REl - 0600411-45.2020.6.21.0019 - Voto Relator(a) - Sessão: 19/05/2022 às 15:00

VOTO

O recurso é tempestivo e adequado, merecendo ser conhecido.

Quanto ao mérito, adianto que o recurso não merece provimento.

Relativamente aos dois depósitos em dinheiro recebidos na mesma data pelo mesmo doador, identificado com o CPF n. 585.554.980-15, sendo o primeiro no valor de R$ 1.064,00 e o segundo de R$ 360,00, totalizando o valor de R$ 1.424,00, em desacordo com o previsto no § 1º do art. 21 da Resolução TSE n. 23.607/19, o recorrente sustenta que se trata de uma cidade pequena do interior, com dificuldade de acesso à rede bancária, sendo o depósito em dinheiro a única forma possível de aplicar recursos na campanha em razão da falta de cartão de débito ou cheques disponíveis, deixando de utilizar a operação bancária de transferência eletrônica ou cheque cruzado e nominal, como determina o art. 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19. Alega que a receita adveio do seu próprio patrimônio, restando devidamente esclarecida a sua origem.

Sem razão o recorrente.

O recebimento do valor total de R$ 1.424,00, por meio de dois depósitos em espécie na conta bancária específica da campanha, efetivado no dia 13.11.2020, contrariou a disciplina constante do art. 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 21. As doações de pessoas físicas e de recursos próprios somente poderão ser realizadas, inclusive pela internet, por meio de:

I - transação bancária na qual o CPF do doador seja obrigatoriamente identificado;

II - doação ou cessão temporária de bens e/ou serviços estimáveis em dinheiro, com a demonstração de que o doador é proprietário do bem ou é o responsável direto pela prestação de serviços;

III - instituições que promovam técnicas e serviços de financiamento coletivo por meio de sítios da internet, aplicativos eletrônicos e outros recursos similares.

§ 1º As doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação ou cheque cruzado e nominal.

§ 2º O disposto no § 1º aplica-se também à hipótese de doações sucessivas realizadas por um mesmo doador em um mesmo dia.

§ 3º As doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo não podem ser utilizadas e devem, na hipótese de identificação do doador, ser a ele restituídas ou, se isso não for possível, devem ser consideradas de origem não identificada e recolhidas ao Tesouro Nacional, na forma prevista no caput do art. 32 desta Resolução.

§ 4º No caso da utilização das doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo, ainda que identificado o doador, os valores devem ser recolhidos ao Tesouro Nacional, na forma do disposto caput do art. 32 desta Resolução. (Grifo nosso)

 

Assim, as doações financeiras provenientes de pessoas físicas ou do próprio candidato, em valores iguais ou superiores a R$ 1.064,10, devem ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação, ou compensação de cheque cruzado e nominal.

Ademais, para fins de identificação da origem das receitas eleitorais, a pessoa física do candidato não se confunde com a sua pessoa jurídica, à qual é expedido número de CNPJ para que possa abrir conta bancária destinada ao gerenciamento dos recursos arrecadados para o financiamento da sua campanha.

Dessa forma, muito embora o recorrente tenha declarado que a importância em tela era proveniente de seu patrimônio pessoal, inexiste elemento indicativo dessa alegação, a exemplo de extrato bancário de conta-corrente de sua titularidade, que demonstrasse ter efetuado saque daquela quantia na mesma data da efetivação do depósito em espécie na conta bancária da campanha, que assegurasse um mínimo de certeza quanto à origem da receita movimentada durante o pleito.

A referida transação bancária inviabilizou a identificação da real origem da quantia de R$ 1.424,00, a qual foi integralmente utilizada para a quitação de despesas eleitorais, devendo, portanto, ser recolhida ao Tesouro Nacional, em atendimento ao art. 21, §§ 1º e 4º, c/c o art. 32, caput e § 1º, inc. IV, da Resolução TSE n. 23.607/19, este último reproduzido na sequência:

Art. 32. Os recursos de origem não identificada não podem ser utilizados por partidos políticos e candidatos e devem ser transferidos ao Tesouro Nacional por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU).

§ 1º Caracterizam o recurso como de origem não identificada:

(...)

IV - as doações recebidas em desacordo com o disposto no art. 21, § 1º, desta Resolução quando impossibilitada a devolução ao doador;

 

Logo, a ausência de apresentação de comprovante de saque dos recursos da conta do próprio candidato impede a certeza quanto à origem dos valores doados à sua campanha.

Assim, diante da impossibilidade de identificação do efetivo doador, e uma vez caracterizada a utilização de recursos de origem não identificada (art. 32, § 1º, in. I, da Resolução TSE n. 23.607/19), correta a sentença ao determinar o recolhimento ao Tesouro Nacional, pois o § 4º do art. 21 da Resolução TSE 23.607/19 dispõe que, em relação à irregularidade sob análise, no caso da utilização do recurso na campanha, “ainda que identificado o doador, os valores devem ser recolhidos ao Tesouro Nacional, na forma do art. 32 desta Resolução”. Ademais, pelas razões já expostas, o CPF do recorrente utilizado no depósito em dinheiro não comprova, por si só, a origem dos valores.

Quanto à pretensão de limitar o recolhimento ao erário ao valor que superou o teto estabelecido no art. 21 da Resolução TSE n. 23.607/19, não procede a pretensão.

No que concerne à arrecadação de recursos próprios em montante superior ao limite de gastos, contrariando o disposto no art. 27, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, o parecer conclusivo (ID 44903727) aponta a extrapolação com base na soma entre os valores de R$ 1.424,00 e de R$ 200,00, quantias depositadas em dinheiro com o registro do CPF do candidato.

Ocorre que, diante da conclusão de que os depósitos em espécie no valor de R$ 1.424,00 não possuem origem identificada, não pode ser esse montante considerado como patrimônio do candidato. Assim, afasto a multa aplicada pela sentença, no valor de R$ 125,29.

É nesse sentido o entendimento desta Corte:

 

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. PRESTAÇÃO DE CONTAS. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. CANDIDATO. VEREADOR. RECURSO DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. RECEBIMENTO DE DEPÓSITO EM ESPÉCIE. INOBSERVÂNCIA DO TETO IMPOSTO AO AUTOFINANCIAMENTO DA CAMPANHA. REDUÇÃO DO VALOR A SER RECOLHIDO AO TESOURO NACIONAL. INVIABILIZADO O AGRAVAMENTO DA SITUAÇÃO JURÍDICA NO PROCESSO. REFORMATIO IN PEJUS. PROVIMENTO PARCIAL.

1. Insurgência contra sentença que julgou aprovadas com ressalvas as contas relativas ao pleito de 2020, em virtude do recebimento de depósito em espécie, caracterizado como proveniente de origem não identificada, e do excesso de gastos com recursos próprios. Determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional, com fundamento nos arts. 21, §§ 1º e 4º, 27, §§ 1º e 4º, e 74, inc. II, todos da Resolução TSE n. 23.607/19.

2. Na dicção do § 1º do art. 21 da Resolução TSE n. 23.607/19, as doações financeiras provenientes de pessoas físicas ou do próprio candidato, de valores iguais ou superiores a R$ 1.064,10, devem ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação, ou compensação de cheque cruzado e nominal. Na hipótese, inexiste indicativo de que o valor transferido era proveniente do patrimônio pessoal do recorrente, circunstância que inviabiliza a identificação da real origem da quantia, a qual foi integralmente utilizada para a quitação de dispêndios eleitorais, devendo, portanto, ser recolhida ao Tesouro Nacional, em atendimento ao art. 21, §§ 1º e 4º, c/c o art. 32, caput e § 1º, inc. IV, da Resolução TSE n. 23.607/19.

3. Redução do valor a ser recolhido ao Tesouro Nacional. A inconsistência relativa à inobservância do teto imposto ao autofinanciamento da campanha no município nas eleições de 2020, assim como a imposição da penalidade de multa dela decorrente, nos termos do art. 27, §§ 1º e 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19, devem ser excluídas do comando decisório. A conclusão pela ausência de identificação da origem da receita eleitoral impede que a mesma seja considerada como oriunda do patrimônio do próprio prestador. A irregularidade restringe-se à violação da norma contida no art. 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

4. Nada obstante a falha ostente significativa expressividade econômica e corresponda à totalidade das verbas auferidas pelo prestador, cenário em que este Regional, na linha da orientação firmada pelo Tribunal Superior Eleitoral, tem reiteradamente desaprovado a escrituração contábil de participantes do pleito, a matéria foi devolvida a este Colegiado por força da interposição de recurso exclusivamente pela defesa do candidato, restando inviabilizado o agravamento da sua situação jurídica no processo mediante a emissão de juízo pela desaprovação da contabilidade, por incidência do princípio de vedação da reformatio in pejus. Aprovação com ressalvas.

5. Provimento parcial

(Recurso Eleitoral n 060021730, ACÓRDÃO de 15/06/2021, Relator DES. ELEITORAL SILVIO RONALDO SANTOS DE MORAES, Publicação: PJE - Processo Judicial Eletrônico-PJE) (Grifo nosso).

 

Registro, por fim, que o juízo de desaprovação das contas não merece reforma, pois a soma das irregularidades, no valor de R$ 2.014,00 (R$ 1.424,00 + R$ 30,00 + R$ 200,00 + R$ 360,00), supera o montante de R$ 1.064,10 utilizado pela Justiça Eleitoral como parâmetro para aprovação com ressalvas bem como ultrapassa o total de recursos recebidos na campanha (R$ 1.724,75), de modo a inviabilizar a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.

Diante do exposto, VOTO pelo conhecimento e parcial provimento do recurso, para afastar a aplicação de multa por excesso no autofinanciamento, no valor de R$ 125,29, mantendo-se a desaprovação das contas e a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional da quantia referente à utilização de recursos de origem não identificada de R$ 1.454,00.