REl - 0600001-95.2021.6.21.0004 - Voto Relator(a) - Sessão: 20/06/2022 às 14:00

VOTO

1. Admissibilidade Recursal

O recurso é tempestivo e encontram-se presentes os demais pressupostos de admissibilidade, de forma que merece conhecimento.

 

2. Preliminar de Inépcia da Inicial

A preliminar de inépcia da inicial foi abordada em sede de contestação e, novamente, ventilada em contrarrazões.

Contudo, diferente das demais preliminares arguidas pelos recorridos, restou não acolhida.

O argumento central, no sentir dos impugnados, para considerar a exordial inepta, reside na forma desordenada em que foram juntadas as peças que a compõe no sistema PJe. Contudo, em que pese a ordem dos documentos acostados, a inicial atende ao comando do art. 330 do CPC, não obstaculizou a defesa dos recorridos, tampouco prejudicou a análise do Parquet e dos Juízos de primeira e segunda instância, de forma que, alinhado ao entendimento exarado na origem e corroborado pela Procuradoria Regional Eleitoral, deixo de acolher a preliminar.

 

3. Preliminares de Litispendência e Ilegitimidade ativa

Os impugnados, em contrarrazões, suscitam as preliminares de litispendência e ilegitimidade ativa da autora em relação aos candidatos do pleito proporcional.

O reconhecimento da litispendência se deu em primeiro grau, em virtude da Ação de Investigação Judicial Eleitoral - AIJE n. 473-33.2020.6.21.0004, que tratou da mesma matéria aqui vertida nos itens 1 e 5 da exordial e atribuídas aos representantes da chapa majoritária recorridos – uso de programa institucional de rádio, custeado com verbas públicas, para realização de comício em período pré-eleitoral e tiragem de jornal divulgando, com enfoque publicitário e eleitoral, as ações realizadas pela municipalidade na gestão de Douglas e Zelindo. A referida AIJE foi julgada na sessão de 06.4.2021, em recurso de minha relatoria, e ambos restaram condenados com multa pecuniária, conforme ementa do aresto que segue:

 

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL – AIJE. PREFEITO E VICE-PREFEITO. CANDIDATOS À REELEIÇÃO. CONDUTA VEDADA AOS AGENTES PÚBLICOS. ART. 73 DA LEI N. 9.504/97. DESPESAS COM PUBLICIDADE INSTITUCIONAL. LIMITE DE GASTOS EXCEDIDO. VERBA PÚBLICA. FAVORECIMENTO DAS FUTURAS CANDIDATURAS. DESVIO DE FINALIDADE. PREJUÍZO À ISONOMIA ENTRE CONCORRENTES AO PLEITO. ABUSO DE PODER POLÍTICO OU ECONÔMICO. NÃO CARACTERIZADO. SANCIONAMENTO. MULTA PARA CADA ILÍCITO ELEITORAL. INDIVIDUALIZADA PARA RESPONSÁVEL E BENEFICIÁRIO. PATAMAR MÍNIMO. PROVIMENTO PARCIAL.
1. Insurgência contra sentença que julgou improcedente Ação de Investigação Judicial Eleitoral - AIJE ajuizada em desfavor dos reeleitos aos cargos de prefeito e vice-prefeito, sob o entendimento de que o conjunto probatório não demonstrou o cometimento da conduta vedada aos agentes públicos, descrita no art. 73, inc. VII, da Lei n. 9.504/97, tampouco a prática de abuso de poder político ou econômico.
2. Conduta Vedada do art. 73, inc. VII, da Lei n. 9.504/97, c/c o art. 1º, § 3º, inc. VII, da EC n. 107/20. Devido às contingências sanitárias decorrentes da pandemia da COVID-19, para o pleito de 2020, o art. 1º, § 3º, inc. VII, da EC n. 107/20 alterou o período considerado para fins de cálculo das despesas com publicidade institucional de seis para oito meses, prevendo, ainda, a possibilidade de superação da média de gastos, quando presente “caso de grave e urgente necessidade pública, assim reconhecida pela Justiça Eleitoral”. Este Regional sedimentou sua jurisprudência no sentido de que as rubricas relacionadas à publicidade de natureza legal/oficial e aquelas pertinentes à publicidade de utilidade pública/interesse social devem ser excluídas do cômputo da média de gastos a que alude a normativa em tela. Conjunto probatório apto a demonstrar que, no gerenciamento dos gastos com publicidade institucional, os recorridos não observaram adequadamente as restrições legais, incorrendo na prática da conduta vedada. Prejuízo ao princípio da igualdade de chances entre os concorrentes ao pleito, bem jurídico tutelado pela norma. Despiciendas eventuais incursões acerca da potencialidade lesiva da conduta, reservando-se o juízo de proporcionalidade à etapa de aplicação das sanções cabíveis.
3. Abuso de Poder Político e Econômico e Uso Indevido de Meio de Comunicação Social (art. 22, caput, da LC n. 64/90). Veiculação de programa em rádio, no horário destinado à prefeitura, em que o prefeito e candidato à reeleição prestou contas da sua gestão, elencando uma extensa lista de obras e serviços executados durante o seu mandato, ao mesmo tempo em que exaltou as qualidades do seu governo em relação às administrações anteriores. Evidenciado que, sob o pretexto de prestar contas à população – em momento bastante anterior ao final do mandato eletivo –, foi utilizado espaço destinado à publicidade institucional do município, patrocinado com recursos públicos, com o intuito de promover a imagem pessoal e a gestão dos recorridos em benefício das suas candidaturas no pleito vindouro, colocando-os em posição de vantagem em relação aos demais pré-candidatos à disputa majoritária. Idêntica finalidade eleitoral percebidas em outras entrevistas concedidas em rádio e também na imprensa escrita. Embora as circunstâncias fáticas não ostentem gravidade suficiente para macular a normalidade e a lisura do pleito no município, apta a ensejar o seu enquadramento como abuso de poder político ou econômico ou uso indevido dos meios de comunicação social, com a aplicação das sanções correspondentes, nos moldes do art. 22, caput e incs. XIV e XVI, da LC n. 64/90, os fatos claramente importaram em uso do serviço de publicidade institucional, custeado pelo município junto à imprensa local, em favor das futuras candidaturas, em manifesto desvio de finalidade pública e prejuízo à isonomia entre os concorrentes ao pleito, amoldando-se à conduta vedada do art. 73, inc. II, da Lei n. 9.504/97.
4. Inexistência de óbice à emissão de juízo condenatório com esteio em capitulação jurídica diversa daquela atribuída aos fatos na inicial, porquanto, segundo a inteligência da Súmula n. 62 do TSE: “Os limites do pedido são demarcados pelos fatos imputados na inicial, dos quais a parte se defende, e não pela capitulação legal atribuída pelo autor”.
5. Sancionamento das duas condutas vedadas, reconhecidas com base no art. 73, incs. II e VII, da Lei n. 9.504/97, c/c o art. 1º, § 3º, inc. VII, da EC n. 107/20. Aplicação de juízo de proporcionalidade, para estabelecer a penalidade de multa como adequada e suficiente à reprimenda de cada uma delas, na forma do § 4º do art. 73 da Lei Eleitoral, uma vez não terem apresentado ostensividade e gravidade suficientes para ensejar a sanção de cassação do diploma, estipulada no § 5º do citado dispositivo legal. Fixação no patamar mínimo legal para cada uma das condutas vedadas, de forma individualizada aos recorridos.
6. Provimento parcial.
(Grifos acrescidos)

 

No que toca à ilegitimidade ativa da coligação majoritária para demandar condenação de candidatos ao pleito proporcional (alegações 3 e 4 da inicial - entrega de materiais com equipamento da prefeitura e compra de voto), o item foi acolhido na decisão de piso que extinguiu o feito sem resolução de mérito quanto aos impugnados Leandro e Natália frente ao entendimento de que o interesse das coligações, na medida em que sua formação só é possível para concorrer ao executivo, se limita às eleições de prefeito e vice, restando inadmitido seu acesso aos concorrentes à vereança.

As preliminares, acolhidas pelo juízo a quo, devem ser mantidas.

Ocorre que, em irresignação, a recorrente silenciou quanto aos pontos, limitando-se a repisar os argumentos expendidos na inicial, de forma que, não combatidos os fundamentos específicos da sentença, inviável a análise da matéria por esta Corte (art. 932, inc. III, do CPC).

Não desconheço que, na espécie, a coligação majoritária seria legítima para propor ações também em relação ao pleito proporcional. Contudo, infere-se que não subsistiria interesse processual objetivo da autora, por ausência de provas que pudessem levar a um entendimento diverso do adotado pelo Ministério Público Eleitoral de piso, a fim de ensejar o devido processamento e condenação dos requeridos, visto que, como bem consignado na sentença “o Ministério Público, legitimado por excelência (art. 3, §1º e 24 da L 64/90), quando teve oportunidade de examinar as contendas trazidas novamente à baila, quando recebeu notícia dos fatos atribuídos aos vereadores supramencionados, entendeu pelo arquivamento de ambos os feitos por ausência de prova da ocorrência dos atos ilícitos eleitorais atribuídos aos requeridos, entendimento que manteve quando da apresentação de parecer por ocasião deste processo, inclusive em decorrência da ausência de novas provas sobre os fatos”.

Ressalto que o órgão ministerial da origem, após receber as Notícias de Fato Procedimento n. 01758.000.212/2020 (ID 40405683) e Procedimento n. 01898.000.343/2020 (ID 40405533), relativas aos candidatos ao cargo de vereador NATÁLIA STRELOW e LEANDRO KELLER COLLERAUS, concluiu por arquivá-las diante da ausência de provas suficientes a caracterizar a suposta captação ilícita de sufrágio.

Assim, deixo de conhecer o recurso, devido à litispendência, quanto aos itens 1 (uso de propaganda institucional em rádio) e 5 (distribuição de jornal contendo os feitos da Prefeitura); e, na mesma linha, em razão de ausência de interesse processual objetivo da autora, deixo de conhecer a irresignação no que toca os itens 3 (uso de maquinário da municipalidade para entrega de materiais) e 4 (captação ilícita de sufrágio). Porém, aqui somente quanto aos candidatos eleitos à vereança Leandro e Natália, recaindo sobre o mérito a análise das consequências das condutas quanto a Douglas e Zelindo.

Tratadas as preliminares, de modo a fixar a matéria debatida na esfera recursal, conheço dos itens remanescentes - 2, 3, 4, 6 e 7 - do recurso, frisando que os itens 3 e 4, tão somente em relação à eleição majoritária.

 

 

4. Mérito

A COLIGAÇÃO ESPUMOSO É DO POVO ingressou com AIME, ação de cunho constitucional, com assento no art. 14, § 10, da CF, que visa desconstituir mandato quando da ocorrência de abuso de poder econômico, corrupção ou fraude.

Trata-se, conforme doutrina de José Jairo Gomes, de “ação de índole constitucional-eleitoral, com potencialidade desconstitutiva do mandato. Por óbvio, não apresenta caráter criminal. Seu objetivo é tutelar a cidadania, a lisura e o equilíbrio do pleito, a legitimidade da representação política, enfim, o direito difuso de que os mandatos eletivos apenas sejam exercidos por quem os tenha alcançado de forma lícita, sem o emprego de práticas tão censuráveis quanto nocivas como são o abuso de poder, a corrupção e a fraude” (Gomes, José Jairo. Direito eleitoral – 14. ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Atlas, 2018).

No caso concreto, foi interposto recurso pela coligação autora em face da sentença do Juízo Eleitoral da 004ª Zona – Espumoso, a qual julgou improcedente a AIME promovida em desfavor de DOUGLAS FONTANA e ZELINDO SIGNOR NETO, reeleitos Prefeito e Vice-Prefeito de Espumoso na eleição de 2020, e de LEANDRO KELLER COLLERAUS e NATÁLIA STRELOW, eleitos ao cargo de vereador no pleito de 2020, aos quais a recorrente atribuiu as práticas de abuso de poder político e econômico por meio da utilização da Administração Municipal, bem como captação ilícita de sufrágio por parte dos candidatos na eleição proporcional.

Passo a análise do mérito quanto às alegações recursais conhecidas (itens 2, 3, 4, 6 e 7 do recurso).

4.1. Uso de espaço físico da prefeitura para promover atos de filiação partidária ao PDT (partido dos impugnados) e cooptação de apoio político por meio da administração pública (item 2 do recurso)

Aduz a recorrente que o prefeito impugnado, por meio de seus secretários e servidores em comissão (CC), teria transformado a Prefeitura de Espumoso em comitê eleitoral do partido pelo qual concorreu (PDT), publicando fotos de novas filiações realizadas no interior do prédio da municipalidade e realizando propaganda de forma a atrair mais pessoas ao criar a sensação de obtenção de vantagens caso filiado à sua grei.

Aqui, há subdivisão da matéria aventada em recurso em 5 pontos: 1.1) cooptação de Antônio Tavares, 1.2) cooptação de Enio Bonfanti, 1.3) cooptação de Sandra Alves e seu marido, 1.4) cooptação de Derly Helder, e 1.5) aumento exorbitante de filiações ao PDT, contudo, grosso modo, versam sobre o aumento das fileiras do partido em decorrência das ações do gestor municipal de Espumoso, de modo que serão tratados em conjunto.

Pois bem.

O Sr. Antônio Tavares foi nomeado Secretário Municipal de Administração pelo Prefeito reeleito - Douglas - em ato lícito no exercício da discricionariedade peculiar à sua posição, visto se tratar de cargo de livre nomeação e exoneração. A ação, corriqueira em qualquer administração, traduz a liberdade que o gestor possui para compor seu staff, de forma a permitir que os líderes do executivo tenham ao seu lado, por exemplo, aliados - políticos ou não -, pessoas que compartilham suas convicções, especialistas e, não raro, outros candidatos, com votação expressiva ou não, reconhecidos pela população, como é o caso do Pastor Tavares, nome pelo qual concorreu em 2016.

O cooptado tem vida politica pregressa, já tendo, inclusive, disputado uma vaga ao legislativo pelo PDT, partido do atual prefeito, em 2001, com êxito. Em momento posterior, aderiu ao MDB e pleitou, novamente, cadeira junto à vereança, conseguindo a suplência. E, em 2020, dentro da janela partidária, retornou ao PDT.

Inviável, diante da notória atividade politica exercida pelo Pastor Tavares, acolher a tese recursal de uso do espaço da prefeitura pelo Prefeito Douglas, visto que a foto colacionada apenas indica que a ficha de filiação do Sr. Eliseu foi abonada pelo atual Secretário da Administração e filiado ao PDT, sem menção ou participação do gestor local, em evento aparentemente isolado, não conduzindo, necessariamente, ao ilícito arrolado pela recorrente.

No que toca aos empresários, filiados licitamente ao PDT, Enio Bonfanti, inscrito em 2020 (ID 40402183), Edmilson Borba de Oliveira, filiado em 2018 (ID 40403033), e sua esposa, suplente de vereador pelo PP na eleição de 2016, Sandra Alves da Silva, filiada, segundo a recorrente, em 2020, com efeito houve um incremento de suas vendas junto ao órgão municipal, do que não se extrai que as operações tenham ocorrido à margem da lei. A distinção abordada pela recorrente refere-se aos valores praticados entre um mandato e outro, contudo os demonstrativos de despesas coligidos (ID 40401933, 40401983, 40402033, 40402083, 40402133) não fazem prova de mácula entre as transações realizadas entre os empresários e a municipalidade, deixando a autora de trazer ao feito notícia ou prova cabal de ilegalidade apta a infirmar a decisão de piso. De outro vértice, os impugnados, em contestação, carrearam aos autos documentação hábil a aferir a adequação dos trâmites ocorridos entre as partes, os quais já aconteciam quando do predecessor de Douglas a frente da administração municipal.

Há, ainda, a suposta cooptação do ex-prefeito de Espumoso, Derly Helder, mediante oferecimento de vantagem econômica, traduzida em locação de pedreira de sua propriedade.

O antecessor de Douglas foi levado ao cargo de prefeito pela Coligação Espumoso Para Todos, composta pelos partidos PRB, PT, PSDB e PP, concorrendo filiado a este último, no pleito de 2012. Derrotado em 2016, seguiu associado ao PP e, em 2020, quando do novo pleito municipal, a despeito de sua agremiação fazer oposição à reeleição do candidato do PDT, segundo a recorrente, apoiou o candidato Douglas.

Ocorre que, nos dizeres da autora, o ex-prefeito, ainda que filiado ao PP, teria sido cooptado pelo líder da atual gestão local em decorrência do arrendamento de uma área de 2ha (dois hectares) contendo pedreira do Sr. Derly Helder.

Quanto ao ponto, ainda que manejada argumentação no sentido da ilegalidade do contrato, visando a mitigação dos adversários políticos com a utilização de recursos públicos, não foi coligida ao feito prova nesta direção, bem como não foi combatida, em sede recursal, a tese vertida em contestação, a qual indica a existência de apenas duas pedreiras licenciadas na região, de forma que o acordo, em realidade, resultaria em economia para os cofres públicos, e, ainda, a ausência de declaração de apoio do antigo ao atual prefeito.

Não obstante o aumento substancial de filiados ao PDT, último item do tópico, informação obtida em cotejo, realizado pela coligação, entre o número de inscritos ao partido no ano de 2016 e em 2020, a aduzida ilegalidade no incremento das fileiras da grei não foi demonstrada. Tampouco foi sopesada a vultosa diferença de votos obtidos entre pleitos de 2016 e 2020 a favor do candidato Douglas, aqui impugnado.

Por percuciente, colho do Parecer da Procuradoria Regional Eleitoral:

 

Ao proceder à comparação entre os resultados das eleições de 2016 e 2020 em relação aos votos obtidos pelo candidato eleito Prefeito, verifica-se uma diferença de 1.966 votos (6.500 – 4.534), que corresponde a um aumento de 43,36%.
Por sua vez, ao proceder à comparação entre o número de filiados ao PDT na última legislatura (2017-2020), verifica-se uma diferença de 160 filiados (754 – 594), que corresponde a um aumento de 26,93% no número de filiados, o que é compatível com o crescimento do apoio do eleitorado ao governo do impugnado.
De outra banda, a Coligação recorrente não comprovou qualquer ilegalidade no ato de filiação ou da conduta dos 160 novos filiados, em especial dos filiados nominados na petição inicial Antônio Tavares, Ênio Bonfanti, Sandra Alves da Silva, Edimilson Borba de Oliveira e Derly Helder.

 

Enfrentado o tópico invocado pela recorrente, adiro, no que calha a fragilidade das razões e evidências aduzidas, à decisão exarada pelo magistrado a quo:

 

“Não se desacredita dos argumentos supramencionados, tendo em vista que parcela mínima deles acompanhados de um mínimo de indícios, como, por exemplo, fotografia da filiação de Antônio, reportagem do Ministério Público de Caxias do Sul, e notas de empenho a Ênio.
Ocorre que referidos documentos são apenas provas indiciárias, já que apenas fazem prova da ligação dos supostos filiados com a Administração Municipal, bem como com o PDT.
Entretanto, não comprovam que as pessoas supramencionadas filiaram-se ao PDT exclusivamente em decorrência de realização de contratação com a Administração Pública.
Não se constatou nenhuma irregularidade nas contratações entre os filiados supramencionados e a Administração Pública. Na verdade, juntou prova documental apenas da contratação entre o Município e o filiado Ênio, que ocorrem ao menos desde 2017 (empenhos juntados à inicial), ou seja, bem antes da filiação.
Por outro lado, constatou-se que a maior parte deles já havia sido filiada ao PP e/ou ao MDB, partidos coligados em oposição ao PDT nas últimas eleições.
Cabe salientar que as eleições majoritárias municipais vêm sendo compostas por apenas três grandes partidos, MDB e PP de um lado e PDT do outro. Não causando nenhuma estranheza no fato de que filiados que atuam em partidos com objetivos semelhantes, insatisfeitos com a sua atuação, passem a filiar-se em partidos de oposição.
Nesse contexto, os fatos alegados pelo requerente, desprovidos de prova robusta, não se prestam a cassação de mandato eletivo, motivo por que restam desacolhidos.
De igual forma, o aumento de cerca de 150 filiados ao PDT durante a última legislatura não se presta a mesma finalidade buscada pelos demandantes, tendo em vista que desprovida de prova de ilegalidade no ato de filiação ou da conduta dos filiados.
Por fim, não há nenhum impedimento legal para que seja firmado no interior da prefeitura um pedido de filiação, não se confundindo tal ato com aquele apontado como ilegal pelo Ministério Público de Caxias do Sul, na reportagem jornalística juntada à inicial, onde o “Parquet” coibia o uso do espaço público “Salão Nobre” da Prefeitura daquela cidade, para reunião coletiva de interesse político-partidário, o que não ocorreu no caso em testilha, um ato isolado de assinatura de requerimento de filiação.”

 

O acervo carreado pela autora, desta feita, não tem força suficiente a fazer prova inconteste do alegado, de forma que a recorrente não se desincumbiu do ônus de comprovar os ilícitos aos recorridos atribuídos.

 

4.2. Captação ilícita de sufrágio por Leandro Colleraus e Natália Strelow (pontos 3 e 4 do recurso – apenas quanto ao favorecimento do pleito majoritário)

 

De forma contígua, tal qual o ponto anterior, enfrentarei a matéria controvertida, diante das acusações de ambos os candidatos ao pleito proporcional de compra de votos em prol de suas candidaturas e da chapa majoritária encabeçada pelo candidato eleito Douglas Fontana.

A compra de votos tem previsão legal no art. 41-A da Lei n. 9.504/97, cuja redação é a seguinte:

Art. 41-A. Ressalvado o disposto no art. 26 e seus incisos, constitui captação de sufrágio, vedada por esta Lei, o candidato doar, oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição, inclusive, sob pena de multa de mil a cinqüenta mil Ufir, e cassação do registro ou do diploma, observado o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar no 64, de 18 de maio de 1990. (Incluído pela Lei nº 9.840, de 1999)

§ 1o Para a caracterização da conduta ilícita, é desnecessário o pedido explícito de votos, bastando a evidência do dolo, consistente no especial fim de agir. (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)

§ 2o As sanções previstas no caput aplicam-se contra quem praticar atos de violência ou grave ameaça a pessoa, com o fim de obter-lhe o voto. (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009) (Grifei.)

 

É necessária a demonstração de que o candidato realizou uma das condutas da supracitada norma, mesmo que não seja possível determinar exatamente qual foi o eleitor eventualmente corrompido.

Nesse passo, adianto que as irresignações não prosperam, pois padecem do mesmo vício, a ausência de inovação recursal a atestar a captação de ilícita de votos, em favor próprio e do atual prefeito, pelos eleitos vereadores Leandro e Natália, notícias já tratadas e arquivadas pelo Parquet na origem.

Leandro Colleraus, concorrendo a vereança no pleito de 2020, foi acusado de compra de votos mediante entrega de material de construção, utilizando equipamento da Prefeitura, ao eleitor Jair da Silva, e ainda, oferta de dinheiro, cestas básicas e combustível a Gleidson Bones Drum.

As duas situações foram apuradas pelo Ministério Público, Notícia de Fato (NF) n. 01898.000.329/2020 e 01898.000.343/2020 (ID 40404383), respectivamente, e, não comprovadas, foram arquivadas.

Ocorre que a retroescavadeira da municipalidade teve sua solicitação de serviço realizada e paga, conforme acervo juntado, por Jocimar José Bertolini Filho, no intuito de retribuir os serviços de jardinagem a ele prestados por Jair da Silva com material de construção – areia. E, no que importa a promessa de valores, cestas básicas e gasolina a Gleidson, melhor sorte não assiste ao recorrente, visto que as provas, obtidas em diligência pelo MP, não se revestem da força necessária a comprovar o ilícito (ID 40404083, 40404133, 40404183, 40404233 e 40404283).

Natália Strelow foi impugnada, pois, segundo a recorrente, teria, por meio de entrega de materiais de construção e pagamento de mão-de-obra, em proveito da chapa majoritária, comprado os votos de Josiele Pinto e Jussara das Almas.

O ilícito foi denunciado à Promotoria de Justiça de Tapera, a qual instaurou o Procedimento Preparatório Eleitoral – PPE n. 01898.000.318/2020, e, na linha dos demais, foi arquivado diante da ausência de comprovação do noticiado.

Em resumo, Josiele prestou serviços de faxina na residência de Natália e utilizou cheque pré-datado, emitido pelo esposo desta última, para quitar dispêndio com pedreiro que reformava sua casa; enquanto Jussara, que também reformava sua moradia, comprovou o pagamento dos itens necessários a sua obra inclusive com apresentação de notas fiscais. Afastados, em ambos os casos, o ilícito imputado a candidata a vereança de Espumoso.

Na linha da bem-lançada sentença, dessa forma, inexistindo prova dos ilícitos, não há falar em compra de votos em benefício da chapa majoritária.

Segue precedente do TSE no mesmo sentido:

Eleições 2016. Representação. Captação ilícita de sufrágio. Art. 41-A da Lei 9.504/97. Candidato a vereador eleito. Condenação. Gravação ambiental. Prova robusta. Ausência.

1. A tese de ilicitude da prova, por impossibilidade de identificar se a gravação foi realizada em ambiente público, não foi expressamente examinada pelo Tribunal a quo, ainda que tenham sido opostos embargos de declaração pelo candidato a vereador. Nada obstante a ausência de enfrentamento do tema pela Corte de origem, não foi alegada ofensa ao art. 275 do Código, razão pela qual incide o óbice do verbete sumular 72 desta Corte Superior.

2. Para afastar a afirmação do Tribunal a quo no sentido de que o diálogo entabulado na gravação ambiental se deu entre o recorrente e envolvia efetivamente um eleitor, seria necessário o reexame do acervo fático-probatório, providência vedada nesta instância especial, a teor do verbete sumular 24 do TSE.

3. O TRE/MG concluiu pela configuração da prática de captação ilícita de sufrágio, embasando-se, além do depoimento pessoal do candidato ao reconhecer sua voz (mas negando a prática ilícita), em uma única prova consistente em gravação ambiental, sem efetivamente declinar as circunstâncias da produção desse elemento probatório e destacando pequeno trecho de diálogo, de teor vago sobre eventual cooptação de voto, do qual não é possível inferir, com segurança, a existência da conduta ilícita.

4. ‘A configuração da captação ilícita de votos possui como consequência inexorável a grave pena da cassação do diploma, pelo que se exige para o seu reconhecimento conjunto probatório robusto, apto a demonstrar, indene de dúvidas, a ocorrência do ilícito e a participação ou anuência dos candidatos beneficiários com a prática.’ (AgR-RO 2240-81, rel. Min. Rosa Weber, DJe de 6.8.2018).

Recurso especial provido.

(Recurso Especial Eleitoral nº 69233, Acórdão, Relator: Min. Admar Gonzaga, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônica, Data: 28/05/2019) (Grifei.)

 

4.3. Contratações irregulares em ano eleitoral – cooptação de apoio (ponto 6 do recurso)

 

Aduz a recorrente que o prefeito impugnado realizou contratações à margem da lei.

Em síntese, apontaram a contratação de cliente de Douglas, enquanto advogado, para a atividade de engenheiro, sem realização de seleção pública, identificação do tipo de engenharia ou formação; ausência de qualificação profissional de 21 contratados a demonstrar aptidão para o exercício das atividades a eles designadas; e a contratação de empresa de Leandro Pereira dos Santos para prestar serviços de zeladoria.

Do acervo carreado pela autora, não consta documentação alguma a corroborar a tese explanada na exordial e replicada em sede recursal, de forma que, do todo exposto, a coligação não logrou fazer prova dos fatos ao líder do executivo municipal imputados, no que coaduno com a sentença e o parecer ministerial.

 

4.4. Ocorrência de “voto a cabresto” e publicação, em redes sociais, com os seguintes dizeres “Espumoso – Terra sem Lei” (item 7 do recurso)

 

O aspecto aqui ventilado é a coação dos munícipes pelo chefe do executivo de Espumo, de forma a incorrer em abuso de poder político e econômico.

A autora, em segunda instância, revisita a argumentação ofertada na inicial, no que respeita aos dizeres “Espumoso – Terra sem lei”, publicado em redes sociais, decorrente das ações coercitivas empreendidas por Douglas Fontana e seus cabos.

Consubstanciam-se as acusações em ameaças, supostamente realizadas pelos cabos eleitorais Márcio Toledo e Cristiano Lupatini, contra Mateus (Ferruginha); inércia, quanto a intercorrências durante a campanha eleitoral, e colaboração da Brigada Militar para com o grupo do impugnado; publicação de vídeos, segundo a demandante, de traficantes comemorando com tiros a vitória de Douglas; e afirmação deste último, em discurso, no sentido que detém o controle da cidade, incorrendo em abuso de poder político e econômico.

 

O abuso de poder encontra-se normatizado no art. 22, caput e incs. XIV e XVI, da LC n. 64/90:

Art. 22. Qualquer partido político, coligação, candidato ou Ministério Público Eleitoral poderá representar à Justiça Eleitoral, diretamente ao Corregedor-Geral ou Regional, relatando fatos e indicando provas, indícios e circunstâncias e pedir abertura de investigação judicial para apurar uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido político, obedecido o seguinte rito:

(...)

XIV – julgada procedente a representação, ainda que após a proclamação dos eleitos, o Tribunal declarará a inelegibilidade do representado e de quantos hajam contribuído para a prática do ato, cominando-lhes sanção de inelegibilidade para as eleições a se realizarem nos 8 (oito) anos subsequentes à eleição em que se verificou, além da cassação do registro ou diploma do candidato diretamente beneficiado pela interferência do poder econômico ou pelo desvio ou abuso do poder de autoridade ou dos meios de comunicação, determinando a remessa dos autos ao Ministério Público Eleitoral, para instauração de processo disciplinar, se for o caso, e de ação penal, ordenando quaisquer outras providências que a espécie comportar; (Redação dada pela Lei Complementar nº 135, de 2010)

(...)

XVI – para a configuração do ato abusivo, não será considerada a potencialidade de o fato alterar o resultado da eleição, mas apenas a gravidade das circunstâncias que o caracterizam. (Incluído pela Lei Complementar nº 135, de 2010)

 

Na lição de José Jairo Gomes (Direito Eleitoral Essencial, São Paulo: Editora Método, 2018, pp. 228-229):

 

Haverá abuso sempre que, em um contexto amplo, o poder – não importa sua origem ou natureza – for manejado com vistas à concretização de ações irrazoáveis, anormais, inusitadas ou mesmo injustificáveis diante das circunstâncias que se apresentarem e, sobretudo, ante os princípios e valores agasalhados no ordenamento jurídico. Por conta do abuso, ultrapassa-se o padrão normal de comportamento, realizando-se condutas que não guardam relação lógica com o que normalmente ocorreria ou se esperaria que ocorresse. A análise da razoabilidade da conduta e a ponderação de seus motivos e finalidades oferecem importantes vetores para a apreciação e o julgamento do evento; razoável, com efeito, é o que está em consonância com a razão.

(...)

No Direito Eleitoral, o abuso de poder consiste no mau uso de direito, situação ou posição jurídicas com vistas a exercer indevida e ilegítima influência em dada eleição. Para caracterizá-lo, fundamental é a presença de uma conduta em desconformidade com o Direito (que não se limita à lei), podendo ou não haver desnaturamento dos institutos jurídicos envolvidos. No mais das vezes, há a realização de ações ilícitas ou anormais, denotando mau uso de uma situação ou posição jurídicas ou mau uso de bens e recursos detidos pelo agente ou beneficiário ou a eles disponibilizados, isso sempre com o objetivo de influir indevidamente em determinado pleito eleitoral.

 

As práticas abusivas, nas suas diferentes modalidades, não demandam prova da sua interferência no resultado da votação, mas, tão somente, da gravidade das condutas para afetar o equilíbrio entre os candidatos e, com isso, causar mácula à normalidade e à legitimidade da disputa eleitoral (TSE, AIJE n. 060177905, Acórdão, Relator Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, DJE de 11.3.2021), valores tutelados pelo art. 14, § 9º, da Constituição Federal:

Art. 14. (...)

(...)

§9º. Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para o exercício do mandato, considerada a vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta.

 

No que respeita especificamente ao abuso de poder econômico, é necessário que a conduta abusiva tenha em vista processo eleitoral futuro ou em curso, concretizando ações ilícitas ou anormais, das quais se denote o uso de recursos patrimoniais detidos, controlados ou disponibilizados ao agente, que extrapolem ou exorbitem, no contexto em que se verificam, a razoabilidade e a normalidade no exercício de direitos e o emprego de recursos, com o propósito de beneficiar determinada candidatura, provocando a quebra da igualdade de forças que deve preponderar no âmbito da disputa eleitoral.

Das alegadas ameaças, realizadas por Márcio e Cristiano contra Ferruginha, constam apenas áudios (ID 40403533 - repetido no ID 40403783-, 40403133 e 40403183), que traduzem o consabido acirramento de ânimos durante a corrida eleitoral, agravado, principalmente, em pequenas localidades. Contudo, em nada alcançam o demandado, tampouco fazem prova de que as ações tenham ocorrido a seu mando ou com seu conhecimento.

A atuação da Brigada Militar em nada pode ser desabonada frente às denúncias de inércia e favorecimento em prol da candidatura de Douglas, visto que o material coligido não se presta a confirmar os atos a ela atribuídos – fotos de ID 40402783 e 40402833 e vídeo 40403983 – pois não demonstram conduta atentatória à sua função em nenhum momento ou indício da participação do prefeito. Corroborando, não consta nos autos anotação de que a possível irregularidade tenha sido levada ao conhecimento da Instituição para apuração.

Na comemoração, dito pela coligação, de traficantes pela reeleição do impugnado, demonstrada por vídeos, não há menção alguma ao pleito ou ao atual líder do executivo municipal, sequer há comprovação de tratar-se de traficantes membros de facção criminosa, o que consta são dois arquivos, ID 40404033 e 40403433, com pessoas realizando disparos para cima em residência em local e data não informadas, sendo que apenas no primeiro arquivo consta um vídeo (aparentemente divulgado na internet, pois podemos verificar que há indicação de possível usuário “@valdirprates_17” na parte inferior do celular e, na parte superior, o nome marvin_vanceta), com participante gritando “é os guri”, e, no ID 40403233, matéria com foto de prisão de traficante, no Município de Ijuí, o que em nada conduz ou mácula a conduta de representante da chapa majoritária.

Em discurso, de fato o gestor da municipalidade alegou “saber de tudo” e que “quem manda na cidade é o Prefeito” (ID 40403883 e 40403933), porém não dentro do contexto de coação e abuso a ele imposto, mas sim no bojo de exposição sobre as medidas a serem adotadas pelos cidadãos durante o período de pandemia. Os arquivos de áudio carreados pela recorrente são “cortes” de uma matéria que tratava sobre o primeiro caso de coronavírus na cidade, conforme link https://www.facebook.com/1800145430237008/videos/2797548103692379, informado em contestação, não servindo ao desígnio de induzir a penalização do prefeito.

Com efeito, todo arcabouço construído pela recorrente, com fotos, vídeos e áudios, tal qual o exarado em sentença, apenas faz prova indiciária do aduzido pela autora, sem qualquer lastro probatório, de sorte que, não demonstrada a ilicitude dos atos praticados pela chapa majoritária, inviável a condenação dos impugnados.

Nesse sentido, não restou evidenciado o liame entre os fatos apresentados e a suposta prática dos crimes pretendidos, conforme doutrina de Mitidiero, Arenhart e Marinoni, a qual indica que:

“Por meio da prova indiciária, o conhecimento do fato probando resulta de uma inferência lógica, formulada pelo magistrado a quem é submetida a causa, a partir do conhecimento de outro fato - que se prova nos autos, chamado de indício – e ao qual, normalmente, a ocorrência do primeiro está ligada. Há, então, um fato “secundário” provado e, por sua ocorrência, extrai-se a consequente existência (ou inexistência) do fato “primário”, em que se tinha, efetivamente, interesse. Esse juízo é possível diante de um critério racional indutivo de normalidade ou de probabilidade lógica da coexistência de ambos os fatos. Ou seja, tem-se, no cerne da figura, uma ideia de silogismo: ocorrendo o fato “A”, sempre deve ocorrer o fato “B”; verificada a ocorrência do fato “A”, então também ocorreu o fato “B”.Como fica claro na análise do esquema apresentado, a adequação ou não da inferência lógica está calcada na maiou ou menor precisão das premissas utilizadas para subsidiar a conclusão, ou seja, no grau de “certeza” que se tem da efetiva ocorrência do fato secundário e no grau de vinculação que existe entre a verificação deste e a consequente e necessária existência do fato primário. Portanto, o grau de credibilidade da presunção judicial repousa na convicção existente a partir da inexorabilidade da procedência da ilação formulada” (MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Manual do processo civil. 5. ed. rev., atual. e ampl. - São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2020).

 

Assim, não há falar em abuso de poder, seja político ou econômico, do qual poderia resultar a cassação de mandato, diante da ausência de suporte fático-probatório a sustentar a presente ação de impugnação, entendimento sufragado pela Corte Superior:

ELEIÇÕES 2018. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ORDINÁRIO. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO. DEPUTADO FEDERAL. SUPOSTO ABUSO DE PODER ECONÔMICO. PROVA ROBUSTA E GRAVIDADE DOS FATOS. INEXISTÊNCIA. DESPROVIMENTO. 1. Inexiste ofensa ao art. 36, § 7º do RITSE, amparada a decisão na legislação aplicável à espécie e na jurisprudência deste Tribunal. 2. Imprescindível para a configuração do abuso de poder prova inconteste e contundente da ocorrência do ilícito eleitoral, inviabilizada qualquer pretensão articulada com respaldo em conjecturas e presunções. Precedentes. 3. Além disso, a quantia de R$ 10.300,00 (dez mil e trezentos reais), ainda que utilizada com o escopo de obter apoio político, é incapaz de afetar os bens jurídicos da normalidade e legitimidade, bem como da isonomia entre os candidatos, considerando o contexto de eleições gerais para o cargo de Deputado Federal, com abrangência em todo o estado da federação.4. Agravo Regimental desprovido.

(RO n. 060000603, Acórdão, Relator(a) Ministro ALEXANDRE DE MORAES, DJE de 02.02.2021.) (Grifei.)

 

Por esses motivos, na esteira do posicionamento da Procuradoria Regional Eleitoral, uma vez constatada a escassez e a precariedade dos elementos probatórios coligidos aos autos, deve ser mantido o juízo de improcedência da demanda com relação às supostas práticas de captação ilícita de sufrágio e abuso de poder econômico e político pelos demandados.

 

Diante do exposto, VOTO, preliminarmente, por rejeitar a alegação de inépcia da inicial, reconhecer a existência de litispendência quanto aos pontos 1 e 5 do recurso, reconhecer a ilegitimidade ativa da coligação para demandar os candidatos ao pleito proporcional quanto aos itens 3 e 4 do recurso; e, no mérito, pelo desprovimento do recurso para manter a sentença de improcedência da Ação de Impugnação de Mandato Eletivo – AIME.

É como voto, senhor Presidente.