ED no(a) REl - 0600528-97.2020.6.21.0128 - Voto Relator(a) - Sessão: 09/06/2022 às 14:00

VOTO

Inicialmente, considerando que os embargos declaratórios apontaram erro material no acórdão quanto à determinação de recálculo dos quocientes partidário e eleitoral, entendo que o recurso comporta conhecimento para a devida correção, na forma do art. 1.022, inc. III, do CPC.

A Secretaria de Tecnologia da Informação deste Tribunal manifestou-se no sentido de que os votos realmente não foram computados e que nova totalização não gerará resultado diverso do atual (ID 44968265).

Portanto, sem alterar a fundamentação do voto, acolho os embargos de declaração tão somente para suprimir do dispositivo do acórdão a determinação de recálculo dos quocientes eleitoral e partidário, do cabeçalho da ementa o enunciado “RECÁLCULO DOS QUOCIENTES ELEITORAL E PARTIDÁRIO. PROVIMENTO PARCIAL AOS APELOS CONHECIDOS”, e do “item 7” a frase “devendo ser realizado o recálculo dos quocientes eleitoral e partidário, por ser inaplicável à espécie o disposto no art. 175, § 4º, do Código Eleitoral, por força do disposto no art. 198, inc. II, al. "b", da Resolução TSE n. 23.611/19”.

O dispositivo passa a ter a seguinte redação:

Considero prequestionada toda a matéria invocada nos autos, a fim de facilitar o acesso à instância recursal, e declaro nulos, para todos os fins, os votos atribuídos a MÁRCIO RICARDO PAULA DA SILVA.

 

A ementa passa a ter a seguinte redação:

RECURSOS. ELEIÇÕES 2020. REPRESENTAÇÃO. CANDIDATO AO CARGO DE VEREADOR. ADMISSIBILIDADE RECURSAL. TRANSCORRIDO IN ALBIS O PRAZO PARA CONSTITUIÇÃO DE NOVO PROCURADOR. RECURSO NÃO CONHECIDO. PRESENTES OS PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE NOS DEMAIS RECURSOS. AFASTADA A PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA POR CERCEAMENTO DE DEFESA. REENQUADRAMENTO JURÍDICO DA CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO COMO ABUSO DE PODER ECONÔMICO. NÃO CARACTERIZADA A REFORMATIO IN PEJUS. EXPOSIÇÃO DA IMAGEM DO CANDIDATO DURANTE AS ENTREGAS DE BRINDES. REALIZAÇÃO DE CAMPANHA ELEITORAL EM LIVES COM FINALIDADE COMERCIAL. OFENSA À LEGITIMIDADE DO PLEITO. ILEGITIMIDADE DOS VOTOS AUFERIDOS. USO INDEVIDO DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO SOCIAL NA INTERNET. EXPOSIÇÃO DESPROPORCIONAL DO CANDIDATO EM DETRIMENTO DOS DEMAIS. EXTRAPOLAÇÃO DO SIMPLES EXERCÍCIO DA LIBERDADE DE EXPRESSÃO. COMPROVADA GRAVIDADE APTA A DESEQUILIBRAR A DISPUTA. REFORMA PARCIAL DA SENTENÇA. CASSAÇÃO DO REGISTRO DE CANDIDATURA. DECLARAÇÃO DE INELEGIBILIDADE. PREQUESTIONADA TODA A MATÉRIA INVOCADA NOS AUTOS. DECLARADOS NULOS OS VOTOS ATRIBUÍDOS AO CANDIDATO. PROVIMENTO PARCIAL.

 

1. Insurgências contra sentença que deu parcial provimento à representação eleitoral para reconhecer a configuração de captação ilícita de sufrágio (art. 41-A da Lei n. 9.504/97) e uso indevido dos meios de comunicação social (art. 22, inc. XIV, da LC n. 64/90). Determinada a cassação do registro de candidatura de um dos recorrentes, além da condenação ao pagamento de multa e declaração de inelegibilidade, pelo prazo de oito anos subsequentes à eleição de 2020, de dois recorrentes.

 

2. Admissibilidade recursal. Após a interposição do recurso, um dos recorrentes restou sem representação por advogado nos autos em razão da renúncia de sua procuradora. Entretanto, perfectibilizada a intimação para regularização da representação processual, tendo em vista que foi dirigida ao endereço constante dos autos. Uma vez que não houve comunicação de mudança de endereço, o curso do prazo concedido iniciou-se a partir da juntada do comprovante de tentativa de entrega, nos termos do art. 274, parágrafo único, do Código de Processo Civil. Não conhecido o recurso do interessado, uma vez que transcorrido in albis o prazo para constituição de novo procurador (art. 76, § 2º, inc. I, do Código de Processo Civil). Conhecidos os demais recursos por estarem presentes os pressupostos de admissibilidade.

 

3. Afastada a preliminar de nulidade da sentença. Alegado cerceamento de defesa por não terem sido admitidas no processo as declarações escritas firmadas por apoiadores das lives, as quais reportariam informações essenciais sobre os acontecimentos que ensejaram a condenação. No entanto, as referidas declarações foram juntadas aos autos após o expresso encerramento da instrução, quando já em curso o prazo para oferecimento de razões finais, o que subverte o andamento processual e prejudica a celeridade demandada nas ações da espécie. Inexistência de mácula na conduta adotada pelo juízo a quo.

 

4. Reenquadramento jurídico dos fatos em grau recursal, independentemente de requerimento das partes. Não caracterizada a reformatio in pejus por falta de recurso do autor da ação contra a improcedência do pedido no que se refere à prática de abuso de poder econômico, pois a adequação da conduta à norma legal pode ser realizada de ofício tanto pela sentença quanto em segundo grau, uma vez que a conduta foi inadequadamente considerada como captação ilícita de sufrágio. Ademais, a petição inicial alega que os fatos impugnados caracterizam também hipótese de abuso de poder econômico, tendo os recorrentes, ao longo da ação, apresentado defesa ao enquadramento dos fatos nesse sentido. Atendido o contraditório e a ampla defesa. O Código de Processo Civil, aplicável de forma subsidiária e supletiva à matéria eleitoral, acolheu a teoria da substanciação da causa de pedir. Ao autor compete narrar os fatos na inicial e sobre eles a parte oferece defesa, o que não afasta a possibilidade de ser realizado um novo enquadramento jurídico do fato se for necessário. Caracterizado, na hipótese, o abuso de poder econômico ainda que os brindes tenham sido entregues sem recursos do próprio candidato e sem o condicionamento ao voto. Impossível a desvinculação dos “presentes” das pessoas dos apresentadores, entre eles o candidato, o qual, ao menos de forma indireta, auferiu proveito eleitoral com a exposição de sua imagem durante as entregas de benefícios subsidiada pelo poder econômico, nas lives e na página da internet. Manifesto prejuízo à isonomia entre os candidatos pelo desequilíbrio da conduta com outros atos legítimos de divulgação da candidatura, sem envolvimento de bens e vantagens financeiras. Demonstrada a ofensa à legitimidade do pleito e, por consequência, a ilegitimidade dos votos auferidos.

 

5. Abuso mediante o uso indevido dos meios de comunicação social na internet. A ostensiva divulgação de candidatura, combinado com o sorteio de brindes, foi suficiente para causar um desequilíbrio no pleito. Configurada exposição desproporcional do candidato em detrimento dos demais, requisito necessário para a conformação do ilícito. O uso de meio de comunicação social para ostensivas demonstrações de apoio ao candidato e exposição de sua imagem caracteriza prática abusiva reprimida pelo art. 22 da LC n. 64/90. Configurada a realização de campanha eleitoral com finalidade comercial, hipótese que desborda das permissões legais e extrapola o simples exercício da liberdade de expressão. Manutenção da sentença quanto às sanções de cassação do registro de candidatura e declaração de inelegibilidade de dois recorrentes, pelo prazo de 08 anos subsequentes à eleição de 2020 (art. 22, inc. XIV, da LC n. 64/90), por uso indevido dos meios de comunicação social.

 

6. Afastadas as penalidades de cassação do registro de candidatura e multa individual por prática de captação ilícita de sufrágio. Reenquadramento como abuso de poder econômico (art. 22 da LC n. 64/90), a fim de fixar a sanção de cassação do diploma e declaração de inelegibilidade de dois recorrentes, pelo prazo de 08 anos subsequentes à eleição de 2020 (art. 22, inc. XIV, da LC n. 64/90). Manutenção da sentença com relação às sanções aplicadas por uso indevido dos meios de comunicação social.

 

7. Prequestionada toda a matéria invocada nos autos, a fim de facilitar o acesso à instância recursal. Declarados nulos, para todos os fins, os votos atribuídos ao candidato.

 

8. Provimento parcial.

 

Os demais pontos de inconformismo não merecem acolhimento.

O embargante entende que o acórdão não enfrentou de forma específica o disposto nos arts. 141 e 492 do Código de Processo Civil quanto à decisão do mérito nos limites propostos pelas partes e à vedação de decisão diversa da pedida, em quantidade superior ou em objeto diverso do que lhe foi demandado.

Ocorre que a decisão judicial não necessita expressamente citar cada norma legal em que está amparada, mas apenas aplicar o Direito, demonstrar o raciocínio percorrido e apresentar, de forma fundamentada, a decisão alcançada.

Se o embargante entende que o julgado violou normas processuais, deve ajuizar o pertinente recurso em superior instância, não havendo omissão alguma quando o julgador não especifica, em cada fundamento de suas razões, o dispositivo em que está amparado.

No mesmo sentido, a insurgência quanto ao reenquadramento dos fatos como abuso de poder econômico foi apresentada sem apontamento de omissão, contradição ou obscuridade no aresto. O embargante simplesmente manifestou seu inconformismo quanto à justiça da decisão, sendo inviável o manifesto propósito de rediscutir o mérito recursal.

Por fim, consigno que o pedido de prequestionamento está alcançado pelo art. 1.025 do CPC.

Com esses fundamentos, VOTO pelo provimento parcial dos embargos de declaração tão somente para a correção de erro material no dispositivo e na ementa do acórdão, nos termos da fundamentação.