REl - 0600566-74.2020.6.21.0172 - Voto Relator(a) - Sessão: 21/06/2022 às 14:00

VOTO

LUIZ PEGORARO, candidato ao cargo de vereador no Município de Novo Hamburgo, recorre contra a sentença proferida pelo juízo da 172ª Zona Eleitoral, que desaprovou as contas, com base no art. 74, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/19, em vista da constatação da falta de comprovação da regular utilização de recursos do FEFC, relativamente ao montante total destinado pelo referido fundo à campanha do prestador, no valor de R$ 4.978,00, o qual foi integralmente sacado da sua conta.

Acolhendo o parecer contábil (ID 44866084), a sentença (ID 44866091) consignou que:

A) O candidato efetuou saque avulso do valor integral da receita do Fundo Especial contrariando o disposto 38 da Resolução mencionada. Vejamos:

Art. 38. Os gastos eleitorais de natureza financeira, ressalvados os de pequeno vulto previstos no art. 39 e o disposto no § 4º do art. 8º, ambos desta Resolução, só podem ser efetuados por meio de:

I - cheque nominal cruzado;

II - transferência bancária que identifique o CPF ou CNPJ do beneficiário;

III - débito em conta; ou

IV - cartão de débito da conta bancária.

§ 1º O pagamento de boletos registrados pode ser realizado diretamente por meio da conta bancária, vedado o pagamento em espécie.

§ 2º É vedado o pagamento de gastos eleitorais com moedas virtuais.

É correto que a falta de talões de cheques alegada pelo prestador não tem força pra afastar a obrigatoriedade do cumprimento do dispositivo citado já que a lei coloca à disposição do prestador outras formas de se efetuar os gastos de campanha, conforme o dispositivo citado.

E correto, também, que não se tratou de pagamento de despesas de pequeno vulto, tal como preveem os artigos 39 e 40 da Resolução TSE n. 23.607/19, pois o valor sacado superou em muito o limite legal de 2%:

Art. 39. Para efetuar pagamento de gastos de pequeno vulto, o órgão partidário e o candidato podem constituir reserva em dinheiro (Fundo de Caixa), desde que:

I - observem o saldo máximo de 2% (dois por cento) dos gastos contratados, vedada a recomposição;

II - os recursos destinados à respectiva reserva transitem previamente pela conta bancária específica de campanha;

III - o saque para constituição do Fundo de Caixa seja realizado mediante cartão de débito ou emissão de cheque nominativo em favor do próprio sacado.

Parágrafo único. O candidato a vice ou a suplente não pode constituir Fundo de Caixa.

E, como muito bem cita o Senhor Examinador, o valor sacado não foi utilizado para pagamento de despesas individuais conforme o art. 40 que segue:

Art. 40. Para efeito do disposto no art. 39 desta Resolução, consideram-se gastos de pequeno vulto as despesas individuais que não ultrapassem o limite de meio salário mínimo, vedado o fracionamento de despesa.

Parágrafo único. Os pagamentos de pequeno valor realizados por meio do Fundo de Caixa não dispensam a respectiva comprovação na forma do art. 60 desta Resolução.

Nesse passo, houve também grandes divergências entre a movimentação financeira presente nos extratos eletrônicos e os valores declarados na prestação de contas.

Dessa forma, não merecem respaldo as contas prestadas e a desaprovação surge eminente.

No seguimento, os valores recebidos a título de fundo especial, como não puderam ter sua destinação aferida em face do saque na “boca do caixa” efetuado pelo então candidato, são considerados gastos irregulares e devem ser restituídos ao Tesouro Nacional em sua integridade. Esse é o teor do art. 79, § 1º da Resolução TSE n. 23.607/21.

§ 1º Verificada a ausência de comprovação da utilização dos recursos do Fundo Partidário e/ou do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) ou a sua utilização indevida, a decisão que julgar as contas determinará a devolução do valor correspondente ao Tesouro Nacional no prazo de 5 (cinco) dias após o trânsito em julgado, sob pena de remessa dos autos à representação estadual ou municipal da Advocacia-Geral da União, para fins de cobrança.

Quanto à dissonância entre os extratos bancários da conta de Outros Recursos e as contas prestadas deixo de entender pelo recolhimento de valores, em face da impossibilidade de se ratificar a verdadeira movimentação financeira, já que já indícios não confirmados de que o candidato tenha utilizado da conta de Outros Recursos para movimentar os valores recebidos a título de Fundo Especial.

Em suas razões, o recorrente se limitou a afirmar que recebeu os recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) depois da data das eleições e que não obteve cheques para a movimentação da respectiva conta-corrente e houve por bem efetuar o saque do numerário a fim de, afinal, devolvê-lo à conta-corrente de outros recursos. Em verdade, os valores são os mesmos sacados da conta específica do FEFC, acrescidos de R$ 151,00 (cento e cinquenta e um reais). A transferência foi realizada por MARA EMÍLIA SOARES DA SILVA, única prestadora de serviços da campanha. Ademais, afirma que o saque das sobra de campanha foi um equívoco do candidato, mas que se trata da única irregularidade nas contas, que podem ser aprovadas com ressalvas.

Sem razão o recorrente.

O prestador das contas realizou saque integral do valor recebido do FEFC, o que inviabiliza a identificação da contraparte (prestador dos serviços ou fornecedor). Via de consequência, restou violada a exigência das formas de pagamento (emissão de cheque na forma nominal e cruzada ou da realização de transferência eletrônica) conforme exige o art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19. Não por acaso, são estas formas de pagamento que viabilizam a identificação pessoa, física ou jurídica, que recebeu o valor depositado na conta de campanha.

Conforme observou o ilustre Procurador Regional Eleitoral (ID 44971359):

Tais dados fecham o círculo da análise das despesas, mediante a utilização de informações disponibilizadas por terceiro alheio à relação entre credor e devedor e, portanto, dotado da necessária isenção e confiabilidade para atestar os exatos origem e destino dos valores. Isso porque somente o registro correto e fidedigno das informações pela instituição financeira permite o posterior rastreamento, para que se possa apontar, por posterior análise de sistema a sistema, eventuais inconformidades.

Assim, se por um lado o pagamento pelos meios indicados pelo art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19 não é suficiente, por si só, para atestar a realidade do gasto de campanha informado, ou seja, de que o valor foi efetivamente empregado em um serviço ou produto para a campanha eleitoral, sendo necessário trazer uma confirmação, chancelada pelo terceiro com quem o candidato contratou, acerca dos elementos da relação existente; por outra via a tão só confirmação do terceiro por recibo, contrato ou nota fiscal também é insuficiente, pois não há registro rastreável de que foi ele quem efetivamente recebeu o referido valor.

É somente tal triangularização entre prestador de contas, instituição financeira e terceiro contratado, com dados provenientes de diversas fontes, que permite, nos termos da Resolução TSE n. 23.607/19, o efetivo controle dos gastos de campanha a partir do confronto dos dados pertinentes. Saliente-se, ademais, que tal necessidade de controle avulta em importância quando, como no caso, se trata de aplicação de recursos públicos.

 

Observo que o próprio recorrente confessa o descumprimento da norma ao confirmar que realizou o saque do valor (R$ 4.978,00) com o objetivo de depositar tal quantia na conta Outros Recursos, o que vai de encontro com a previsão do art. 9º, §2º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Destaco, ao fim, que a alegação de que a Sra. Maria Emília teria recebido o valor de R$ 3.100,00, bem demonstra as lacunas existentes na prestação de contas, visto que não houve a correta comprovação da regularidade da despesa (ID 44866031).

É dever do candidato a inserção de dados no Sistema de Prestação de Contas Eleitorais (SPCE), de forma completa e documentada, nos termos do art. 53, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19, bem como o integral cumprimento do art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19.

Desse modo, acertada a sentença ao reconhecer a irregularidade em tela, desaprovando as contas do candidato.

Diante do exposto, VOTO pelo conhecimento e desprovimento do recurso interposto por LUIZ PEGORARO, mantendo a sentença que desaprovou as contas relativas ao pleito de 2020 em sua íntegra.

É como voto, senhor Presidente.