REl - 0600666-56.2020.6.21.0163 - Voto Relator(a) - Sessão: 27/04/2022 às 14:00

VOTO

 

Conforme relatado, trata-se de recurso eleitoral em prestação de contas de campanha interposto pelo candidato CLAUDIO FREITAS XAVIER em face da sentença que desaprovou as suas contas em razão do recebimento de doação, em espécie, em valor superior ao limite legal.

Da Intempestividade.

Na linha deduzida no parecer da Procuradoria Regional Eleitoral, da lavra do ilustre Dr. José Osmar Pumes (ID 44933112), o apelo é manifestamente intempestivo.

Com efeito, nos termos do art. 30, § 5º, da Lei n. 9.504/97 (e art. 85 da Resolução TSE n. 23.607/19), o prazo para interposição de recurso contra a sentença que julgar as contas prestadas pelos candidatos é de 3 (três) dias.

No caso dos autos, conforme pesquisa aos expedientes do processo eletrônico no sistema PJE de primeiro grau, o ato de intimação eletrônica da sentença ocorreu, via sistema, em 16.9.2021 (quinta-feira), tendo sido registrada a ciência da parte prestadora na data de 23.9.2021 (quinta-feira), passando a correr o tríduo legal para oferecimento do recurso em 24.9.2021 (sexta-feira), nos termos do art. 56 da Resolução TRE-RS n. 338/19:

Art. 56. Considera-se como prazo inicial da intimação ou notificação o primeiro dia útil que seguir à data da ciência eletrônica, seja ela efetivada pela parte ou se dê de forma automática pelo sistema.

 

Logo, o termo final do prazo recursal ocorreu 26.9.2021 (domingo), tendo sido protraído para 27.9.2021 (segunda-feira).

No entanto, o apelo somente foi protocolado em 04.10.2021 (ID 44849298), ou seja, após o prazo legal.

 

DIANTE DO EXPOSTO, voto pelo não conhecimento do recurso em razão da sua intempestividade.

 

 

CASO CONHECIDO O RECURSO, PASSO AO EXAME DO MÉRITO.

 

 

 

Do Mérito

As contas do recorrente foram desaprovadas com base no parecer técnico conclusivo (ID 44849289), no qual foi apontado o recebimento de doação, em espécie, da quantia de R$ 1.750,00, descumprindo o disposto no art. 21, § 1º, da Resolução TSE 23.607/2019, que estabelece o limite de R$ 1.064,09 para tal modalidade de transação bancária.

Em suas razões, o candidato recorrente afirma que os valores considerados irregulares consistem em recursos próprios e que não houve prejuízo ao o controle da Justiça Eleitoral, pois não houve a aplicação de multa.

Não assiste razão ao recorrente.

Segundo dispõem os §§ 1º e 4º do art. 21 da Resolução TSE n. 23.607/2019, as doações em montante igual ou superior a R$ 1.064,10 devem ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação ou cheque cruzado e nominal, devendo os valores serem recolhidos ao Tesouro Nacional, caso haja utilização dos recursos recebidos em desacordo com o estabelecido no dispositivo, ainda que identificado o doador.

O escopo da norma é possibilitar o cruzamento de informações com o Sistema Financeiro Nacional, de modo a permitir que a fonte declarada seja confirmada por meio dos mecanismos técnicos de controle da Justiça Eleitoral.

Embora o recorrente afirme que o crédito advém de recursos próprios, é firme o posicionamento do egrégio Tribunal Superior Eleitoral no sentido de que o mero depósito identificado é incapaz de comprovar a efetiva origem dos recursos, haja vista a ausência de seu trânsito prévio pelo sistema bancário e a natureza essencialmente declaratória desse ato bancário:

AGRAVO REGIMENTAL. ELEIÇÕES 2016. PREFEITO. CONTAS DE CAMPANHA DESAPROVADAS. DOAÇÃO. PESSOA FÍSICA. DEPÓSITO. ART. 18, §§ 1º E 3º, DA RES.-TSE 23.463/2015. PERCENTUAL EXPRESSIVO. PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. NÃO INCIDÊNCIA. DESPROVIMENTO.

1. A teor do art. 18, §§ 1º e 3º, da Res.-TSE 23.463/2015, doações de pessoas físicas para campanhas, em valor igual ou superior a R$ 1.064,10, devem ser obrigatoriamente realizadas por meio de transferência eletrônica, sob pena de restituição ao doador ou de recolhimento ao Tesouro Nacional na hipótese de impossibilidade de identificá-lo.

2. Na espécie, é incontroverso que os candidatos, a despeito da expressa vedação legal, utilizaram indevidamente recursos financeiros R$ 5.000,00, o que corresponde a 16% do total de campanha oriundos de depósito bancário, e não de transferência eletrônica, o que impediu que se identificasse de modo claro a origem desse montante.

3. A realização de depósito identificado por determinada pessoa é incapaz, por si só, de comprovar sua efetiva origem, haja vista a ausência de trânsito prévio dos recursos pelo sistema bancário. Precedentes, com destaque para o AgR-REspe 529-02/ES, Rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJe de 19.12.2018.

4. Concluir em sentido diverso especificamente quanto à alegação de que as irregularidades não comprometeram a lisura do ajuste ou de que houve um erro formal do doador demandaria reexame do conjunto probatório, providência inviável em sede extraordinária, a teor da Súmula 24/TSE.

5. Inaplicáveis os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, pois se trata de falha que comprometeu a transparência do ajuste contábil. Precedentes.

6. Descabe conhecer de matéria alusiva ao desrespeito aos princípios da isonomia e legalidade (art. 5º, caput e II, da CF/88), porquanto cuida-se de indevida inovação de tese em sede de agravo regimental.

7. Agravo regimental desprovido.

(TSE – AgR-REspe n. 251-04, Relator: MIN. JORGE MUSSI, julgado em 19.3.2019, publicado no DJE, tomo 66, de 05.4.2019, pp. 68-69). Grifei.

Consigno, a tal respeito, que a Corte Superior entende que a obrigação de as doações acima de R$ 1.064,09 serem realizadas mediante transferência bancária não se constitui em mera exigência formal, sendo que o seu descumprimento enseja, em tese, a desaprovação das contas, consoante precedente a seguir colacionado:

ELEIÇÕES 2016. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. VEREADOR. DOAÇÃO. DEPÓSITO BANCÁRIO. EM ESPÉCIE. VALOR SUPERIOR A R$ 1.064,10. TRANSFERÊNCIA ELETRÔNICA. EXIGÊNCIA. ART. 18, § 1º DA RES. TSE Nº 23.463/2015. DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. PROVIMENTO.

1. In casu, trata-se de prestação de contas relativa às eleições de 2016 em que o candidato ao cargo de vereador recebeu doação de recursos para sua campanha, por meio de depósito bancário, no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais).

2. Nas razões do regimental, o Parquet argumenta que não foi observado o art. 18, § 1º, da Res.-TSE nº 23.463/2015, segundo o qual "as doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação". 3. A Corte Regional, soberana na análise dos fatos e provas, atestou a identificação da doadora do valor apontado como irregular por meio do número do CPF impresso no extrato eletrônico da conta de campanha.

4. Consoante decidido nesta sessão, no julgamento do AgR-REspe nº 265-35/RO, a maioria deste Tribunal assentou que a exigência de que as doações acima de R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) sejam feitas mediante transferência eletrônica não é meramente formal e o seu descumprimento enseja, em tese, a desaprovação das contas.

5. Considerando a maioria formada no presente julgamento nos mesmos termos do paradigma supracitado, reajusto o meu voto no caso vertente a fim de dar provimento ao recurso do Ministério Público Eleitoral para condenar o recorrido a recolher aos cofres públicos o valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais).

6. A desaprovação das contas em virtude de eventual gravidade da irregularidade mostra-se inaplicável na espécie, em respeito ao princípio da congruência, uma vez que referida pretensão não foi objeto do recurso especial.

7. Agravo regimental acolhido para dar provimento ao recurso especial, com determinação de recolhimento ao erário do valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais).

(Recurso Especial Eleitoral n. 52902, Acórdão, Relator: MIN. TARCISIO VIEIRA DE CARVALHO NETO, Publicação:  DJE - Diário da justiça eletrônica, Tomo 250, Data 19.12.2018, pp. 92/93). Grifei.

 

Nesse trilhar, o TSE já assentou que “a ratio essendi da norma é identificar a origem de recurso arrecadado, com o rastreamento a partir da transferência eletrônica efetivada entre estabelecimentos bancários” (Recurso Especial Eleitoral n. 26535, Relatora designada: MIN. ROSA WEBER, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônica, Data 20.11.2018, p. 32).

Não se olvida que este Regional tem arrefecido o rigor dessas disposições normativas quando o prestador, por outros meios, atinge o fim colimado pela norma, qual seja, a demonstração segura da origem dos recursos, mormente, por meio do oferecimento de comprovantes de saque em dinheiro da conta-corrente do doador e imediato depósito em espécie na conta de campanha, demonstrando que a operação de transferência bancária restou meramente decomposta em um saque seguido incontinenti de um depósito na mesma data.

Entrementes, na hipótese vertente inexiste comprovação adicional mínima sobre a origem dos recursos, impossibilitando que a falha seja relevada.

Por fim, embora haja previsão expressa de recolhimento dos valores identificados como de origem não identificada (RONI) aos cofres do Tesouro Nacional (art. 32 da Resolução TSE n. 23.607/2019), não tendo sido a medida determinado pela sentença e existindo a interposição de recurso exclusivamente pelo candidato, não cabe, nesta instância, a imposição do dever de recolhimento de ofício, sob pena de violação do princípio da non reformatio in pejus.

Por essas razões, a sentença deve ser merece ser mantida integralmente.

Do Percentual da Irregularidade Constatada

Considerando-se que a falha apontada (R$ 1.750,00) representa aproximadamente 51,83% das receitas declaradas pelo candidato (R$ 3.376,72), não se mostra possível a aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade para aprovar as contas com ressalvas.

Por fim, embora haja previsão expressa de recolhimento dos valores identificados como de origem não identificada (RONI) aos cofres do Tesouro Nacional (art. 32 da Resolução TSE n. 23.607/2019), não tendo sido a medida determinado pela sentença e existindo a interposição de recurso exclusivamente pelo candidato, não cabe, nesta instância, a imposição do dever de recolhimento de ofício, sob pena de violação do princípio da non reformatio in pejus.

Dispositivo

DIANTE DO EXPOSTO, voto pelo desprovimento do recurso, mantendo integralmente a sentença que desaprovou as contas de Claudio Freitas Xavier, relativas ao pleito de 2020.