REl - 0600358-83.2020.6.21.0142 - Voto Relator(a) - Sessão: 20/06/2022 às 14:00

VOTO

Da Admissibilidade

O recurso é tempestivo, pois interposto dentro do tríduo legal, e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, razão pela qual dele conheço.

 

Do Mérito

No mérito, trata-se de irresignação interposta contra sentença que desaprovou as contas de ROBERTO VIEIRA ORTIZ, candidato ao cargo de vereador nas eleições de 2020, no Município de Candiota, e determinou-lhe o recolhimento de R$ 300,00 em favor do Tesouro Nacional, por omissão de gastos e consequente arrecadação de recursos de origem não identificada.

O ilustre magistrado a quo entendeu que o candidato, não tendo declarado em sua contabilidade o gasto com serviços advocatícios, os quais efetivamente foram prestados em prol da campanha, incorreu em omissão de despesa, cujo pagamento se deu com a utilização de recursos de origem não identificada. Tendo em vista não ser possível apurar o exato montante sonegado, foi esse fixado pela autoridade judicial em R$ 300,00, equivalente à média dos valores cobrados por advogados no município em questão para o desempenho de serviços similares.

Com efeito, segundo estabelece o art. 53, inc. I, al. “g”, da Resolução TSE n. 23.607/19, a prestação de contas deve ser integrada por todas as receitas e despesas, especificadamente, verbis:

Art. 53. Ressalvado o disposto no art. 62 desta Resolução, a prestação de contas, ainda que não haja movimentação de recursos financeiros ou estimáveis em dinheiro, deve ser composta:

I - pelas seguintes informações:

[...]

g) receitas e despesas, especificadas;

 

In casu, não foi escriturada nas contas de campanha a despesa com serviços advocatícios, os quais efetivamente foram prestados ao candidato.

Desse modo, mostra-se patente a infringência à retrocitada norma.

O recorrente argumenta que não houve pagamento para a primeira profissional, uma vez que ela não pôde acompanhar o processo até o final, e que o seu atual procurador, como dirigente partidário estadual, apenas juntou a procuração com o intuito de suprir a representação processual e dar continuidade ao processo sem a cobrança de honorários.

O argumento, entretanto, não foi amparado em qualquer documento probatório da contratação dos serviços advocatícios, até porque o próprio recorrente refere em seu recurso que “houve um acerto verbal entre o PSB e a Dra. Elisama Maryan Cardoso da Silva Alves, para que a profissional fizesse a prestação de contas do candidato”.

Outrossim, ainda que o seu atual procurador, como dirigente partidário estadual, tenha se oferecido para dar continuidade ao processo sem a cobrança de honorários, tal fato não teria o condão de afastar a mácula, porquanto, de qualquer maneira, não houve o registro da despesa e da receita na prestação de contas, ainda que fosse como doação estimável em dinheiro.

Ademais, a omissão de gastos financeiros na prestação de contas final é falha que pode ser sanada na prestação de contas retificadora com o registro da despesa, nos termos do art. 71 da Resolução TSE n. 23.607/19.

Logo, a receita utilizada para satisfação do débito com advogado, financeira ou estimável em dinheiro, caracterizou-se como recursos de origem não identificada, consoante o disposto no art. 32 da Resolução TSE n. 23.607/19.

Nesse passo, entendo que não merece reparo a decisão monocrática que, com base na média dos valores cobrados por outros advogados nas contas apresentadas por candidatos do Município de Candiota, conforme apurado pelo órgão técnico em primeira instância (ID 44939869), arbitrou em R$ 300,00 o quantum da despesa omitida e determinou ao candidato o recolhimento da importância ao Tesouro Nacional.

Dessa forma, como bem pontuou o ilustre Procurador Regional Eleitoral Dr. José Osmar Pumes em seu parecer (ID 44943253):

[...]

Diante disso, verificados gastos com consultoria jurídica e serviços judiciais sem o trânsito, pelas contas de campanha, das correspondentes receitas utilizadas para pagamento, tais recursos devem ser considerados como de origem não identificada, consoante dispõe o art. 32, § 1º, inc. VI, da Resolução TSE n. 23.607/19 (Caracterizam o recurso como de origem não identificada: (...) os recursos financeiros que não provenham das contas específicas de que tratam os arts. 8º e 9º desta Resolução), impondo-se o seu recolhimento ao erário, nos termos do caput do mesmo artigo.

Devem ser mantidas também as ponderações do parecer conclusivo, acolhidas pela sentença, sobre o valor a ser recolhido ao Tesouro Nacional, verbis:

Por fim, para não ficar prejudicado o recolhimento dos valores considerados, s.m.j., como recursos de origem não identificada, esta analista de contas junta aos autos cópias retiradas dos outros processos (devidamente excluídos os prestadores), onde consta os valores cobrados por 3 advogados no município de Candiota nas eleições 2020, sendo que os valores são: R$200,00, R$300,00 e R$400,00, fazendo então a média de R$300,00.caracterizado o recebimento de recursos de origem não identificada, está correta a sentença na parte em que reconheceu a irregularidade em tela, determinando o recolhimento dos valores omitidos ao Tesouro Nacional nos termos do art. 32 da referida Resolução. Outrossim, tendo em vista a ausência de qualquer informação pelo prestador, o valor utilizado pela unidade técnica para estimar o valor gasto com serviços de advocacia tomou com base outras prestações de contas referentes ao mesmo município.

 

Nessa linha, trago à colação recentes arestos desta Corte Regional, em que foi assentado que a falta de escrituração no ajuste contábil de gastos com honorários advocatícios configura recursos de origem não identificada, sendo adequado o arbitramento do valor da despesa pelo juiz eleitoral:

RECURSO. RECURSO. ELEIÇÕES 2020. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. VEREADOR. PRELIMINAR. JUNTADA DE PRESTAÇÃO DE CONTAS RETIFICADORA NA VIA RECURSAL. PRECLUSÃO. ANÁLISE TÉCNICA PORMENORIZADA. ATIVIDADE A SER REALIZADA EM PRIMEIRA INSTÂNCIA. OMISSÃO DE GASTOS. SERVIÇOS ADVOCATÍCIOS. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. QUANTUM ARBITRADO PELO JUÍZO COM BASE NA MÉDIA VERIFICADA NO MUNICÍPIO. VALOR ABSOLUTO DIMINUTO. PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Recurso contra sentença que desaprovou as contas de candidato a vereador, referentes às eleições municipais de 2020, em virtude de omissão de gasto eleitoral atinente a serviços advocatícios, configurando recebimento de recursos de origem não identificada. Determinado o recolhimento ao Tesouro Nacional.

2. Preliminar. Não conhecida a prestação de contas retificadora oferecida com as razões recursais, porquanto demandaria a realização de exame pormenorizado dos lançamentos contábeis, em cotejo com os extratos bancários e demais batimentos integrantes dos procedimentos técnicos de exame, atividade a ser realizada, nas eleições municipais, em primeira instância. Transcorrido o momento processual adequado, preclusa a possibilidade da apresentação de contas retificadoras, na esteira da jurisprudência deste Tribunal.

3. Segundo estabelece o art. 53, inc. I, al. “g”, da Resolução TSE n. 23.607/19, a prestação de contas deve ser integrada por todas as receitas e despesas, especificadamente. In casu, não foi escriturada nas contas de campanha a despesa com serviços advocatícios, os quais efetivamente foram prestados ao candidato. Logo, a receita utilizada para satisfação deste débito, financeira ou estimável em dinheiro, caracteriza-se como recurso de origem não identificada, consoante o disposto no art. 32 da Resolução TSE n. 23.607/19. Não merece reparo a decisão monocrática que, com base na média dos valores cobrados por outros advogados nas contas apresentadas por candidatos do município arbitrou o quantum da despesa omitida e determinou ao candidato o recolhimento da importância ao Tesouro Nacional.

4. A falha identificada nas contas, conquanto represente 69,77% das receitas declaradas, mostra-se, em termos absolutos, reduzida. Nessa linha, a jurisprudência deste Tribunal admite a aplicação do critério do valor nominal diminuto, que prepondera sobre eventual aferição do alcance percentual das falhas, de modo a afastar o juízo de desaprovação das contas quando o somatório das irregularidades se mostra irrelevante.

5. Parcial provimento do recurso, para aprovar com ressalvas as contas de campanha relativas às eleições de 2020, mantendo a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional.

(Recurso Eleitoral n 060032848, ACÓRDÃO de 30.11.2021, Relator Miguel Antônio Silveira Ramos, Publicação: PJE - Processo Judicial Eletrônico-PJE.)

 

ELEIÇÕES 2020. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. VEREADOR. DOAÇÃO DE BEM ESTIMÁVEL EM DINHEIRO. PRODUTO DO SERVIÇO OU ATIVIDADE ECONÔMICA DO DOADOR. NÃO COMPROVADO. OMISSÃO DE GASTOS. NOTA FISCAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. AUSENTE REGISTROS NA PRESTAÇÃO DE CONTAS. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA - RONI. IRREGULARIDADES DE ELEVADO PERCENTUAL. VALOR ABSOLUTO DIMINUTO. APLICAÇÃO DOS POSTULADOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Recurso contra sentença que desaprovou as contas de candidato a vereador, relativas ao pleito de 2020, em virtude de recebimento de valor estimável em dinheiro, que não constituiu produto do serviço ou atividade econômica do doador; e de omissão de gastos com publicidade e serviços advocatícios, determinando o recolhimento ao Tesouro Nacional.

2. O art. 25 da Resolução TSE n. 23.607/19 dispõe que os bens ou serviços estimáveis em dinheiro devem constituir produto de serviço ou atividade econômica do doador ou, no caso de bens, integrarem seu patrimônio. O relatório preliminar apontou a doação estimável em dinheiro de publicidade por materiais impressos sem a contrapartida de constituir produto de serviço ou atividade econômica da pessoa física que constou como doadora do material ao candidato.

3. Omissão de gastos relativos à emissão de uma nota fiscal de compra de adesivos e à falta de escrituração de despesa com honorários advocatícios, os quais foram fixados na sentença com base na média de mercado. Despesas que não constaram nas contas e caracterizam infringência ao disposto no art. 53, inc. I, al. “g”, da Resolução TSE n. 23.607/19.

4. As irregularidades presentes nas contas, relativas à falta de escrituração de bem estimável e de despesas com adesivos e serviços advocatícios, impossibilitam a Justiça Eleitoral de verificar a origem dos valores utilizados para o pagamento dos gastos eleitorais da campanha, caracterizando recursos de origem não identificada.

5. As irregularidades representam 127,36% do total de receitas declaradas. Entretanto, apesar do percentual elevado, o valor absoluto é reduzido e, inclusive, inferior ao que a disciplina normativa das contas considera módico. Desse modo, as contas podem ser aprovadas com ressalvas em atenção aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Circunstância que não afasta o dever de recolhimento ao erário, na forma do art. 79 da Resolução TSE n. 23.607/19, dos recursos sem identificação de origem verificados nas contas.

6. Provimento parcial.

(TRE-RS, REl n. 0600350-09.2020.6.21.0142, Relator Des. Eleitoral Gerson Fischmann, julgado em 21.10.2021.) (Grifei.)

 

Por derradeiro, cabe salientar que na espécie não se discute a boa-fé ou a má-fé do recorrente, e sim a observância das normas sobre finanças de campanha, bem como a transparência, a confiabilidade e a lisura da prestação de contas.

Destarte, a falha identificada nas contas, consubstanciada no valor de R$ 300,00, conquanto represente aproximadamente 23,32% das receitas declaradas (R$ 1.286,00), mostra-se em termos absolutos reduzida e, inclusive, bastante inferior ao parâmetro de R$ 1.064,10 (ou mil UFIRs) que a disciplina normativa das contas considera módico, de modo a permitir o gasto de qualquer eleitor pessoalmente, não sujeitos à contabilização, e de dispensar o uso da transferência eletrônica interbancária nas doações eleitorais (arts. 43, caput, e 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19), possibilitando a aprovação das contas com ressalvas.

Nessa linha, a jurisprudência deste Tribunal admite a aplicação do critério do valor nominal diminuto, que prepondera sobre eventual aferição do alcance percentual das falhas, de modo a afastar o juízo de desaprovação das contas quando o somatório das irregularidades se mostra irrelevante, adotando-se como referência a quantia de R$ 1.064,10 (TRE-RS: PC n. 0600698-02.2019.6.21.0000, Relator: Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores, julgado em 14.7.2020, e REl n. 0600399-70.2020.6.21.0103, Relator: Des. Eleitoral Gerson Fischmann, julgado em 20.5.2021.).

Dessa forma, considerando-se o reduzido valor nominal da irregularidade, as contas devem ser aprovadas com ressalvas, nos termos do art. 74, inc. II, da Resolução TSE n. 23.607/19, em face da aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.

Outrossim, o julgamento pela aprovação das contas com ressalvas não afasta a obrigatoriedade do recolhimento da quantia de R$ 300,00 ao Tesouro Nacional, conforme determinado na sentença, em atendimento ao art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

 

Dispositivo

DIANTE DO EXPOSTO, voto pelo parcial provimento do recurso, para aprovar com ressalvas as contas de campanha de Roberto Vieira Ortiz, relativas às eleições de 2020, mantendo a determinação de recolhimento de R$ 300,00 (trezentos reais) ao Tesouro Nacional.