REl - 0600363-11.2020.6.21.0044 - Voto Relator(a) - Sessão: 15/07/2022 às 14:00

VOTO

Da Admissibilidade

Preenchidos os pressupostos de admissibilidade recursal, merece ser conhecido o recurso.

Do Mérito

Eminentes Colegas, trata-se da prestação de contas de CLAUDETE GONÇALVES VARGAS, candidata ao cargo de vereadora no Município de Unistalda/RS, relativa às eleições do ano de 2020.

A sentença recorrida julgou desaprovadas as contas da recorrente (ID 44928643) em razão da extrapolação do limite de autofinanciamento de campanha, sem arbitramento da multa prevista no art. 27, § 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19, e da ausência de comprovação de gastos diante da constatação de cheque sacado direto no caixa.

Assim, reconheço a ausência de interesse em discutir a questão da extrapolação do prazo para abertura de conta bancária. Embora mencionada no relatório da decisão impugnada (ID 44928643), a falha não foi retomada na fundamentação da decisão que desaprovou as contas, logo, se considera que a questão restou superada pela julgadora a quo.

Passo à análise das demais teses recursais.

Inicialmente, o parecer técnico conclusivo (ID 44928640) assinalou o recebimento de crédito na conta bancária de campanha no valor de R$ 2.000,00, por meio de depósito em espécie, identificado com o CNPJ da candidata. Foi registrada a existência de saque por meio de cheque, na “boca do caixa”, sem identificação da contraparte no mesmo valor, além do apontamento de que não houve comprovação das despesas realizadas nesse montante.

Em suas razões, a recorrente alega que os valores de R$ 1.064,09 e de R$ 935,91, depositados na sua conta eleitoral, são provenientes de recursos próprios. Explica que o funcionário do banco informou o CNPJ da própria candidata como depositante, motivo pelo qual as referidas doações não foram registradas no Sistema de Prestação de Contas Eleitorais (SPCE). No intuito de sanar o equívoco e regularizar a falha cometida, foi devolvido o montante total à pessoa física da candidata, por meio do cheque sob n. 000001, no valor de R$ 2.000,00, descontado na data de 28.09.2020. Sustenta que a sucessão de equívocos não deve ser interpretada como fraude ou má-fé, especialmente porque tudo foi registrado. Sustenta que o valor não foi utilizado para custear as despesas de campanha, pois foi devolvido para a própria candidata.

A matéria objeto de análise encontra-se regulamentada na Resolução TSE n. 23.607/19, a qual, em seu art. 27, dispõe:

Art. 27. As doações realizadas por pessoas físicas são limitadas a 10% (dez por cento) dos rendimentos brutos auferidos pelo doador no ano-calendário anterior à eleição (Lei n. 9.504/97, art. 23, § 1º).

§ 1º O candidato poderá usar recursos próprios em sua campanha até o total de 10% (dez por cento) dos limites previstos para gastos de campanha no cargo em que concorrer (Lei n. 9.504/97, art. 23, § 2º-A).

[...]

§ 4º A doação acima dos limites fixados neste artigo sujeita o infrator ao pagamento de multa no valor de até 100% (cem por cento) da quantia em excesso, sem prejuízo de o candidato responder por abuso do poder econômico, nos termos do art. 22 da Lei Complementar n. 64/90 (Lei n. 9.504/97, art. 23, § 3º).

[…]

 

O órgão técnico, no parecer conclusivo (ID 44928640), opinou pelo reconhecimento de um erro na identificação do doador dos recursos com o CNPJ e, também, de que a candidata extrapolou o valor limite para doação recursos próprios, litteris:

Em referência a doação no montante de R$ 2.000,00 notou-se que não existiu má fé para identificação do doador dos recursos com o CNPJ, mas sim um erro de identificação (funcionário do banco ou Candidato no momento do depósito) podendo desconsiderar o apontamento que fere o art. 31 da Resolução TSE n. 23.607/19. No mesmo ímpeto de sanar a inconsistência do valor arrecadado notou-se um saque em caixa no montante de R$ 2.000,00 para devolução ao doador originário, o que é um dos procedimentos para doação de fonte vedada apontada no item 3, quer dizer, não deixou de satisfazer o apontamento do art. 12 da Resolução Supracitada.

O que não pode deixar de transparecer, é que foi extrapolado pela candidata o valor limite para doação recursos próprios é 10% do limite de gastos (R$15.227,97) onde se deu a diferença na monta de R$ 477,20, mesmo que tenha feito a devolução indevida da doação, esse não deixa de ser um montante acima do permitido conforme art. 27, § 1º da Resolução TSE n. 23.607/19.

 

Examinando detidamente os elementos de convicção constantes do caderno processual, observa-se que a recorrente depositou em espécie, no dia 23.9.2020, o valor total de R$ 2.000,00 (R$ 1.064,09 + R$ 935,91) em sua conta bancária de campanha. Levando-se em consideração que a candidata poderia ter utilizado em recursos próprios, no Município de Unistalda, o valor máximo de R$ 1.522,79, vê-se que essa doação excedeu em R$ 447,20 o limite legal. Posteriormente, em 28.9.2020, a prestadora devolveu para si própria o montante de R$ 2.000,00, mediante o cheque sob n. 000001, descontado diretamente no caixa.

A tese defensiva de que tanto o depósito quanto o saque de R$ 2.000 (dois mil reais) foram realizados pela própria candidata foi acolhida na sentença, o que se depreende da análise dos trechos “a não identificação do CNPJ ou do CPF do sujeito beneficiário pelo destino dos R$2.000,00 (dois mil reais) sacados pela própria candidata“ e “a candidata doou valor superior ao determinado pela Lei e, após ter constatado a irregularidade efetuou o saque do mesmo valor, conforme verifica-se do extrato bancário da base de dados da Justiça Eleitoral”.

Dessa forma, identificado o doador, não subsiste irregularidade quanto à origem dos recursos, devendo ser afastada qualquer evidência de caracterização da mácula prevista no art. 32 da Resolução TSE n. 23.607/19.

Em relação à extrapolação do limite de 10% previsto no § 1º do art. 27 da Resolução TSE n. 23.607/19 na modalidade de recursos próprios, a candidata afirma que, ao perceber o ocorrido, buscou sanar o erro devolvendo os valores ao doador. A sentença reconheceu que o montante foi sacado pela própria candidata.

Assim, além de afastar dúvidas sobre a origem e o destino do valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais), é de se entender que a candidata agiu tempestivamente para corrigir o problema da doação acima do limite, pois os recursos arrecadados foram devolvidos e não custearam gastos de campanha.

Além disso, em consulta ao Sistema DivulgaCand (https://divulgacandcontas.tse.jus.br/divulga/#/candidato/2020/2030402020/88480/210000659652/extratos), observa-se que foi utilizado na campanha da recorrente o montante de R$ 998,00 (novecentos e noventa e oito reais) em recursos próprios, proveniente de um depósito realizado em 06.11.2020.

Com efeito, embora a devolução dos valores impugnados não tenha se dado por transferência eletrônica, consoante determinado pelas normas de regência, é certo que a verba não foi utilizada pela prestadora de contas e restou restituída ao doador.

Adotando a linha de que as possíveis irregularidades devem ser dadas como superadas, a douta Procuradora Regional Eleitoral Substituta, Dra. Maria Emília Corrêa da Costa, examinado o tema (ID 44976979), concluiu que “a sentença considerou que a candidata “após ter constatado a irregularidade efetuou o saque do mesmo valor”, não poderia ter considerado ausente “comprovação dos gastos com a identificação do CNPJ ou CPF do recebedor”, visto que o recebedor foi identificado. No mesmo parecer, também ficou pontuado que:

Diante da ausência de recurso do MPE, não é possível reverter o seu entendimento quanto à ocorrência ou não de autofinanciamento ou de recurso de origem não identificada, tampouco quanto ao saque pela própria candidata do valor irregularmente doado ou quanto à sua utilização para pagamento de alguma despesa eleitoral.

 

Por conseguinte, tenho que a falha na arrecadação/gasto não acarretou prejuízo à transparência e à confiabilidade das contas, de sorte que enseja, tão somente, a aposição de ressalvas sobre a contabilidade.

Dispositivo

ISSO POSTO, voto por dar provimento ao recurso para aprovar com ressalvas as contas de campanha de CLAUDETE GONÇALVES VARGAS, candidata ao cargo de vereadora no Município de Unistalda nas eleições 2020.