REl - 0600370-26.2020.6.21.0004 - Voto Relator(a) - Sessão: 29/03/2022 às 14:00

VOTO

Cuida-se da prestação de contas do PARTIDO PROGRESSISTAS – PP/RS relativa à arrecadação e à aplicação de recursos utilizados na campanha às eleições municipais 2020, regida pela Lei n. 9.504/97 e, no âmbito processual, pela Resolução TSE n. 23.607/19 .

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

Preliminarmente, quanto ao recebimento de documentos em sede recursal, conheço da documentação apresentada com o recurso, seguindo a orientação firmada nesta Corte:

 

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO 2016. DESAPROVAÇÃO. AFASTADA PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA. NÃO CONFIGURADO CERCEAMENTO DE DEFESA. MÉRITO. RECEBIMENTO DE RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. DOCUMENTOS JUNTADOS COM O RECURSO. ART. 266 DO CÓDIGO ELEITORAL. IRREGULARIDADE SANADA. PROVIMENTO.

1. Preliminar. Afastada a nulidade da sentença. Ausente qualquer prejuízo ao recorrente, pressuposto essencial para a declaração de nulidade.

2. Constatado, pelo órgão técnico, o recebimento de recursos de origem não identificada. Documentos juntados pelo prestador em sede recursal, com fulcro no art. 266 do Código Eleitoral. Irregularidade sanada.

3. Provimento do recurso para aprovação das contas.

(TRE-RS - RE: 2593 SÃO SEBASTIÃO DO CAÍ - RS, Relator: GUSTAVO ALBERTO GASTAL DIEFENTHÄLER, Data de Julgamento: 03.12.2019, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 231, Data 11.12.2019, Página 2-4) (Grifo nosso)

 

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2017. DESAPROVAÇÃO. PRELIMINAR ACOLHIDA. CONHECIMENTO DE NOVOS DOCUMENTOS JUNTADOS AO RECURSO. ART. 266, CAPUT, DO CÓDIGO ELEITORAL. MÉRITO. RECEBIMENTO DE VALORES PROVENIENTES DO DIRETÓRIO NACIONAL DA AGREMIAÇÃO SEM A IDENTIFICAÇÃO DO DOADOR ORIGINÁRIO. DOCUMENTOS APRESENTADOS SUPRIRAM A FALHA. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Preliminar acolhida. Juntada de novos documentos com o recurso. Este Tribunal, com base no art. 266, caput, do Código Eleitoral, tem se posicionado pelo recebimento de documentos novos com as razões de recurso, até mesmo quando não submetidos a exame de primeiro grau de jurisdição, quando sua simples leitura mostra capacidade de influir positivamente no exame das contas, ou seja, o saneamento da falha deve resultar de plano da documentação, sem necessidade de qualquer persecução complementar.

2. Recebimento de valores provenientes do diretório nacional da agremiação, sem a identificação dos doadores originários, em afronta ao art. 5º, inc. IV, da Resolução TSE n. 23.464/15. Os esclarecimentos prestados, associados às informações constantes nos recibos das doações, permitem aferir, de forma clara, os doadores originários com seus respectivos CPFs, cumprindo a determinação normativa. Afastadas as sanções impostas.

3. Parcial provimento. Aprovação com ressalvas.

(TRE-RS - RE: 1428 SANTIAGO - RS, Relator: GERSON FISCHMANN, Data de Julgamento: 25.4.2019, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 75, Data 29.4.2019, Página 7.) (Grifo nosso)

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2016. DESAPROVAÇÃO. CONHECIMENTO DA DOCUMENTAÇÃO APRESENTADA INTEMPESTIVAMENTE. PREVISÃO DISPOSTA NO ART. 266 DO CÓDIGO ELEITORAL. RECEBIMENTO DE RECURSOS PROVENIENTES DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. ART. 13, PARÁGRAFO ÚNICO, DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.464/15. APLICAÇÃO IRREGULAR DE VERBAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. INCONSISTÊNCIA COM RELAÇÃO A GASTOS COM COMBUSTÍVEIS. SANADA PARTE DAS IRREGULARIDADES. REDUÇÃO DO MONTANTE A SER RECOLHIDO AO TESOURO NACIONAL. AFASTADA A PENALIDADE DE SUSPENSÃO DO RECEBIMENTO DE QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. MANTIDA A MULTA FIXADA NA SENTENÇA. RESPONSABILIDADE PELO RECOLHIMENTO DOS VALORES FIXADA EXCLUSIVAMENTE À ESFERA PARTIDÁRIA. PROVIMENTO PARCIAL.

1. Conhecimento da documentação apresentada com o recurso, a teor do disposto no art. 266 do Código Eleitoral.

2. Recebimento de recursos oriundos de origem não identificada. Ainda que o número de inscrição no CPF corresponda ao do doador informado nas razões recursais, não foram apresentadas outras informações para subsidiar a fiscalização da licitude da receita, não sendo possível, sem a adoção dos procedimentos técnicos de exame destinados à verificação das fontes vedadas, atestar a regularidade do recurso arrecadado.

[…]

6. Provimento parcial.

(TRE-RS - RE: 4589 ALVORADA - RS, Relator: ROBERTO CARVALHO FRAGA, Data de Julgamento: 21.3.2019, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 52, Data 22.3.2019, Página 4.) (Grifo nosso)

 

Ademais, o exame da documentação independe de novo parecer técnico.

No mérito, a prestação de contas foi desaprovada pelo juízo a quo devido à constatação do descumprimento dos requisitos encartados nos art. 53, inc. I, al. “g”, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Acertadamente, a sentença (ID 41966933) foi no seguinte sentido:

(...)

Cuida – se de apreciar contas de campanha eleitoral por Partido Político.

Registre – se que a prestação de contas apresentada encontra-se instruída com os documentos arrolados na Resolução TSE n. 23.607/2019.

Note – se que, aberto o prazo legal por edital, não houve impugnação em desfavor destas contas.

Em análise técnica, houve apontamento de irregularidades que podem levar a desaprovação das contas.

Oportunizado o contraditório.

Realizado parecer conclusivo acerca da análise técnica, restaram parcialmente mantidas as conclusões acerca de irregularidades que levariam à desaprovação, considerando a irregularidade referida no item 6.14. Ainda opinou-se pela condenação ao pagamento do valor despendido de R$ 1.215,00, em favor do Tesouro Nacional.

O Ministério Público Eleitoral em convergência ao parecer conclusivo, manifestou-se no sentido de serem aprovadas as contas, embora com aquelas ressalvas.

Com efeito, nos termos do art. 74, III da Resolução TSE n. 23.607/2019, mantendo-se o resultado do parecer conclusivo, cabe a sua desaprovação, considerando a irregularidade referida no item 6.14, condenando-se ao pagamento do valor despendido de R$ 1.215,00, em favor do Tesouro Nacional.

III – DISPOSITIVO:

Diante do exposto, considerando o relatório final de exame, e os pareceres, conclusivo e do Ministério Público Eleitoral, DESAPROVO as presentes contas de campanha, relativas às Eleições Municipais de 2020, nos termos do art. 74, III da Resolução TSE n. 23.607/2019, a desaprovação, considerando a irregularidade referida no item 6.14, condenando-se ao pagamento do valor despendido de R$ 1.215,00, em favor do Tesouro Nacional.

 Determino ainda, a perda do direito ao recebimento da quota do Fundo Partidário pelo período de 04 (quatro) meses, nos termos dos §§ 5ºe 7º do art. 74, da Res. TSE 23.607/19.

 

O ponto central combatido no presente recurso diz respeito à omissão de receitas e gastos eleitorais, uma vez que foi identificada inconsistência entre as informações relativas às despesas constantes da prestação de contas e aquelas da base de dados da Justiça Eleitoral, obtidas mediante confronto com notas fiscais eletrônicas emitidas contra o CNPJ do prestador, conforme informado pela Prefeitura de Alto Alegre/RS e pelo Governo do Estado do Rio Grande do Sul/RS (art. 53, inc. I, al. "g", da Resolução TSE n. 23.607/19).

No laudo pericial (ID 41966683 - item 6.14), a unidade técnica identificou que o fornecedor GRÁFICA FAZENDO ARTE LTDA. emitiu a Nota Fiscal n. 5623 no dia 01.10.2020, no valor de R$ 1.215,00, contra o CNPJ do prestador. Contudo, a referida despesa foi omitida na prestação de contas apresentada.

Ainda de acordo com o apontado no parecer conclusivo, a omissão mencionada caracteriza falha grave:

A omissão de registros financeiros no Sistema de Prestação de Contas Eleitoral (SPCE - Cadastro) é considerada falha grave uma vez que não é possível identificar a origem dos recursos que foram utilizados para o pagamento destas despesas, circunstância que pode configurar o disposto no art. 14 da Resolução TSE 23.607/19:

Art. 14. O uso de recursos financeiros para o pagamento de gastos eleitorais que não provenham das contas específicas de que tratam os arts. 8º e 9º implicará a desaprovação da prestação de contas do partido político ou do candidato (Lei nº 9.504/1997, art. 22, § 3º).

§ 1º Se comprovado o abuso do poder econômico por candidato, será cancelado o registro da sua candidatura ou cassado o seu diploma, se já houver sido outorgado (Lei nº 9.504/1997, art. 22, § 3º).

§ 2º O disposto no caput também se aplica à arrecadação de recursos para campanha eleitoral os quais não transitem pelas contas específicas previstas nesta resolução.

 

Diante da impossibilidade de identificar-se a origem dos recursos utilizados, considera-se a despesa descrita na Nota Fiscal n. 5623 como recurso de origem não identificada, sujeito a recolhimento ao Tesouro Nacional (R$ 1.215,00).

Em suas razões recursais (ID 41967183), o prestador sustenta que não houve movimentação financeira, como consta na SPCE. Alega que foi surpreendido com a notícia da nota fiscal emitida contra seu CNPJ, buscando esclarecimentos junto à empresa emissora do documento fiscal. Apresenta declaração de suposto representante da Gráfica Fazendo Arte Ltda., Sr. Carlos Augusto Weiss, afirmando não ter confeccionado o material descrito na nota fiscal em comento, tampouco recebido qualquer pagamento (ID 41967233).

Não assiste razão ao prestador.

A omissão pelo partido político de registros financeiros no Sistema de Prestação de Contas Eleitoral - SPCE é considerada falha grave, uma vez que não é possível identificar a origem dos recursos que foram utilizados para o pagamento dessas despesas, atraindo, assim, a incidência dos arts. 14, caput, 32, 53, inc. I, al. “g”, da Resolução TSE n. 23.607/19:

 

Art. 14. O uso de recursos financeiros para o pagamento de gastos eleitorais que não provenham das contas específicas de que tratam os arts. 8º e 9º implicará a desaprovação da prestação de contas do partido político ou do candidato (Lei nº 9.504/1997, art. 22, § 3º).
 

Art. 32. Os recursos de origem não identificada não podem ser utilizados por partidos políticos e candidatos e devem ser transferidos ao Tesouro Nacional por meio de Guia de Recolhimento da União
(GRU).

 

Art. 53. Ressalvado o disposto no art. 62 desta Resolução, a prestação de contas, ainda que não haja movimentação de recursos financeiros ou estimáveis em dinheiro, deve ser composta: I - pelas seguintes informações:
(...)

g) receitas e despesas, especificadas;


 

Frise-se que a despesa relativa ao documento fiscal, além de ter sido omitida na prestação de contas, foi paga com valores que não transitaram em conta específica. Não houve, igualmente, individualização nos registros financeiros da campanha, configurando recursos de origem não identificada.

Note-se que a apresentação da Nota Fiscal n. 5623 não regulariza a falha apontada. Não somente porque não há comprovação de que a pessoa que assina o documento seja efetivamente o representante da empresa, como bem observado pela Procuradoria Regional Eleitoral em seu Parecer, mas, sobretudo, porque o art. 92, §§ 5º e 6º, da Resolução TSE n. 23.607/19 exige o cancelamento da nota fiscal emitida, conforme se pode observar:


Art. 92. A Secretaria da Receita Federal do Brasil e as secretarias estaduais e municipais de Fazenda encaminharão ao Tribunal Superior Eleitoral, pela internet, arquivo eletrônico contendo as notas fiscais eletrônicas relativas ao fornecimento de bens e serviços para campanha eleitoral (Lei nº 9.504/1997, art. 94-A, I), nos seguintes prazos: (Vide, para as Eleições de 2020, art. 7º, inciso XIII, da Resolução nº 23.624/2020).

(...)
§ 5º O eventual cancelamento de notas fiscais eletrônicas após sua regular informação como válidas pelos órgãos fazendários à Justiça Eleitoral, apresentado por ocasião do cumprimento de diligências determinadas nos autos de prestação de contas, será objeto de notificação específica à Fazenda informante, no julgamento das contas, para apuração de suposta infração fiscal, bem como de encaminhamento ao Ministério Público.

§ 6º Na situação de eventual cancelamento de notas fiscais eletrônicas após sua regular informação como válidas pelos órgãos fazendários à Justiça Eleitoral, o prestador deverá apresentar a comprovação de cancelamento, junto com esclarecimentos firmados pelo fornecedor.
 

Ao que consta nos autos, não se vislumbra informação no sentido do cancelamento ou estorno formal da nota fiscal expedida, de maneira que ela continua válida para todos os efeitos. Ressalte-se, ainda, que a declaração juntada aos autos pelo prestador não possui o condão de cancelar a referida nota fiscal.

Desse modo, como os recursos financeiros utilizados para pagamento da nota fiscal não transitaram pela contabilidade de campanha, configuram recursos de origem não identificada, estando sujeitos a recolhimento ao Tesouro, forte do art. 32, caput e inc. VI, da Resolução TSE n. 23.607/19.

No que atine à sanção de suspensão de quotas do Fundo Partidário pelo período de 04 (quatro) meses, correta a sentença, haja vista o disposto no art. 25 da Lei n. 9.504/97, como segue:

Art 25. O partido que descumprir as normas referentes à arrecadação e aplicação de recursos fixadas nesta Lei perderá o direito ao recebimento da quota do Fundo Partidário do ano seguinte, sem prejuízo de responderem os candidatos beneficiados por abuso do poder econômico.
Parágrafo único. A sanção de suspensão do repasse de novas quotas do Fundo Partidário, por desaprovação total ou parcial da prestação de contas do candidato, deverá ser aplicada de forma proporcional e razoável, pelo período de 1 (um) mês a 12 (doze) meses, ou por meio do desconto, do valor a ser repassado, na importância apontada como irregular, não podendo ser aplicada a sanção de suspensão, caso a prestação de contas não seja julgada, pelo juízo ou tribunal competente, após 5 (cinco) anos de sua apresentação.

 

Portanto, diante da existência de receitas que configuram recursos de origem não identificada, impõe-se o recolhimento da quantia de R$ 1.215,00 ao Tesouro Nacional.

Em outros casos julgados por esta Corte, mesmo que o percentual representasse valor superior ao utilizado como critério pela Justiça Eleitoral para aprovação com ressalvas (10%), se o valor nominal das irregularidades estivesse abaixo de R$ 1.064,10, as contas poderiam ser aprovadas com ressalvas.

Entretanto, no caso dos presentes autos, não há como se afastar o juízo de desaprovação das contas, com base nos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade, eis que não declarada nenhuma receita e o valor nominal da irregularidade se mostra superior ao valor adotado como referência, ou seja, a quantia de R$ 1.064,10 (ou mil UFIRs), que a disciplina normativa das contas considera módico, de modo a permitir o gasto de qualquer eleitor pessoalmente, não sujeitos à contabilização, e de dispensar o uso da transferência eletrônica interbancária nas doações eleitorais (arts. 43, caput, e 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19).

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo desprovimento do recurso de prestação de contas de campanha das eleições de 2020 do DIRETÓRIO MUNICIPAL DO PARTIDO PROGRESSISTAS – PP, do Município de Alto Alegre/RS, mantendo a desaprovação das contas, a determinação do recolhimento do valor de R$ 1.215,00 ao Tesouro Nacional (art. 32 da Resolução TSE n. 23.607/19), assim como a perda do direito ao recebimento da quota do Fundo Partidário pelo período de 04 (quatro) meses (art. 74, §§ 5º e 7º, da Resolução TSE n. 23.607/19).