo.

Beneficiário 2: Todo mundo chama ele de Rim

Interlocutor: Fazer o que. É bem boa a pedra aí

Beneficiário: [olhando para o chão] mas é ô, não tem um barrinho cara.

Interlocutor: E nessa época eles dão mesmo né.

Beneficiário 2: Dão.

Interlocutor: Não deram mais nada aqui? Se não deram nada de cano, essas coisas.

Beneficiário 2: Não, foi só pedra

Beneficiário: Eu fui lá falar com o Jean, mas foi quase certo que foi cara, foi o Rim.

Beneficiário 2: Foi.

Beneficiário: Inaudível.

[câmera desce e mostra o cascalho no caminho próximo à cerca]

(...)

 

[vídeo com título “Vídeo Izadi dos Santos Machado sesmaria do cerro – manga Pedro Moraes” - No início do vídeo é mostrado jornal de sexta-feira, 23.10.2020, e, a partir do minuto 2:28, entra em contato com a moradora]

Interlocutor: Com licença. Boa tarde. Chovendo aí também. Boa tarde vizinha.

Beneficiária: Boa tarde, entra pra cá, entre.

Interlocutor: Com é que tá a senhora. Tá bem?

Beneficiária: Vai se levando

(...)

Interlocutor: A senhora me arruma um copo d’água? Eu ando vendo como é que tá as propaganda política aí, comprando alguma coisa antiga

Beneficiária: É?

Interlocutor: A senhora não tem panela velha, essas coisas pra vender aí?

Beneficiária: Pior que agora acho que não tem, né.

(...)

Interlocutor: Como é que ficou a água da senhora aí?

Beneficiária: Ficou boa.

Interlocutor: Chegou os cano que eles arrumaram?

Beneficiária: Chegou. Só que nós não tinha ainda o pé da caixa, como arrumar, né, e coisa, mas tem uma torneirinha ali daí. O senhor é quem?

Interlocutor: Eu sou José da Silva. Eu trabalho na campanha, até o Pedro mandou uns santinho aqui pra senhora. A senhora deve ter ganhado um material do quarenta. Ele arrumou uns cano pra senhora né?

Beneficiária: Aham (…) Umas manga né

Interlocutor: E a senhora não sabe alguém que precise alguma coisa?

Beneficiária: Não. Não sei.

Interlocutor: E a senhora ficou bem servida? Não faltou mais nada?

Beneficiária: Faltou o pé da caixa a bem dizer né.

Interlocutor: E ele vai, lhe prometeu?

Beneficiária: Não. Não me prometeu.

Interlocutor: Então tá bom. Mas ele perguntou se precisasse mais alguma coisa. O pé da caixa?

Beneficiária: É, o pé da caixa que nós (inaudível). Aí nós tivemo que ficar com a torneirinha ali

Interlocutor: Mas se ele arrumou os cano ele arruma com certeza

Beneficiária: Pois é.

Interlocutor: Vou falar com ele. Quantos metros de manga?

Beneficiária: Cento e vinte foi né mana? Cento e vinte acho

Interlocutor: E ele não lhe cobrou nada?

Beneficiária: Até aqui não, até aqui não falou nada. Eu mesma nem vi ele, né, foi o guri do Danilo que teve aí, depois a minha guria tava quando tiveram aí. Eu nem conheço pessoalmente ele

Interlocutor: Não, mas com um presente desses a senhora vai votar

Beneficiária: Ah… quem ajuda a gente, né. Dá uma mão pra gente né.

Interlocutor: Bá, se ele deu de bom gosto

Beneficiária: Pois é.

Interlocutor: É, e nessa época precisa do voto né?

Beneficiária: Claro. Mas senta um pouco

Interlocutor: Não, mas eu tô meio com pressa (inaudível) se a senhora precisar de alguma coisa. A senhora fala. É o pé da caixa que a senhora precisa?

Beneficiária: É o pé da caixa

Interlocutor: É, mas com certeza ele vai arrumar. Só tem que falar.

Beneficiária: Pois é. É, tem que falar porque, claro, ele não sabe o que a gente precisa né?

Interlocutor: E a senhora falou pra quem que ele arrumou as manga?

Beneficiária: Nós nem falemo com ninguém. Quem veio aqui foi o guri do Danilo né? E daí perguntou como é que nós tava com. Ele sabia que nós não ia ter como botar agora puxar a água pra baixo que nós tinha as manga, né? Daí ele veio aqui, conversou com o Paulo, daí. Aí o Paulo disse não, se ele arrumasse né. Pra nós tava bem bom e aí nós dava uma força pra ele também né?

 

[vídeo com título “Vídeo Luiz Paulo Machado Sesmaria do cerro – manga Pedro Moraes” - No início do vídeo é mostrado jornal de sexta-feira, 30.10.2020, e, a partir do minuto 1:30, entra em contato com o morador]

Interlocutor: Ah, mas aqui tem uma sombra bem boa. Até dá pra sentar um pouco. Boa tarde.

Beneficiário: Boa tarde.

Interlocutor: Eu tive aqui e falei com a sua esposa eu acho, dá pra sentar um pouquinho na sombra?

Beneficiário: Dá (inaudível) quer pegar uma cadeira?

Interlocutor: Não, aqui tá bom. Isso aí é pouco tempo. Eu estive pra pegar o seu nome. Eles não mandaram o pé da caixa

Beneficiário: Não.

Interlocutor: Só as mangueira veio?

Beneficiário: Só as mangueira.

Interlocutor: Ela falou eu falei lá com eles. Só que daí eu cheguei lá e não peguei o nome dela. Como é que é o seu nome?

Beneficiário: Meu nome é Luiz Paulo Machado

Interlocutor: Luiz...

Beneficiário: Paulo Machado

Interlocutor: Aqui é?

Beneficiário: Sesmaria do Cerro

Interlocutor: No mais tudo bem?

Beneficiário: Tudo bem.

Interlocutor: Lugar bonito aqui né?

Beneficiário: É bom. É meio quieto né

Interlocutor: E o Pedro tem aparecido aqui?

Beneficiário: Ele veio de manhã e eu não tava.

Interlocutor: Mas ele disse que ia mandar. Era pra saber certo onde é que é. Ele disse não, tu deu as manga lá. E o Rim não apareceu?

Beneficiário: Não, o Rim veio e eu não tava também (inaudível)

Interlocutor: Mas a mangueira foi o Pedro que deu?

Beneficiário: Foi. Foi o Pedro. Tá aí olha, tá do lado aí.

Interlocutor: Ele não cobrou nada?

Beneficiário: Não.

Interlocutor: Então tá bom. Mas ele já era pra ter mandado isso, mas depende vem amanhã ou depois. Ele vai lá ver o nome, o seu endereço que eu vou mandar.

Beneficiário: Não, não tem problema (inaudível) do Rim tá bom né?

Interlocutor: É agora eles têm que dar alguma coisa

Beneficiário: É, se não der agora [risos] depois é complicado né.

Interlocutor: E o voto ele pediu também?

Beneficiário: Ah, pediu. Não, o voto ele pediu.

Interlocutor: E pro candidato a prefeito ele pediu também?

Beneficiário: Bom, eu não tava mas (inaudível), falou decerto pra mulher, eu não tava (inaudível)

Interlocutor: E qual é o seu candidato a prefeito?

Beneficiário: Mas eu não sei eu tô meio

Interlocutor: Tá indeciso?

Beneficiário: To indeciso. Eu não sei. Qual é que vou. Eu não sei. Eu não tenho certeza pra votar mas eu sempre gostava que o Rim ganhasse.

Interlocutor: É?

Beneficiário: Porque ele sempre nos (inaudível) sabe? Não é só agora. Com nós, na cidade, sempre (inaudível), sempre, a vida toda

Interlocutor: É, tão mandando as coisa né?

Beneficiário: (inaudível) é aqui fora nem tanto, mas na cidade ele sempre ajudava. (inaudível) de Natal, ele arruma as coisa, (inaudível) sempre ajudando né? Primeira Dama

Interlocutor: Então foi a sua mulher que tava em casa aquele dia. O senhor nem falou com ele (inaudível)

Beneficiário: Não

Interlocutor: Como é que é o nome dela então?

Voz ao fundo: (inaudível)

Beneficiário: É ela. Izadi.

(…)

 

Sobre o cascalho, Adriana Staffen relata que seu marido (Lisandro Staffen) “pediu pro Rim”, “lá na Prefeitura que ele pediu né”, “Ele pediu na Prefeitura e eles entregaram”, mas que “não cobraram nada”, mas sem referir pedido de voto. Ao final, novamente questionada sobre o responsável pelo envio dos materiais, a eleitora demonstra incerteza, dizendo: “acho eu que tem a ver com ele porque eu não sei bem certo, porque eu não tava (...). Ele pediu na Prefeitura e eles entregaram”.

Ivo Adão Boeck afirmou, em relação às cargas de cascalho e brita, que “é o Rim que manda, daí não pode cobrar, né?!”, que “Sempre deu as coisas”, bem como responde positivamente à indagação “E ele pediu voto né?”. Porém, não é possível depreender se o pedido de voto teria ocorrido no mesmo contexto em que prometidos os materiais ou se teria ocorrido em outra circunstância, em simples proselitismo eleitoral, sem qualquer condição ou oferta correlacionada de voto. Em sequência, relata outros benefícios que teriam sido alcançados pela atuação de “Rim”, referindo: “que nem eu disse pro Rim aquela vez, vamos ajeitar as minhas água aí, mandou, o cara veio aí, fez tudo aí” e “eu sei que se a gente pedir uma calçada, o meu guri pediu a brita ali pra eles, ele veio e ganhou”.

De seu turno, Marcos Padilha atribui a carga de terra entrega em sua propriedade ao “Vandi”, complementando, ainda, que “a Prefeitura fez uma rede de d’água para nós aqui” e que havia uma promessa de trazer cascalho, feita por “Marlon”. Por fim, disse que o “Rim” não prometeu nada.

Da mesma forma, Valdir Soares esclarece que a carga de cascalho pode ser obtida com o Secretário de Obras e que “se quiser botar pedra, a hora é agora” e que “o Secretário de Obras disse pra mim que eles tavam dando pedra pra quem quisessem”. E que seria “a troco de voto”, pois “época de eleição é assim”.

Percebe-se que essa última afirmação não se relaciona ao caso específico do eleitor Valdir, que não relata ter sido solicitado o seu voto como condição para as entregas e, inclusive, revela incerteza sobre o resultado das eleições, afirmando: “eu tô pensando pro Bernardi e a Léia, a mulher” e, sobre o adesivo em seu carro, refere que “mas os guri botaram ali, eu nem sei. Até quis tirar e não consegui”. Por fim, informa não ter certeza do nome do Secretário de Obras, referindo: “Eu nem sei qual é que é lá agora. Eu acho que é o Marlon. Eu acho que é Marlon”.

Nilson Braatz conta que conseguiu canos com o “Rim”, que também é seu amigo e sempre está tomando chimarrão com ele, conforme relata. Destaca-se, nessa conversa, que, em relação ao pedido de votos, o eleitor limita-se a concordar com os aspectos trazidos pelo interlocutor, sem formular ou agregar elementos à ideia posta, tais como: “Interlocutor: Mas eu vou ter que dizer que voto nele, senão eu não ganho as coisa / Beneficiário: Ah, mas tem que dizer, senão não ganha”.

Em relação a Ilko Thiesen, igualmente, a conversa envolve os canos que teriam sido enviados por “Rim” e que “veio os cara da prefeitura largar os cano”. Ao interlocutor perguntar como poderia conseguir benefício semelhante, o eleitor indica: “ele mora ali. Ele tá trabalhando hoje”.

Na conversa com Marcos Rosa, também é dito que o cascalho foi obtido com a Prefeitura, com o “Rim”, relacionando a facilidade na obtenção do material com o período eleitoral: “agora na política, eles não vão negar”. O enunciado, porém, não se vincula a fatos determinados, o que lhe confere ares de uma mera suposição pessoal. Além disso, indagado sobre “quem acha que ganha a eleição”, o eleitor responde: “mas nem sei”.

Por sua vez, no diálogo travado com Izadi dos Santos Machado, é o interlocutor que inicialmente sugere que “a senhora deve ter ganhado um material do quarenta. Ele arrumou uns cano pra senhora, né?”, o que é confirmado com um singelo “Aham”. Em sequência, a eleitora manifesta que, apesar dos canos, faltou o “pé da caixa”. Perguntada se também lhe prometeram, responde: “não, não me prometeu”. Indagada sobre quem arrumou as mangueiras, a eleitora afirmou que “quem veio aqui foi o guri do Danilo” e que “o Paulo disso não, se ele arrumasse né. Pra nós tava bem bom e aí nós dava uma força pra ele também né?”.

Luiz Paulo Machado, marido de Izadi, relaciona entrega das mangueiras para escoamento de água ao “Pedro”. Sobre suposto pedido de voto, traz uma informação contraditória, dizendo que “o voto ele pediu” e, após, indagado sobre o candidato a prefeito, afirma “bom, eu não tava”, “falou decerto pra mulher, eu não tava”. Quanto à preferência pessoal do eleitor, diz “tô indeciso. (...). Eu não tenho certeza pra votar, mas eu sempre gostava que o Rim ganhasse”.

Em relação ao próprio interlocutor que abordou os supostos eleitores, não há informação nos autos sobre a sua verdadeira identidade, impossibilitando a sua oitiva em juízo para melhor esclarecer as circunstâncias das conversas, bem como dificultando o exercício efetivo do contraditório pelos demandados.

Ressalta-se que, perante os eleitores Adriana Staffen, Marcos Padilha e Ilko Thiesen, o interlocutor se apresenta como integrante da campanha do candidato Nestor (“do quarenta”), inclusive distribuindo santinhos para Adriana e fazendo certo grau de enaltecimento eleitoral com os demais munícipes, sugerindo, concomitantemente, ser também um agente da Prefeitura responsável pela distribuição de benefícios.

Em relação a outros cidadãos, o interlocutor se identifica como mero munícipe interessado em tirar proveito do processo eleitoral para obter prestações dos candidatos ou da Prefeitura, como ocorreu com Ivo Carlos Boeck, Valdir Soares e Marcos Rosa, Telmo Ávila e Luiz Paulo Machado, ou como visitante a procura de itens rurais para compra e venda, o que se deu diante de Nilson Braatz (rodas de trator) e Izadi dos Santos Machado (panelas velhas).

Da análise das conversas, depreende-se, de forma geral, que as respostas dadas pelos cidadãos são induzidas pelo interlocutor, o qual já delimita suas frases em um contexto de proveito particular dos serviços da Prefeito, com sugestões de compra de votos e intermediação do candidato “Rim”, a exemplo, dos trechos: “cascalho veio certinho ali para a senhora?”, “Foi o Rim que mandou isso alí?” (para Adriana Staffen); “É isso é o Rim que manda, daí não pode cobrar, né?!”, “E ele pediu voto né?”, “Tem que votar, se ele deu…” (para Ivo Boeck); “E veio todo o material direitinho, o cascalho direito?”, “O Rim não prometeu nada aí?” (para Marcos Padilha); “E agora na época da campanha eles dão né?” (para Nilson Braatz); “Quanto tempo faz que o Rim mandou esse ali?” (para Ilko Thiesen), dentre outros.

Portanto, ainda que se entenda pela licitude do meio, a prova em questão é frágil, duvidosa e produzida de forma unilateral pela parte demandante, por meio de ardil e fraude, uma vez que os eleitores foram enganados sobre a efetiva identidade do interlocutor e sobre suas intenções, com evidente abuso de confiança, violação à boa-fé e infringência ao art. 369 do CPC.

Na doutrina, Luiz Francisco Torquato Avolio anota que a prova produzida com deslealdade e emprego de artifícios fraudulentos rompe com o padrão ético vigente e com a índole dialética do processo, ficando desprovida de força probante, aduzindo que:

De nossa parte, temos como eloquente exemplo de prova imoral a gravação unilateral de conversa (gravação clandestina ou ambiental) em que o autor da gravação dirige ao interlocutor perguntas capciosas para lograr respostas induzidas, que, num falso contexto, poderiam fornecer-lhe versão dos fatos favorável aos seus intentos. (AVOLIO, Luiz Francisco Torquato. Gravações clandestinas e ambientais no processo civil: as provas imorais. Revista dos Tribunais, São Paulo, v.92, n.818, p. 47-64, dez. 2003)

 

Na mesma senda, a lição de Cássio Benvenutti de Castro, ao tratar da eticidade ou moralidade da prova, assevera que, “quando um dos interlocutores prepara ou efetua um ardiloso cenário para o debate, a prova torna-se imprestável, porque violenta a ética da reciprocidade na confiança entre os sujeitos” (CASTRO, Cássio Benvenutti de. O compromisso de dinamização da prova civil. Revista Jurídica Luso-Brasileira, Ano 5 (2019), nº 2, p. 1135).

A debilidade da força probatório das filmagens é reforçada pelo fato de que nem o interlocutor e nem os referidos eleitores tiveram suas declarações ratificadas perante o juízo, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, oportunidade em que poderiam melhor esclarecer as colocações expostas na conversa, de forma objetiva, solene e comprometida, após qualificadas e juramentadas, facultando-se eventuais contraditas pela parte adversa.

Salienta-se, quanto ao ponto, que, embora alguns dos eleitores mencionados tenham sido inicialmente arrolados na petição inicial, a oitiva das testemunhas foi dispensada pelos próprios demandantes, sob a justificativa de dificuldades operacionais para a realização de audiência virtual e por considerar a prova já acostada suficiente para comprovar os fatos (ID 41344933).

No aspecto, não prospera a alegação de que os demandados consentiram com a veracidade das narrativas contidas nos diálogos captados, porquanto se teriam limitado a suscitar a ilicitude da prova, sem impugnar o seu conteúdo material.

Em realidade, paralelamente à defesa da ilicitude da prova, a parte demandada sustentou, em contestação (ID 41342933) e alegações finais (ID 41345883), que “o interlocutor que gravou usou de ardil, se passando por pessoa que não era, falseando a verdade no diálogo com os outros interlocutores, o que é vedado pela legislação vigente”, bem como expressamente impugnou as fotografias e filmagens juntadas aos autos, admitindo apenas que é comum os agricultores procurarem a Prefeitura para melhorias em suas localidades, mas negando qualquer tipo de favorecimento individual a pessoas ou propriedades particulares.

Dessarte, impugnadas as gravações em forma e em conteúdo e limitado o contraditório substancial sobre a prova, não pode ser emprestado aos diálogos a mesma força probatório que seria atribuível à prova testemunhal, ou outra equivalente, produzida sob as garantias do devido processo legal.

Sequer é possível ter certeza dos aspectos temporais ou contextuais das filmagens e não há elementos pelos quais se possa concluir de modo minimamente razoável sobre a parcialidade e a real qualificação de todos os pretensos eleitores entrevistados.

De seu turno, os demandados alegaram que o então Vice-Prefeito Nestor Rubens Ellwanger, conhecido como “Rim”, estava licenciado da função na época dos fatos, a fim de dedicar-se à campanha eleitoral, não podendo ordenar ou conceder tais benesses às pessoas referidas.

Sustentaram, ainda, que as melhorias em estradas, entradas, vielas, bueiros e acessos, bem como a instalação de redes de água, via tubulações e mangueiras, são realizadas de forma contínua pela Prefeitura, ano após ano, nas comunidades rurais, inclusive por solicitação dos agricultores, atividade que não guarda relação direta com compra de votos ou abuso do poder econômico e não poderia ser interrompida em ano eleitoral.

Em acréscimo, os demandados carrearam aos autos declarações escritas, com firma reconhecida em Tabelionato de Notas, nas quais os eleitores agregam aspectos concernentes às conversas gravadas, acompanhadas de algumas fotografias dos locais mencionados (ID 41343483).

No documento, Adriana Braatz declara que mora na localidade de Linha Bernardino, “onde tem uma sanga que não tem passagem para minha casa, não restando a opção de vir a secretaria e pedir ao secretário canos e providências”. Relata que tem um filho “que esta estudando e tem que passar todos os dias pela sanga as vezes em tempos chuvosos tem que passar pelo vizinho onde já foi mordido por cachorros e com os calçados na mão para colocar do outro lado para chegar seco a escola” (ID 41343033).

Ilko Thiesen declara que foi à Secretaria de Obras “a uns três ou quatro meses atrás pedir um bueiro em frente a minha propriedade que tinha uma valeta para entrar para minha casa da água da chuva, então veio os canos” (ID 41343083)

Por sua vez, Ivo Adão Boeck declarou ter recebido uma visita de um senhor em um carro Fiat Uno Vermelho, dizendo-se ser da Coligação do “Rim”. Afirmou que não consegue entrar com caminhão na entrada de sua propriedade para carregar fumo em razão do barro, tendo procurado “Rim” para falar sobre uma carga de pedra, ao que lhe foi dito que “em época de campanha não posso me envolver, deixa passar a eleição e fala com o Secretário” (ID 41343133).

Jeferson Fernando Cezar declara ser filho de Danilo Luiz Cezar e que entregou algumas mangueiras que tinha sobrando para o casal Luiz Paulo Machado e Izadi dos Santos Machado, em troca de serviço na colheita do fumo, pois “eles estavam precisando para encanar água de uma nascente para sua sobrevivência e matar a sede dos animais”, bem como que “em nenhum momento foi falado em troca de mangueiras por votos” (ID 41343183).

O eleitor Luiz Paulo Machado firma declaração em que confirma a narrativa sobre a negociação de mangueiras por serviços de colheita de fumo. Relata, também, que conversa sobre política com Jeferson Fernando Cezar, que é apoiador de Pedro para a Câmara de Vereadores, mas que a obtenção dos materiais não foi em troca do voto (ID 41343333).

Desde já, as contradições e incertezas verificadas nas gravações de diálogos de Izadi e seu marido são esclarecidas a partir das declarações firmadas por Luiz Paulo Machado e Jeferson Fernando Cezar, filho de Danilo Kuiz Cezar, no sentido de que as mangueiras foram entregues como parte de um negócio ajustado entre este último e o casal de eleitores, em troca de trabalho na colheita de fumo, snedo que Pedro somente teria sido mencionado em conversa paralela travada entre Luiz Paulo e Jeferson, envolvendo a política local e as preferências eleitorais, não havendo relação dos materiais negociados com a prefeitura ou com o candidato Pedro.

De seu turno, José Cláudi Frey assevera que ocorreu infiltração da canalização de esgoto por baixo da sua casa e que “deu um buraco em frente da casa, bem na caixa dos canos, bem em frente a minha garagem e a prefeitura levou uma carga de cascalho para colocar no buraco para mim ter entrada” (ID 41343233).

Lisandro Staffen afirma que “fez pedido na secretaria da agricultura de uma carga de cascalho no começo do ano para ajeitar a entrada que estava um atoleiro e os caminhões de fumo não conseguiam entrar (...) e tem uma sanga que sai para fora nas cheias do inverno, levando o cascalho todo para a sanga, ficando os buracos e atoleiros”. Declarou, ainda, que procurou o “Rim” e “ele disse que não poderia se envolver que estava em campanha, mas me disse que eu tinha que ir falar com o secretario” (ID 41343283).

Marcos Padilha subscreve termo narrando que a Prefeitura está fazendo uma rede de água em sua localidade de Sesmaria do Cerro, onde planta fumo, e, que guardou, em seu galpão, as mangueiras utilizadas na obra pública. Outrossim, declara que pediu cascalho ao Secretário Vandi, “porque estou guardando as mangueiras da rede de água a pedido dele e, na oportunidade que ele foi me pedir para guardar, foi quando mostrei o atoleiro que estava e não tinha condições do caminhão encostar para carregar fumo” (ID 41343383).

No último documento firmado, Valdir Luis Soares informa que, embora tenha dito na conversa captada que achava que Secretário se chamava Marlon, na verdade, solicitou o cascalho com o Secretário Gilvam, “porque minha entrada já não dava mais para chegar em dias de chuva, virou um atoleiro, e depois de março quando a prefeitura me levou graças a Deus ficou bem, até sobrou um pouco de cascalho que está em cima do barranco para eles usar na estrada” (ID 41343433).

Por sua vez, a prova oral produzida em juízo restringe-se à oitiva de Omar Vanilo Rehbein (ID 41345633), o qual se declarou ser pedreiro e residir há mais de 30 anos no Município, confirmando que houve uma movimentação anormal de máquinas públicas carregando cascalho, areia, terra e brita, pouco antes das eleições, em diversos locais, inclusive em espaços privados. Afirmou que “era uma loucura” e que “isso era meio geral”, bem como que presenciou “eles descarregando foi na frente da minha casa”: “eu vi descarregando, eu tava fazendo uma obra, na Linha Fátima, ali veio mais de 20 cargas de cascalho e aterro”, confirmando que a foto colacionada na folha 6 da petição inicial corresponde à casa localizada em frente à sua. Disse que entrega ocorreu em espaço particular e que “tá lá hoje para olhar”. Afirmou que tudo ocorreu “a troco de voto”, conforme lhe disseram os vizinhos com quem conversou. Relatou que “ali na Linha Fátima, onde a nós tava construindo, ali veio muito cascalho e aterro, até o prefeito chegou lá, esse, o candidato, chegou lá, (...) durante a entrega, (...), na Linha Fátima”. Indagado sobre os vizinhos que teriam admitido o recebimento de cascalho em troca de votos, referiu que: “um é o Rosa, o rapazinho, moreno” e que ou outro se mudou e não sabe para onde ele foi.

Pois bem.

Em relação à suposta captação ilícita de sufrágio, as gravações clandestinas não se permitem que se extraia de forma firme e segura que os benefícios vinham sendo distribuídos sob a condição do voto em favor dos recorridos.

As referências feitas a respeito de eventuais pedidos nesse sentido são superficiais, genéricas e descontextualizadas, sendo relacionados a impressões pessoais e suposições advindas da época de campanha, em que é comum ao cidadão médio pensar que a Administração Pública emprega mais esforços em sua atividade e evita descontentar seus potenciais eleitores.

Quanto ao ponto, adoto a lúcida manifestação da Procuradoria Regional Eleitoral:

Destarte, no que se refere à captação ilícita de sufrágio, não há uma demonstração de que tenha havido a negociação do voto do eleitor com os candidatos investigados ou com os secretários municipais. O mais próximo que se chega disso seria o relato feito pelo eleitor Ivo Boecker, quando, no início da gravação, afirma que o candidato “Rim” esteve em sua casa e pediu voto. Porém, o trecho da conversa, neste ponto, é bastante curto e não se tem o início da conversa para entender adequadamente o contexto. É dizer, o eleitor poderia estar se referindo ao momento em que o candidato “Rim”, em ato de campanha, compareceu à sua casa e pediu voto, sem que tenha havido uma vinculação desse pedido aos materiais entregues.

 

Da mesma forma, o depoimento de Omar Vanilo Rehbein, em relação à compra de votos, não confere suporte a um decreto condenatório, pois, ainda que mencionando que a atividade da Prefeitura ocorria “a troco de voto”, trata-se mera dedução pessoal e genérica, não amparada por qualquer outro elemento idôneo de prova.

Destaca-se que a própria testemunha assumiu que não presenciou pessoalmente algum fato envolvendo a mercancia do voto, mas que apenas ouviu de vizinhos, os quais sequer teve êxito em identificar de modo assertivo e razoável, sendo, tal circunstância, suficiente para se concluir pela fragilidade da prova sobre o aspecto em tela.

Quanto ao ilícito em questão, é assente na jurisprudência que “para que seja caracterizada a captação ilícita de sufrágio, é necessária a demonstração do especial fim de agir consistente no condicionamento da entrega da vantagem ao voto do eleitor” (TSE - RO: 000796257, Relator: Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJE de 09.02.2017), o que não ocorre de forma inconteste nos autos.

Desse modo, diante da ausência de provas robustas e contundentes que demonstrem a compra ou negociação do voto ou o condicionamento de benefícios ao voto, deve ser mantida a sentença de improcedência da demanda em relação à imputação de captação ilícita de sufrágio (art. 41-A da Lei n. 9.504/97).

Em relação ao enquadramento dos fatos como conduta vedada (art. 73, inc. IV e § 10, da Lei das Eleições) e abuso do poder político e econômico, igualmente, julgo que o arcabouço probatório é por demais deficiente para embasar um decreto condenatório.

Cumpre repisar, os vídeos reproduziriam declarações realizadas por pessoas simples, residentes em área rural de pequena cidade do interior, que desconheciam estarem sendo gravadas e que diálogo viria a ser utilizado em procedimento judicial.

Assim, a compreensão das falas deve considerar exageros e simplificações, comuns na conversa informal e despretensiosa, havidos também pelo excesso de confiança com o interlocutor, que mascarou sua verdadeira identidade e suas intenções com a indução da conversa.

Nas gravações de diálogos, os eleitores Adriana Staffen, Ivo Adão Boeck, Nilson Braatz, Ilko Thiesen, Marcos Rosa e Telmo D’Ávila relacionam a obtenção dos itens a pedidos dirigidos ao “Rim”.

Por outro lado, nas declarações escritas, Adriana Braatz e Ilko Thiesen corrigem-se, dizendo os pedidos de providências foram feitos à Secretaria de Obras. Por sua vez, Adão Boeck assevera que “Rim” teria lhe dito que “em época de campanha não posso me envolver, deixa passar a eleição e fala com o Secretário”.

O conjunto probatório, que, conforme anteriormente analisado, deve ser avaliado com redobrada cautela, é insuficiente, vago e contraditório sobre o envolvimento de “Rim”, não permitindo precisar, em cada hipótese, com certeza mínima, como o candidato teria explorado as supostas condutas para promoção pessoal ou como teria feito a referida intermediação, ou mesmo a época em que ocorreram.

Não é possível distinguir, em cada caso, se as referências envolvem uma ação concreta do então candidato no seio da Administração Pública, de cunho eleitoreiro, ou se apenas eram prestadas orientações aos cidadãos que lhe buscavam sobre os órgãos e procedimentos para as solicitações administrativas em questão.

Em verdade, não se pode concluir sequer se as afirmações sobre maior facilidade de obtenção de benefícios com o candidato Nestor decorreram de condutas certas e determinadas ou consistem em meras explanações e suposições, mas lançadas em tom categórico, na ausência de qualquer maior pretensão, em uma conversa informal e privada.

No tocante às condutas vedadas, a norma legal alegadamente violada tem a seguinte redação:

Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:

(...).

IV - fazer ou permitir uso promocional em favor de candidato, partido político ou coligação, de distribuição gratuita de bens e serviços de caráter social custeados ou subvencionados pelo Poder Público;

(...).

§ 10. No ano em que se realizar eleição, fica proibida a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da Administração Pública, exceto nos casos de calamidade pública, de estado de emergência ou de programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior, casos em que o Ministério Público poderá promover o acompanhamento de sua execução financeira e administrativa.

 

É assente na jurisprudência que as previsões de condutas vedadas consistem em tipos fechados, que, por presunção legal, tendem a afetar a isonomia entre os competidores eleitorais, sendo que, na análise de tais ilícitos, “imperam os princípios da tipicidade e da legalidade estrita, devendo a conduta corresponder exatamente ao tipo previsto na lei” (TSE, REspe n. 626-30/DF, Relatora: Min. Maria Thereza de Assis Moura, DJe de 4.2.2016).

Depreende-se da redação legal que a mens legis das disposições é, portanto, a proibição de se utilizar programas assistencialistas, com distribuição de bens e serviços de caráter social, custeados ou subvencionados pelo poder público, ao eleitor, buscando uma vantagem eleitoral, já tendo decidido o TSE que, “tratando-se de bem que seria posto à disposição de toda a coletividade, não há que se falar em ‘distribuição’, pois não há a entrega de bens a pessoas determinadas” (TSE - RO: 060136634, Relator: Min. Jorge Mussi, DJe de 24.10.2019).

Logo, a reforma da sentença reclamaria prova firme e inconteste de que as supostas distribuições de cascalhos, terras e a instalação de tubulações direcionaram-se para o favorecimento exclusivo de eleitores específicos da zona rural do Município, durante o ano eleitoral.

Nesse sentido, o diálogo captado com Ivo Boeck, embora sugira a obtenção inicial de uma carga de cascalho para arrumar o acesso a sua propriedade, há relevante dúvida sobre o aspecto temporal das afirmações, pois, além da ausência de informações sobre a data em que realizada a gravação, o eleitor afirma que “um ano eles me trouxeram, mas já faz anos, logo que eu vim aí de muda”. Referindo, ao final, sobre uma carga de brita que lhe foi fornecida ainda antes das eleições.

De seu turno, Marcos Padilha, apesar de comentar sobre a Prefeitura ter enviado uma carga de cascalho e realizado uma rede de água, relata ter que “atravessar aquele campo lá ó, embaixo daquela terra com um monte de eucalipto e levar pro outro morador lá”, do que se depreenderia que a infraestrutura alcançada beneficiaria mais de um morador.

Em relação aos vídeos em que filmados Valdir Soares e Ilko Thiesen, em que são exibidos os supostos benefícios alcançados, não há clareza sobre o local em que depositados os matérias, pois, no primeiro, aparece uma carga de pedras espalhada perto de um posto de luz, em terreno sem delimitação precisa com o passeio público, estando a carga mais próxima da via do que da residência do eleitor, e, sobre o segundo, a tubulação exposta encontra-se claramente fora da propriedade, aquém da sua cerca.

Igualmente, as imagens fotográficas acostadas aos autos não explicitam a época em que produzidas ou as circunstâncias em que depositados os materiais vislumbrados em cada caso, ou mesmo se os espaços em destaques envolvem bens privados ou vias públicas.

Consoante bem pontou o Magistrado a quo, “fotografias são elementos estáticos e, por conta disso, não permitem, por si só, que se possa estabelecer uma relação entre o que nelas se visualiza e as condutas imputadas”.

Mesmo a foto contida na folha 6 da petição inicial, relacionada à carga de cascalho que teria beneficiado Marcos Rosa e Telmo Ávila, não clarifica, além de qualquer dúvida razoável, sobre a situação e origem do material, bem como sobre o uso e natureza da via na qual espalhadas as pedras.

No mais, apesar dos indícios de favorecimento particular de alguns cidadãos, no caso dos autos, todos os benefícios relatados na petição inicial envolvem medidas visando ao amortecimento do acúmulo ou drenagem de águas, cuja afetação, de modo geral, ultrapassa os limites de uma única propriedade, especialmente na zona rural, em que as divisões entre a via pública e os acessos aos lotes rurais não são bem definidas.

É o que se extrai das alusões contidas nas declarações escritas de Adriana Braatz e Lisandro Staffen, ao relatarem o encanamento de sangas que transbordavam em dias de chuva, gerando alagamentos, buracos e atoleiros; de Ilko Thiesen, ao dizer sobre um bueiro em frente de casa, do qual decorreu uma valeta, que impedia o acesso a sua casa; e José Cláudio Frey, ao narrar a existência de um buraco em frente de casa, na “caixa de canos”; e Marcos Padilha, ao descrever que sua propriedade estava sendo usada pela Prefeitura para a realização de uma rede de água em sua localidade.

Assim, a despeito das falas no sentido de que as melhorias ocorreram a título pessoal, remanescem dúvidas sobre a precisão da fala ou do uso de “força de expressão” referentes a ações de infraestrutura em vias de uso comum, voltadas, em verdade, para o interesse coletivo, ainda que sob demanda de munícipe determinado ou com parcela do trabalho realizado em propriedades privadas.

Conforme anteriormente analisado, em diversos vídeos o interlocutor se faz passar por pessoa da vizinhança interessada nos mesmos serviços da Prefeitura ou, até mesmo, por emissário do próprio “Rim”, de modo que não é possível subtrair de plano eventuais dizeres com o ânimo de “contar vantagem”, bem como enaltecimentos exagerados visando agradar o ouvinte.

Assim, a prova dos autos, embasada em filmagens obtidas de forma clandestina, enganosa e unilateral e em declarações não submetidas ao crivo judicial, evidencia-se por demais frágil, duvidosa e inconsistente para um decreto condenatório em relação à prática de condutas vedadas e abuso de poder.

Não se pode ignorar que as ações administrativas da Prefeitura poderiam ser inequivocamente demonstradas por documentos públicos, tais ordens de serviço, notas de empenho, registros de execuções orçamentárias, etc; corroboradas por oitivas de testemunhas em juízo, incluindo servidores públicos e eleitores.

Contudo, nada disso foi trazido aos autos.

Sob o viés do abuso de poder, a debilidade da prova acostada impediria, até mesmo, que se aferisse, com alguma medida mínima de certeza, o alcance e gravidade dos supostos ilícitos cometidos, uma vez que não é possível estabelecer o período em que teriam ocorrido os fatos, os valores financeiros envolvidos ou o quantitativo de possíveis eleitores beneficiados.

De acordo com a jurisprudência sedimentada do TSE, para as condenações pretendidas, exige-se que a comprovação dos elementos que integram o ilícito se dê por meio de prova robusta, “não sendo suficientes meros indícios ou presunções” (TSE - AgR-REspe n. 471-54; Relator: Min. Tarcisio Vieira De Carvalho Neto, DJe de 19.9.2019; e AgR-REspe 272-38, Relator: Min. Jorge Mussi, DJe de 2.4.2018), bem como, no atinente à comprovação da prática de abuso de poder econômico ou político, “a jurisprudência exige a presença de prova segura e inequívoca (o que se convencionou chamar de ‘prova robusta’), sobre a qual não pairem dúvidas acerca da gravidade das circunstâncias do ato abusivo” (TSE - REspe n. 23854, Relator: Min. Luis Felipe Salomão, DJe de 04.06.2021).

Na hipótese concreta, evidencia-se por demais frágil, duvidosa e inconsistente a prova acostada para um decreto condenatório em relação à captação ilícita de sufrágio, à prática de condutas vedadas e de abuso de poder, impondo-se a manutenção da sentença recorrida.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo desprovimento do recurso.

 

 

CASO ACOLHIDO O DESTAQUE, PROSSIGO COM O MÉRITO.

 

III – Do Mérito.

Subtraídas as gravações clandestinas de conversas obtidas mediante engodo de um dos interlocutores, a prova carreada aos autos, a respeito dos fatos narrados na petição inicial, produzida pela parte demandante, consiste em fotografias, vídeos de tratores da Prefeitura em atividade e o depoimento da testemunha Omar Vanilo Rehbein.

Do acervo probatório, há um conjunto de vídeos que não envolvem a captação de diálogos, mas imagens de maquinário da Prefeitura em trabalho, extraídas, aparentemente, a partir da via pública, quais sejam:

1) “Vídeo obras Claudio Frey 23-10-2020”, “Vídeo obras Claudio Frey 23-10-2020 2”, “Vídeo Claudio Frey”, nos quais se visualiza uma retroescavadeira, identificada com o brasão da Prefeitura, revolvendo o terreno, diante de uma casa;

2) “Vídeo com distribuição de cascalhos” e “Vídeo Claudio Frey 4”, em que é exibida uma edição de jornal impresso e enfocados montes de terras depositados na via pública;

3) “Vídeo demonstrando entrega de cascalhos na Rua Silvio Pinto, 189”, no qual, após exibição de um exemplar de jornal publicado em 23.10.2020, é focalizada uma casa verde de madeira, com cascalho e terra no chão da parte interna da entrada e da passagem e veículos;

4) “Vídeo extração cascalhos pela Prefeitura”, mostrando uma edição de jornal de 28.10.2020, com imagens aéreas de máquinas e caminhões, extraindo e transportando terra do leito de um rio; e

5) “Depósito prefeitura com cascalhos”, iniciando com o destaque de um jornal de 23.10.2020 e seguindo para um terreno vazio, com diversos montes de terras e cascalhos.

Observa-se que os vídeos em questão foram captados de maneira descontextualizada, não sendo possível aferir a data em que produzidos ou suas circunstâncias fáticas.

Desse modo, há somente imagens de tratores e caminhões em trabalho, o que não permite que se estabeleça se as atividades e depósitos de materiais apresentados consistiriam em obras ou serviços lícitos e ordinários da Prefeitura, de interesse geral, ou o favorecimento indevido de eleitores determinados com fins eleitorais.

Das imagens em questão, não é possível extrair indícios de utilização eleitoreira do aparelhamento da Administração Pública, pois o prosseguimento de obras e manutenção de vias públicas pela Prefeitura, mesmo em ano eleitoral, não caracteriza, por si, qualquer ilegalidade na esfera eleitoral.

Por sua vez, a prova oral produzida em juízo restringe-se à oitiva de Omar Vanilo Rehbein (ID 41345633), o qual se declarou ser pedreiro e residir há mais de 30 anos no município, confirmando que houve uma movimentação anormal de máquinas públicas carregando cascalho, areia, terra e brita, pouco antes das eleições, em diversos locais, inclusive em espaços privados. Afirmou que “era uma loucura” e que “isso era meio geral”, bem como que presenciou “eles descarregando foi na frente da minha casa”: “eu vi descarregando, eu tava fazendo uma obra, na Linha Fátima, ali veio mais de 20 cargas de cascalho e aterro”, confirmando que a foto colacionada na folha 6 da petição inicial corresponde à casa localizada em frente à sua. Disse que a entrega ocorreu em espaço particular e que “tá lá hoje para olhar”. Afirmou que tudo ocorreu “a troco de voto”, conforme lhe disseram os vizinhos com quem conversou. Relatou que “ali na Linha Fátima, onde a nós tava construindo, ali veio muito cascalho e aterro, até o prefeito chegou lá, esse, o candidato, chegou lá, (...) durante a entrega, (...), na Linha Fátima”. Indagado sobre os vizinhos que teriam admitido o recebimento de cascalho em troca de votos, referiu que: “um é o Rosa, o rapazinho, moreno” e que o outro se mudou e não sabe para onde ele foi.

De seu turno, os demandados alegaram que o então Vice-Prefeito Nestor Rubens Ellwanger, conhecido como “Rim”, estava licenciado da função na época dos fatos, a fim de dedicar-se à campanha eleitoral, não podendo ordenar ou conceder tais benesses às pessoas referidas.

Sustentaram, ainda, que as melhorias em estradas, entradas, vielas, bueiros e acessos, bem como a instalação de redes de água, via tubulações e mangueiras, são realizadas de forma contínua pela Prefeitura, ano após ano, nas comunidades rurais, inclusive por solicitação dos agricultores, atividade que não guarda relação direta com compra de votos ou abuso do poder econômico e não poderia ser interrompida em ano eleitoral.

Em acréscimo, os demandados carrearam aos autos declarações escritas, com firma reconhecida em Tabelionato de Notas, nas quais os eleitores agregam aspectos concernentes às conversas gravadas, acompanhadas de algumas fotografias dos locais mencionados (ID 41343483).

No documento, Adriana Braatz declara que mora na localidade de Linha Bernardino, “onde tem uma sanga que não tem passagem para minha casa, não restando a opção de vir a secretaria e pedir ao secretário canos e providências”. Relata que tem um filho “que esta estudando e tem que passar todos os dias pela sanga as vezes em tempos chuvosos tem que passar pelo vizinho onde já foi mordido por cachorros e com os calçados na mão para colocar do outro lado para chegar seco a escola” (ID 41343033).

Ilko Thiesen declara que foi à Secretaria de Obras “a uns três ou quatro meses atrás pedir um bueiro em frente a minha propriedade que tinha uma valeta para entrar para minha casa da água da chuva, então veio os canos” (ID 41343083)

Por sua vez, Ivo Adão Boeck declarou ter recebido uma visita de um senhor em um carro Fiat Uno Vermelho, dizendo-se ser da Coligação do “Rim”. Afirmou que não consegue entrar com caminhão na entrada de sua propriedade para carregar fumo em razão do barro, tendo procurado “Rim” para falar sobre uma carga de pedra, ao que lhe foi dito que “em época de campanha não posso me envolver, deixa passar a eleição e fala com o Secretário” (ID 41343133).

Jeferson Fernando Cezar declara ser filho de Danilo Luiz Cezar e que entregou algumas mangueiras que tinha sobrando para o casal Luiz Paulo Machado e Izadi dos Santos Machado, em troca de serviço na colheita do fumo, pois “eles estavam precisando para encanar água de uma nascente para sua sobrevivência e matar a sede dos animais”, bem como que “em nenhum momento foi falado em troca de mangueiras por votos” (ID 41343183).

O eleitor Luiz Paulo Machado firma declaração em que ratifica narrativa sobre a negociação de mangueiras por serviços de colheita de fumo. Relata, também, que conversa sobre política com Jeferson Fernando Cezar, que é apoiador de Pedro para a Câmara de Vereadores, mas que a obtenção dos materiais não foi em troca do voto (ID 41343333).

De seu turno, José Cláudi Frey assevera que ocorreu infiltração da canalização de esgoto por baixo da sua casa e que “deu um buraco em frente da casa, bem na caixa dos canos, bem em frente a minha garagem e a prefeitura levou uma carga de cascalho para colocar no buraco para mim ter entrada” (ID 41343233).

Lisandro Staffen afirma que “fez pedido na secretaria da agricultura de uma carga de cascalho no começo do ano para ajeitar a entrada que estava um atoleiro e os caminhões de fumo não conseguiam entrar (...) e tem uma sanga que sai para fora nas cheias do inverno, levando o cascalho todo para a sanga, ficando os buracos e atoleiros”. Declarou, ainda, que procurou o “Rim” e “ele disse que não poderia se envolver que estava em campanha, mas me disse que eu tinha que ir falar com o secretário” (ID 41343283).

Marcos Padilha subscreve termo narrando que a Prefeitura está fazendo uma rede de água em sua localidade de Sesmaria do Cerro, onde planta fumo, e que guardou, em seu galpão, as mangueiras utilizadas na obra pública. Outrossim, declara que pediu cascalho ao Secretário Vandi, “porque estou guardando as mangueiras da rede de água a pedido dele e, na oportunidade que ele foi me pedir para guardar, foi quando mostrei o atoleiro que estava e não tinha condições do caminhão encostar para carregar fumo” (ID 41343383).

Por fim, Valdir Luis Soares informa que, embora tenha dito na conversa captada que achava que o Secretário se chamava Marlon, na verdade, solicitou o cascalho com o Secretário Gilvam, “porque minha entrada já não dava mais para chegar em dias de chuva, virou um atoleiro, e depois de março quando a prefeitura me levou graças a Deus ficou bem, até sobrou um pouco de cascalho que está em cima do barranco para eles usar na estrada” (ID 41343433).

Como ser percebe, o caderno probatório não permite que se extraia de forma firme e segura que houve a distribuição de benefícios da Prefeitura de modo particular a determinados eleitores ou mesmo que estes eram entregues sob a condição do voto em favor dos candidatos recorridos.

Da mesma forma, o depoimento de Omar Vanilo Rehbein, em relação à compra de votos, não confere suporte a um decreto condenatório, pois, ainda que mencionando que a atividade da Prefeitura ocorria “a troco de voto”, trata-se de mera dedução pessoal e genérica, não amparada por qualquer outro elemento idôneo de prova.

Destaca-se que a própria testemunha assumiu que não presenciou pessoalmente algum fato envolvendo a mercancia do voto, mas que apenas ouviu de vizinhos, os quais sequer teve êxito em identificar de modo assertivo e razoável, sendo, tal circunstância, suficiente para se concluir pela fragilidade da prova sobre o aspecto em tela.

Quanto à captação ilícita de sufrágio, é assente na jurisprudência que “para que seja caracterizada a captação ilícita de sufrágio, é necessária a demonstração do especial fim de agir consistente no condicionamento da entrega da vantagem ao voto do eleitor” (TSE - RO: 000796257, Relator: Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJE de 09.02.2017), o que não ocorre de forma inconteste nos autos.

Desse modo, diante da ausência de provas robustas e contundentes que demonstrem a compra ou negociação do voto ou o condicionamento de benefícios ao voto, deve ser mantida a sentença de improcedência da demanda em relação à imputação de captação ilícita de sufrágio (art. 41-A da Lei n. 9.504/97).

Sobre o enquadramento dos fatos como conduta vedada (art. 73, inc. IV e § 10, da Lei das Eleições) e abuso do poder político e econômico, igualmente, julgo que o arcabouço probatório é deficiente para embasar um decreto condenatório.

Nas declarações escritas, Adriana Braatz e Ilko Thiesen dizem que os pedidos de providências foram feitos à Secretaria de Obras. Por sua vez, Adão Boeck assevera que “Rim” teria lhe dito que “em época de campanha não posso me envolver, deixa passar a eleição e fala com o Secretário”.

O conjunto probatório, portanto, não demonstra, minimamente, qualquer espécie de envolvimento de “Rim” com os fatos imputados e nem indica, de modo concreto, como teria ocorrido a sua suposta promoção pessoal a partir do uso da máquina pública.

No tocante às condutas vedadas, a norma legal alegadamente violada tem a seguinte redação:

Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:

(...).

IV - fazer ou permitir uso promocional em favor de candidato, partido político ou coligação, de distribuição gratuita de bens e serviços de caráter social custeados ou subvencionados pelo Poder Público;

(...).

§ 10. No ano em que se realizar eleição, fica proibida a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da Administração Pública, exceto nos casos de calamidade pública, de estado de emergência ou de programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior, casos em que o Ministério Público poderá promover o acompanhamento de sua execução financeira e administrativa.

 

É assente na jurisprudência que as previsões de condutas vedadas consistem em tipos fechados, que, por presunção legal, tendem a afetar a isonomia entre os competidores eleitorais, sendo que, na análise de tais ilícitos, “imperam os princípios da tipicidade e da legalidade estrita, devendo a conduta corresponder exatamente ao tipo previsto na lei” (TSE, REspe n. 626-30/DF, Relatora: Min. Maria Thereza de Assis Moura, DJe de 4.2.2016).

Depreende-se da redação legal que a mens legis das disposições é, portanto, a proibição de se utilizar programas assistencialistas, com distribuição de bens e serviços de caráter social, custeados ou subvencionados pelo poder público, ao eleitor, buscando uma vantagem eleitoral, já tendo decidido o TSE que “tratando-se de bem que seria posto à disposição de toda a coletividade, não há que se falar em ‘distribuição’, pois não há a entrega de bens a pessoas determinadas” (TSE - RO: 060136634, Relator: Min. Jorge Mussi, DJe de 24.10.2019).

Logo, a reforma da sentença reclamaria prova firme e inconteste de que as supostas distribuições de cascalhos, terras e a instalação de tubulações direcionaram-se para o favorecimento exclusivo de eleitores específicos da zona rural do município, durante o ano das eleições.

As imagens fotográficas acostadas aos autos não explicitam a época em que produzidas ou as circunstâncias em que depositados os materiais vislumbrados em cada caso, ou mesmo se os espaços em destaques envolvem bens privados ou vias públicas.

Consoante bem pontou o Magistrado a quo, “fotografias são elementos estáticos e, por conta disso, não permitem, por si só, que se possa estabelecer uma relação entre o que nelas se visualiza e as condutas imputadas”.

Mesmo a foto contida na folha 6 da petição inicial, relacionada à carga de cascalho que teria beneficiado Marcos Rosa e Telmo Ávila, não clarifica, além de qualquer dúvida razoável, sobre a situação e origem do material, bem como sobre o uso e natureza da via na qual espalhadas as pedras.

No mais, todos os benefícios relatados na petição inicial envolvem medidas visando ao amortecimento do acúmulo ou drenagem de águas, cuja afetação, de modo geral, ultrapassa os limites de uma única propriedade, especialmente na zona rural, em que as divisões entre a via pública e os acessos aos lotes rurais não são bem definidas.

É o que se extrai das alusões de Adriana Braatz e Lisandro Staffen, ao relatarem o encanamento de sangas que transbordavam em dias de chuva, gerando alagamentos, buracos e atoleiros; de Ilko Thiesen, ao dizer sobre um bueiro em frente de casa, do qual decorreu um valeta, que impedia o acesso a sua casa; e José Cláudio Frey, ao narrar a existência de um buraco em frente de casa, na “caixa de canos”; e Marcos Padilha, ao descrever que sua propriedade estava sendo usada pela Prefeitura para a realização de uma rede de água em sua localidade.

Assim, a despeito das declarações no sentido de que as melhorias ocorreram a título pessoal, remanescem dúvidas sobre a precisão da fala ou do uso de “força de expressão” em relação a ações de infraestrutura em vias de uso comum, voltadas, em verdade, para o interesse coletivo, ainda que sob demanda de munícipe determinado.

Não se pode ignorar que as ações administrativas da Prefeitura poderiam ser inequivocamente demonstradas por documentos públicos, tais ordens de serviço, notas de empenho, registros de execuções orçamentárias, etc; corroboradas por oitivas de testemunhas em juízo, incluindo servidores públicos e eleitores.

Contudo, nada disso foi trazido aos autos.

Sob o viés do abuso de poder, a debilidade da prova acostada impediria, até mesmo, que se aferisse, com alguma medida mínima de certeza, o alcance e a gravidade dos supostos ilícitos cometidos, uma vez que não é possível estabelecer o período em que teriam ocorrido os fatos, os valores financeiros envolvidos ou o quantitativo de possíveis eleitores beneficiados.

De acordo com a jurisprudência sedimentada do TSE, para as condenações pretendidas, exige-se que a comprovação dos elementos que integram o ilícito ocorra por meio de prova robusta, “não sendo suficientes meros indícios ou presunções” (TSE - AgR-REspe n. 471-54; Relator: Min. Tarcisio Vieira De Carvalho Neto, DJe de 19.9.2019; e AgR-REspe 272-38, Relator: Min. Jorge Mussi, DJe de 2.4.2018), bem como, no atinente à comprovação da prática de abuso de poder político, “a jurisprudência exige a presença de prova segura e inequívoca (o que se convencionou chamar de ‘prova robusta’), sobre a qual não pairem dúvidas acerca da gravidade das circunstâncias do ato abusivo” (TSE - REspe n. 23854, Relator: Min. Luis Felipe Salomão, DJe de 04.06.2021).

Na hipótese concreta, evidencia-se por demais frágil, duvidosa e inconsistente a prova acostada para um decreto condenatório em relação à captação ilícita de sufrágio, à prática de condutas vedadas e de abuso de poder, devendo ser integralmente mantida a sentença recorrida.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo desprovimento do recurso.