REl - 0600525-80.2020.6.21.0084 - Voto Relator(a) - Sessão: 28/04/2022 às 14:00

VOTO

O recorrente pretende a condenação do Nilton Pires de Quadros por prática de abuso de pode econômico devido à divulgação de propaganda por meio de vídeo publicado no perfil do candidato no Facebook, em 7 de novembro de 2020, no qual o candidato afirma ter obtido uma emenda parlamentar de R$ 400.000,00, junto ao Deputado Federal Giovani Cherini, para a construção de 16 piquetes gaúchos (construção de madeira no estilo cabana), no município de Tapes:

Meus amigos e minhas amigas, estou aqui na frente do parque José Claudio Machado, consegui uma emenda parlamentar do deputado Giovani Cherini de R$ 400.000,00 (quatrocentos mil reais) para 16 piquetes, então meus amigos, eu provo e comprovo, mato a cobra, mostro o pau e deixo o couro do bixo estaqueado. Então meus amigos dia quinze é quinze, dois patinhos na lagoa e três coraçãozinhos, vinte e dois, trezentos e trinta e três, quero trabalhar por Tapes e continuar trabalhando, um forte abraço a todos os gauchos do meu Rio Grande.

 

Conforme ressaltado na sentença, considerando que não foi produzida prova de a referida emenda parlamentar de orçamento foi efetivamente solicitada, ou que eventual pedido foi realizado por influência do candidato.

Além disso, não há comprovação nos autos sobre a efetiva construção dos piquetes anunciados no vídeo impugnado.

Também não foi demonstrada a gravidade do fato sobre o resultado do pleito, pois não foi juntada a URL da postagem, exigência prevista no art. 17, inc. III e § 2° da Resolução TSE n. 23.608/19 para a petição inicial da representação relativa à propaganda irregular veiculada em ambiente de internet, o que torna inviável verificar o alcance da publicação em termos de “curtidas ou likes” e compartilhamentos.

Sequer foi demonstrado ter se tratado de mensagem pública a todos os usuários do Facebook, ou postagem privada reduzida aos perfis cadastrados como “amigos” do candidato na rede social.

Assim, as razões recursais não são suficientes para afastar a fragilidade da tese de que o recorrido, enquanto candidato, praticou abuso de poder econômico ao anunciar emenda parlamentar, merecendo ser reproduzido o seguinte trecho da decisão recorrida:

Nos termos do Art. 22 da lei de inelegibilidades (Lei complementar nº 64 de 1990) a Ação de investigação eleitoral tem por escopo apurar uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido político.

 

Para que seja deferido o processamento da AIJE é necessário em um primeiro momento que existam ao menos indícios de condutas que possam se enquadrar nas hipóteses citadas no Art. 22 da Lei de inelegibilidades.

 

Não é o caso dos autos. O requerente fundamentou seu inconformismo pelo fato do requerido Nilton Pires de Quadros ter se "beneficiado" da condição de candidato, frente a uma possível vinda de emenda parlamentar destinada a uma parcela “tradicionalista” da sociedade, a qual tenho como genérica e totalmente impessoal, não comprovada inclusive nos autos, a evidência do dolo ou a correlação da troca de benefícios.

 

Como se sabe a CF88 garante a todos o direito a livre manifestação em seu Art. 5º. O fato do requerido ser candidato ao cargo de vereador não lhe retira tal garantia.

 

Destaco ainda que em um ambiente eleitoral, como bem destaca o agente ministerial, promessas sem o objetivo de satisfazer interesses individuais e privados, não são capazes de atrair a incidência do Art. 41-A da Lei n. 9.504/97, atos que por palavras fogem a atribuições dos cargos pretendidos.

 

Ao fim e ao cabo o que pretende o requerente é censurar o requerido por não concordar com o teor das promessas feitas, o que evidentemente apresentado nos autos, não pode ser considerado estelionato eleitoral ou ainda captação ilícita de sufrágio universal.

 

Ante o exposto, por ser evidente a ausência de justa causa que justifique a interposição da presente AIJE, julgo a ação improcedente.

 

Desse modo, concluo ter sido acertada a decisão recorrida, pois a propaganda em questão trata-se de mera promessa de campanha que, apesar de divulgar a quantia financeira de R$ 400.000,00, não se caracteriza como abuso de poder econômico com gravidade suficiente para conduzir à cassação do mandato eletivo e à declaração da inelegibilidade.

Na esteira da jurisprudência do TSE, as promessas de campanha dirigidas indistintamente a eleitores sem referência a pedido de voto não constituem ilícito eleitoral (Ac. de 24.6.2014 no AgR-AI nº 44498, rel. Min. Luciana Lóssio; no mesmo sentido o Ac. de 8.4.2010 no Respe n. 35352, rel. Min. Fernando Gonçalves. Cito, ainda, os seguintes precedentes:

“[...] Captação ilícita de sufrágio. Distribuição de panfletos. Isenção de taxa condominial. Empreendimentos do programa habitacional minha casa minha vida. Promessa genérica. Plataforma política. Viabilidade em tese. Má-fé não demonstrada. Manutenção do acórdão regional [...]

(…)

7. Na espécie, conforme a moldura fática delineada no acórdão regional, não houve promessa de bem ou vantagem pessoal, consoante exige a norma em epígrafe, mas, sim, promessa dirigida a uma coletividade. A delimitação dos destinatários da propaganda eleitoral - moradores dos condomínios Nova Caraguá e Jetuba - não retira o caráter genérico da promessa, uma vez que a isenção da taxa condominial beneficiaria os condôminos indistintamente.

8. Esta Corte já decidiu que as promessas genéricas, sem o objetivo de satisfazer interesses individuais e privados, não são capazes de atrair a incidência do art. 41-A da Lei n. 9.504/97.

9. É assente, no ordenamento jurídico pátrio, o postulado segundo o qual a boa-fé se presume, a má-fé se prova.

10. No âmbito da propaganda eleitoral, e aqui se incluem as promessas de campanha, verificada a dificuldade de se provar a verdade ou a falsidade daquilo que foi divulgado, presente a boa-fé, deve-se decidir a favor do candidato, em homenagem à liberdade de expressão e à preservação dos direitos políticos.

[...]

12. Consoante se depreende do voto condutor do acórdão recorrido, não há falar em ilicitude da promessa de campanha em razão da impossibilidade do seu cumprimento, uma vez que ‘[...] a conduta dos recorridos possui respaldo no Decreto Municipal n. 634/2017, o qual autoriza a realização de serviços públicos essenciais nos condomínios 'Nova Caraguá' e 'Jetuba', com o intuito de extinguir a taxa condominial.

[...]

14. A viabilidade, ao menos em tese, do cumprimento do projeto político em favor dos eleitores da referida comunidade torna a promessa de campanha lícita.

[...]

16. Conclui-se que, no caso, não há falar em captação ilícita de sufrágio, porquanto: i) trata-se de promessa de campanha promovida de modo genérico; ii) demonstrou-se a viabilidade, ainda que mínima, de sua concretização; e iii) os recorrentes a veicularam de acordo com o primado da boa-fé objetiva [...]”.

(Ac. de 14.3.2019 no REspe nº 47444, rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto.) - Grifei

 

“[...] Abuso de poder econômico. Corrupção. 1. A promessa feita pelo candidato de que não cobraria contribuição de melhoria pelas benfeitorias realizadas nos logradouros municipais não configura nem abuso de poder econômico nem corrupção. [...]” NE: Alegação de promoção do asfaltamento de ruas da cidade sem cobrança dos beneficiados, bem como realização de propaganda institucional dessas obras.

(Ac. de 7.11.2006 no REspe no 25.984, rel. Min. José Delgado, red. designado Min. Carlos Alberto Menezes Direito.) - Grifei

 

Com essas razões, entendo não demonstrado o abuso de poder econômico no fato descrito na inicial, devendo ser integralmente confirmada a sentença que julgou improcedente a ação.

Ante o exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso.