REl - 0600270-90.2020.6.21.0127 - Voto Relator(a) - Sessão: 27/04/2022 às 14:00

VOTO

As contas foram desaprovadas em virtude do recebimento de recursos de origem não identificada relativos ao pagamento de despesa com publicidade no valor de R$ 1.400,00, localizada a partir de nota fiscal não contabilizada, emitida contra o CNPJ do candidato a prefeito, e pela emissão de cheques nominais não cruzados utilizados para pagamento de despesas com recursos do Fundo Especial de Financiamento de campanha (FEFC).

Quanto à primeira irregularidade, trata-se da localização da nota fiscal n. 31661718, emitida por Leonardo de Lima Silva, no valor de R$ 1.400,00, a qual foi encontrada pelo exame técnico por meio do procedimento de circularização, e pode ser consultada no sítio Divulga Cand Contas ( https://divulgacandcontas.tse.jus.br/divulga/#/candidato/2020/2030402020/86797/210000781424/nfes).

Em suas razões, os recorrentes alegam que não efetuaram a contratação do serviço, inclusive juntaram declaração de Leonardo de Lima Silva, informando que a nota fiscal foi emitida por equívoco (ID 44857072).

Na hipótese em tela, a declaração feita pelo empresário não afasta a irregularidade, uma vez que não foi cancelada a nota fiscal emitida, conforme é possível verificar pelo sítio da receita estadual no endereço (https://www.nfe.fazenda.gov.br/portal/consultaResumo.aspx?tipoConteudo=7PhJ+gAVw2g= ), utilizando-se a chave de acesso n. 4320 1187 9586 7400 0181 5589 0031 6617 1818 4440 0955.

Uma vez que há determinação expressa no art. 59 da Resolução TSE n. 23.607/19, segundo o qual “o cancelamento de documentos fiscais deve observar o disposto na legislação tributária, sob pena de ser considerado irregular”, por conseguinte permanece a mácula, cuja origem da quantia para pagamento de despesa não restou demonstrada, a qual não circulou pela conta aberta para a movimentação da receita da candidatura.

Desse modo, a quantia se caracteriza como recursos de origem não identificada, na forma do art. 32, caput, da Resolução TSE n. 23.607/19.

O dispositivo em questão prevê que tais valores não podem ser utilizados e devem ser recolhidos ao Tesouro Nacional, portanto, correta a sentença ao considerar o valor como recurso de origem não identificada e determinar seu recolhimento ao Tesouro Nacional, na forma do art. 79 da Resolução TSE n. 23.607/19.

A segunda falha refere-se à utilização de dois cheques nominais não cruzados, compensados com recursos do FEFC para pagamento de serviços advocatícios, no montante de R$ 10.000,00, e de produção de programas de rádio, televisão ou vídeo, no valor de R$ 5.000,00, totalizando R$ 15.000,00.

O cheque n. 850013, dirigido nominalmente ao prestador de serviço advocatício (ID 44857071), no valor de R$ 10.000,00, foi sacado na boca do caixa, sem identificação do CPF do sacador. A mesma falha ocorreu com o cheque n. 850010, nominal a Juliano Miranda da Silva, na quantia de R$ 5.000,00, conforme extrato bancário da conta do FEFC.

Do exame dos autos, verifica-se que foram juntados o contrato de prestação de serviços advocatícios (ID 44857014), em cuja cláusula 3ª consta o preço do serviço de R$ 10.000,00, e o contrato de gravação de áudio e vídeo (ID 44857012), em que, na cláusula 2ª, consta a remuneração no valor de R$ 5.000,00.

O juízo a quo ao apontar a falha considerou que a documentação juntada aos autos não afasta a irregularidade, mas não acarreta o dever de recolhimento dos valores ao erário.

Entretanto, como bem se manifestou a douta Procuradoria Regional Eleitoral, tais contratos, por se tratar de documentos produzidos por acordo entre partes, não têm fé suficiente, podendo dar margem a burlas por não trazerem transparência sobre o destino dos recursos públicos.

Não se trata da apuração de má-fé, mas da total falta de confiabilidade dos documentos apresentados pelos prestadores para comprovar o destinatário de recursos públicos, sendo certo que o mero registro da contratação não tem o condão de sanar a irregularidade relativa à falta de identificação dos beneficiários dos cheques nos extratos bancários.

Como se vê, os candidatos não se desincumbiram de comprovar de forma suficiente e estreme de dúvidas a irregularidade, e não é possível aceitar tão somente os contratos apresentados como comprobatórios do emprego de dinheiro público.

A emissão de cheque nominal não cruzado permite circular e compensar sem depósito bancário, não havendo transparência nem confiabilidade na identificação dos beneficiários dos gastos em questão, impedindo a rastreabilidade das quantias utilizadas na campanha, desatendendo o disposto no art. 38, inc. I, da Resolução TSE 23.607/19, que estabelece a necessidade de que o pagamento seja realizado por cheque nominal cruzado:

Art. 38. Os gastos eleitorais de natureza financeira, ressalvados os de pequeno vulto previstos no art. 39 e o disposto no § 4º do art. 8º, ambos desta Resolução, só podem ser efetuados por meio de:

I - cheque nominal cruzado;

II - transferência bancária que identifique o CPF ou CNPJ do beneficiário;

III - débito em conta; ou IV - cartão de débito da conta bancária.

§ 1º O pagamento de boletos registrados pode ser realizado diretamente por meio da conta bancária, vedado o pagamento em espécie.

§ 2º É vedado o pagamento de gastos eleitorais com moedas virtuais.

O art. 32 da Resolução TSE n. 23.607/19 prevê que tais valores não podem ser utilizados e devem ser recolhidos ao Tesouro Nacional. Entretanto, a sentença limitou-se a desaprovar as contas, sem determinação de recolhimento ao erário, assim descabe rever a decisão em face de o recurso ter sido interposto somente pelos candidatos, e não pelo órgão ministerial.

Desse modo, as razões recursais são insuficientes para o afastamento das falhas verificadas nas contas.

Nesses termos, o recurso não comporta provimento em virtude das irregularidades perfazerem o total de R$ 16.400,00, R$ 1.400,00 referente à despesa não declarada e R$ 15.000,00 relativo à emissão de cheques nominais não cruzados, quantia que representa 21,07% do total das receitas financeiras, no montante de R$ 77.830,70, e ultrapassa o valor de parâmetro de R$ 1.064,10 (ou mil UFIRs) que a Resolução TSE n. 23.607/19 considera módico.

Com essas considerações, não é adequado, razoável e proporcional o juízo de aprovação das contas, ainda que com ressalvas, pois a falha é grave e compromete de forma insanável a confiabilidade da movimentação financeira.

Ante o exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso para manter a desaprovação das contas e a determinação de recolhimento de R$ 1.400,00 ao Tesouro Nacional, nos termos da fundamentação.