REl - 0600469-42.2020.6.21.0118 - Voto Relator(a) - Sessão: 17/02/2022 às 14:00

VOTO

As contas foram desaprovadas em razão de despesa com combustível no valor de R$ 400,00, sem o correspondente registro de locações, cessões de veículos, publicidade com carro de som ou gasto com geradores de energia, e também devido ao excesso de autofinanciamento de campanha de R$ 228,01, uma vez que o candidato aplicou recursos próprios no valor de R$ 2.120,00, enquanto o limite máximo era de R$ 1.891,99 para o Município de Estância Velha.

Observa-se que o recurso não impugnou a sentença no que se refere à primeira falha constatada, relativa à irregularidade na despesa com combustíveis, devendo ser mantida a decisão nesse ponto.

Quanto à segunda inconsistência, o candidato defende que não podem ser computadas no limite de autofinanciamento as despesas com pagamento de honorários advocatícios e contábeis, invocando o art. 4º, § 5º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

A tese recursal de que não se deve somar tais receitas ao limite não encontra amparo legal. O dispositivo referido nas razões recursais trata tão somente do total geral de despesas que um candidato pode realizar durante a campanha, para cuja soma fica dispensada a inclusão de honorários advocatícios e contábeis. Este regramento é geral e não se relaciona com o limite de autofinanciamento.

O total geral de gastos previstos para os candidatos pode ser adimplido com recursos próprios, do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC).

No entanto, a regra aplicada, no parecer conclusivo e na sentença, é a do art. 27, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, que se refere a recursos próprios que um candidato pode doar para sua campanha, litteris:

Art. 27. As doações realizadas por pessoas físicas são limitadas a 10% (dez por cento) dos rendimentos brutos auferidos pelo doador no ano-calendário anterior à eleição (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 1º).

§ 1º O candidato poderá usar recursos próprios em sua campanha até o total de 10% (dez por cento) dos limites previstos para gastos de campanha no cargo em que concorrer (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 2º-A).

 

A diferença de regulamentação é significativa para receitas oriundas de outras fontes que não do próprio candidato, pois, para o autofinanciamento, há limite isonômico de 10% de doação de recursos próprios para todos os concorrentes, de acordo com o cargo pleiteado.

A norma visa à igualdade, ainda que relativa, entre os concorrentes, ou seja, uma forma de mitigar eventuais desequilíbrios patrimoniais prévios dos candidatos, que poderiam interferir de modo substancial nos resultados da campanha.

Nessa linha, oportuno trazer as considerações da douta Procuradoria Regional Eleitoral:

[...]

O fato não é negado pelo recorrente, que tão somente alega que efetuou gastos de R$ 151,30 a título de serviços contábeis e de R$ 250,00 a título de serviços advocatícios, os quais não ficariam sujeitos a limites de gastos, razão pela qual os recursos próprios utilizados para a satisfação de tais débitos também não poderiam se sujeitar ao limite imposto na sentença. Ademais, alega não ter agido de má-fé e que o valor é irrisório e não comprometeu a transparência das contas. Postula, assim, pela aprovação das contas sem quaisquer ressalvas.

Ocorre que existem regras distintas a fim de disciplinar situações distintas. Uma delas trata do limite global de gastos, ao qual, de fato, não se encontram sujeitos “os gastos advocatícios e de contabilidade referentes a consultoria, assessoria e honorários, relacionados à prestação de serviços em campanhas eleitorais e em favor destas, bem como em processo judicial decorrente de defesa de interesses de candidato ou partido político”, nos termos do § 5º do art. 4º da Resolução TSE nº 23.607/2019. Tal norma se refere ao plano da despesa. Já a outra regra é aquela aplicada no caso, pertinente ao âmbito das receitas de campanha, e que estabelece, de maneira objetiva, que “o candidato poderá usar recursos próprios em sua campanha até o total de 10% (dez por cento) dos limites previstos para gastos de campanha no cargo em que concorrer”.

Como referido, a regra prevista no art. 23, § 2-A, da Lei 9.504/97 é objetiva, somente é possível o autofinanciamento que importe em 10% do limite previsto para gastos nas campanhas dos diversos cargos. Esse limite, por sua vez, é estabelecido de acordo com a previsão contida no art. 18-C da Lei das Eleições. Definido o limite para o cargo em relação a determinado município, automaticamente está estabelecido o valor que o candidato pode aportar para sua campanha.

A regra que exclui dos limites de gastos as despesas com advogado e contador é uma exceção e, como tal, deve ser interpretada restritivamente. Assim, aplicável apenas para permitir que o candidato, no tocante ao total de suas despesas extrapole o limite legal no que diz com os referidos gastos.

[...]

Aqui, impõe-se a aplicação do princípio da igualdade na disputa eleitoral.

Outros candidatos certamente observaram o dispositivo legal e limitaram sua doação de campanha com recursos próprios, enquanto o recorrente não o fez, desequilibrando a disputa de forma ilícita e atraindo a aplicação da sanção prevista no art. 27, § 4º, da Resolução 23.607/19 (art. 23, § 3º, da Lei das Eleições).

Outrossim, não se discute a boa-fé ou a má-fé do recorrente nem a prática de abuso de poder econômico, e sim a observância das normas sobre finanças de campanha.

Na hipótese, ainda que o candidato tenha possibilitado a identificação das fontes e a origem dos financiamentos de sua campanha, houve descumprimento das regras contábeis aplicáveis a todos os concorrentes.

As irregularidades perfazem o total de R$ 628,01: R$ 400,00, referentes à despesa com combustível, e R$ 228,01, relativos ao autofinanciamento, que representam 27,54% das receitas declaradas (R$ 2.280,00).

Contudo, tendo em vista que as falhas apresentam quantia absoluta pouco expressiva, o recurso comporta provimento parcial para que as contas sejam aprovadas com ressalvas, em atenção aos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade.

Tal conclusão, entretanto, não afasta a condenação ao pagamento de multa, que decorre exclusiva e diretamente do autofinanciamento acima do limite legal, na forma do art. 27, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, valor que deve ser recolhido ao Fundo Partidário.

A penalidade de multa fixada na sentença, no percentual de 100% da quantia em excesso, encontra previsão no art. 27, §§ 1º e 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19, e o patamar se afigura razoável, adequado e proporcional à falha verificada.

Diante do exposto, VOTO pelo parcial provimento do recurso para reformar em parte a sentença e aprovar as contas com ressalvas, mantendo a sanção de multa de R$ 228,01, a ser recolhida ao Fundo Partidário, nos termos da fundamentação.