REl - 0600322-42.2020.6.21.0077 - Voto Relator(a) - Sessão: 15/07/2022 às 14:00

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

As contas dos recorrentes foram julgadas não prestadas, em sentença assim fundamentada (ID 44908750):

Devem ser julgadas não prestadas as contas dos candidatos em epígrafe, relativas às Eleições Municipais 2020.

 

Registre-se que a prestação de contas dos candidatos foi transmitida, contudo, houve omissão na entrega da mídia contendo os documentos digitalizados que deveriam ser juntados aos presentes autos, para fins de análise da prestação de contas.

 

Ressalto que a omissão da entrega da mídia, com a consequente ausência da juntada dos documentos da prestação de contas, impede a análise da regularidade das contas e o prosseguimento regular do feito.

 

Detectada a irregularidade pela ausência da entrega da mídia, os candidatos foram devidamente intimados, todavia, não atenderam à determinação deste Juízo, tendo transcorrido in albis o prazo para sanar a omissão.

 

In casu, incidem os dispositivos previstos no art. 74, inc. IV, al. “b” e “c”, da Resolução TSE 23.607/19, pois as contas devem ser julgadas não prestadas quando:

- não forem apresentados os documentos e as informações de que trata o art. 53; e

- o responsável deixar de atender às diligências determinadas para suprir a ausência que impeça a análise da movimentação declarada na prestação de contas.

 

Ao contrário do que restou decidido, tenho que a falta da mídia não inviabilizou a apreciação das contas, constando no parecer conclusivo o que segue (ID 44908742):

1. Extratos eletrônicos

Foi identificada a abertura de 2 (duas) contas bancárias, uma sem movimentação e a outra com movimentação, seguindo a consulta e o extrato da conta em anexo.

2. Recebimento de recursos do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC)

Conforme consulta ao Sistema SPCE WEB, módulo Recursos de Fundo Público, não foi identificado o recebimento de recursos públicos, seguindo documento em anexo.

3. Fontes vedadas

Conforme consulta aos extratos bancários enviados à Justiça Eleitoral, não foram identificados recursos provenientes de fontes vedadas.

4. Recursos de origem não identificada

Conforme consulta aos extratos bancários enviados à Justiça Eleitoral, não foi constatada a existência de recursos de origem não identificada.

 

Dessa forma, na esteira do que foi apresentado no parecer da douta Procuradoria Eleitoral, tenho que deve ser afastado o juízo de não prestação de contas (ID 44954233):

Em primeiro lugar, trata-se de prestação de contas simplificada, pois contas eleitorais relativas a município com 7.472 eleitores, hipótese que se submete ao previsto no §1º do art. 62 da Resolução TSE nº 23.607/19:

Art. 62. (…)

§ 1º Nas eleições para cargo de prefeito e vereador em municípios com menos de 50 mil eleitores, a prestação de contas será feita pelo sistema simplificado (Lei 9.504/1997, art. 28, § 11).

§ 2º Para os fins deste artigo, considera-se movimentação financeira o total das despesas contratadas e registradas na prestação de contas.

Em segundo lugar, cumpre referir que a ausência parcial dos documentos e das informações de que trata o art. 53 ou o não atendimento das diligências determinadas não enseja – necessária e obrigatoriamente – o julgamento das contas como não prestadas, se os autos contiverem elementos mínimos que permitam a análise da prestação de contas, nos termos do art. 74, IV, § 2º, da Resolução supramencionada.

Em terceiro lugar, o caput e o §5º do art. 64 da Resolução TSE nº 23.607/19 dispõem que a prestação de contas simplificada será composta exclusivamente pelas informações prestadas diretamente no SPCE e pelos documentos descritos nas alíneas a, b, d e f do inciso II do art. 53, sendo que, caso se trate de recursos públicos, deverão ser apresentados os respectivos comprovantes dos recursos utilizados, na forma do disposto no § 1º do art. 53 daquela Resolução.

Pois bem, conforme atestado pelo parecer conclusivo, não houve o recebimento de recursos públicos. No entanto, há recursos oriundos de doação para a campanha que devem se submeter à fiscalização da Justiça Eleitoral.

Em consulta ao Divulgacand, observa-se que a campanha dos recorrentes declarou como total de recursos recebidos o montante de R$ 1.316,00, oriundos de recursos próprios do candidato a Prefeito. Todavia, apenas a título de exemplo, dos extratos bancários ali acostados também se observa o registro de crédito em dinheiro tendo por contraparte o CNPJ da própria campanha, além de diversos débitos pertinentes, em tese, ao pagamento de fornecedores. Some-se a isso que as três notas fiscais emitidas contra o CNPJ da campanha (apenas três) atingem um valor maior que a totalidade dos recursos declarados pelo prestador.

Como é cediço, o controle da regularidade dos ganhos e gastos eleitorais é a base para o alcance do objetivo maior da prestação de contas eleitorais, qual seja garantir a lisura, a legitimidade e a igualdade no pleito eleitoral. Quando o prestador deixa de comprovar tal regularidade, macula a confiabilidade de sua movimentação financeira de campanha, abrindo espaço para possíveis manobras fraudulentas e ilegais.

Nesse contexto, e frisando que a parte não atendeu às diligências, há inconsistências evidentes nos extratos bancários e decorrentes de seu cotejo com as notas fiscais disponibilizadas à Justiça Eleitoral, razão pela qual entende esta Procuradoria Regional Eleitoral que estão presentes elementos mínimos que permitiriam a análise técnica da presente prestação das contas eleitorais, o que não foi feito.

No que tange aos documentos carreados aos autos no prazo do recurso (prestação de contas final retificadora – ID 44908755 e seguintes), ressalta-se que a prestação de contas intempestiva não é capaz de suprir a omissão do prestador, uma vez que consiste unicamente na tabulação de dados, sem possibilidade de análise de eventuais documentos comprobatórios da regularidade das despesas, para o que seria necessária a ampla avaliação das contas, incabível em sede recursal. Porém, reforça-se, tal análise era possível a partir dos documentos que já estavam disponíveis à Justiça Eleitoral.

Cabe ressaltar que a ausência de análise pelo órgão técnico de exame das informações que já constavam dos autos justifica a anulação da sentença, para que seja determinado o retorno do feito à instância de origem, a fim de que o juízo proceda na forma do art. 74, §4º, da Resolução TSE nº 23.607/2019, uma vez que a causa não está madura para apreciação por essa e. Corte conforme admite o art. 1.013, §3º, do CPC.

Ante o exposto, o Ministério Público Eleitoral opina pela anulação da sentença, com o retorno dos autos à instância de origem, a fim de que seja proferida nova decisão de mérito, com o exame das contas apresentadas, nos termos da fundamentação.

 

Assim, sendo a presente prestação de contas simplificada diante do número de eleitores do município (7.472), considerando que a ausência parcial de documentos não dá ensejo, por si só, ao julgamento como não prestadas e, por último, tendo em vista a verificação de não recebimento de recursos públicos, o que conduziria à obrigação de exibição de comprovantes de sua utilização, tenho que há elementos suficientes para a análise técnica dos registros contábeis, que deve compreender todos os documentos apresentados, inclusive com o recurso eleitoral, nos termos do que dispõe o art. 74, § 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 74. Apresentado o parecer do Ministério Público e observado o disposto no parágrafo único do art. 73 desta Resolução, a Justiça Eleitoral verificará a regularidade das contas, decidindo (Lei nº 9.504/1997, art. 30, caput):

I - pela aprovação, quando estiverem regulares;

II - pela aprovação com ressalvas, quando verificadas falhas que não lhes comprometam a regularidade;

III - pela desaprovação, quando constatadas falhas que comprometam sua regularidade;

IV - pela não prestação, quando, observado o disposto no § 2º:

 

a) depois de citada(o), na forma do inciso IV do § 5º do art. 49, a candidata ou o candidato ou o órgão partidário e as(os) responsáveis permanecerem omissas(os) ou as suas justificativas não forem aceitas;

b) não forem apresentados os documentos e as informações de que trata o art. 53; ou

c) a(o) responsável deixar de atender às diligências determinadas para suprir a ausência que impeça a análise da movimentação declarada na prestação de contas.

 

§ 1º Nas eleições gerais, na hipótese de manifestação técnica pela aprovação das contas, com parecer no mesmo sentido do Ministério Público Eleitoral, o julgamento das contas poderá ser realizado por decisão monocrática.

§ 2º A ausência parcial dos documentos e das informações de que trata o art. 53 ou o não atendimento das diligências determinadas não enseja o julgamento das contas como não prestadas se os autos contiverem elementos mínimos que permitam a análise da prestação de contas.

§ 3º (revogado)

§ 4º Na hipótese do § 2º deste artigo, a autoridade judiciária examinará se a ausência verificada é relevante e compromete a regularidade das contas para efeito de sua aprovação com ressalvas ou desaprovação. (Grifo nosso)

 

Ante o exposto, VOTO pelo provimento parcial do recurso, ao efeito de reformar a sentença recorrida para reconhecer a possibilidade de exame de mérito das contas, nos termos do art. 74, § 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19, com o retorno dos autos à instância de origem para elaboração de exame técnico da contabilidade e prolação de nova sentença.