REl - 0600438-11.2020.6.21.0057 - Voto Relator(a) - Sessão: 19/04/2022 às 14:00

VOTO

O recurso é tempestivo e regular, comportando conhecimento.

No mérito, as contas de ANDERSON SENNA DE CASTRO foram desaprovadas em sentença assim fundamentada:

Analisando os documentos acostados aos autos, considero que as falhas apontadas, com exceção da existência de dívidas de campanha, não se revestem de gravidade suficiente para amparar a rejeição das presentes contas. (...)

Por outro lado, a existência de dívidas de campanha sem comprovação de quaisquer providências para o adimplemento da mesma ou para sua assunção pelo órgão partidário compromete a totalidade das contas, posto que resta comprometida a fiscalização da origem dos recursos que serão utilizados para o seu adimplemento.

Ocorre que tanto o valor absoluto da dívida (R$ 1.226,00) quanto o valor percentual que ela representa (89,42 % das despesas totais de campanha ou, simplesmente 100% das despesas financeiras) desautorizam a aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, ensejando a desaprovação das presentes contas. Neste sentido, colaciono recente jurisprudência do TRE-PA:

(...)

Trata-se, portanto, de irregularidade grave que compromete a lisura das contas e a fiscalização pela Justiça Eleitoral, motivo pelo qual a desaprovação das contas, na forma dos art. 74, inciso III, da Resolução TSE n. 23.607/19, é medida que se impõe.

Saliento, outrossim, que o julgamento das contas apresentadas está adstrito às informações declaradas pelo prestador de contas e à movimentação financeira apurada nos extratos bancários vinculados à campanha eleitoral, não afastando a possibilidade de apuração por outros órgãos quanto à prática de eventuais ilícitos antecedentes e/ou vinculados, verificados no curso de investigações em andamento ou futuras, conforme previsto no artigo 75 da Resolução TSE n. 23.607/19.

III – DISPOSITIVO

Isso posto, e com base no art. 74, III da Resolução TSE n. 23.607/19, julgo DESAPROVADAS as contas de ANDERSON SENNA DE CASTRO relativas às eleições de 2020.

Na hipótese vertente, o candidato declarou dívidas de campanha na prestação de contas decorrentes do não pagamento de despesas eleitorais, no montante de R$ 1.226,00, sem terem sido apresentados documentos obrigatórios.

Consoante se observa do parecer conclusivo (ID 44937368), não foram apresentados:

• Autorização do órgão nacional para assunção da dívida pelo órgão partidário da respectiva circunscrição;

• Acordo expressamente formalizado, no qual deverão constar a origem e o valor da obrigação assumida, os dados e a anuência do credor;

• Cronograma de pagamento e quitação que não ultrapasse o prazo fixado para a prestação de contas da eleição subsequente para o mesmo cargo e

• Indicação da fonte dos recursos que serão utilizados para a quitação do débito assumido.

Deveras, dispõem o art. 33, §§ 1º, 2° e 3°, e art. 34, da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 33. Partidos políticos e candidatos podem arrecadar recursos e contrair obrigações até o dia da eleição.

§ 1º Após o prazo fixado no caput, é permitida a arrecadação de recursos exclusivamente para a quitação de despesas já contraídas e não pagas até o dia da eleição, as quais deverão estar integralmente quitadas até o prazo de entrega da prestação de contas à Justiça Eleitoral.

§ 2º Eventuais débitos de campanha não quitados até a data fixada para a apresentação da prestação de contas podem ser assumidos pelo partido político (Lei n. 9.504/97, art. 29, § 3º; e Código Civil, art. 299).

§ 3º A assunção da dívida de campanha somente é possível por decisão do órgão nacional de direção partidária, com apresentação, no ato da prestação de contas final, de:

I - acordo expressamente formalizado, no qual deverão constar a origem e o valor da obrigação assumida, os dados e a anuência do credor;

II - cronograma de pagamento e quitação que não ultrapasse o prazo fixado para a prestação de contas da eleição subsequente para o mesmo cargo;

III - indicação da fonte dos recursos que serão utilizados para a quitação do débito assumido.

(...)

Art. 34. A existência de débitos de campanha não assumidos pelo partido, na forma prevista no § 3º do art. 33 desta Resolução, será aferida na oportunidade do julgamento da prestação de contas do candidato e poderá ser considerada motivo para sua rejeição.

No apelo, o candidato sustenta, em síntese, que, em face de versar sobre prestação de contas na modalidade simplificada, não havia necessidade de apresentar outros documentos, além daqueles obrigatórios, elencados no art. 53, inc. II, al. a, b, d e f, da Resolução TSE n. 23.607/19. Colacionou arestos de tribunais aprovando as contas com ressalvas, em caso de dívidas de campanha não assumidas pela agremiação.

Não assiste razão ao recorrente.

Como cediço, as prestações de contas das eleições de 2020 devem observar as prescrições contidas na Resolução TSE n. 23.607/19, que, em seu art. 62, prevê a prestação de contas simplificada “para candidatos que apresentarem movimentação financeira correspondente, no máximo, ao valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais)”.

Ocorre que a adoção do procedimento simplificado de apresentação e análise não dispensa o registro de todas as receitas e despesas eleitorais, de modo a permitir à Justiça Eleitoral a fiscalização integral da movimentação financeira de campanha, consoante evidenciam os arts. 64, § 1º, e 65, inc. IV, da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 64. A prestação de contas simplificada será composta exclusivamente pelas informações prestadas diretamente no SPCE e pelos documentos descritos nas alíneas "a", "b", "d" e "f" do inciso II do art. 53.

§ 1º A adoção da prestação de contas simplificada não dispensa sua apresentação por meio do SPCE, disponibilizado na página da Justiça Eleitoral na internet.

[…].

Art. 65. A análise técnica da prestação de contas simplificada será realizada de forma informatizada, com o objetivo de detectar:

I - recebimento direto ou indireto de fontes vedadas;

II - recebimento de recursos de origem não identificada;

III - extrapolação de limite de gastos;

IV - omissão de receitas e gastos eleitorais;

V - não identificação de doadores originários, nas doações recebidas de outros prestadores de contas.

Grifei.

Ademais, o procedimento simplificado não constitui direito do prestador de contas, mas sim um meio mais ágil e eficiente de a Justiça Eleitoral se desincumbir de suas atribuições.

Logo, sendo exigida do prestador de contas pelo órgão judiciário a apresentação de documentos hábeis a sanar irregularidades vislumbradas pela área técnica, o candidato vê-se obrigado a providenciá-los, sob pena de o apontamento contábil sofrer glosa.

Como bem assinalou o Parquet Eleitoral, “A existência de dívida de campanha no valor de R$ 1.226,00, declarada pela parte prestadora sem que fossem acostados os documentos exigidos pelo art. 33, §§ 2º e 3º, da Resolução TSE n. 23.607/19, relativos à assunção da dívida pelo partido, constitui falha grave, pois conduz à conclusão de que o pagamento ocorrerá fora do controle da Justiça Eleitoral, com recursos de origem não identificada”.

Com efeito, não tendo o candidato comprovado que o partido assumiu a dívida, presume-se que a mesma foi ou será adimplida com valores que não transitaram pelas contas bancárias de campanha, situação caracterizadora da utilização de recursos oriundos de origem não esclarecida.

Por oportuno, esclareço que os julgados acostados pelo recorrente não se prestam a auxiliar sua tese, de que a irregularidade não compromete as contas e é incapaz de ensejar sua reprovação, porquanto nos referidos casos a aprovação com ressalvas ocorreu em virtude de o montante da falha, ou do percentual desta em relação ao total arrecadado, ter sido considerado módico, em estrita sintonia com o entendimento seguido por esta Corte e pelo egrégio Tribunal Superior Eleitoral.

Diversamente, nos autos ora examinados a falha, no importe de R$ 1.226,00, representa cifra bastante superior ao total de receitas declaradas (R$ 145,00), restando inviabilizada a aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade como forma de atenuar sua gravidade sobre o conjunto das contas, impondo-se a manutenção do juízo de desaprovação, na linha da jurisprudência consolidada deste Tribunal.

 

Diante do exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso interposto por ANDERSON SENNA DE CASTRO, mantendo-se a desaprovação de suas contas de campanha relativas às eleições de 2020, nos termos da fundamentação.