REl - 0600256-97.2020.6.21.0130 - Voto Relator(a) - Sessão: 20/04/2022 às 14:00

VOTO

Eminentes Colegas.

O recurso é tempestivo, e presentes os demais pressupostos de admissibilidade, merece conhecimento.

MARIA LUÍZA NOGUEIRA MAIO interpõe recurso contra a sentença de desaprovação das contas de candidatura ao cargo de vereadora no município de São José do Norte nas eleições 2020, proferida pelo Juízo da 130ª Zona Eleitoral, em razão de (1) irregularidades nos registros das movimentações financeiras na conta das verbas oriundas do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC, e (2) divergência entre dados informados na prestação e os constantes do extrato bancário da conta “outros recursos”.

No concernente à primeira irregularidade, a auditoria contábil realizada no juízo de origem identificou duas operações financeiras registradas nos extratos eletrônicos da conta n. 621364008 do Banco do Estado do Rio Grande do Sul – BANRISUL, específica para trânsito das verbas oriundas do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC, as quais não foram informadas na prestação de contas.

Observo que o extrato bancário indica apenas três operações, quais sejam, (1) o ingresso de R$ 500,00, (2) o pagamento de tarifa (folha de cheque) na quantia de R$ 15,50, debitado em 16.11.2020, e (3) o saque eletrônico de R$ 484,50, realizado em 11.12.2020. As duas últimas movimentações não foram registradas na prestação.

As verbas públicas disponibilizadas não foram utilizadas e ao final, sacadas. Ainda, a candidata informou na prestação de contas ter recolhido R$ 500,00 em sobras de campanha da conta FEFC – argumento acolhido pelo magistrado de origem, com a ressalva de que o valor efetivamente recolhido ao Erário fora de R$ 484,50, conforme Guia de Recolhimento da União – GRU acostada aos autos.

Nesse contexto o documento seria inaceitável como prova da devolução da quantia à União, mas tendo a decisão de origem entendido como sanado o vício, não há como alterar a situação da recorrente para pior, e perde força a divergência de valores, pois a quantia de R$ 15,50 parece corresponder à tarifa bancária, de modo que o ponto se presta apenas à anotação de ressalvas nas contas.

No que se refere à segunda falha, o parecer conclusivo aponta divergência entre dados informados na prestação e os constantes do extrato da conta n. 621363702, BANRISUL, a qual movimenta “outros recursos”.

De fato, o extrato bancário demonstra o ingresso de R$ 1.000,00, em 05.10.2020, e de R$ 60,58, em 11.12.2020, e em ambos os depósitos consta a identificação da parte depositante como a própria candidata. Ainda, entre as receitas declaradas na prestação de contas há apenas a indicação do aporte em recursos próprios da quantia de R$ 400,00, na data de 05.11.2020, estando as primeiras operações não reproduzidas na prestação. Com efeito, a diferença entre os recursos próprios efetivamente utilizados e aqueles declarados é de R$ 660,58.

A legislação de regência determina que incumbe ao prestador o zelo na escrituração contábil com o fim de incorporar transparência e integridade às contas, o que não verifico no caso presente, devendo ser mantido o apontamento da falha até mesmo pela grande proporção da diferença identificada.

Por fim, entendo possível a construção do juízo de aprovação com ressalvas mediante aplicação do princípio da razoabilidade, pois o valor nominal da irregularidade remanescente é módico, R$ 660,58, inferior ao parâmetro de R$ 1.064,10 utilizado por este Tribunal como autorizador da aplicação dos referidos postulados constitucionais. Nesse sentido, julgado do Tribunal Superior Eleitoral:

AGRAVOS REGIMENTAIS. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CAMPANHA ELEITORAL. DEPUTADO ESTADUAL. ELEIÇÕES 2018. PRINCÍPIOS. PROPORCIONALIDADE. RAZOABILIDADE. DESPROVIMENTO. SÍNTESE DO CASO.

[...]

4. No caso em exame, tendo em vista que não foi constatado má–fé do prestador de contas; que o valor correspondente à irregularidade verificada não foi significativo; e que se trata apenas de único vício, devidamente aferido no âmbito da prestação de contas, é possível a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para aprovar as contas com ressalvas.

5. A orientação adotada por este Tribunal é no sentido de que é viável "a aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade para aprovar as contas com ressalvas quando a irregularidade representa percentual ínfimo e a falha não inviabilizou o controle das contas pela Justiça Eleitoral" (AgR–AI 507–05, rel. Min. Gilmar Mendes, DJE de 03.6.2015.).

6. Segundo a jurisprudência desta Corte, "nas hipóteses em que não há má–fé, a insignificância do valor da irregularidade pode ensejar a aprovação da prestação de contas, devendo ser observado tanto o valor absoluto da irregularidade, como o percentual que ela representa diante do total dos valores movimentados pelo candidato" (AgR–Al 1856–20, rel. Min. Maria Thereza Rocha de Assis Moura, redator para o acórdão Min. Henrique Neves da Silva, DJE de 09.02.2017.).

7. No julgamento do AgR–REspe 0601473–67, de relatoria do Ministro Edson Fachin, de 05.11.2019, esta Corte assentou compreensão no sentido de adotar "como balizas, para as prestações de contas de candidatos, o valor máximo de R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) como espécie de tarifação do princípio da insignificância' como valor máximo absoluto entendido como diminuto e, ainda que superado o valor de 1.000 UFIRs, é possível a aplicação dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade para aquilatar se o valor total das irregularidades não superam 10% do total da arrecadação ou da despesa, permitindo–se, então, a aprovação das contas com ressalvas". Acresceu–se, ainda, a premissa consignada no voto–vista proferido pelo Ministro Tarcisio Vieira de Carvalho Neto no sentido de que "tal balizamento quanto aos aspectos quantitativos das prestações de contas não impede sua análise qualitativa. Dessa forma, além de sopesar o aspecto quantitativo descrito acima, há que se aferir se houve o comprometimento da confiabilidade das contas (aspecto qualitativo). Consequentemente, mesmo quando o valor apontado como irregular representar pequeno montante em termos absolutos ou ínfimo percentual dos recursos, eventual afetação à transparência da contabilidade pode ensejar a desaprovação das contas".

(...)

(Agravo de Instrumento n. 060752792, Acórdão, Relator Min. Sergio Silveira Banhos, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônica, Tomo 211, Data 20.10.2020.)

Diante do exposto, VOTO para dar provimento parcial ao recurso e aprovar as contas com ressalvas.