REl - 0600211-49.2020.6.21.0080 - Voto Relator(a) - Sessão: 22/02/2022 às 14:00

VOTO

As contas foram desaprovadas em razão do recebimento de recursos de origem não identificada, consistentes em três depósitos efetuados na mesma data, um na quantia de R$ 371,82 e outros dois de R$ 1.064,09, totalizando R$ 2.500,00.

O parecer conclusivo identificou esses três depósitos em dinheiro, realizados em 09.11.2020, com o CPF da esposa do candidato (ID 44791583):

1) Foram identificadas doações financeiras recebidas de pessoas físicas ou de recursos próprios, inclusive mediante financiamento coletivo, de valor igual ou superior a R$ 1.064,10, realizadas de forma distinta da opção de transferência eletrônica ou cheque cruzado e nominal, entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação, contrariando o disposto no art. 21, §1º, da Resolução TSE nº 23.607/2019, sujeito ao recolhimento previsto no art. 32, caput, dessa resolução:

O prestador, em sua petição de ID 88597682, apresenta documento assinado pela Sra. Ana Luiza Simões Lopes, CPF nº 388.454.660-00, onde a mesma declara que o valor de R$ 2.500,00 doado é compatível com a sua Declaração de Imposto de Renda, no entanto a irregularidade apontada no relatório de exame é que o valor doado na forma de 3 depósitos em dinheiro no mesmo dia, ultrapassou em R$ 1.435,90 o valor máximo para depósito nesta modalidade (R$ 1.064,10).

O fato é que a Resolução TSE nº 23.607/2019, que dispõe sobre a arrecadação e os gastos de recursos por partidos políticos e candidatos e sobre a prestação de contas nas eleições, em seu art. 21, §1º, reza que as doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação ou cheque cruzado e nominal, ainda que na hipótese de doações sucessivas realizadas por um mesmo doador em um mesmo dia (§2º do mesmo artigo), in casu, extrapolado o referido limite (3 doações sucessivas por depósito em dinheiro em 09/11/2020, perfazendo o valor total de R$ 2.500,00), os valores não foram restituídos ao doador e foram utilizados.

Entendo que trata-se de inconsistência grave que compromete as contas do candidato, cabendo desaprovação.

O procedimento adotado na doação contraria o art. 21, inc. I, §§ 1º e 2º, da Resolução TSE n. 23.607/19, que estabelece o limite de R$ 1.064,09 para doações bancárias sucessivas em espécie, realizadas por um mesmo doador em um mesmo dia:

Art. 21. As doações de pessoas físicas e de recursos próprios somente poderão ser realizadas, inclusive pela internet, por meio de:

(...)

§ 1º As doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação ou cheque cruzado e nominal.

§ 2º O disposto no § 1º aplica-se também à hipótese de doações sucessivas realizadas por um mesmo doador em um mesmo dia.

§ 3º As doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo não podem ser utilizadas e devem, na hipótese de identificação do doador, ser a ele restituídas ou, se isso não for possível, devem ser consideradas de origem não identificada e recolhidas ao Tesouro Nacional, na forma prevista no caput do art. 32 desta Resolução.

§ 4º No caso da utilização das doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo, ainda que identificado o doador, os valores devem ser recolhidos ao Tesouro Nacional, na forma do disposto caput do art. 32 desta Resolução.

§ 5º Além da consequência disposta no parágrafo anterior, o impacto sobre a regularidade das contas decorrente da utilização dos recursos recebidos em desacordo com este artigo será apurado e decidido por ocasião do julgamento.

§ 6º É vedado o uso de moedas virtuais para o recebimento de doações financeiras.

Tal exigência normativa visa assegurar a rastreabilidade dos recursos (origem e destino) recebidos pelos candidatos, o que resta comprometido quando a operação utiliza meio diverso, como feito pelo recorrente.

Nesse cenário, ainda que os comprovantes de depósitos indiquem o CPF da doadora, há irregularidade porque houve superação do limite diário de recebimento de doação em dinheiro, a qual inviabiliza o rastreamento. Os depósitos foram realizados de maneira sucessiva, estando correta a conclusão do juízo a quo no sentido de que os valores não estão com a origem devidamente identificada, o que conduz ao recolhimento ao erário, na forma prevista no caput do art. 32 da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 32. Os recursos de origem não identificada não podem ser utilizados por partidos políticos e candidatos e devem ser transferidos ao Tesouro Nacional por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU).

§ 1º Caracterizam o recurso como de origem não identificada:

I - a falta ou a identificação incorreta do doador;

II - a falta de identificação do doador originário nas doações financeiras recebidas de outros candidatos ou partidos políticos;

III - a informação de número de inscrição inválida no CPF do doador pessoa física ou no CNPJ quando o doador for candidato ou partido político;

IV - as doações recebidas em desacordo com o disposto no art. 21, § 1º, desta Resolução quando impossibilitada a devolução ao doador;

V - as doações recebidas sem a identificação do número de inscrição no CPF/CNPJ no extrato eletrônico ou em documento bancário;

VI - os recursos financeiros que não provenham das contas específicas de que tratam os arts. 8º e 9º desta Resolução;

VII - doações recebidas de pessoas físicas com situação cadastral na Secretaria da Receita Federal do Brasil que impossibilitem a identificação da origem real do doador; e/ou

VIII - recursos utilizados para quitação de empréstimos cuja origem não seja comprovada.

§ 2º O comprovante de devolução ou de recolhimento, conforme o caso, poderá ser apresentado em qualquer fase da prestação de contas ou até 5 (cinco) dias após o trânsito em julgado da decisão que julgar as contas de campanha, sob pena de encaminhamento dos autos à representação estadual ou municipal da Advocacia-Geral da União, para fins de cobrança.

§ 3º Incidirão atualização monetária e juros moratórios, calculados com base na taxa aplicável aos créditos da Fazenda Pública, sobre os valores a serem recolhidos ao Tesouro Nacional, desde a data da ocorrência do fato gerador até a do efetivo recolhimento, salvo se tiver sido determinado de forma diversa na decisão judicial.

§ 4º O disposto no § 3º deste artigo não se aplica quando o candidato ou o partido político promove espontânea e imediatamente a transferência dos recursos para o Tesouro Nacional, sem deles se utilizar.

§ 5º O candidato ou o partido político pode retificar a doação, registrando-a no SPCE, ou devolvê-la ao doador quando a não identificação decorra do erro de identificação de que trata o inciso III do § 1º deste artigo e haja elementos suficientes para identificar a origem da doação.

§ 6º Não sendo possível a retificação ou a devolução de que trata o § 5º, o valor deverá ser imediatamente recolhido ao Tesouro Nacional.

§ 7º A devolução ou a determinação de devolução de recursos recebidos de origem não identificada não impede, se for o caso, a desaprovação das contas, quando constatado que o candidato se beneficiou, ainda que temporariamente, dos recursos ilícitos recebidos, assim como a apuração do fato na forma do art. 30-A da Lei nº 9.504/1997, do art. 22 da Lei Complementar nº 64/1990 e do art. 14, § 10, da Constituição da República.

Ressalto que o egrégio Tribunal Superior Eleitoral entende que a obrigação de as doações acima de R$ 1.064,09 serem realizadas mediante transferência bancária não se constitui em mera exigência formal, e o seu descumprimento enseja, em tese, a desaprovação das contas, consoante precedente a seguir colacionado:

ELEIÇÕES 2016. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. VEREADOR. DOAÇÃO. DEPÓSITO BANCÁRIO. EM ESPÉCIE. VALOR SUPERIOR A R$ 1.064,10. TRANSFERÊNCIA ELETRÔNICA. EXIGÊNCIA. ART. 18, § 1º DA RES. TSE Nº 23.463/2015. DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. PROVIMENTO.

(...)

2. Nas razões do regimental, o Parquet argumenta que não foi observado o art. 18, § 1º, da Res.-TSE nº 23.463/2015, segundo o qual "as doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação". 3. A Corte Regional, soberana na análise dos fatos e provas, atestou a identificação da doadora do valor apontado como irregular por meio do número do CPF impresso no extrato eletrônico da conta de campanha.

4. Consoante decidido nesta sessão, no julgamento do AgR-REspe nº 265-35/RO, a maioria deste Tribunal assentou que a exigência de que as doações acima de R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) sejam feitas mediante transferência eletrônica não é meramente formal e o seu descumprimento enseja, em tese, a desaprovação das contas.

(...)

7. Agravo regimental acolhido para dar provimento ao recurso especial, com determinação de recolhimento ao erário do valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais).

(Recurso Especial Eleitoral n. 52902, Acórdão, Relator Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônica, Tomo 250, Data: 19.12.2018, pp. 92-93.) (Grifei.)

O raciocínio é que o descumprimento da exigência de transferência bancária ou de cheque nominal cruzado não fica suprido pela realização de depósito em espécie, ainda que identificado por determinada pessoa, circunstância que não se mostra apta para comprovar a efetiva origem do valor, devido à ausência de trânsito prévio dos recursos pelo sistema bancário.

No caso dos autos, inexiste comprovação adicional mínima sobre a origem dos recursos ou por qual motivo não foram realizados depósitos por transferências bancárias de modo conjunto, impossibilitando que a falha seja relevada.

Não se trata de análise da boa ou má-fé dos prestadores, ou de hipótese de malversação e desvio dos recursos públicos recebidos, mas de manifesto e injustificável descumprimento de norma eleitoral aplicável a todos os candidatos.

A tese de que um dos depósitos, por ser inferior a R$ 1.064,10, deve ser excluído da soma que gerou a superação do limite diário não encontra amparo legal, pois os depósitos sucessivos devem ser somados para fins de aferição do descumprimento da regra. É a integralidade do crédito recebido na mesma data que acarreta a superação do limite diário de doações, comprometendo a confiabilidade e a transparência das contas, conforme claramente disposto na resolução regulamentadora.

Desse modo, é inviável a tese de que um dos depósitos seria regular e apenas os demais deveriam ser recolhidos ao erário, dado que se deve compreender o conjunto dos depósitos como operação única, em espécie.

Assim, permanece a irregularidade, referente a três depósitos na mesma data no valor de R$ 2.500,00, que representa 50% das receitas declaradas (R$ 5.000,00), percentual superior a 10% e com valor acima de R$ 1.064,10, os quais são considerados como critério para a aprovação com ressalvas por aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

Com essas considerações, afigura-se razoável e proporcional o juízo de desaprovação das contas e a determinação de recolhimento dos valores ao Tesouro Nacional.

Ante o exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso para manter a desaprovação das contas e a determinação de recolhimento de R$ 2.500,00 ao Tesouro Nacional, nos termos da fundamentação.