REl - 0600342-69.2020.6.21.0065 - Voto Relator(a) - Sessão: 24/02/2022 às 14:00

VOTO

As contas foram desaprovadas em virtude do recebimento de recurso de origem não identificada consistente na emissão de nota fiscal contra o CNPJ do candidato, localizada a partir do procedimento de circularização de despesas realizado pelo cartório eleitoral.

Foi constatado o pagamento no valor de R$ 1.309,00, referente à nota fiscal n. 2724, emitida pela empresa Integração Administradora Ltda. em 10.11.2020, contra o CNPJ do candidato, para serviço de mídia em jornal (ID 44404083).

Em suas razões, o recorrente declara que não informou se tratar de despesa realizada pelo partido sem sua anuência e que, na verdade, consiste em dívida de campanha, e não de recurso de origem não identificada.

Compulsando os autos, verifica-se que há uma declaração feita pelo recorrente de que o serviço foi realizado pelo Diretório Municipal do Partido PSL sem sua anuência (ID 44403983), como bem apontou a sentença.

Quanto à alegação de tratar-se de dívida de campanha, há alguns elementos que devem ser analisados, os quais contrariam essa tese.

A um, a despesa deveria estar registrada na prestação de contas como gasto eleitoral, não bastando a alegação do candidato, realizada após ser verificado o gasto não informado à Justiça Eleitoral, de que se trata de uma dívida, pois a conduta impede a fiscalização da movimentação financeira da campanha.

A dois, como se manifestou a douta Procuradoria Regional Eleitoral, a assunção de dívida de campanha somente é possível por decisão do órgão nacional de direção partidária, não podendo ser admitida de forma unilateral pela simples declaração do candidato de que realizou um gasto que sequer constou em suas contas. Nesse sentido, dispõe o art. 33 da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 33. Partidos políticos e candidatos podem arrecadar recursos e contrair obrigações até o dia da eleição.

§ 1º Após o prazo fixado no caput, é permitida a arrecadação de recursos exclusivamente para a quitação de despesas já contraídas e não pagas até o dia da eleição, as quais deverão estar integralmente quitadas até o prazo de entrega da prestação de contas à Justiça Eleitoral.

§ 2º Eventuais débitos de campanha não quitados até a data fixada para a apresentação da prestação de contas podem ser assumidos pelo partido político (Lei nº 9.504/1997, art. 29, § 3º; e Código Civil, art. 299).

§ 3º A assunção da dívida de campanha somente é possível por decisão do órgão nacional de direção partidária, com apresentação, no ato da prestação de contas final, de:

I - acordo expressamente formalizado, no qual deverão constar a origem e o valor da obrigação assumida, os dados e a anuência do credor;

II - cronograma de pagamento e quitação que não ultrapasse o prazo fixado para a prestação de contas da eleição subsequente para o mesmo cargo;

III - indicação da fonte dos recursos que serão utilizados para a quitação do débito assumido.

 

Considerando que o valor utilizado para o serviço de campanha em jornal não transitou pela conta bancária, a quantia destinada ao pagamento caracteriza-se como recurso de origem não identificada, o qual deve ser recolhido ao Tesouro Nacional, como bem concluiu a decisão de primeiro grau, na forma do art. 32 da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 32. Os recursos de origem não identificada não podem ser utilizados por partidos políticos e candidatos e devem ser transferidos ao Tesouro Nacional por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU).

§ 1º Caracterizam o recurso como de origem não identificada:

I - a falta ou a identificação incorreta do doador;

II - a falta de identificação do doador originário nas doações financeiras recebidas de outros candidatos ou partidos políticos;

III - a informação de número de inscrição inválida no CPF do doador pessoa física ou no CNPJ quando o doador for candidato ou partido político;

IV - as doações recebidas em desacordo com o disposto no art. 21, § 1º, desta Resolução quando impossibilitada a devolução ao doador;

V - as doações recebidas sem a identificação do número de inscrição no CPF/CNPJ no extrato eletrônico ou em documento bancário;

VI - os recursos financeiros que não provenham das contas específicas de que tratam os arts. 8º e 9º desta Resolução;

VII - doações recebidas de pessoas físicas com situação cadastral na Secretaria da Receita Federal do Brasil que impossibilitem a identificação da origem real do doador; e/ou

VIII - recursos utilizados para quitação de empréstimos cuja origem não seja comprovada.

§ 2º O comprovante de devolução ou de recolhimento, conforme o caso, poderá ser apresentado em qualquer fase da prestação de contas ou até 5 (cinco) dias após o trânsito em julgado da decisão que julgar as contas de campanha, sob pena de encaminhamento dos autos à representação estadual ou municipal da Advocacia-Geral da União, para fins de cobrança.

§ 3º Incidirão atualização monetária e juros moratórios, calculados com base na taxa aplicável aos créditos da Fazenda Pública, sobre os valores a serem recolhidos ao Tesouro Nacional, desde a data da ocorrência do fato gerador até a do efetivo recolhimento, salvo se tiver sido determinado de forma diversa na decisão judicial.

§ 4º O disposto no § 3º deste artigo não se aplica quando o candidato ou o partido político promove espontânea e imediatamente a transferência dos recursos para o Tesouro Nacional, sem deles se utilizar.

§ 5º O candidato ou o partido político pode retificar a doação, registrando-a no SPCE, ou devolvê-la ao doador quando a não identificação decorra do erro de identificação de que trata o inciso III do § 1º deste artigo e haja elementos suficientes para identificar a origem da doação.

§ 6º Não sendo possível a retificação ou a devolução de que trata o § 5º, o valor deverá ser imediatamente recolhido ao Tesouro Nacional.

 § 7º A devolução ou a determinação de devolução de recursos recebidos de origem não identificada não impede, se for o caso, a desaprovação das contas, quando constatado que o candidato se beneficiou, ainda que temporariamente, dos recursos ilícitos recebidos, assim como a apuração do fato na forma do art. 30-A da Lei nº 9.504/1997, do art. 22 da Lei Complementar nº 64/1990 e do art. 14, § 10, da Constituição da República.

 

Embora o cartório eleitoral não tenha juntado o documento fiscal aos autos, elemento necessário para a comprovação da irregularidade, pode-se verificar a chave de acesso da nota fiscal n. 2724, emitida contra o CNPJ do recorrente, no site DivulgaCandContas (https://divulgacandcontas.tse.jus.br/).

Ademais, a partir da pesquisa da chave no portal da Nota Fiscal Eletrônica é possível constatar que seu status é autorizada e contra o CNPJ do candidato (https://www.nfse.canela.rs.gov.br:8181/sys552/publico/viewAutentNfse.xhtml?tipoCons=1).

Outrossim, não se discute dolo ou a má-fé do recorrente, e sim a observância das normas sobre finanças de campanha, assim como a transparência, a confiabilidade e a lisura da prestação de contas.

Assim, permanece a irregularidade no valor de R$ 1.309,00, que representa 130,80% das receitas declaradas (R$ 1.000,70), percentual superior a 10% e com valor acima de R$ 1.064,10, os quais são considerados como critério para a aprovação com ressalvas, por aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

Com essas considerações, afigura-se razoável e proporcional o juízo de desaprovação das contas e a determinação de recolhimento do recurso de origem não identificada ao Tesouro Nacional.

Diante do exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso, para manter a sentença de desaprovação das contas e a determinação de recolhimento da quantia de R$ 1.309,00 ao Tesouro Nacional, nos termos da fundamentação.