REl - 0600539-22.2020.6.21.0001 - Voto Relator(a) - Sessão: 27/04/2022 às 14:00

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, a prestação de contas foi desaprovada pelo juízo a quo devido à constatação do descumprimento dos requisitos encartados nos arts. 38, 53, inc. II, al. “c”, e 60 da Resolução TSE n. 23.607/19.

Acertadamente, a sentença (ID 44860408) foi no seguinte sentido:

 

(...)

Cuida-se de apreciar contas de campanha eleitoral oferecidas por candidato ao cargo de vereador.

A prestação de contas foi instruída com os documentos arrolados na Resolução TSE n. 23.607/19 do TSE e as peças devidamente assinadas.

A unidade técnica apontou, após a conclusão de todos os exames, a existência das seguintes irregularidade nas contas:  identificação de inconsistências nas despesas pagas com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), contrariando o que referem os arts. 38, 53, II, c, e 60, da Resolução TSE n. 23.607/2019. São despesas declaradas no SPCE nos valores de R$800,00, R$850, R$150,00, R$100,00,e ausentes no extrato bancário R$100,00, R$1.437,29, 600,00, R$537,29, R$600,00, R$600,00, R$150,00, R$150,00, R$100,00 R$150,00, R$50,00, R$800,00, R$800,00, R$600,00, R$800,00, R$300,00 R$1.500,00, R$200,00, sem comprovação dos destinatários.

Também foram apontados valores não declarados na prestação de contas referentes as quantias de R$200,00, R$350,00, R$300,00, R$150,00, R$150.00, R$150,00, R$1.200,00, R$500,00, R$2.500,00, R$1.500,00, R$1.500,00 e R$1.437,29.

O prestador não respondeu aos apontamentos do relatório preliminar elaborado pela Equipe Técnica da Justiça Eleitoral, portanto não comprovou a regularidade de suas contas eleitorais.

O aparecer técnico foi pela desaprovação das contas.

De fato, os valores apontados comprometem um alto percentual das receitas declaradas na campanha e a omissão de documentos necessários impede que a Justiça Eleitoral exerça o seu papel fiscalizatório. Nestas circunstâncias não se pode apurar os fatos geradores das despesas.

Enfim, o prestador não observou o disposto nos artigos 38, 53, II, ‘c’, e 60, todos da Resolução TSE n. 23.607/19, o que impede a aprovação de suas contas.

O montante de R$ 10.087,29, soma dos valores apontados, deverá ser recolhido ao Tesouro Nacional, nos termos do artigo 79, §1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Assim, concluo, considerando os fatos apontados, pela aplicação do disposto no art. 30, III, da Lei n. 9.504/97, combinado com o art. 74, III, da Resolução n. 23.607/19 do TSE, desaprovando as contas prestadas.

 III - DISPOSITIVO

Diante do exposto, julgo DESAPROVADAS as contas de ADRIANO RODRIGUES DA SILVA  nos termos do art. 74, inciso III, da Resolução n. 23.607/19, do TSE.

Determino o recolhimento do valor total de R$ 10.087,29 ao Tesouro Nacional.


 

A decisão acolheu os apontamentos efetuados pela unidade técnica em seu parecer conclusivo (ID 44860404) de que, em relação às despesas realizadas com recursos financeiros do Fundo Especial de Financiamento de Campanha - FEFC, não foram comprovados gastos no valor de R$ 10.087,29 relativos a pagamentos efetuados por meio de cheques sem a devida identificação da contraparte no registro dos pagamentos das despesas contratadas perante todos os fornecedores. Verificaram-se, ainda, despesas declaradas no SPCE e ausentes nos extratos bancários, assim como dados constantes dos extratos e não declarados na prestação de contas, contrariando o que referem os arts. 38, 53, inc. II, al. “c”, e 60, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Em suas razões, o recorrente não contesta o disposto na sentença quanto à existência das irregularidades, apenas alude que se trata de “pessoa rústica”, sem habilidade para cumprir a legislação eleitoral e em primeira campanha eleitoral.

Não merece acolhida os argumentos do recorrente.

Primeiro, porque alegar inexperiência em campanha eleitoral não o exime das responsabilidades impostas a todos os candidatos e partidos, pois cabe à sigla orientar adequadamente os candidatos para a correta observância da legislação. Segundo, porque o prestador efetuou os pagamentos por meio de emissão de cheques e/ou em dinheiro. Ocorre que os cheques foram sacados na “boca do caixa” em espécie, demonstrando, assim, que não foram cruzados.

A unidade técnica em seu exame preliminar (ID 44860397), posteriormente ratificado no parecer conclusivo, esclarece o ponto da seguinte forma:

O cheque cruzado é aquele que não pode ser sacado, o que significa que ele só pode ser recebido fazendo o seu depósito em conta corrente, e assim identificando tanto o favorecido como o emissor do cheque, ou seja, a contraparte, informação imprescindível para verificar a regularidade da prestação de contas.

 

Houve, portanto, infração ao disposto no art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19, o qual determina que os gastos eleitorais de natureza financeira só podem ser efetuados por meio de:

 

  1. cheque nominal cruzado;
  2. transferência bancária que identifique o CPF ou CNPJ do beneficiário;
  3. débito em conta; ou
  4. cartão de débito da conta bancária.

 

Nesse sentido, o que constou no parecer da douta Procuradoria Regional Eleitoral (ID 44905793):

(...) os meios de pagamento previstos no art. 38 são os únicos que permitem identificar exatamente a pessoa, física ou jurídica, que recebeu o valor depositado na conta de campanha, constituindo, assim, um mínimo necessário para efeito de comprovação do real destinatário dos recursos de campanha, e, por consequência, da veracidade do correspondente gasto.

 

No caso em tela, sendo o pagamento realizado através de cheque não cruzado e/ou dinheiro, restou inviabilizado o sistema instituído pela Justiça Eleitoral para conferir transparência e publicidade às receitas e aos gastos de campanha, pois impediu que o sistema Divulgacandcontas fosse alimentado com a informação sobre o beneficiário do cheque, impossibilitando o controle e a fiscalização da destinação dos recursos públicos.

Outro ponto que restou prejudicado, dado que os valores embora oriundos dos cofres públicos não transitam pelo sistema financeiro nacional, foi o rastreamento para que se verificasse se os destinatários dos pagamentos de fato pertenceram à relação que originou o gasto de campanha, além de outros controles públicos, como é o caso da Receita Federal e do COAF.

A legislação eleitoral determina os arts. 38 e 60, caput e §§ 1º e 2º, da Resolução TSE n. 23.607/19 para análise conjunta das despesas. O primeiro dispositivo legal elenca os meios pelos quais os pagamentos devem ser efetuados e o segundo contempla um rol de documentos complementares à comprovação dos gastos eleitorais.

Dessa maneira, a Justiça Eleitoral construiu uma análise circular das despesas, contando para isso, com dados das instituições financeiras, dos prestadores de contas e dos terceiros contratados para atestar a origem e o destino dos valores.

A Procuradoria Regional Eleitoral explicita em suas palavras a necessidade de analisar de forma conjunta os dados extraídos (ID 44905793):

 

É somente tal triangularização entre prestador de contas, instituição financeira e terceiro contratado, com dados provenientes de diversas fontes distintas, que permite, nos termos da Resolução, o efetivo controle dos gastos de campanha a partir do confronto dos dados pertinentes. Saliente-se, ademais, que tal necessidade de controle avulta em importância quando, como no caso, se tratam de recursos públicos, como são as verbas recebidas via FEFC.

 

Ainda, as irregularidades representam 62% do total das receitas declaradas (R$16.262,69), percentual superior ao limite utilizado (10%) como critério pela Justiça Eleitoral para aprovação com ressalvas. Além disso, o valor absoluto (R$ 10.087,29) é superior ao parâmetro de R$ 1.064,10 (ou mil UFIRs) que a disciplina normativa das contas considera módico, de modo a permitir o gasto de qualquer eleitor pessoalmente, não sujeitos à contabilização, e de dispensar o uso da transferência eletrônica interbancária nas doações eleitorais (arts. 43, caput, e 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19), de modo que não há como invocar, para o caso telado, os princípios da razoabilidade e proporcionalidade.

Diante do exposto, VOTO pelo DESPROVIMENTO do recurso, nos termos da fundamentação, mantendo a desaprovação das contas bem como a determinação de recolhimento do valor de R$ 10.087,29 ao Tesouro Nacional.