REl - 0600269-08.2020.6.21.0127 - Voto Relator(a) - Sessão: 16/05/2022 às 14:00

VOTO

As contas do PDT de Giruá foram desaprovadas em razão das seguintes irregularidades: a) ausência de apresentação dos instrumentos de comprovação dos recursos estimáveis em dinheiro arrecadados, no valor de R$ 1.000,00; b) omissão de receitas e gastos de R$ 2.438,97 verificados a partir da emissão de notas fiscais; c) não aplicação do percentual mínimo de recursos do Fundo Partidário para candidaturas femininas.

Verifica-se nos autos que houve duas receitas estimáveis em dinheiro, no valor de R$ 1.000,00, cuja natureza descrita é de serviços prestados por terceiro, no caso, desempenho da função de secretária.

Entretanto, segundo a norma eleitoral, a doação estimável deve ser acompanhada de instrumento de prestação de serviços, conforme o art. 58, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/19, o que não ocorreu no caso dos autos, pois mesmo sendo intimada para regularizar a situação não acostou os contratos de prestação de serviços.

Assim, permanece a irregularidade na quantia de R$ 1.000,00 e por ser considerada como recurso de origem não identificada deve ser recolhida ao erário, de acordo com o art. 32 da Resolução supramencionada.

A segunda irregularidade motivadora da desaprovação relaciona-se, também, ao recebimento de recursos de origem não identificada relativos ao pagamento de diversas despesas, no montante de R$ 2.438,97, localizadas a partir de notas fiscais não contabilizadas lançadas contra o CNPJ do partido político.

Com exceção de uma nota emitida por Falster e Cia. Ltda., na quantia de 1.006,94, todas as demais foram emitidas por Cerealista Giruá Ltda., filial 2, entre os dias 26.9.2020 e 13.10.2020,  e  encontradas mediante exame técnico por meio do procedimento de circularização e podem ser consultadas no sítio Divulga Cand Contas (https://divulgacandcontas.tse.jus.br/divulga/#/partido/2020/2030402020/86797/4/12/nfes).

Em suas razões, a agremiação alega que se trataria de um equívoco das empresas emissoras das notas fiscais e, para sustentar o argumento, refere que em diversos processos de prestação restou demonstrada tal ocorrência.

Todavia, não trouxe aos autos qualquer elemento comprobatório do alegado, como cancelamento das notas, uma vez que há determinação expressa no art. 59 da Resolução TSE n. 23.607/19, segundo o qual “o cancelamento de documentos fiscais deve observar o disposto na legislação tributária, sob pena de ser considerado irregular”.

Por conseguinte, permanece a mácula de que a origem da quantia para pagamento de despesa não restou demonstrada, pois a importância não circulou pela conta aberta para a movimentação da receita da candidatura.

Desse modo, o montante de R$ 2.438,97 se caracteriza como recurso de origem não identificada, na forma do art. 32, caput, da Resolução TSE n. 23.607/19.

O dispositivo em questão prevê que tais valores não podem ser utilizados e devem ser recolhidos ao Tesouro Nacional, portanto, correta a sentença ao considerar o valor como recurso de origem não identificada e determinar seu recolhimento ao Erário, na forma do art. 79 da Resolução TSE n. 23.607/19.

A última falha apontada na sentença é da ausência de destinação do percentual mínimo de recursos do Fundo Partidário para candidaturas femininas.

O partido recebeu verbas do Fundo Partidário no total de R$ 14.765,00 e deveria ter aplicado nas campanhas de cinco candidatas o total de R$ 4.429,50, correspondente a 30%, mas repassou somente a quantia de R$ 3.248,50.

Assim, correta a sentença ao apontar que o valor omitido das candidatas, à razão de R$ 1.181,00, deve ser recolhido ao Tesouro Nacional, em virtude da má aplicação, ou seja, destinação ilegal dos recursos públicos para outras finalidades que não as campanhas femininas.

A falha é gravíssima e o prejuízo é irreparável.

Houve expresso descumprimento da decisão proferida na ADI STF n. 5.617 e do disposto no art. 19, § 3°, da Resolução TSE n. 23.607/19.

A alegação de que a infração é de valores diminutos não exime o partido de arcar com a penalidade pela falha cometida, que, no caso, foi a suspensão de quotas do Fundo Partidário pelo período de quatro meses, prazo bastante razoável e proporcional ao gravame da conduta.

Não está em discussão, neste feito, a intencionalidade no cometimento da falha (dolo), ou a má-fé da agremiação, mas o mero descumprimento de regra cogente aplicável a todos os partidos.

Conforme assentado pelo TSE: “É de se ter enraizada nas estruturas partidárias a consciência da transparência, da moralidade, da economicidade, da razoabilidade, da boa-fé, da cooperação e de outros importantes princípios norteadores das despesas com recursos públicos (Prestação de Contas n. 22997, Acórdão, Rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJE 19.4.2018.)".

Destaco que o art. 45, § 2º, da Resolução TSE n. 23.607/19 estabelece a responsabilidade dos partidos sobre suas contas, não podendo a irregularidade ser relevada com base na alegação de que ocorreu por equívoco.

A quantia somada (R$ 4.856,17) representa 28,31% do total das receitas financeiras, no montante de R$ 17.150,00, não sendo adequado, razoável e proporcional o juízo de aprovação das contas, mesmo com ressalvas, pois as falhas são graves e comprometem de forma insanável a confiabilidade e a transparência da movimentação financeira.

Com essas considerações, a manutenção da sentença de desaprovação das contas é medida impositiva.

Diante do exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso, para manter a sentença que desaprovou a prestação de contas, determinou o recolhimento de R$ 4.856,17 (R$ 3.438,97 + R$ 1.417,20) ao Tesouro Nacional e decretou a perda do direito ao recebimento da quota do Fundo Partidário pelo período de 04 meses.

 

RETIFICAÇÃO de voto

 

Considerando que no pedido de vista o ilustre Desembargador Eleitoral Caetano Cuervo Lo Pumo se reportou à incidência da EC n. 117 ao caso, solicitei os autos para retificar, no ponto, o voto lançado, eis que iria, de qualquer modo, aderir quanto ao posicionamento pela aplicação das novas disposições legais no presente julgamento.

No voto apresentado na sessão de 9.5.2022, entendi não sanada a irregularidade relativa à falta de aplicação de recursos do Fundo Partidário, no total de R$ 1.417,20, para as quotas de candidaturas femininas e raciais, mantendo a determinação de recolhimento do valor ao Tesouro Nacional.

Entretanto, desconsiderei o texto da Emenda Constitucional n. 117, promulgada pelo Congresso Nacional em 5 de abril de 2022, a qual expressamente estabelece que suas disposições têm aplicabilidade retroativa:

Art. 2º Aos partidos políticos que não tenham utilizado os recursos destinados aos programas de promoção e difusão da participação política das mulheres ou cujos valores destinados a essa finalidade não tenham sido reconhecidos pela Justiça Eleitoral é assegurada a utilização desses valores nas eleições subsequentes, vedada a condenação pela Justiça Eleitoral nos processos de prestação de contas de exercícios financeiros anteriores que ainda não tenham transitado em julgado até a data de promulgação desta Emenda Constitucional.

 

Art. 3º Não serão aplicadas sanções de qualquer natureza, inclusive de devolução de valores, multa ou suspensão do fundo partidário, aos partidos que não preencheram a cota mínima de recursos ou que não destinaram os valores mínimos em razão de sexo e raça em eleições ocorridas antes da promulgação desta Emenda Constitucional.

 

Em recente julgamento, o TSE interpretou o alcance das novas normas consignando que, com a constitucionalização, “a gravidade da falha se tornou ainda mais evidente”, e que as regras “alcançam somente as sanções porventura aplicáveis aos partidos que tenham descumprido o percentual mínimo de aplicação na ação afirmativa” (Prestação de Contas n. 060176555, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJE 06/05/2022).

No acórdão em questão, o Relator, Min. Mauro Campbell Marques, apontou que a EC n. 117 não incide sobre a fase em que o Juízo Eleitoral analisa as glosas identificadas nas contas para concluir pela sua aprovação com ou sem ressalvas, ou desaprovação, nem excluiu a possibilidade desta Justiça Eleitoral aferir a regularidade do uso das verbas públicas.

Assim, embora no caso em tela seja correto o juízo de desaprovação das contas, nos termos da fundamentação já apresentada, cumpre retificar o voto, com o alinhamento ao que foi decidido pelo Tribunal Superior Eleitoral, para decotar do valor a ser recolhido ao Tesouro Nacional a quantia de R$ 1.417,20 e reduzir, também, o período de suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário, o qual foi fixado em 4 meses na sentença.

Em face da EC n. 117, as falhas a serem computadas no cálculo do prazo de suspensão de 1 a 12 meses disposto no art. 74, § 7o, da Resolução TSE n. 23.607/19, são de R$ 3.438,97, que representam aproximadamente 20,04% de toda a arrecadação, no montante R$ 17.150,00.

Utilizando-se de um critério de proporcionalidade, a suspensão pelo período de 12 meses mereceria aplicação caso o valor das irregularidades alcançassem 100% da quantia arrecadada, ou seja, R$ 17.150,00. Nessa medida, considerando que a proporção do percentual de 20,04% das falhas, representada em meses, equivale a 2,4 meses, entendo adequada a diminuição do prazo de 4 para 2 meses.

Nessas circunstâncias, a conclusão é pelo provimento parcial do recurso em face desta decisão conduzir a uma situação jurídica mais benéfica ao recorrente.

Com esses fundamentos, retifico em parte o voto apresentado para dar provimento parcial ao recurso, manter a desaprovação das contas, reduzir o valor a ser objeto de recolhimento ao erário para R$ 3.438,97, e redimensionar a sanção de perda do direito ao recebimento de quotas do Fundo Partidário para 02 meses.