REl - 0600665-37.2020.6.21.0045 - Voto Relator(a) - Sessão: 20/04/2022 às 14:00

VOTO

Senhor Presidente,

Eminentes colegas:

 

Admissibilidade Recursal

O recurso é tempestivo e regular, comportando conhecimento.

Mérito

No mérito, as contas foram desaprovadas com base nas seguintes irregularidades: a) registro na Ficha de Qualificação de conta n. 4268-9, sem a entrega dos extratos bancários físicos e sem o seu registro eletrônico; b) não comprovação da transferência da sobra de campanha, no valor de R$ 29,85, à direção partidária municipal, em desacordo com o disposto no art. 50, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19 e c) despesas no valor de R$ 500,00 e R$ 320,00 (cheques 900001 e 900002) com recursos do FEFC, que não foram registradas na prestação de contas, tampouco foram comprovadas.

A recorrente realizou a abertura da conta bancária – outros recursos de n. 4268-9, ag. 0504, da Caixa Econômica Federal, mas não entregou os extratos bancários e nem os registrou no Sistema de Prestação de Contas Eleitorais – SPCE-WEB.

Destaca-se que, apesar de devidamente intimada, não acostou aos autos extratos bancários ou declaração do banco a fim de comprovar a alegada ausência de movimentação financeira, em desacordo com o que dispõe a Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 53. Ressalvado o disposto no art. 62 desta Resolução, a prestação de contas, ainda que não haja movimentação de recursos financeiros ou estimáveis em dinheiro, deve ser composta:

(…)

II - pelos seguintes documentos, na forma prevista no § 1º deste artigo:

a) extratos das contas bancárias abertas em nome do candidato e do partido político, inclusive da conta aberta para movimentação de recursos do Fundo Partidário e daquela aberta para movimentação de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), quando for o caso, nos termos exigidos pelo inciso III do art. 3º desta Resolução, demonstrando a movimentação financeira ou sua ausência, em sua forma definitiva, contemplando todo o período de campanha, vedada a apresentação de extratos sem validade legal, adulterados, parciais ou que omitam qualquer movimentação financeira; (Grifei.)
 

Não desconheço o entendimento jurisprudencial de que a não apresentação de extratos bancários pelo prestador constitui falha que, por si só, não tem potencial para gerar a desaprovação das contas, nos casos em que for possível a análise da movimentação financeira por meio dos extratos eletrônicos enviados pela instituição bancária, disponíveis no Sistema de Divulgação de Candidaturas e Contas Eleitorais. Entretanto, no caso concreto, não constam os extratos nas informações disponíveis no referido sistema (https://divulgacandcontas.tse.jus.br).

Dessarte, não há como ser aferida a fidedignidade e veracidade das informações apresentadas pela candidata.

Assim, deve ser mantida a sentença que entendeu pela desaprovação das contas, pois a ausência dos extratos impediu a fiscalização pela Justiça Eleitoral e maculou a transparência da contabilidade.

Nesse sentido, a ementa que reproduzo do TSE, que sedimenta a compreensão de que apenas pode ser afastada a gravidade da ausência de extratos bancários se de outro modo for possível conferir a regularidade das contas:

ELEIÇÕES 2018. AGRAVO INTERNO EM RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATOS AOS CARGOS DE GOVERNADOR E VICE–GOVERNADOR. CONTAS DE CAMPANHA ELEIÇÕES 2018. AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. DEPUTADO FEDERAL. CONTAS APROVADAS COM RESSALVAS. AUSÊNCIA DE JUNTADA DE EXTRATOS BANCÁRIOS PELO CANDIDATO. EXTRATOS ELETRÔNICOS ENCAMINHADOS PELA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. ANÁLISE SIMPLIFICADA EFETUADA PELA JUSTIÇA ELEITORAL. A CORTE REGIONAL CONCLUIU QUE O VÍCIO ERA MERAMENTE FORMAL E QUE NÃO COMPROMETEU A HIGIDEZ NEM A LISURA DAS CONTAS. CONCLUSÃO DIVERSA. REEXAME DE PROVAS. INCIDÊNCIA DO ENUNCIADO Nº 24 DA SÚMULA DO TSE. NEGADO PROVIMENTO AO AGRAVO INTERNO.

1. O acórdão regional assentou que foi efetuada análise simplificada das contas, mediante os extratos eletrônicos encaminhados pela instituição bancária, o que não acarretou prejuízo à fiscalização pela Justiça Eleitoral, e que a omissão do candidato de juntar aos autos digitais os extratos bancários configurou mera irregularidade formal, a qual não teve o condão de macular as contas apresentadas a ponto de ensejar a desaprovação.

2. Na decisão agravada, consignei a incidência do Enunciado Sumular nº 24 do TSE, sob o fundamento de que decidir de forma diversa do acórdão regional quanto ao ponto para concluir pela gravidade do referido vício e, por conseguinte, desaprovar as contas, como pretendia o então recorrente, demandaria o reexame do acervo de provas juntado aos autos do processo eletrônico. Na ocasião, assinalei também a incidência do óbice do Enunciado Sumular nº 28 do TSE, devido à ausência de similitude fática entre os julgados confrontados, haja vista a existência de extratos eletrônicos nos presentes autos digitais, o que viabilizou a análise, pela Corte regional, da movimentação financeira do candidato.

3. O ora agravante defende o reenquadramento jurídico dos fatos, sob o argumento de que é incontroverso que o candidato não juntou extratos bancários aos autos digitais, o que, nos termos da jurisprudência do TSE, é falha grave e inviabiliza o controle social, motivo pelo qual entende que as contas devem ser desaprovadas.

4. O entendimento consolidado desta Corte Superior é no sentido de que a gravidade decorrente da ausência de extrato bancário ocorre nas hipóteses em que ficar impossibilitada a concreta análise da regularidade das contas apresentadas, o que, contudo, não é o caso do feito, visto que, nas contas em exame, foi feita uma análise simplificada de toda a movimentação financeira do candidato, por meio dos extratos eletrônicos encaminhados pela instituição bancária, concluindo-se pela sua regularidade, conforme consignado pelo TRE/PB.

5. Este Tribunal Superior, no recente julgamento do AgR-REspe nº 0600603-54/PB, ocorrido em 2.4.2020, de relatoria do Ministro Sérgio Banhos e publicado no DJe de 29.4.2020, ao analisar caso similar ao dos autos digitais, em que presentes extratos eletrônicos encaminhados por instituição bancária, concluiu que a reforma do entendimento do Tribunal a quo, com a finalidade de afastar o caráter meramente formal do vício decorrente da ausência de extratos bancários, bem como a ausência de gravidade de tal irregularidade capaz de comprometer a confiabilidade das contas e ensejar a desaprovação delas, demandaria a reincursão no acervo fático-probatório do feito, a qual não se coaduna com a via estreita do recurso especial.

6. Ante a inexistência de argumentos aptos para afastar tais conclusões, deve ser mantida a decisão agravada por seus próprios fundamentos.

7. Negado provimento ao agravo interno.

(TSE - RESPE: 06006823320196000000 JOÃO PESSOA - PB, Relator: Min. Og Fernandes, Data de Julgamento: 13.8.2020, Data de Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 177, Data 03.9.2020, Página 0) (Grifei.)
 

A segunda irregularidade refere-se à ausência de comprovante de transferência para o diretório municipal do partido das sobras de campanha, no valor de R$ 29,85, em desacordo com o art. 50, §1º, da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 50. Constituem sobras de campanha:

(…)

§ 1º As sobras de campanhas eleitorais devem ser transferidas ao órgão partidário, na circunscrição do pleito, conforme a origem dos recursos e a filiação partidária do candidato, até a data prevista para a apresentação das contas à Justiça Eleitoral.

 

A recorrente não comprovou o repasse das sobras de campanha para a direção partidária municipal, pois não apresentou o recibo, apenas imagem de uma tela de computador (ID 44859865), além disso cabe apontar que consta no extrato bancário o saldo no valor de R$ 29,85.

Assim, permanece a falha apontada.

A terceira irregularidade refere-se à ausência de comprovação de gastos eleitorais com verbas do FEFC, decorrente do desconto de dois cheques (cheques 900001 e 900002) nos valores de R$ 500,00 e R$ 320,00, atribuídos pela prestadora a pagamentos por serviços de militância.

No quesito, a recorrente juntou aos autos cópias de dois contratos de prestação de serviço de militância nos valores referidos, no entanto, nos extratos bancários, o registro dos cheques descontados vem desacompanhado da indicação das contrapartes.

No ponto, a Resolução TSE n. 26.607/19 dispõe:

Art. 38. Os gastos eleitorais de natureza financeira, ressalvados os de pequeno vulto previstos no art. 39 e o disposto no § 4º do art. 8º, ambos desta Resolução, só podem ser efetuados por meio de:

I - cheque nominal cruzado;

II - transferência bancária que identifique o CPF ou CNPJ do beneficiário;

III - débito em conta; ou

IV - cartão de débito da conta bancária.

 

A recorrente sustenta que os documentos juntados denotam a regularidade das contas.

Contudo, sem razão.

Muito embora as cópias dos contratos de prestação de serviço tenham sido apresentados, não há como verificar se os prestadores de serviço foram os beneficiários dos créditos, devido à ausência de identificação das contrapartes que realizaram os saques, conforme informação no https://divulgacandcontas.tse.jus.br/divulga/#/candidato/2020/2030402020/88536/210001139686/extratos.

Sublinho que a falha decorre da não observância das formas estabelecidas na legislação de regência para pagamento dos gastos eleitorais: cheque nominal cruzado, transferência bancária que identifique o CPF ou CNPJ do beneficiário, débito em conta ou cartão de débito da conta bancária, como bem esclarece o douto Procurador Regional Eleitoral, em alentado trecho do parecer, o qual transcrevo e adoto expressamente como razões de decidir, a fim de evitar desnecessária repetição:

Assim, se por um lado o pagamento pelos meios indicados pelo art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19 não é suficiente, por si só, para atestar a realidade do gasto de campanha informado, ou seja, de que o valor foi efetivamente empregado em um serviço ou produto para a campanha eleitoral, sendo necessário trazer uma confirmação, chancelada pelo terceiro com quem o candidato contratou, acerca dos elementos da relação existente; por outra via a tão só confirmação do terceiro por recibo, contrato ou nota fiscal também é insuficiente, pois não há registro rastreável de que foi ele quem efetivamente recebeu o referido valor.

É somente tal triangularização entre prestador de contas, instituição financeira e terceiro contratado, com dados provenientes de diversas fontes, que permite, nos termos da Resolução TSE n. 23.607/19, o efetivo controle dos gastos de campanha a partir do confronto dos dados pertinentes. Saliente-se, ademais, que tal necessidade de controle avulta em importância quando, como no caso, se trata de aplicação de recursos públicos.

Ademais, a obrigação de que os recursos públicos recebidos pelos candidatos sejam gastos mediante forma de pagamento que permite a rastreabilidade do numerário até a conta do destinatário (crédito em conta), como se dá com o cheque cruzado (art. 45 da Lei n. 7.357/85), assegura que outros controles públicos possam ser exercidos, como é o caso da Receita Federal e do COAF.

 

Ante o exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso, confirmando integralmente a sentença que desaprovou as contas de campanha de FABIANA VERISSIMO FREITAS, relativas ao pleito de 2020.

É como voto, senhor Presidente.