REl - 0600789-54.2020.6.21.0163 - Voto Relator(a) - Sessão: 17/05/2022 às 14:00

VOTO

Eminentes Colegas.

O recurso é tempestivo e, presentes todos os pressupostos de admissibilidade, está a merecer conhecimento.

O recorrente requer o recebimento e a análise dos documentos acostados ao recurso. Ainda que o tópico tenha relação com o posicionamento da Procuradoria Regional Eleitoral, discorro, inicialmente, apenas sobre o conhecimento de documentos em fase recursal, prática aceita por este Tribunal na classe processual de prestação de contas naqueles casos em que se trate de documentos simples, capazes de esclarecer as irregularidades apontadas sem a necessidade de diligências complementares.

No caso, todavia, julgo configurada a impossibilidade de admissão dos documentos perante o grau recursal exatamente porque a documentação apresentada exigiria a remessa dos autos à Secretaria de Auditoria Interna deste Tribunal, para análise técnica de cunho contábil, de modo que entendo descabido o conhecimento das peças. Julgo que a reabertura da instrução, para o exame detalhado dos lançamentos em cotejo com as demais informações e dados constantes dos extratos eletrônicos, resultaria em tratamento privilegiado do recorrente em relação aos demais candidatos da eleição para a qual concorreu, sobretudo aqueles que, de forma diligente, apresentaram tempestivamente as prestações de contas.

Nesse norte, o pedido de conhecimento de farta documentação na fase recursal não pode ser acolhido, pois se trata da própria prestação de contas, e não de mero documento esclarecedor ao primeiro olhar. A situação consubstanciaria inclusive supressão de instância, pois a sentença já assinalou a omissão do prestador em oferecer a documentação obrigatória de modo tempestivo.

E é no presente ponto que passo a analisar a opinião de anulação da sentença e o retorno dos autos à origem, externada em parecer pela d. Procuradoria Regional Eleitoral:

No caso dos autos, em que pese não tenham sido juntados pelo prestador os extratos relativos às contas bancárias para movimentação de recursos oriundos do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha e o extrato bancário relativo à conta “Outros recursos”, seria possível à Unidade Técnica avaliar a regularidade das contas a partir dos elementos disponíveis nos sistemas da Justiça Eleitoral. (…)

No que toca à conta “Outros recursos”, a omissão do recorrente quanto à apresentação do extrato bancário também poderia ser suprida pela verificação do extrato eletrônico disponível no Divulgacand.

Por outro lado, ainda que os autos não tenham sido instruídos com documentos relacionados às receitas obtidas e às despesas realizadas, o Divulgacand registra notas fiscais eletrônicas emitidas contra o cnpj da campanha (duas notas fiscais, totalizando R$ 958,50), informações estas que, confrontadas com os quadros contábeis apresentados na prestação de contas parcial do candidato (ID 44880314) e no extrato eletrônico disponível no Divulgacand, permitiriam a análise da prestação de contas, na forma do já citado art. 74, §2º, da Resolução TSE nº 23.607/2019. Ressalta-se que as notas fiscais existentes não foram analisadas para verificação acerca da eventual utilização de recursos de origem não identificada na campanha, a impor o dever de recolhimento ao Tesouro Nacional.

Adianto ser igualmente inviável acolher, no ponto, o parecer do Órgão Ministerial.

Explico.

Inicialmente, trago o detalhamento dos documentos faltantes, constante no relatório preliminar, do qual o recorrente foi devidamente intimado, ID 44880394, com grifos no original:

Apontamentos:

Foram constatadas as seguintes inconsistências que afetam a análise da prestação de contas apresentada:

Não foram apresentadas as seguintes peças obrigatórias que devem integrar a prestação de contas (art. 53 da Resolução TSE nº 23.607/2019):

- Extrato das contas bancárias destinadas à movimentação de recursos do Fundo Partidário, se houver

- Extrato das contas bancárias destinadas à movimentação de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), se houver

- Extrato das contas bancárias destinadas à movimentação de Outros Recursos

Tendo em vista a irregularidade apontada acima, fica prejudicada a análise da Prestação de Contas. Assim sendo, não há como concluir se os documentos a seguir estão ausentes ou se não há obrigação de serem apresentados:

- Comprovante de recolhimento à respectiva direção partidária das sobras financeiras de campanha relativas aos recursos do Fundo Partidário

- Comprovante de recolhimento à respectiva direção partidária das sobras financeiras de campanha relativas a Outros Recursos

- Declaração firmada pela direção partidária comprovando o recebimento das sobras de campanha constituídas por bens móveis ou imóveis, quando houver

- Documentos fiscais que comprovem a regularidade dos gastos eleitorais realizados com recursos do Fundo Partidário

- Documentos fiscais que comprovem a regularidade dos gastos eleitorais realizados com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC)

- Autorização do órgão nacional de direção partidária, na hipótese de assunção de dívida pelo partido político, acordo expressamente formalizado, bem como cronograma de pagamento e quitação

- Comprovantes bancários de devolução dos recursos recebidos de fonte vedada ou de recursos de origem não identificada ou guia de recolhimento ao Tesouro Nacional de recursos de origem não identificada, conforme o caso

- Comprovante de recolhimento ao Tesouro Nacional dos recursos do FEFC não utilizados.

 

Não obstante, perante o juízo de origem, na oportunidade para apresentação das contas finais, o candidato limitou-se a entregar à Justiça Eleitoral o extrato de prestação de contas, formulário meramente declaratório, carecendo de comprovação por meio de documentos contratuais, fiscais e bancários das informações nele contidas. 

Fosse a omissão apenas na entrega dos extratos bancários, com efeito, poderia o relatório preliminar e o parecer conclusivo serem elaborados a partir do cotejo das informações constantes na prestação e aquelas disponíveis à Justiça Eleitoral. No entanto, o que verifico é a ausência de qualquer documento relativo à comprovação de receitas e de despesas, os quais deveriam constar na prestação de contas final.

Transcrevo, agora, trecho do parecer conclusivo, cujos grifos são originais:

Apontamentos:

Foram constatadas as seguintes inconsistências na prestação de contas apresentada:

ANÁLISE DA MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA (ART. 53, DA RESOLUÇÃO TSE N° 23.607/2019):

Não foram apresentadas as seguintes peças obrigatórias que devem integrar a prestação de contas (art. 53 da Resolução TSE nº 23.607/2019):

- Extrato das contas bancárias destinadas à movimentação de recursos do Fundo Partidário, se houver

- Extrato das contas bancárias destinadas à movimentação de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), se houver

- Extrato das contas bancárias destinadas à movimentação de Outros Recursos

Em diligência, o candidato foi intimado a apresentar a documentação faltante e/ou prestar esclarecimentos. Transcorrido o prazo, o candidato restou silente.

Trata-se de inconsistência grave, que denota a ausência de comprovação da movimentação financeira ou sua ausência alegada durante o período de campanha eleitoral, não viabilizando o efetivo controle sobre as contas. Falha geradora de julgamento pela não prestação de contas em razão da ausência de informação ou documento essencial ao exame.

 

Ou seja, inviável analisar a documentação trazida ao processo extemporaneamente, após o parecer conclusivo e a manifestação do Ministério Público, no mesmo dia da prolação da sentença, sem a caracterização de tratamento diferenciado, pois o confronto das informações declaradas nos presentes autos com eventuais dados constantes no banco de dados da Justiça Eleitoral demandaria inequivocamente a realização de intempestivas diligências complementares (verificações no sistema Divulgacand), quer no presente grau recursal, quer no juízo de origem, a serem realizadas pelos servidores da Justiça Eleitoral, em procedimento não disponibilizado aos demais candidatos.

A legislação de regência estabelece que é obrigação dos candidatos e partidos a entrega da prestação de contas com toda a documentação a ela atinente. Como os elementos disponíveis seriam nitidamente insuficientes para a instrução adequada do processos, o procedimento redundaria em privilégio ao recorrente à míngua de suporte legal ou regulamentar para tanto.

Tenho, assim, no caso sob exame, por valorizar o tratamento paritário aos competidores eleitorais em detrimento do esclarecimento de prestação de contas de candidato pouco diligente, mediante atos complementares a serem realizados por servidores públicos.

No mérito, cuida-se de recurso interposto contra sentença que julgou não prestadas as contas de campanha de MARCOS ROGERIO DOS SANTOS CASEIRA. A decisão hostilizada apontou que o candidato deixou de apresentar a contabilidade de campanha, incorrendo no art. 49 da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 49. As prestações de contas finais referentes ao primeiro turno de todos os candidatos e de partidos políticos em todas as esferas devem ser prestadas, via SPCE, à Justiça Eleitoral até o 30º dia posterior à realização das eleições (Lei nº 9.504/1997, art. 29, III). (Vide, para as Eleições de 2020, art. 7º, inciso VIII, da Resolução nº 23.624/2020)

(...) § 5º Findos os prazos fixados neste artigo sem que as contas tenham sido prestadas, observar-se-ão os seguintes procedimentos:

(...) VII - permanecendo a omissão, as contas serão julgadas como não prestadas (Lei nº 9.504/1997, art. 30, IV).

Por fim, é clara a incidência à hipótese do disposto no art. 80, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19, que prevê o impedimento de o candidato obter a certidão de quitação eleitoral até o final da legislatura, persistindo os efeitos da restrição após esse período até a efetiva apresentação das contas, sem que tal circunstância impeça que o recorrente ofereça ao juízo de primeiro grau requerimento para regularizar a omissão e, assim, alcançar a referida quitação, após o final da legislatura para o cargo disputado.

Nesses termos, deve ser mantida a decisão recorrida.

Diante do exposto, VOTO para negar provimento ao recurso.