REl - 0600468-73.2020.6.21.0048 - Voto Relator(a) - Sessão: 12/04/2022 às 14:00

VOTO

Eminentes Colegas.

O recurso é tempestivo e preenche os pressupostos de admissibilidade, de modo que merece conhecimento.

No mérito, o caso dos autos traz a incontroversa veiculação de propaganda eleitoral, pelo então candidato a prefeito na cidade de São Francisco de Paula, DÉCIO ANTONIO COLLA, em suas redes pessoais na plataforma Facebook, “https://www.facebook.com/deciocollasfp/” e “https://www.facebook.com/decio.colla”, perfis estes cujos endereços eletrônicos não foram informados à Justiça Eleitoral.

Sublinho desde já que o fato em si não é negado pelos recorrentes, os quais alegam que “provavelmente por falha técnica, as informações não foram transmitidas”.

À análise.

A representação foi embasada no art. 57-B, da Lei n. 9.504/97, cuja redação é clara ao dispor acerca das formas de veiculação de propaganda eleitoral na rede mundial de computadores. Peço atenção ao § 1º do referido comando legal:

Art. 57-B. A propaganda eleitoral na internet poderá ser realizada nas seguintes formas:

(…)

IV - por meio de blogs, redes sociais, sítios de mensagens instantâneas e aplicações de internet assemelhadas cujo conteúdo seja gerado ou editado por:

a) candidatos, partidos ou coligações; ou

b) qualquer pessoa natural, desde que não contrate impulsionamento de conteúdos.

§ 1º Os endereços eletrônicos das aplicações de que trata este artigo, salvo aqueles de iniciativa de pessoa natural, deverão ser comunicados à Justiça Eleitoral, podendo ser mantidos durante todo o pleito eleitoral os mesmos endereços eletrônicos em uso antes do início da propaganda eleitoral.

(…)

§ 5º A violação do disposto neste artigo sujeita o usuário responsável pelo conteúdo e, quando comprovado seu prévio conhecimento, o beneficiário, à multa no valor de R$5.000,00 (cinco mil reais) a R$30.000,00 (trinta mil reais) ou em valor equivalente ao dobro da quantia despendida, se esse cálculo superar o limite máximo da multa.

A sentença hostilizada julgou improcedente a representação ao entendimento de que a ausência de comunicação dos perfis não comprometeu a transparência e a fiscalização, pois “Décio Antônio Colla é uma figura pública de destaque em São Francisco de Paula, três vezes Prefeito Municipal e o médico mais antigo desta cidade. É do conhecimento de todos que possui perfis nas redes sociais”.

Em oposição, o recurso do Ministério Público de origem sustenta que o fundamento exarado na sentença fere o princípio da isonomia.

De fato, antecipo que o recurso merece provimento.

A observância à legislação de regência é indispensável para que se assegure a igualdade  objetiva entre os candidatos, valor tão caro a todo o processo eleitoral. Não pode ser chancelado destaque de atributos particulares de determinado candidato, de índole subjetiva, para admitir que em nome de particularidades a lei seja em todos os casos aplicável e, em relação a um único candidato, seja  concedido o privilégio de descumprir normas estabelecidas a todos.

Ora, o escopo da norma não é dar publicidade aos perfis nas redes sociais indicados pelos candidatos, mas facilitar a aferição pela sociedade e pela Justiça Eleitoral do conteúdo que passará a ser veiculado. Aliás, o raciocínio mais adequado à hipótese é exatamente pelo fato de DÉCIO se tratar de figura pública de "destaque", três vezes Prefeito Municipal e profissional antigo da área da saúde, é que deveria ter sido informado à Justiça Eleitoral de que os "perfis redes sociais bastante conhecidos" passariam a ser utilizados para fins eleitorais, pois tanto mais repercussão podem gerar na corrida eleitoral. 

Como bem asseverado pelo órgão ministerial, a situação fere gravemente o princípio da isonomia. Apenas a título de argumentação, imagine-se a situação de candidatura à Presidência da República de parte de celebridade com milhões de seguidores nas redes sociais.

Estaria ela desonerada da obrigação legal?

Obviamente, não.

Ademais, observo que a comunicação deveria ter ingressado nos autos por ocasião do registro de candidatura, mas foi trazida bastante tardiamente aos 07.11.2020, poucos dias antes da eleição, do que faz notícia o candidato inclusive em demanda apartada, a Petição n. 0600476-50, também inserida na pauta do dia da presente sessão de julgamento, e que receberá desfecho próprio. Ora, a informação ao final do período de campanha tornou a comunicação inócua, pois já transcorrida a absoluta maioria das ações de propaganda eleitoral na internet.

Ainda, verifico a realização inconteste de impulsionamento de propaganda eleitoral em sítio não informado à Justiça Eleitoral em situação que consubstancia afronta objetiva à norma legal. Colho trecho do parecer do Procurador Regional Eleitoral que de forma irretocável aborda a questão, e o torno expressamente como razões de decidir:

No presente caso, o candidato violou a regra que exige a comunicação à Justiça Eleitoral acerca da utilização de seu perfil pessoal no Facebook para a veiculação de propaganda eleitoral, sendo incontroversa, inclusive, a ocorrência de impulsionamento de conteúdo na rede social, conforme admitido em contestação. Incide, portanto, a multa prevista no § 5º do citado dispositivo.

Cumpre registrar que pouco importa, para incidência da sanção, se o juízo de origem avalia que o candidato é ou não figura pública no município ou se a mera utilização de perfil em rede social não se caracteriza como uso de sítio eletrônico. A ausência de comunicação do endereço eletrônico da rede social utilizada na campanha, assim como a sua informação tardia à Justiça Eleitoral, vulneram o objetivo da norma estatuída no art. 57–B da Lei n. 9.504/97, pois prejudicam o controle de eventuais irregularidades na propaganda eleitoral divulgada na internet. A norma, ademais, possui caráter objetivo, não havendo motivos para afastamento da multa nela prevista.

Destaco que a prática acarreta a aplicação da multa estabelecida no referido § 5º do art 57-B, e no tocante à dosimetria julgo adequado o valor de R$ 10.000,00, considerando se tratar de 2 (dois) perfis diferentes, o cargo majoritário máximo municipal colocado em disputa e o grande e incontroverso alcance de mais de 9.000 seguidores em município que conta com 15.906 eleitores, conforme “https://www.tse.jus.br/eleitor/estatisticas-de-eleitorado/consulta-por-municipio-zona”.

Por fim, indico que para além de se omitir no relativo à apresentação de informação obrigatória, o recorrido igualmente deixou de oferecer contrarrazões ao recurso. 

 

Diante do exposto, VOTO para dar provimento ao recurso, julgar procedente a representação e aplicar multa de R$ 10.000,00, nos termos da fundamentação.