REl - 0600539-92.2020.6.21.0010 - Voto Relator(a) - Sessão: 19/04/2022 às 14:00

VOTO

As contas foram desaprovadas em razão de despesa com combustível no valor de R$ 50,00, sem o correspondente registro de locações, cessões de veículos, publicidade com carro de som ou gasto com geradores de energia, e também devido à divergência entre o lançamento de um crédito de R$ 205,40 oriundo da conta do FEFC do candidato à eleição majoritária, Edson Joel Lawall, e de dois saques eletrônicos nas quantias de R$ 83,40 e R$ 122,00 por cheques de terceiros por caixa, sem identificação do beneficiário dos recursos, que a recorrente alegou ter devolvido à conta bancária de origem.

Com referência à primeira irregularidade, a candidata afirma que efetuou gastos com o veículo de propriedade de seu falecido cônjuge, juntando aos autos, para comprovar o alegado, imagem do documento do veículo (ID 44841190), e que não vislumbrou razão para efetuar cessão de veículo próprio ainda que estimável em dinheiro. Defende a recorrente que, para comprovar a sua despesa, constou na nota fiscal seu CNPJ.

Ocorre que o art. 35, § 6º, al. “a”, da Resolução TSE n. 23.607/19 estabelece que não são considerados gastos eleitorais e não podem ser pagos com recursos de campanha as despesas de natureza pessoal, como combustível e manutenção de veículo usado pela candidata na campanha.

Assim, embora o art. 60, § 4º, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/19 realmente dispense a cessão de automóvel de propriedade do candidato e do seu cônjuge para utilização em benefício da candidatura, este deveria ser registrado nas contas e o valor do combustível não poderia ser custeado com recursos financeiros das contas de campanha.

Nesse mesmo sentido, a manifestação da douta Procuradoria Regional Eleitoral, litteris:

Quanto à primeira irregularidade, a Unidade Técnica apontou, no item 1.1 do relatório preliminar, a existência de despesas realizadas com combustíveis sem o correspondente registro de locações, cessões de veículos, publicidade com carro de som ou despesa com geradores de energia. Intimado(a) (ID 44841186), o(a) prestador(a) apresentou comprovante de que o veículo utilizado na campanha GM/Vectra SD, placa IPG8J61, pertencia a seu falecido marido Jelson Moacir Halberstadt (ID 44841190), salientando que o CNPJ da candidata consta na nota fiscal de utilização de combustíveis.
Ocorre que, nos termos do art. 60, §§ 4º e 5º, da Resolução TSE n. 23.607/19, a cessão de automóvel de propriedade do candidato para campanha deve ser registrada na prestação de contas, estimando-se o valor da cessão, como segue:
Art. 60. (…). § 4º Ficam dispensadas de comprovação na prestação de contas: (…) III - a cessão de automóvel de propriedade do candidato, do cônjuge e de seus parentes até o terceiro grau para seu uso pessoal durante a campanha. § 5º A dispensa de comprovação prevista no § 4º não afasta a obrigatoriedade de serem registrados na prestação de contas os valores das operações constantes dos incisos I a III do referido parágrafo.
Ademais, a aquisição de combustível para abastecer veículo próprio do(a) candidato(a) não poderia ter se dado com recursos da campanha por força do art. 35, § 6º, da Resolução TSE n. 23.607/19 [art. 31 (…) § 6º Não são consideradas gastos eleitorais, não se sujeitam à prestação de contas e não podem ser pagas com recursos da campanha as seguintes despesas de natureza pessoal do candidato: a) combustível e manutenção de veículo automotor usado pelo candidato na campanha;].
Destarte, não merece reforma a sentença neste ponto.

Portanto, a falha permanece devido à utilização irregular do recurso de campanha.

Em relação à segunda irregularidade, a unidade técnica apontou haver divergências no total de R$ 205,40 entre a movimentação financeira declarada na prestação de contas e aquela registrada nos extratos eletrônicos:

2. ANÁLISE DA MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA (ART. 53, DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.607/19)

Há divergências entre a movimentação financeira registrada na prestação de contas e aquela registrada nos extratos eletrônicos (art. 53, I, alínea "g" e II, alínea "a", da Resolução TSE n. 23.607/19, conforme abaixo:

Identificação da conta bancária: 041 - BCO DO ESTADO DO RS S.A. (BANRISUL) / 586 / 00000000000601211802
Natureza da conta: DOAÇÕES PARA CAMPANHA
Percentual compatibilizado: 62,5000
Movimentação financeira não compatibilizada:

A recorrente afirma que a transferência bancária de R$ 205,40 foi efetuada pelo candidato a prefeito Edson Joel Lawall para repassar recursos oriundos do FEFC, os quais foram transferidos para sua conta de campanha por equívoco e que, tão logo tomou conhecimento da falha, efetuou a devolução dos valores por meio de dois cheques de terceiros por caixa/saque eletrônico, nas quantias de R$ 83,40 e 122,00.

Com a petição esclarecendo as irregularidades (ID 44841188) e com o presente recurso, a prestadora apresentou cópia dos dois cheques n. 000001 e 000002 (ID 44841189), constantes do extrato, que teriam sido utilizados para a devolução dos valores recebidos indevidamente, ambos nominais à Gráfica Arte Ltda. e/ou Eleição 2020 Edson Joel Lawall FEFC.

A decisão de primeiro grau entendeu que a falha merecia ser mantida, pois envolvia recursos públicos do FEFC, os quais foram transferidos para a conta outros recursos da candidata, destinada a movimentar dinheiro privado, e porque a devolução dos valores ao doador, o candidato da majoritária, por meio de cheque sem indicação do CPF do destinatário, não garantiu transparência à movimentação e nem respeitou as normas eleitorais.

Além disso, a sentença considerou que a falha não deveria ensejar o recolhimento do valor ao erário, pois na conta do FEFC do candidato apontado como doador da transferência de R$ 205,40 constou o depósito identificado pelo CPF da candidata, nos valores de R$ 83,40 e 122,00, totalizando R$ 205,40.

Da documentação juntada aos autos verifica-se que não houve utilização dos recursos oriundos do FEFC equivocadamente transferidos à candidata, sendo meramente informado o fato de a devolução não ter sido realizada por transferência bancária ou cheque.

Consta nos autos a transferência de R$ 205,40, realizada por meio de depósito identificado com o CPF da recorrente (ID 44841184 – p. 4), e os cheques de R$ 83,40 e 122,00, demonstrando a devolução do valor, ao candidato à majoritária, ainda que a devolução da quantia não tenha se dado por transferência entre contas ou emissão de cheque nominal cruzado.

Pela análise do extrato bancário eletrônico da conta de campanha da recorrente, disponível no sítio Divulga Cand Contas (https://divulgacandcontas.tse.jus.br/divulga/#/candidato/2020/2030402020/86088/210000855182/extratos), verifica-se que de fato houve o saque dos dois cheques supramencionados, pois não houve o cruzamento dos mesmos, mas estes não foram utilizados para pagamentos de despesas da prestadora de contas, como bem apontou o Parquet.

Isso porque é possível verificar, no extrato, que os gastos com a empresa Gráfica Fazendo Arte Ltda., nos valores de R$ 122,00 e 83,40, foram pagos com recursos da própria candidata, com depósito identificado com o seu CPF no dia 03.11.2020, antes do débito das despesas na mesma data, logo não houve a efetiva utilização de recurso público.

Portanto, tal como concluiu a sentença, não há necessidade de devolução do valor recebido indevidamente ao erário.

Ressalto que não se discute dolo ou a má-fé, e sim a observância das normas sobre finanças de campanha, assim como a transparência, a confiabilidade e a lisura da prestação de contas.

As duas irregularidades apontadas, relativas ao gasto com combustível em veículo próprio (R$ 50,00) e do crédito de recursos do FEFC com o débito sem identificação da contraparte (R$ 205,40), totalizam R$ 255,40.

As falhas representam 100% do total da movimentação financeira declarada, entretanto seu valor absoluto é bastante reduzido, sendo a quantia inferior, inclusive, ao parâmetro de R$ 1.064,10, considerado como módico pela Resolução TSE n. 23.607/19, de modo a permitir o gasto de qualquer eleitor pessoalmente, não sujeito à contabilização, e de dispensar o uso da transferência eletrônica interbancária nas doações (arts. 43, caput, e 21, § 1º).

Assim, o recurso comporta provimento parcial para que as contas sejam aprovadas com ressalvas em homenagem aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.

Diante do exposto, VOTO pelo parcial provimento do recurso para reformar a sentença e aprovar as contas com ressalvas, nos termos da fundamentação.