REl - 0600369-88.2020.6.21.0150 - Voto Relator(a) - Sessão: 17/03/2022 às 14:00

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

Preliminarmente, conheço da documentação apresentada com o recurso, seguindo a orientação firmada nesta Corte:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO 2016. DESAPROVAÇÃO. AFASTADA PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA. NÃO CONFIGURADO CERCEAMENTO DE DEFESA. MÉRITO. RECEBIMENTO DE RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. DOCUMENTOS JUNTADOS COM O RECURSO. ART. 266 DO CÓDIGO ELEITORAL. IRREGULARIDADE SANADA. PROVIMENTO.

1. Preliminar. Afastada a nulidade da sentença. Ausente qualquer prejuízo ao recorrente, pressuposto essencial para a declaração de nulidade.

2. Constatado, pelo órgão técnico, o recebimento de recursos de origem não identificada. Documentos juntados pelo prestador em sede recursal, com fulcro no art. 266 do Código Eleitoral. Irregularidade sanada.

3. Provimento do recurso para aprovação das contas.

(TRE-RS - RE: 2593 SÃO SEBASTIÃO DO CAÍ - RS, Relator: GUSTAVO ALBERTO GASTAL DIEFENTHÄLER, Data de Julgamento: 03.12.2019, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 231, Data 11.12.2019, Página 2-4.) (grifo nosso)

 

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2017. DESAPROVAÇÃO. PRELIMINAR ACOLHIDA. CONHECIMENTO DE NOVOS DOCUMENTOS JUNTADOS AO RECURSO. ART. 266, CAPUT, DO CÓDIGO ELEITORAL. MÉRITO. RECEBIMENTO DE VALORES PROVENIENTES DO DIRETÓRIO NACIONAL DA AGREMIAÇÃO SEM A IDENTIFICAÇÃO DO DOADOR ORIGINÁRIO. DOCUMENTOS APRESENTADOS SUPRIRAM A FALHA. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PARCIAL PROVIMENTO.

1. Preliminar acolhida. Juntada de novos documentos com o recurso. Este Tribunal, com base no art. 266, caput, do Código Eleitoral, tem se posicionado pelo recebimento de documentos novos com as razões de recurso, até mesmo quando não submetidos a exame de primeiro grau de jurisdição, quando sua simples leitura mostra capacidade de influir positivamente no exame das contas, ou seja, o saneamento da falha deve resultar de plano da documentação, sem necessidade de qualquer persecução complementar.

2. Recebimento de valores provenientes do diretório nacional da agremiação, sem a identificação dos doadores originários, em afronta ao art. 5º, inc. IV, da Resolução TSE n. 23.464/15. Os esclarecimentos prestados, associados às informações constantes nos recibos das doações, permitem aferir, de forma clara, os doadores originários com seus respectivos CPFs, cumprindo a determinação normativa. Afastadas as sanções impostas. 3. Parcial provimento. Aprovação com ressalvas.

(TRE-RS - RE: 1428 SANTIAGO - RS, Relator: GERSON FISCHMANN, Data de Julgamento: 25.4.2019, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 75, Data 29.4.2019, Página 7.) (Grifo nosso)

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2016. DESAPROVAÇÃO. CONHECIMENTO DA DOCUMENTAÇÃO APRESENTADA INTEMPESTIVAMENTE. PREVISÃO DISPOSTA NO ART. 266 DO CÓDIGO ELEITORAL. RECEBIMENTO DE RECURSOS PROVENIENTES DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. ART. 13, PARÁGRAFO ÚNICO, DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.464/15. APLICAÇÃO IRREGULAR DE VERBAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. INCONSISTÊNCIA COM RELAÇÃO A GASTOS COM COMBUSTÍVEIS. SANADA PARTE DAS IRREGULARIDADES. REDUÇÃO DO MONTANTE A SER RECOLHIDO AO TESOURO NACIONAL. AFASTADA A PENALIDADE DE SUSPENSÃO DO RECEBIMENTO DE QUOTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. MANTIDA A MULTA FIXADA NA SENTENÇA. RESPONSABILIDADE PELO RECOLHIMENTO DOS VALORES FIXADA EXCLUSIVAMENTE À ESFERA PARTIDÁRIA. PROVIMENTO PARCIAL.

1. Conhecimento da documentação apresentada com o recurso, a teor do disposto no art. 266 do Código Eleitoral.

2. Recebimento de recursos oriundos de origem não identificada. Ainda que o número de inscrição no CPF corresponda ao do doador informado nas razões recursais, não foram apresentadas outras informações para subsidiar a fiscalização da licitude da receita, não sendo possível, sem a adoção dos procedimentos técnicos de exame destinados à verificação das fontes vedadas, atestar a regularidade do recurso arrecadado.

[…]

6. Provimento parcial.

(TRE-RS - RE: 4589 ALVORADA - RS, Relator: ROBERTO CARVALHO FRAGA, Data de Julgamento: 21.3.2019, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 52, Data 22.3.2019, Página 4.) (Grifo nosso)

 

Ademais, o exame da documentação independe de novo parecer técnico.

No mérito, a prestação de contas foi desaprovada pelo juízo a quo devido à constatação do descumprimento dos requisitos encartados no art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19, restando configurada a ausência de comprovação dos gastos realizados com recursos do FEFC.

A sentença (ID 44476033) foi prolatada sob os seguintes fundamentos:

[…]

Devem ser desaprovadas as contas prestadas.

Registre-se que a prestação de contas simplificada apresentada pelo candidato MARCOS VINICIUS ROCHA foi instruída com os documentos arrolados na Resolução TSE nº 23.607/19.

Contudo, realizada análise técnica, foram verificadas irregularidades com aplicação de recursos públicos, tendo em vista a ausência de comprovação e utilização indevida.

Em atendimento ao princípio do contraditório, o prestador foi intimado a fim de prestar esclarecimentos e/ou sanar as falhas apontadas.

Contudo, não logrou êxito em afastar as irregularidades verificadas pela análise técnica das contas.

Não foi apresentado documento fiscal da despesa com alimentação, realizada junto à fornecedora NILVA MATIAS DA SILVA, no valor de R$ 50,00, sendo acostado mero recibo (ID 89594647, na prestação de contas final e ID 92471358, na prestação de contas retificadora), contendo descrição diversa da de despesa com alimentação.

Da mesma forma, a entrega de prestação de contas retificadora não teve o condão de afastar a irregularidade verificada por conta do pagamento em espécie realizado a OLI VALENTIM DA SILVA FILHO, no valor de R$ 500,00.

Conforme extrato eletrônico juntado aos autos (92741120), verifica-se que o candidato realizou, em 18.11.2020, a transferência da quantia de R$ 524,50 para sua própria conta bancária (Conta nº 739043, Agência: 2266, da Caixa Econômica Federal).

Em que pese haver prova do recolhimento realizado ao Tesouro Nacional, em 15.01.2021, da quantia de R$ 24,50 (ID 92471378), com relação ao valor de R$ 500,00 perdeu-se a rastreabilidade dos recursos do FEFC, havendo afirmação de que teria pago o prestador de serviços em espécie, mas não havendo provas do efetivo pagamento.

Com isso, revela-se irregularidade apta a comprometer a confiabilidade das contas, bem como atrair a obrigação de ressarcimento ao erário. Nesse sentido:

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. DESAPROVAÇÃO DAS CONTAS. CANDIDATO A VEREADOR. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APLICAÇÃO IRREGULAR DE VERBAS ORIUNDAS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA (FEFC). CONHECIDA A DOCUMENTAÇÃO JUNTADA COM O RECURSO. IRREGULARIDADE GRAVE E INSANÁVEL. MÁCULA À CONFIABILIDADE E À TRANSPARÊNCIA DA ESCRITURAÇÃO CONTÁBIL. INVIABILIZADA A APLICAÇÃO DOS POSTULADOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. DESPROVIMENTO.

1. Insurgência contra sentença que julgou desaprovadas contas relativas às eleições de 2020. Condenação de recolhimento ao Tesouro Nacional, em virtude da aplicação irregular de recursos oriundos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), com fundamento nos arts. 74, inc. III, e 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

2. Conhecida a documentação juntada com o recurso. No âmbito dos processos de prestação de contas, expedientes que têm preponderante natureza declaratória e possuem como parte apenas o prestador, este Tribunal tem concluído, em casos excepcionais, com respaldo no art. 266, caput, do Código Eleitoral, pela aceitação de novos documentos acostados com a peça recursal e não submetidos a exame do primeiro grau de jurisdição, ainda que o interessado tenha sido intimado para se manifestar, quando sua simples leitura possa sanar irregularidades e não haja necessidade de nova análise técnica. Potencializa-se o direito de defesa, especialmente quando a juntada da nova documentação mostra capacidade de influenciar positivamente no exame da contabilidade, de forma a prestigiar o julgamento pela retidão no gerenciamento dos recursos empregados no financiamento da campanha.

3. De acordo com a disciplina contida no art. 38, incs. I a IV, da Resolução TSE n. 23.607/19, os gastos eleitorais de natureza financeira – excetuados aqueles de pequeno vulto e movimentados sem necessidade de trânsito por conta bancária – devem ser efetuados por meio de cheque nominal e cruzado, transferência bancária com identificação do CPF ou CNPJ do beneficiário, débito em conta ou cartão de débito da conta bancária. A esse regramento não escapa a movimentação de verbas derivadas do FEFC, de modo que a realização do saque eletrônico da conta-corrente específica para a quitação de despesa com recursos dessa natureza importa irregularidade grave e insanável. Como consequência da caracterização da falha, deve ser reconhecida a obrigatoriedade de transferência do seu valor ao Tesouro Nacional, consoante determina o art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

4. A quantia ilicitamente movimentada representa 16,99% das receitas auferidas para o custeio dos dispêndios eleitorais, circunstância que inviabiliza a aplicação dos postulados da proporcionalidade e da razoabilidade ao efeito de afastar a mácula à confiabilidade e à transparência da escrituração contábil, devendo ser mantido o juízo de desaprovação exarado no primeiro grau. Nesse sentido, jurisprudência deste Regional.

5. Desprovimento.

(Recurso Eleitoral n 060042770, ACÓRDÃO de 27.7.2021, Relator(aqwe) AMADEO HENRIQUE RAMELLA BUTTELLI, Publicação: PJE - Processo Judicial Eletrônico-PJE ) (grifei)

 

O parecer acostado pelo Cartório Eleitoral (ID 92741119) informa que as falhas com aplicação de recursos do FEFC totalizam a quantia de R$ 550,00, sendo que as irregularidades identificadas representam 26,83% do total de recursos registrados na prestação de contas (R$ 2.050,00).

Inaplicável, portanto, os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, pois, conforme entendimento do Tribunal Superior Eleitoral (Recurso Especial Eleitoral nº 060130661, Acórdão, Relator(a) Min. Mauro Campbell Marques, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 242, Data 23/11/2020, Página 0), a aplicação dos referidos princípios pressupõe:

(a) os valores considerados irregulares não ultrapassem o valor nominal de 1.000 Ufirs (R$ 1.064,00);

(b) as irregularidades, percentualmente, não podem superar 10% do total; e

(c) as irregularidades não podem ter natureza grave.

Nos termos do art. 74, inc. III, da Resolução TSE 23.607/19, quando constatadas falhas que comprometam sua regularidade devem ser desaprovadas as contas apresentadas.

Por outro lado, identificada irregularidade por conta da não apresentação de documento comprobatório de utilização de recursos públicos ou identificada a utilização indevida, o respectivo valor deve ser recolhido ao Tesouro Nacional, conforme previsão contida no art. 79, §1º, da referida Resolução.

Isso posto, DESAPROVO as contas do candidato a vereador MARCOS VINICIUS ROCHA, relativas às Eleições Municipais de 2020, nos termos do art. 74, inc. III, da Resolução TSE 23.607/19, ante os fundamentos declinados.

Outrossim, determino o recolhimento ao Tesouro Nacional do montante de R$ 550,00 (quinhentos e cinquenta reais), no prazo de 5 (cinco) dias, a contar do trânsito em julgado da presente decisão, conforme art. 79, §1º, da referida Resolução.

 

No caso em tela, as irregularidades com a aplicação dos recursos do FEFC se consubstanciam em dois aspectos: a) falta de apresentação de documento fiscal de despesa com alimentação, no valor de R$ 50,00, e b) pagamento em espécie de despesa realizada com cabo eleitoral, no valor de R$ 500,00.

Com relação à primeira irregularidade, ou seja, ausência de documentação fiscal capaz de comprovar o gasto com alimentação realizado junto à fornecedora NILVA MATIAS DA SILVA, no valor de R$ 50,00, além de ter sido acostado tão somente um recibo, este não contém a descrição da despesa com alimentação.

O recorrente não nega o fato, apenas sustenta que houve erro material na descrição do recibo anteriormente apresentado (“pagamento de mobilização de rua na Campanha Eleitoral eleições 2020”), o qual seria sanado com a juntada do recibo corrigido anexado ao recurso.

O parecer do douto Procurador Regional Eleitoral (ID 44896786) observa que o próprio prestador admitiu a confecção de recibo corretivo após a identificação da irregularidade:

A apresentação de novo recibo com o recurso (ID 44476383), desta feita consignando que Nilva Matias da Silva recebeu o valor a título de pagamento por lanches, não pode ser aceito. Aqui o próprio prestador de contas reconhece que o recibo foi elaborado após a constatação da irregularidade, com a específica finalidade de adequar-se à prestação de contas.

 

De fato, o recorrente não apresentou documento fiscal relativo ao suposto gasto com alimentação, apenas acostou o recibo mencionado, que sequer pode ser reconhecido como válido, de modo que subsistem omissões de parte das receitas do FEFC.

Nesse ponto, sem razão o recorrente, pois, de fato, as receitas provenientes do FEFC não constaram em sua integralidade nos registros da prestação de contas do candidato, nem na prestação final nem na retificadora.

A segunda irregularidade apontada refere-se ao pagamento em espécie de despesa realizada com cabo eleitoral, OLI VALENTIM DA SILVA FILHO, no valor de R$ 500,00, contrariando o disposto no art. 38 da Resolução TSE n. 23. 607/19.

O recorrente não nega que o pagamento tenha sido realizado em espécie, em afronta ao disciplinado no art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19, o qual impõe que “os gastos eleitorais de natureza financeira (...) só podem ser efetuados por meio de: (I) cheque nominal cruzado; (II) transferência bancária que identifique o CPF ou CNPJ do beneficiário; (III) débito em conta; ou (IV) cartão de débito da conta bancária”.

Nesse sentido, o que constou no parecer da douta Procuradoria Regional Eleitoral (ID 44896786):

(...) os meios de pagamento previstos no art. 38 são os únicos que permitem identificar exatamente a pessoa, física ou jurídica, que recebeu o valor depositado na conta de campanha, constituindo, assim, um mínimo necessário para efeito de comprovação do real destinatário dos recursos de campanha, e, por consequência, da veracidade do correspondente gasto.

 

No caso em tela, não efetuado o pagamento por meio de cheque nominal e cruzado, restou inviabilizado o sistema instituído pela Justiça Eleitoral para conferir transparência e publicidade às receitas e gastos de campanha.

Outro ponto que restou prejudicado, já que os valores, embora oriundos dos cofres públicos, não transitaram pelo sistema financeiro nacional, foi o rastreamento para verificação se os destinatários dos pagamentos de fato integravam a relação que originou o gasto de campanha, além de outros controles públicos, como é o caso da Receita Federal e do COAF.

A matéria em exame foi amplamente debatida nesta Corte, conforme ementa que reproduzo, que bem evidencia o entendimento sufragado:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. ELEIÇÕES 2020. PREFEITO E VICE. APROVADAS COM RESSALVAS. USO IRREGULAR DE RECURSOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA-FEFC. IRRESIGNAÇÃO UNICAMENTE QUANTO À DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO DE VALORES AO ERÁRIO. AUSÊNCIA DE VINCULAÇÃO ENTRE OS BENEFICIÁRIOS DAS CÁRTULAS E OS EMITENTES DAS NOTAS FISCAIS. INEXISTÊNCIA DE DOCUMENTOS IDÔNEOS A COMPROVAR A PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. DESPROVIMENTO.

1. Recurso contra sentença que julgou aprovadas com ressalvas prestação de contas de candidatos à majoritária, referentes às eleições municipais de 2020, determinando o recolhimento de valores ao Tesouro Nacional, em face do uso irregular de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC.

2. Insurgência delimitada à determinação de restituição ao erário, não estando a sentença sujeita à modificação na parte em que aprovou as contas com ressalvas, uma vez que a matéria não restou devolvida à apreciação do Tribunal nas razões de apelo.

3. A norma que regulamenta a forma de pagamento das despesas eleitorais está prevista no art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19, o qual determina que os gastos de natureza financeira devem ser pagos por meio de cheque cruzado e nominal ao fornecedor. Incontroverso, na hipótese, o descumprimento, cabe a análise se, por um lado, essa conduta por si só, conduz à determinação de recolhimento dos valores apurados ao Tesouro Nacional ou, por outro lado, se existem documentos idôneos capazes de comprovar os gastos efetuados por meio dos cheques objeto da glosa.

4. A atual jurisprudência do TSE supera o entendimento até hoje vigente neste colegiado, estabelecendo, em síntese, que a devolução de valores oriundos de recursos públicos ao Tesouro Nacional somente é cabível nas hipóteses de ausência de comprovação da utilização dos recursos ou utilização indevida, comandos estabelecidos no § 1º do art. 79 da já citada Resolução TSE 23.607/19.

5. A análise da microfilmagem dos cheques estabelece que os beneficiários das cártulas foram pessoas estranhas aos fornecedores identificados e que apresentaram as notas fiscais e as declarações tendentes a estabelecer vinculação com os já citados cheques. As regras contidas na Resolução TSE n. 23.607/19 dispõem que os gastos de campanha devem ser identificados com clareza e estabelecendo elos seguros entre os beneficiários dos pagamentos e os serviços prestados. É a chamada rastreabilidade, isto é, os pagamentos devem ser atestados por documentos hábeis a demonstrar o serviço prestado pelo beneficiário e sua vinculação com a despesa, o que não ocorreu no caso concreto.

6. O contexto probatório não revela nenhum documento fiscal idôneo emitido pelos beneficiários dos cheques e tampouco contrato ou prova de prestação de serviços a justificar os pagamentos feitos. Ausente a vinculação entre os beneficiários dos cheques e os emitentes das notas fiscais, bem como a inexistência de provas, por documentos idôneos, de prestação de serviços por parte dos beneficiários das cártulas, resta descumprida a regra posta no art. 60, e parágrafos, da Resolução TSE n. 23.607/19. Circunstância que atrai a incidência do disposto no § 1º do art. 79 da Resolução TSE n. 23.607/19, impondo a devolução dos valores ao Tesouro Nacional, como determinado na sentença.

7. Provimento negado.

(Rel 0600464-77.2020.6.21.0099, Relator designado: Des. Eleitoral Oyama Assis Brasil de Moraes, julgado na sessão de 06 de julho de 2021.)

(Grifo nosso)

 

Dessarte, descumprido o que determina o art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19, sem que se possa identificar e rastrear a destinação correta da verba pública (FEFC), correta a determinação de recolhimento da importância ao erário.

Assim, a realização de gastos com recursos do FEFC por meio de forma de pagamento vedada, e sem comprovação da despesa eleitoral, importa em utilização indevida de recursos públicos, ensejando o recolhimento ao Tesouro Nacional da quantia irregular (R$ 550,00), nos termos do art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Conforme consta, o total da irregularidade (R$ 550,00) representa 26,82% das receitas declaradas (R$ 2.050,00) o que, em princípio, levaria à desaprovação das contas.

Contudo, tenho que, apesar de o percentual ser significativo diante do somatório arrecadado, o valor absoluto é reduzido e, inclusive, inferior ao parâmetro de R$ 1.064,10 (ou mil UFIRs) que a disciplina normativa das contas considera módico, de modo a permitir o gasto de qualquer eleitor pessoalmente, não sujeito à contabilização, e de dispensar o uso da transferência eletrônica interbancária nas doações eleitorais (arts. 43, caput, e 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19).

Nessas hipóteses, cabível a incidência dos postulados da razoabilidade e proporcionalidade, na esteira do que constou na decisão monocrática proferida pelo Ministro Luiz Edson Fachin, nos autos do RESPE n. 37447, em 13.06.19:

Entendo que o limite percentual de 10% (dez por cento) adotado por este Tribunal Superior revela-se adequado e suficiente para limitar as hipóteses de incidência dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.

É de se harmonizar, contudo, a possibilidade de sobreposição dos critérios do valor diminuto e da aplicação dos princípios já citados. Em casos tais, deve prevalecer, até o limite aqui indicado, o critério de valor absoluto, aplicando-se o critério principiológico de forma subsidiária.

Assim, se o valor da irregularidade está dentro do máximo valor entendido como diminuto, é desnecessário aferir se é inferior a 10% (dez por cento) do total da arrecadação ou despesa, devendo se aplicar o critério do valor diminuto.

Apenas se superado o valor máximo absoluto considerado irrisório, aplicar-se-á o critério da proporcionalidade e da razoabilidade, devendo ser considerado o valor total da irregularidade analisada, ou seja, não deve ser desconsiderada a quantia de 1.000 UFIRs alcançada pelo critério do valor diminuto.

 

Nessa linha, a jurisprudência tem afastado o severo juízo de desaprovação das contas quando, a despeito da elevada equivalência relativa da falha frente ao conjunto das contas, o valor nominal da irregularidade se mostra irrelevante, adotando-se como referência a quantia de R$ 1.064,10.

A ilustrar, destaco o seguinte julgado sobre o tema:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. DEPUTADO ESTADUAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO RELATIVOS ÀS ELEIÇÕES 2018. PARECER TÉCNICO E MANIFESTAÇÃO MINISTERIAL DESFAVORÁVEIS. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. MONTANTE EXPRESSIVO. VALOR ABSOLUTO ÍNFIMO. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. Dos recursos de origem não identificada. 1.1. Divergências entre a movimentação financeira declarada pelo candidato e aquela aferida no extrato eletrônico do TSE. 1.2. Constatadas despesas declaradas pelo prestador que não transitaram pela conta bancária. 1.3. Omissão de nota fiscal.

2. Ainda que as falhas representem 97,88% dos valores obtidos em campanha, o valor absoluto é mínimo e, conforme entendimento jurisprudencial, permite a aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade para aprovar as contas com ressalvas. Determinado o recolhimento do montante irregular ao erário, nos termos do art. 82 da Resolução TSE n. 23.553/17.

3. Aprovação com ressalvas.

(TRE-RS; PC n. 0600698-02.2019.6.21.0000, Relator: Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores, julgado em 14.7.2020.) (grifo nosso)

 

Transcrevo, ainda, ementa de decisão do Plenário do TSE:

ELEIÇÕES 2016. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. APLICABILIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. "Com base na compreensão da reserva legal proporcional, nem toda irregularidade identificada no âmbito do processo de prestação de contas autoriza a automática desaprovação de contas de candidato ou de partido político, competindo à Justiça Eleitoral verificar se a irregularidade foi capaz de inviabilizar a fiscalização" (AgR-REspe 2159-67, rel. Min. Gilmar Mendes, DJe de 11.3.2016.).

2. Com relação à falha de omissão de receitas e despesas, consistiu ela no valor de R$ 295,20, a qual a própria Corte de origem assinalou não ser "capaz de levar à desaprovação das contas, sendo o caso de anotação de ressalvas, conforme o art. 68, II, da Res. TSE 23.463/2016."

3. Não obstante, o Tribunal a quo entendeu apta a ensejar a desaprovação das contas a irregularidade alusiva a doação que consistiu em recurso de origem não identificada. Todavia, conforme consta da decisão regional, é certo que a falha apontada correspondeu a aproximadamente 12% do total de recursos arrecadados para campanha eleitoral, mas é de se ponderar que se trata de uma campanha para vereador e o valor absoluto corresponde a R$ 1.000,00, a revelar o seu caráter diminuto, o que permite a aprovação com ressalvas.

4. Para fins de aplicação do princípio da razoabilidade e da proporcionalidade no âmbito dos processos de prestação de contas, a gravidade da falha tem relevância para a aferição da questão, mas outras circunstâncias podem ser ponderadas pelo julgador no caso concreto, notadamente se o vício, em termos percentuais ou absolutos, se mostra efetivamente expressivo.

Precedente: AgR-AI 211-33, red. para o acórdão Min. Henrique Neves, DJe de 19.8.2014. Agravo regimental a que se nega provimento.

(Recurso Especial Eleitoral nº 27324, Acórdão, Relator(a) Min. ADMAR GONZAGA, Publicação: DJE-Diário de justiça eletrônico, Data 29.9.2017.) (grifo nosso)

 

Destarte, tendo em vista que a irregularidade perfaz quantia inexpressiva, tenho ser possível a aprovação das contas com ressalvas em homenagem aos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade. Tal conclusão, cabe ressaltar, não afasta o dever de recolhimento ao erário, na forma do art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Ante o exposto, VOTO pelo provimento parcial do recurso, para aprovar com ressalvas as contas de MARCOS VINICIUS ROCHA, mantendo a sentença que determinou o recolhimento de R$ 550,00 ao Tesouro Nacional.