REl - 0600481-46.2020.6.21.0089 - Voto Relator(a) - Sessão: 02/05/2022 às 14:00

VOTO

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

No mérito, trata-se de recurso interposto contra sentença que aprovou com ressalvas as contas de campanha, eleições 2020, ao cargo de vereador de FERMINO DOS SANTOS MAIDANA no Município de Alegria/RS.

Consta que a sentença aprovou com ressalvas as contas do candidato devido a doações com recursos próprios (R$ 1.789,55) acima do limite legal (R$ 1.230,77).

De fato, o montante de R$ 1.789,55, valor dos recursos próprios, supera em R$ 558,78 o teto previsto no art. 27, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19 de 10% do limite de gastos de campanha no cargo em que concorrer, equivalente ao valor de R$ 1.230,77. Assim, o prestador fica sujeito à multa prevista no art. 27, § 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19, cuja determinação não foi consignada na sentença a quo.

No ponto, a Resolução TSE n. 23.607/19, que regulamenta a matéria, assim dispõe:

Art. 27. As doações realizadas por pessoas físicas são limitadas a 10% (dez por cento) dos rendimentos brutos auferidos pelo doador no ano-calendário anterior à eleição (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 1º).

§ 1º O candidato poderá usar recursos próprios em sua campanha até o total de 10% (dez por cento) dos limites previstos para gastos de campanha no cargo em que concorrer (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 2º-A).

§ 2º É vedada a aplicação indireta de recursos próprios mediante a utilização de doação a interposta pessoa, com a finalidade de burlar o limite de utilização de recursos próprios previstos no artigo 23, § 2º-A, da Lei 9.504/2017.

§ 3º O limite previsto no caput não se aplica a doações estimáveis em dinheiro relativas à utilização de bens móveis ou imóveis de propriedade do doador ou à prestação de serviços próprios, desde que o valor estimado não ultrapasse R$ 40.000,00 (quarenta mil reais) (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 7º).

§ 4º A doação acima dos limites fixados neste artigo sujeita o infrator ao pagamento de multa no valor de até 100% (cem por cento) da quantia em excesso, sem prejuízo de o candidato responder por abuso do poder econômico, nos termos do art. 22 da Lei Complementar nº 64/1990 (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 3º).

 

No que se refere ao argumento do recorrente de que o valor estimável em dinheiro relativo à cessão de veículo não possui uma “quantificação precisa”, de modo que poderia ter lançado valores de menor vulto, “poderia ser de R$ 100,00, de R$ 200,00 ou até menos que isso, considerando os valores de mercado de tal “serviço” na nossa região”, não assiste razão ao recorrente.

Embora a receita tipificada como bem estimável em dinheiro seja de natureza gratuita, ela possui valor econômico e, assim sendo, o valor estimado deve refletir o de mercado; ou seja, não pode ser hipotético, afastado da realidade, ou, ainda, lançado a fim de se adequar ao limite de autofinanciamento do candidato. Se o valor lançado pelo candidato para cessão do veículo foi o de R$ 1.000,00, certamente foi o considerado adequado para o mercado regional.

Com efeito, há disciplina normativa pertinente ao âmbito das receitas de campanha, em que a regra é aplicada no caso concreto e que estabelece, de maneira objetiva, que “o candidato poderá usar recursos próprios em sua campanha até o total de 10% (dez por cento) dos limites previstos para gastos de campanha no cargo em que concorrer”.

A regra é objetiva, o limite previsto para gastos nas campanhas dos diversos cargos é deduzido da regra estabelecida no art. 18-C da Lei das Eleições. Definido o valor para o cargo em relação a determinado município, o candidato pode autofinanciar sua campanha em valores de até 10% do aludido limite.

E, ademais, como bem salientado pela douta Procuradoria Eleitoral (ID 44905889), a cessão de automóvel de propriedade do candidato para seu uso durante a campanha eleitoral deve ser registrada na prestação de contas justamente para viabilizar a observância do limite para o autofinanciamento, segundo disciplina o art. 60, § 5º, da Resolução TSE n. 23.607/19:

§ 5º A dispensa de comprovação prevista no § 4º não afasta a obrigatoriedade de serem registrados na prestação de contas os valores das operações constantes dos incisos I a III do referido parágrafo.

 

Assim, deve ser mantida a sentença que aprovou as contas com ressalvas, pois o valor do excesso é reduzido (R$ 558,78), inferior ao parâmetro de R$ 1.064,10 (ou mil UFIRs) que a disciplina normativa das contas considera módico, de modo a permitir o gasto de qualquer eleitor pessoalmente, não sujeitos à contabilização, e de dispensar o uso da transferência eletrônica interbancária nas doações eleitorais (arts. 43, caput, e 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19).

Por derradeiro, ressalto que a sentença acolheu as falhas constatadas pela equipe técnica em seu parecer conclusivo com relação à arrecadação de recursos próprios que tenham superado o limite previsto no art. 27, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19. Porém, deixou de aplicar a multa estabelecida no § 4º do mesmo artigo (ID 44864230):

[...]

Nos termos do art. 74 “caput” e inciso II, da Resolução n. 23.607/19, a Justiça Eleitoral decidirá pela aprovação com ressalvas, quando verificadas as falhas que não lhes comprometam a regularidade.

[...]

Isso posto, APROVO COM RESSALVAS as contas de FERMINO DOS SANTOS MAIDANA, relativas às Eleições Municipais de 2020, nos termos do art. 74, II, da Resolução TSE n. 23.607/2019, ante os fundamentos declinados.

 

Dessa forma, não havendo cominação de multa no âmbito da decisão de origem, não há como rediscutir este ponto em grau de recurso, seja por falta de interesse recursal do recorrente, seja em respeito ao princípio do non reformatio in pejus.

Diante do exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso, mantendo a sentença que aprovou com ressalvas as contas de FERMINO DOS SANTOS MAIDANA.