REl - 0600095-27.2021.6.21.0074 - Voto Relator(a) - Sessão: 15/07/2022 às 14:00

VOTO

Senhor Presidente,

Eminentes colegas:

 

No mérito, trata-se de recurso interposto contra sentença que desaprovou as contas de exercício da agremiação e determinou o recolhimento de R$ 1.200,00 ao erário, acrescido de multa de 20%, na forma do art. 48 da Resolução TSE n. 23.604/19, em virtude do recebimento de recursos de origem não identificada por meio de depósito em dinheiro efetuado na conta bancária do partido.

A norma limita o valor dos ingressos em espécie a R$ 1.064,10, art. 8º, § 3º, da Resolução TSE n. 23.604/19, bem como determina, em seu § 10, o recolhimento dos aportes indevidos ao Tesouro Nacional, nos casos em que a restituição ao doador não ocorreu no prazo legal:

Art. 8º

As doações realizadas ao partido político podem ser feitas diretamente aos órgãos de direção nacional, estadual ou distrital, municipal e zonal, que devem remeter à Justiça Eleitoral e aos órgãos hierarquicamente superiores do partido o demonstrativo de seu recebimento e da respectiva destinação, acompanhado do balanço contábil.

§ 3º As doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação ou cheque cruzado e nominal.

§ 10. As doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo não podem ser utilizadas e devem, na hipótese de identificação do doador, ser a ele restituídas, até o último dia útil do mês subsequente à efetivação do crédito, ou, se não for possível identificá-lo, devem ser consideradas de origem não identificada e recolhidas ao Tesouro Nacional, na forma prevista no caput do art. 14 desta resolução.

 

A tese recursal vai no sentido de que o doador restou identificado e que a operação se deu com o fito de suprir o saldo negativo da conta da agremiação. Contudo, não acolhida a hipótese, o prestador sustenta que o valor total do depósito não deve ser devolvido, mas apenas a diferença entre ele e o teto definido pela norma, ou seja, tão somente R$ 135,90, quantia tida como irrisória, resultante do montante que aportou em conta (R$ 1.200,00), subtraído o permissivo legal de R$ 1.064,10.

Nada obstante a irresignação recursal, correta a decisão de piso ao concluir que “sendo impossível o cruzamento de informações com o sistema financeiro nacional, não há como aferir a exata origem do recurso recebido. Do mesmo modo, não há nos autos demonstrativo de restituição dos valores doados. Assim, cumpre o acolhimento do parecer exarado pela unidade técnica”.

Nos extratos eletrônicos, consta o recebimento de depósito em espécie, identificado pelo CPF n. 576.011.190-68, pertencente a Claudiomiro Ferrando Borges, entretanto a aposição realizada pela instituição bancária se trata de mera declaração por parte de quem efetuou a contribuição, não se prestando a fazer prova da origem do montante.

O vício poderia ser sanado, por exemplo, com a juntada de extrato bancário da conta particular do contribuinte indicando a saída do montante na data em que realizada a entrada na conta do partido, porém a agremiação não se desincumbiu deste ônus, pois, ainda que informado o nome do possível doador, não há como o vincular à real fonte da quantia depositada para a sigla.

Incontroversa a operação fora dos parâmetros legais, na medida em que a regra é clara ao estabelecer que as doações financeiras acima de R$ 1.064,09 devem ocorrer por transferência eletrônica ou cheque cruzado e nominal, cabendo ao partido diligenciar para que o aporte de recursos financeiros seja sempre realizado na forma estabelecida na normatização legal, sob pena de devolução ao erário, art. 14 da Resolução TSE n. 23.604/19:

Art. 14. O recebimento direto ou indireto dos recursos previstos no art. 13 sujeita o órgão partidário a recolher o montante ao Tesouro Nacional, por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU), até o último dia útil do mês subsequente à efetivação do crédito em qualquer das contas bancárias de que trata o art. 6º, sendo vedada a devolução ao doador originário.

 

Sobre a possibilidade de abatimento ventilada pela grei, incabível seu acolhimento, visto que a norma caracteriza todo o valor que ingressou de forma indevida na conta de campanha como irregular, e não apenas o montante que exorbitou o teto definido em resolução. É o entendimento plasmado no art. 48 da Resolução TSE n. 23.604/19 e adotado corretamente pelo magistrado sentenciante.

Nesse norte, não há falar em deduções de valores ilícitos em relação à baliza legal, posto que configurado o recebimento de recurso de origem não identificada, ingresso vedado de forma objetiva pela norma, art. 13 da Resolução TSE n. 23.604/19, verbis:

Art. 13

É vedado aos partidos políticos receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, recursos de origem não identificada.

 

No que concerne ao tema, a título de desfecho, adiro à manifestação da Procuradoria Regional Eleitoral, a seguir transcrita:

Descumprida a norma de regência, a totalidade do depósito é irregular, e não apenas o “excesso” da doação. Nesse sentido é a previsão do art. 48 da Resolução TSE nº 23.604/2019, segundo o qual A desaprovação das contas do partido implicará a sanção de devolução da importância apontada como irregular, acrescida de multa de até 20% (vinte por cento) (art. 37 da Lei nº 9.096/95). Obviamente, a quantia irregular, no caso, equivale aos R$ 1.200,00 recebidos como doação por meio de depósito em espécie, quando somente seria possível tal recebimento mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação ou cheque cruzado e nominal.

 

O vício é grave, macula a confiabilidade do acervo contábil e enseja a desaprovação das contas.

A corroborar, a jurisprudência deste Tribunal pacificou o entendimento de que a carência de identificação da fonte originária do recurso na própria operação bancária é falha grave que impede o controle da Justiça Eleitoral sobre eventuais fontes vedadas e prejudica a transparência das declarações contábeis, ensejando a desaprovação do feito.

PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO ESTADUAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2015. AFASTADA A PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA DE DIRIGENTE PARTIDÁRIO. MÉRITO. LICITUDE DAS DOAÇÕES REALIZADAS POR DETENTORES DE MANDATO ELETIVO. VEREADOR. DEPUTADO ESTADUAL. FALTA DE IDENTIFICAÇÃO DO CPF DE CONTRIBUINTES NOS EXTRATOS BANCÁRIOS. REPASSE DE RECURSOS DO FUNDO PARTIDÁRIO A ÓRGÃO IMPEDIDO DE RECEBER VALORES DESSA RUBRICA. INOBSERVÂNCIA DA APLICAÇÃO DO PERCENTUAL DE PROMOÇÃO À PARTICIPAÇÃO POLÍTICA DAS MULHERES. SUSPENSÃO DAS QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. DESAPROVAÇÃO DAS CONTAS.

1. Afastada a preliminar de ilegitimidade passiva. Incontroverso que o dirigente foi um dos responsáveis pelo controle e pela movimentação financeira da agremiação durante parcela do exercício financeiro em análise, sendo assim legitimado para integrar o presente processo. Aplicação das disposições processuais previstas na Resolução TSE n. 23.464/15.

2. Recebimento de valores advindos de deputado estadual e de vereadores. Licitude das doações. Cargos não enquadrados no conceito de autoridade pública a que se refere o art. 31, inc. II, da Lei n. 9.096/95, na redação vigente ao tempo dos atos em análise. O fundamento para vedar a doação de ocupantes de cargos de direção e chefia é evitar a distribuição de funções públicas com o intento de alimentar os cofres partidários. O detentor de mandato eletivo não é titular de cargo nomeado em razão de vinculações partidárias, ao contrário, são alçados ao cargo pela vontade popular. Considerar tais doadores como autoridade pública significaria atribuir interpretação ampliativa de uma norma restritiva de direitos, o que não se coaduna com a ordem constitucional.

3. Emprego de verbas de origem não identificada. Valores depositados em espécie e na conta da agremiação, sem a identificação do CPF do contribuinte. Irregularidade que enseja o recolhimento do montante indevidamente utilizado ao Tesouro Nacional.

4. Configura irregularidade o repasse de recursos do Fundo Partidário ao Diretório Municipal durante o período em que cumpre suspensão de recebimento das quotas.

5. Inobservância da regra de destinação do percentual mínimo de 5% dos recursos oriundos do Fundo Partidário na criação e manutenção de programas para promover e difundir a participação política das mulheres. Imposição do acréscimo de 2,5% no ano seguinte ao trânsito em julgado, bem como o recolhimento do valor correspondente ao Erário, ante a proibição legal de utilização da quantia para outra finalidade, nos termos do art. 22 da Resolução TSE n. 23.432/14.

6. Sancionamento. Suspensão de recebimento de novas quotas do Fundo Partidário pelo período de um mês. Recolhimento ao Tesouro Nacional do valor da quantia irregularmente empregada.

7. Desaprovação.

(TRE-RS, PC N. 54-16, Des. El. Gerson Fischmann, julgado em 10.10.2018, publicado no DEJERS n. 187, de 15.10.2018, pp. 4-5.) (Grifei.)

 

Assim, diante da soma irregular, inviável a aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, visando à mitigação do juízo de desaprovação para que as contas sejam aprovadas com ressalvas, dado que a cifra de R$ 1.200,00 representa 72,20% da receita arrecadada e ultrapassa o parâmetro utilizado por esta Corte para considerar a quantia ínfima, seja em valores nominais ou percentuais.
                     Todavia, em relação à aplicação da multa prevista no art. 37 da Lei n. 9.096/95, c/c art. 48 da Resolução TSE n. 23.604/19, tenho que é necessário realizar a readequação do seu percentual, para aplica-lá de forma proporcional e razoável, nos termos do § 2º do aludido artigo da resolução.                 

No caso, levando em consideração o somatório indevido de 72,20% do total dos recursos recebidos, a multa de 20% aplicada na sentença deve ser reduzida para 14,44%, incidente sobre o valor total irregular de R$ 1.200,00.

Assim, o montante a ser recolhido ao Tesouro Nacional totaliza R$ 1.200,00.

Por sua vez, a quantia da multa aplicada (14,44%) resta em R$ 173,28, devendo ser recolhida ao Fundo Partidário, nos termos do art. 48 da Resolução TSE n. 23.604/19.

Por fim, ressalto que a falha compromete a transparência e lisura da contabilidade, diante da ausência de segurança sobre a origem dos valores percebidos pelo partido, de forma que a manutenção da sentença de desaprovação das contas, ainda que reduzida a multa, é medida que se impõe.

 

Diante do exposto, VOTO pelo parcial provimento do recurso, para manter a desaprovação das contas do exercício de 2020 apresentadas pelo DIRETÓRIO MUNICIPAL DE ALVORADA DO PARTIDO PROGRESSISTAS (PP) e a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional da quantia de R$ 1.200,00, reduzindo o percentual da multa para 14,44% (R$ 173,28), cifra que deve ser recolhida ao Fundo Partidário, nos termos do art. 48 da Resolução TSE n. 23.604/19.

É como voto, Senhor Presidente.