REl - 0600469-47.2020.6.21.0084 - Voto Relator(a) - Sessão: 10/03/2022 às 14:00

VOTO

Eminentes Colegas.

O recurso é tempestivo e, presentes os demais pressupostos de admissibilidade, merece conhecimento.

1. Da análise de novos documentos

A recorrente fez acompanhar, ao recurso, instrumento de procuração e peças geradas no Sistema de Prestação de Contas Eleitorais - SPCE na data de 19.11.2021, quais sejam, Ficha de Qualificação, Demonstrativo de Receitas/Despesas, Relatório de Despesas Efetuadas, Doações Efetuadas a Candidatos/Partidos, Fundo de Caixa, todos preenchidos com dados diferentes da prestação de contas apresentada perante a Zona Eleitoral.

Destaco que a legislação de regência concede o prazo de três dias, a partir da intimação do relatório preliminar, para que os candidatos apresentem esclarecimentos e documentos, sob pena de preclusão, e determina que a retificação voluntária da prestação de contas somente pode ser oferecida antes do pronunciamento técnico, sob pena de invalidade, conforme art. 69, §§ 1º e 6º, e art. 71, inc. II, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Observo que o conhecimento de documentos em fase recursal é prática aceita por este Tribunal na classe processual sob exame quando não apresentar prejuízo à tramitação do processo por se tratar de documentos simples, capazes de esclarecer as irregularidades apontadas sem a necessidade de nova análise técnica ou diligências complementares.

No caso, todavia, para além da preclusão já indicada, entendo descabido o conhecimento das peças porque sua aceitação exigiria uma nova análise técnica, com reabertura de instrução para o exame detalhado dos lançamentos em cotejo com as demais informações e dados constantes dos extratos eletrônicos, resultando em supressão de atividade atinente, na espécie, ao Juiz Eleitoral da instância inicial, e tratamento desigual da recorrente, privilegiado, em relação aos demais candidatos da eleição para a qual concorreu.

Portanto, dos documentos apresentados, entendo por admitir somente o instrumento de procuração, rechaçando os demais.

2. Mérito

MARIA DO CARMO GIMENES RIEFF, candidata ao cargo de vereadora no Município de Tapes nas eleições 2020, interpõe recurso contra a sentença proferida pelo Juízo da 84ª Zona Eleitoral que desaprovou as contas em razão de 1) ausência de comprovantes da devolução da sobra de verba pública; (2) omissão de movimentação financeira; e (3) pagamento de despesas em desacordo com a legislação. A decisão hostilizada determinou o recolhimento da quantia de R$ 2.000,00 ao Tesouro Nacional.

Passo à análise pormenorizada.

2.1. No concernente à primeira irregularidade, o juízo de origem identificou, no extrato de prestação de contas, as informações de recebimento de R$ 5.000,00 oriundos do Fundo Partidário sem a correspondente ocorrência de gastos, a gerar sobra de valores. Por força do art. 50, §§1º a 4º, da Resolução TSE 23.607/2019, o valor deveria ser devolvido à agremiação partidária:

Art. 50. Constituem sobras de campanha:

(...)

I - a diferença positiva entre os recursos financeiros arrecadados e os gastos financeiros realizados em campanha;

II - os bens e materiais permanentes adquiridos ou recebidos durante a campanha até a data da entrega das prestações de contas de campanha;

III - os créditos contratados e não utilizados relativos a impulsionamento de conteúdos, conforme o disposto no art. 35, § 2º, desta Resolução.

§ 1º As sobras de campanhas eleitorais devem ser transferidas ao órgão partidário, na circunscrição do pleito, conforme a origem dos recursos e a filiação partidária do candidato, até a data prevista para a apresentação das contas à Justiça Eleitoral.

§ 2º O comprovante de transferência das sobras de campanha deve ser juntado à prestação de contas do responsável pelo recolhimento, sem prejuízo dos respectivos lançamentos na contabilidade do partido político.

§ 3º As sobras financeiras de recursos oriundos do Fundo Partidário devem ser transferidas para a conta bancária do partido político destinada à movimentação de recursos dessa natureza.

 

Não houve, contudo, manifestação da recorrente acerca do tópico. A correção da falha seria possível com a juntada do comprovante de devolução ao partido político, o que não aconteceu, de modo que subsiste a falha.

2.2. A segunda irregularidade diz respeito à omissão de movimentação financeira,  pois a análise contábil verificou – destaco que a recorrente não apresentou os extratos bancários – três transferências de valores, com valor de R$ 1.000,00 cada uma delas, da conta da recorrente para as contas beneficiárias indicadas “Eleições 2020 Ivanira Teixeira Santos”, “Eleições 2020 Cinara Mendes Freitas” e “Eleições 2020 KLFL”.

O juízo sentenciante entendeu que “apesar de tais informações terem sido omitidas nas contas em exame, não há vedação à transferência de recursos públicos entre candidatos da mesma agremiação, mormente quando ausentes indícios de violação à quota de gênero, como no caso, motivo pelo qual não há que se falar em recolhimento de tais valores.”

Destaco a importância da entrega das informações em tempo de análise, pois, no ponto, as doações implicam em elementos a considerar no exame da contabilidade de outros candidatos, situação que gera indubitavelmente distorções e deve ser considerada, ao menos, para a construção do juízo de aprovação ou desaprovação.

2.3. Ainda, houve a identificação de três notas fiscais eletrônicas emitidas contra o CNPJ da campanha pelo fornecedor Abastecedora de Combustíveis Rioxel Ltda., duas no valor de R$ 150,00 e uma de 220,00, gastos esses não declarados na prestação de contas. A sentença hostilizada não aborda individualmente essas despesas, tratando em conjunto com os valores recebidos sobre os quais não há esclarecimento do destino:

Em relação aos valores remanescentes, no montante de R$ 2.000,00, oriundos de recursos públicos e utilizados pela candidata, constata-se que não foram juntados aos autos os documentos comprobatórios relativos às despesas, tampouco os respectivos comprovantes de pagamento através de cheque nominal cruzado ou comprovante de transferência bancária, na forma determinada pelo art. 38 da Resolução TSE 23.607/2019.

Com efeito, verifico não haver comprovação do destino das verbas públicas, nem dos pagamentos feitos às despesas identificadas nas notas eletrônicas, que totalizam R$ 520,00.

Ademais, o extrato bancário trazido aos autos pela análise técnica demonstra o desconto de dois cheques no valor de R$ 1.000,00 cada um, ambos sem a indicação da contraparte e, ainda, o ingresso de R$ 1.000,00 no dia 19.11.2020, sacados no mesmo dia por meio de cheque, igualmente sem identificação de beneficiário.

Observo que as formas estabelecidas na legislação de regência para pagamento dos gastos eleitorais, quais sejam, cheque nominal cruzado, transferência bancária que identifique o CPF ou o CNPJ do beneficiário, débito em conta ou cartão de débito da conta bancária, visam viabilizar a fiscalização dos gastos eleitorais e a verificação do real destino das verbas, por meio da identificação dos beneficiários, confirmando-se o vínculo entre pagamento e fornecedor.

Nesse norte, ausentes esclarecimentos a respeito da utilização de verbas públicas, remanesce a irregularidade e adequação da determinação de recolhimento do valor de R$ 2.000,00, nos termos da legislação de regência.

Diante do exposto, VOTO para negar provimento ao recurso.