REl - 0600509-57.2020.6.21.0107 - Voto Relator(a) - Sessão: 15/02/2022 às 14:00

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

Em preliminar, os recorrentes pleiteiam a nulidade da sentença, alegando ausência de fundamentação das decisões judiciais, parcialidade da magistrada, cerceamento de defesa e violação ao princípio do contraditório.

Sem razão.

A matéria foi abordada de forma percuciente na manifestação da douta Procuradoria Eleitoral:

No tocante à alegação de que a magistrada privilegiou os representados, em razão de ter designado audiência de instrução no dia 17.05.2021, com intervalo de 90 minutos entre as testemunhas arroladas pelas partes, ao invés de uma audiência única, verifica-se que a insurgência em relação à forma como foi determinada a realização da audiência não se deu oportunamente, operando-se a preclusão.

Nesse sentido, a decisão de oitiva das testemunhas da parte autora no período da manhã e dos investigados no período da tarde se deu no despacho juntado em 28.04.2021, com ciência por parte dos investigantes no dia 07.05.2021. Os autores ainda peticionaram na véspera da audiência e, mais uma vez, não se insurgiram quanto ao formado do ato processual.

A designação da audiência da forma como foi feita foi justificada em razão do elevado número de testemunhas arroladas, e à necessidade de cumprir as regras sanitárias em vigor. Em alegações finais, os investigantes reconhecem essa justificativa e somente no recurso é que vinculam a suspensão da audiência à suposta imparcialidade do juiz.

Portanto, não há nulidade a ser declarada em razão do formato da audiência realizada.

Tampouco verifico a presença de nulidade pelo indeferimento do pedido para que fosse reproduzido para testemunha áudio de WhatsApp envolvendo denúncia de compra de votos pelos investigados relativamente à eleitora Fátima Rigoli Antunes (1º fato). Neste ponto, importante referir que não haveria qualquer interesse neste momento na nulidade da oitiva da testemunha ante o indeferimento em questão, vez que diz respeito ao primeiro fato, cuja improcedência não foi objeto de impugnação específica no recurso. De fato, correta a sentença, pois não haveria como se falar em captação ilícita de sufrágio de quem não era eleitora no município de Chiapetta, como é o caso de Fátima Rigoli Antunes, que possui domicílio eleitoral no município de Santo Augusto.

De qualquer forma, importante destacar que o pedido de reprodução do áudio foi fundamentadamente indeferido, vez que a transcrição já constava na inicial e poderia ser lida pelo advogado para a testemunha.

E não há tratamento desigual pelo fato de outro áudio de WhatsApp ter sido considerado pela Magistrada para deferir diligência de forma a averiguar eventual falso testemunho.

Trata-se de situações distintas, o áudio que a parte autora queria reproduzir em audiência tratava de conversa sobre dada eleitora, sem a participação da mesma, daí a adjetivação de “fofoca” feita pela Magistrada. Já o áudio que deu azo ao deferimento de diligência tem por interlocutor a testemunha Paulo Rosinei Dutra da Silva, que estaria, após a audiência, pedindo dinheiro para os candidatos da coligação investigante (ID 44837497 e 44837498), o que, naturalmente, importou na determinação de intimação do Ministério Público Eleitoral para se manifestar a respeito (ID 44837502), tendo sido postulada a reinquirição da testemunha (ID 44837503).

Finalmente, no tocante ao indeferimento das contraditas, a Magistrada entendeu que o fato de uma das testemunhas responder a processo criminal por agressão contra um cabo eleitoral do candidato Celço, bem como outras duas serem fornecedoras da Prefeitura não se enquadraria na previsão legal, sendo que as fornecedoras foram contratadas mediante licitação (ID 44837485).

Ainda que de forma sucinta foi fundamentado o indeferimento das contraditas.

No presente caso, verifica-se que a magistrada, em nenhum momento, violou o princípio da imparcialidade, nem tampouco deixou de fundamentar as suas decisões exaradas no curso do processo.

De fato, a magistrada formou sua livre convicção com base na prova oral e documental produzida pelas partes, tendo, inclusive, analisado detalhadamente os 4 (quatro) ilícitos eleitorais narrados na exordial e, de forma devidamente fundamentada, afastado um a um. Frise-se que a própria recorrente impugnou apenas parte da sentença, ou seja, os 3º e o 4º Fatos.

Dentro desse contexto, forçoso reconhecer que não procede a tese de que a prova produzida pela parte autora sempre foi desprezada pela magistrada, ao passo que a da parte ré não, tampouco que suas decisões não tenham sido fundamentadas, não havendo em que se falar em ofensa ao art. 93, inc. IX, da Constituição Federal.

Destarte, a rejeição da presente preliminar é medida que se impõe.

 

Assim, ainda que divirja do entendimento do douto Procurador Eleitoral quanto à preclusão da matéria relativa à imparcialidade, por se tratar de pressuposto processual subjetivo, não sujeito à preclusão, tenho que a magistrada, conforme razões acima transcritas, fundamentou todas as decisões e agiu de forma imparcial ao decidir os pontos trazidos à sua apreciação.

Rejeito a matéria preliminar.

No mérito, a recorrente insurge-se apenas quanto aos fatos 3 e 4 descritos na inicial, ou seja, captação ilícita de sufrágio, consistente na distribuição de material de construção a dois eleitores específicos em troca de votos (3º Fato da inicial), e imputação de prática de abuso de poder político e conduta vedada a agente público, consubstanciada em aumento da remuneração e carga horária de uma servidora pública municipal em período eleitoral, com a intenção de obter o seu voto e de sua família ( 4º Fato da inicial)

Os fatos versam sobre captação ilícita de votos, abuso do poder e condutas vedadas.

A compra de votos tem previsão legal no art. 41-A da Lei n. 9.504/97, cuja redação é a seguinte:

Art. 41-A. Ressalvado o disposto no art. 26 e seus incisos, constitui captação de sufrágio, vedada por esta Lei, o candidato doar, oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição, inclusive, sob pena de multa de mil a cinqüenta mil Ufir, e cassação do registro ou do diploma, observado o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar no 64, de 18 de maio de 1990. (Incluído pela Lei nº 9.840, de 1999)

§ 1º Para a caracterização da conduta ilícita, é desnecessário o pedido explícito de votos, bastando a evidência do dolo, consistente no especial fim de agir. (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)

§ 2º As sanções previstas no caput aplicam-se contra quem praticar atos de violência ou grave ameaça a pessoa, com o fim de obter-lhe o voto. (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)

 

É necessária a demonstração de que o candidato realizou uma das condutas da supracitada norma, mesmo que não seja possível determinar exatamente qual foi o eleitor eventualmente corrompido.

Já o abuso de poder possui estatura constitucional, disposta no § 9º do art. 14 da CF, in verbis:

Art. 14.

[…]

§9º. Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para o exercício do mandato, considerada a vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta.

 

O caput do art. 22 da LC n. 64/90 dispõe sobre a abertura de investigação judicial para apurar uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade:

Art. 22. Qualquer partido político, coligação, candidato ou Ministério Público Eleitoral poderá representar à Justiça Eleitoral, diretamente ao Corregedor-Geral ou Regional, relatando fatos e indicando provas, indícios e circunstâncias e pedir abertura de investigação judicial para apurar uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido político, obedecido o seguinte rito: (Grifo nosso)

 

Trata-se de instituto aberto, não sendo definido por condutas taxativas, mas por sua finalidade de impedir práticas e comportamentos que extrapolem o exercício regular e legítimo da capacidade econômica e de posições públicas dos candidatos capazes de causar indevido desequilíbrio ao pleito.

A quebra da normalidade do pleito está vinculada à gravidade da conduta, apta a alterar a simples regularidade das campanhas, sem a necessidade da demonstração de que sem a prática abusiva o resultado das urnas seria diferente.

É o que dispõe o art. 22, inc. XVI, da Lei Complementar n. 64/90:

Art. 22.

(…)

XVI – para a configuração do ato abusivo, não será considerada a potencialidade de o fato alterar o resultado da eleição, mas apenas a gravidade das circunstâncias que o caracterizam.

 

Nesse sentido, bem esclarece a doutrina de José Jairo Gomes:

É preciso que o abuso de poder seja hábil a comprometer a normalidade e a legitimidade das eleições, pois são esses os bens jurídicos tutelados pela ação em apreço. Deve ostentar, em suma, a aptidão ou potencialidade de lesar a higidez do processo eleitoral. Por isso mesmo, há mister que as circunstâncias do evento considerado sejam graves (LC n. 64/90, art. 22, inc. XVI), o que não significa devam necessariamente alterar o resultado das eleições. Nessa perspectiva, ganha relevo a relação de causalidade entre o fato imputado e a falta de higidez, anormalidade ou desequilíbrio do pleito, impondo a presença de liame objetivo entre tais eventos. (Direito Eleitoral, 12ª ed. 2016, p. 663)

Em arremate, as condutas vedadas são de legalidade estrita.

 

O doutrinador Rodrigo López Zilio (Direito Eleitoral, Editora Verbo Jurídico, 5ª edição, pág. 585-586) traz lição sobre o tema:

As condutas vedadas – na esteira de entendimento da doutrina e jurisprudência – constituem-se como espécie do gênero abuso de poder e surgiram como um antídoto à reeleição, a qual foi instituída através da EC nº 16/97. Em verdade, pode-se conceituar os atos de conduta vedada como espécies de abuso de poder político que se manifestam através do desvirtuamento dos recursos materiais (incisos I, II, IV e §10º do art. 73 da LE), humanos (incisos III e V do art. 73 da LE), financeiros (inciso VI, a, VII e VIII do art. 73 da LE) e de comunicação (inciso VI, b e c do art. 73 da LE) da Administração Pública (lato sensu).

[…]

O bem jurídico tutelado pelas condutas vedadas é o princípio da igualdade entre os candidatos. Assim, desnecessário qualquer cotejo com eventual malferimento à lisura, normalidade ou legitimidade do pleito. Basta, apenas, seja afetada a isonomia entre os candidatos; nada mais. Neste sentido, aliás, o próprio caput do art. 73 da LE prescreve que são condutas vedadas porque “tendentes” a afetar a igualdade entre os candidatos. Ou seja, o legislador presume que tais condutas, efetivamente, inclinam-se a desigualar os contendores.

 

Postas essas considerações teóricas quanto aos fatos 3 e 4, o Juízo da 107ª Zona Eleitoral de Santo Augusto julgou improcedente (ID 44837560) a ação manejada, nos seguintes termos:

3º FATO

Assevera a parte autora que dois eleitores, PEDRO PAULO DOS SANTOS e PAULO ROSINEI DUTRA DA SILVA receberam material de construção em troca de votos aos representados.

Como bem apontado pelo Ministério Público Eleitoral em suas alegações finais “em que pese a confissão do eleitor, essa prova não é absoluta e deve ser analisada à luz das demais trazidas ao feito. E, na visão ministerial, há dúvida razoável sobre se a compra de voto, de fato, ocorreu, conclusão a que se chega analisando em especial o depoimento da testemunha Rosane Bernadete Muller Zavaski, que, compromissada, negou a versão de Paulo”.

A prova carreada aos autos não é cabal para condenação dos requeridos.

Explico.

Para comprovar o ilícito, a parte autora traz ao feito o depoimento de duas testemunhas, Paulo Rosinei Dutra da Silva (Tigrinho) e Pedro Paulo dos Santos (Ferrozo).

Ambos alegam que os réus lhe ofereceram material de construção em troca de voto, tendo aceitado a benesse. Informam, ainda, que diante desse fato procuraram Evandro (Mussum), o qual trabalha na coligação autora para “denunciar os requeridos”.

Inicialmente, causa muita estranheza o fato das testemunhas, diante de um delito eleitoral, deixar de comunicar o fato às autoridades competentes (MPE e polícia) e procurar exatamente os integrantes do partido adversário.

Além disso, o depoimento das testemunhas apresenta muitas contradições.

Paulo afirma que nunca comprou na loja Movilar, fato este que contradiz com o depoimento em juízo da proprietária da loja (Rosane), a qual confirma que Paulo comprou em seu estabelecimento, dizendo que tinha dinheiro, pois teria conseguido uma “obra boa”. Refere a testemunha Rosane que após a compra Paulo sumiu da cidade. Ademais, a assinatura no termo de confissão de dívida, apesar da negativa da testemunha Paulo, é muito similar a sua assinatura aposta no caderno de votação e documentos oriundos da Prefeitura de Chiapetta. Acrescente-se o fato de que a testemunha Jonas Eduardo afirma em juízo que contratou Paulo para realização de obras em sua casa, pagando mais de R$ 10.000,00 pelo serviço, fato este que corrobora o depoimento de Rosane.

Pedro Paulo (Ferrozo), em seu depoimento, afirma que no dia da eleição foi de carona no carro de Paulo Rosinei até a votação.

Contudo, Paulo Rosinei afirma que no dia da eleição foi a pé até a votação.

Logo, evidentemente alguém está mentindo.

Quanto aos áudios acostados ao caderno processual, Paulo confirmou em juízo que a voz é sua, mas relatou que foi ameaçado para fazer tal gravação. Informou que um dia, no final da tarde, estava voltando para casa de carro, quando veio um veículo em direção oposta dando sinal de luz. Parou o carro e Catiano Sima teria lhe ameaçado caso não gravasse o áudio.

Da transcrição dos áudios tem-se:

“Boa tarde, nego, tudo tranquilo? Viu neguinho, dá uma falada aí com a gurizada, com o Celço, pra me arrumá mais um dinheiro aí, cara. O Celço aquele dia arrumô uma mixaria só pra mim e pro Ferroso, ai cara, quinhentos pila. Vô passa o número de uma conta, fala com ele aí, vocês fazem a transferência aí. Temo precisando pra comprá comida, cara. O que é duzentos e cinquenta pila pra cada um? Não dá home, tá loco!”.

“Aí nego véio, tranquilo? Chego a passá para ele aí ou não? O que te falei aí.”

Ouvindo os áudios não se percebe que a testemunha Paulo estaria nervosa, com medo. Pelo contrário, a voz de Paulo é tranquila, calma.

Além disso, foge ao senso comum alguém, ao entardecer, parar seu carro quando outro veículo, em sentido oposto, lhe dá sinal de luz. Tal postura contradiz qualquer comportamento minimamente defensivo.

Assim, ante as contradições nos depoimentos prestados pelas testemunhas arroladas pela parte autora, bem como diante do depoimento das testemunhas Rosane e Jonas, da parte ré, as quais contrapõem o relatado pelas testemunhas Paulo e Pedro Paulo, entendo que a prova carreada ao feito não é suficiente para uma condenação.

4º FATO

Alega a parte autora que ANA PAULA ALMEIDA DE LIMA, admitida no serviço público em decorrência da participação de processo seletivo, no qual se inscreveu visando obter vaga no cargo de “monitora escolar”, com carga horária de 20 horas semanais, com a intenção de que cooptar seu voto e de sua família, teve sua carga horária aumentada em 20 horas pelo representado, dobrando, por consequência, também a sua remuneração.

Em resposta, os requeridos asseveram que de fato houve uma intercorrência no registro funcional de Ana Paula Almeida de Lima, mas isso se deu sem o conhecimento e a vontade do representado Eder Luis Both. Sustentam que quando soube da alteração na ficha funcional e dos vencimentos da então servidora, o investigado providenciou imediatamente a abertura de procedimento administrativo para apurar o ocorrido. Afirma que o erro foi corrigido e as providências foram tomadas antes do pleito de 15 de novembro.

Sobre as condutas vedadas aos agentes públicos prescreve a Lei n. 9.504/97:

Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:

[…]

V - nomear, contratar ou de qualquer forma admitir, demitir sem justa causa, suprimir ou readaptar vantagens ou por outros meios dificultar ou impedir o exercício funcional e, ainda, ex officio, remover, transferir ou exonerar servidor público, na circunscrição do pleito, nos três meses que o antecedem e até a posse dos eleitos, sob pena de nulidade de pleno direito, ressalvados:

a) a nomeação ou exoneração de cargos em comissão e designação ou dispensa de funções de confiança;

b) a nomeação para cargos do Poder Judiciário, do Ministério Público, dos Tribunais ou Conselhos de Contas e dos órgãos da Presidência da República;

c) a nomeação dos aprovados em concursos públicos homologados até o início daquele prazo;

d) a nomeação ou contratação necessária à instalação ou ao funcionamento inadiável de serviços públicos essenciais, com prévia e expressa autorização do Chefe do Poder Executivo;

e) a transferência ou remoção ex officio de militares, policiais civis e de agentes penitenciários;

[...]

VIII - fazer, na circunscrição do pleito, revisão geral da remuneração dos servidores públicos que exceda a recomposição da perda de seu poder aquisitivo ao longo do ano da eleição, a partir do início do prazo estabelecido no art. 7º desta Lei e até a posse dos eleitos.

O Tribunal Superior Eleitoral entende que:

“a configuração das condutas vedadas prescritas no art. 73 da Lei nº 9.504/97 se dá com a mera prática de atos, desde que esses se subsumam às hipóteses ali elencadas, porque tais condutas, por presunção legal, são tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre os candidatos no pleito eleitoral, sendo desnecessário comprovar-lhes a potencialidade lesiva.” (REsp nº 45.060, Acórdão de 26/09/2013, relatora Ministra Laurita Hilário Vaz).

Assim, as condutas vedadas dispensam comprovação de dolo ou culpa do agente, sendo cláusulas de responsabilidade objetiva. Torna-se, portanto, desnecessária a análise da potencialidade lesiva para influenciar o pleito (Respe TSE nº 38704, rel. Min. Edson Fachin de 13.8.2019). O objetivo é impedir que atos desses agentes possam afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais e influenciar no resultado das eleições. Desse modo, é fundamental o respeito à intenção da lei e do legislador.

No caso em apreço é possível verificar que a remuneração de Ana Paula teve aumento no mês de outubro/2020, em razão de aumento de sua carga horária.

Não há provas de que houve uma revisão geral da remuneração dos servidores municipais ou mesmo outro caso semelhante ao da servidora Ana Paula.

Pelos documentos carreados à contestação denota-se que no dia 05/11/2020 o Prefeito, ora investigado, foi comunicado de um possível erro na folha de pagamento da referida servidora. Em 06/11/2020, antes do pleito e da propositura da presente ação, o requerido Eder, pela Portaria n. 618, determinou a instauração de Sindicância Disciplinar para apuração do fato e correção imediata dos valores.

A Sindicância não conseguiu apurar se a falha decorreu de inserção de dados por ação humana ou falha do sistema. A Comissão processante constatou, ainda, que fatos isolados como o de Ana Paula já haviam ocorrido antes.

Importante destacar que, ao contrário do que alega a parte autora, o contrato inicial da servidora Ana Paula era de 40 horas semanais, tendo sido reduzido para 20 horas semanais em 17/02/2020, conforme documentos anexados pela defesa.

Na folha de pagamento da servidora em questão, referente ao mês de outubro de 2020, consta 30 horas semanais, com aumento do valor da remuneração.

É certo que a conduta vedada prevista pela lei eleitoral dispensa prova de culpa ou dolo do agente público. Contudo, entendo que o caso em liça tem particularidades que devem ser levadas em consideração.

A parte ré comprovou que antes mesmo da eleição, ao tomar conhecimento do fato, procedeu a sua regularização, determinando a correção e investigação acerca do ocorrido. Além disso, existem documentos nos autos que demonstram que erros pontuais como esse ocorreram outras vezes. Acrescente-se, ainda, o fato de que a referida servidora foi inicialmente contratada por uma carga horária superior ao que vinha exercendo, podendo gerar erro no sistema.

Das provas colacionadas ao feito não há provas suficientes acerca da prática da conduta vedada pela lei eleitoral.

 

Sobre o conjunto probatório, o ilustre Procurador Regional Eleitoral manifestou-se da seguinte forma (ID 44898943):

A testemunha Paulo Rosinei Dutra da Silva, também conhecido como “Tigrinho”, prestou compromisso. Em seu depoimento (ID 44837470 e 44837471), mencionou que é pedreiro. Indagado pela defesa da parte autora sobre um termo de confissão de dívida da Loja Movilar que lhe foi mostrado em audiência, respondeu que a assinatura aposta no referido documento não era sua. Referiu que nunca comprou a prazo na Loja Movilar, salientando que, às vezes, retira material que é comprado por seus clientes, mas que particularmente nunca realizou compras na referida loja. Asseverou que, uma semana antes das eleições, foi procurado pelos representados ÉDER BORTH e JORGE ROCHINHESKI, os quais perguntaram o que o depoente precisava, e que deveria prometer seu voto em troca de material de construção. Afirmou que recebeu tijolo maciço, tijolo furado, areia, ferro, cal e cimento, mas que deveria colocar adesivos dos referidos candidatos na sua casa, no entanto não o fez. Mencionou que a Empresa Movilar entregou os materiais em sua casa e que acha errado o que os candidatos fizeram, por isso os denunciou, embora tenha aceitado os materiais. Ressaltou que gravou o vídeo e o entregou para Evandro (Mussum), pois ele trabalhava na coligação de Celso, com o intuito de “passar pra frente o vídeo”; salientando que provavelmente as outras pessoas de seu bairro também receberam materiais de construção, pois todos estavam construindo naquela época e que “hoje é difícil ver” construções no local. Disse que Pedro Paulo dos Santos provavelmente recebeu material, pois viu o caminhão da Loja Movilar fazendo entregas na residência dele, mas que nunca viu ÉDER e JORGE conversando com Pedro. Questionado pela defesa da parte ré acerca dos fatos, referiu que a loja Movilar nunca lhe cobrou alguma dívida, pois não efetuou qualquer compra na mesma. Confirmou que, uns três dias depois que foi entregue o material em sua casa, denunciou para Evandro que gravou o vídeo, salientando que recebeu o material antes da eleição. Asseverou que ÉDER e JORGE chegaram em sua casa depois do horário do expediente, aproximadamente por volta das 18 horas, e que a conversa foi presenciada por sua esposa. Afirmou que foi ÉDER quem falou “nós te damos material pra votar pra nós”, e que recebeu 7 sacos de cimento, 4 barras de ferro, 500 tijolos furados, 1000 tijolos maciços, 4 sacas de cal e 1 barra de cano. Referiu que o vídeo foi gravado na sua casa por Evandro e que fez a gravação por livre e espontânea vontade. Mencionou que o material recebido foi utilizado na construção de sua casa, e que sabia que estaria se comprometendo ao denunciar os candidatos representados. Afirmou que, no dia da eleição, foi a pé até a votação.

Pedro Paulo dos Santos, também conhecido como “Ferrozo”, prestou compromisso. Em seu depoimento (ID 44837473 e 44837474) referiu que é diarista.

Questionado acerca da gravação de áudio/vídeo que fez para denunciar uma compra de votos, disse que estavam oferecendo material de construção para vários eleitores e que aceitou também. Asseverou que foi o candidato JORGE quem lhe ofereceu e que nunca ficou devendo nada na Loja Movilar, tampouco lhe cobraram alguma dívida. Afirmou que fez a gravação para ter prova e mostrar a verdade, e que entregou a gravação para Evandro (Mussum), para “ver se ia colocar pra frente”, destacando que muitas pessoas estavam construindo na época das eleições e depois cessou. Questionado quando e onde o vídeo foi gravado e quais foram os materiais entregues, respondeu que recebeu tijolo, areia, pedra, brita, barras de ferro, madeira, cimento, cerâmica e cano de PVC, com os quais construiu uma varanda (puxado) em sua residência, e que os materiais chegaram em sua residência entre 3 ou 4 dias antes das eleições, enfatizando que gravou o vídeo no seu local de trabalho, na granja de Jarbas Uhtra. Perguntado sobre Evandro, disse que acha que ele é cabo eleitoral de Celso. Confirmou que não comprou material de construção na loja Movilar, tampouco sua esposa, e que, no dia da eleição, foi de carona no carro de Paulo Rosinei até a votação.

Vê-se, portanto, que Paulo Rosinei e Pedro Paulo afirmaram categoricamente que os candidatos investigados lhes teriam oferecido material de construção em troca de voto. No entanto, no lugar de procurar os órgãos públicos competentes (Justiça Eleitoral, MPE ou a Polícia Civil) para denunciar a suposta compra de voto, cada um deles, por livre e espontânea vontade, resolveu gravar um áudio/vídeo e entregar para Evandro (Mussum), que, por sua vez, trabalhou para a coligação autora como cabo eleitoral.

Paulo e Pedro asseveram também em juízo que nunca compraram material de construção na Loja Movilar, afirmação essa que vai de encontro ao depoimento da testemunha Rosane Bernadete Muller Zavaski e aos documentos juntados aos autos.

Com efeito, Rosane Bernadete Muller Zavaski, testemunha arrolada pela defesa dos representados, prestou compromisso. Em seu depoimento (ID 44837476) referiu que é comerciante e proprietária da Loja Movilar, afirmando que tem contrato com o município por meio de processo de licitação. Questionada se os candidatos ÉDER e JORGE foram a sua loja no período eleitoral, disse que não e que sequer eles apareceram na loja para pedir voto, não vendeu material de construção para eles e que ninguém comprou nada em nome de qualquer candidato.

Indagada acerca de uma nota fiscal que lhe foi apresentada em audiência, a qual foi emitida no dia 01.10.2021, no valor de R$ 1.976,08, respondeu que se refere a uma compra realizada por Paulo Rosinei, que é pedreiro e o conhece há 3 anos, salientando que foi ele quem assinou o recibo de entrega do material na residência dele. Afirmou que, em março, Paulo Rosinei efetuou uma compra de materiais no valor de R$ 200,00, sendo que, posteriormente, ele ligou para a depoente dizendo que havia conseguido uma “obra boa” e que por isso poderia adquirir os materiais solicitados e, inclusive, iria acertar também os R$ 200,00. Mencionou que a compra não foi paga e que Paulo Rosinei “sumiu da cidade”, e soube que ele teria ido para o Mato Grosso. Perguntada se Pedro Paulo dos Santos (Ferrozo) fez alguma compra na Loja Movilar, respondeu que a esposa dele (Angélica) foi até a loja e efetuou uma compra de materiais de construção dizendo para a depoente que Pedro Paulo iria acertar posteriormente. Enfatizou que tem certeza que Angélica assinou o termo de confissão de dívida relativa à compra, pois estava presente no momento. Mencionou que não tem conhecimento de que as compras realizadas em sua loja têm relação com compra de votos, confirmando que as compras foram realizadas particularmente por Paulo e Pedro Paulo. Referiu que, até a data da audiência, não houve adimplemento da dívida, e que em nenhum momento foi referido que JORGE ou ÉDER pagariam as contas.

A testemunha Jonas Eduardo de Oliveira Schamadecke, arrolada pela defesa dos representados, prestou compromisso. Em seu depoimento (ID 44837465), referiu que é fornecedor de canos de ar e possui contrato de licitação com a prefeitura. Afirmou que contratou Paulo Rosinei Dutra (Tigrinho) para fazer serviços/obras em sua casa, salientando que pagou integralmente mais de R$ 10 mil reais, mas que a obra nunca foi terminada e que Paulo (Tigrinho) precisava de dinheiro para reformar a casa dele. Mencionou que fez apenas contrato verbal com Paulo.

De outra senda, após a audiência de instrução, os representados juntaram aos autos duas mensagens de áudio gravadas pela testemunha Paulo Rosinei provavelmente enviadas para Evandro (Mussum), ao qual chama no primeiro áudio de “neguinho”, e no segundo de “nego”. Vejamos o teor dos áudios:

“Boa tarde, nego, tudo tranquilo? Viu neguinho, dá uma falada aí com a gurizada, com o Celço, pra me arrumá mais um dinheiro aí, cara. O Celço aquele dia arrumô uma mixaria só pra mim e pro Ferroso, ai cara, quinhentos pila. Vô passa o número de uma conta, fala com ele aí, vocês fazem a transferência aí. Temo precisando pra comprá comida, cara. O que é duzentos e cinquenta pila pra cada um? Não dá home, tá loco!”. (ID 44837497)

“Aí nego véio, tranquilo? Chego a passá para ele aí ou não? O que te falei aí.” (ID 44837498)

Tendo em vista o teor das referidas mensagens e o fato de Paulo Rosinei Dutra da Silva (Tigrinho) ter declarado em seu depoimento que os investigados lhe ofereceram material de construção em troca de votos, o Ministério Público Eleitoral postulou a reinquirição da referida testemunha, sendo acolhido pela magistrada.

[…]

Ainda foram juntados aos autos diversos documentos, dentre eles, no que interessa ao presente tópico, cópia autenticada do Termo de Confissão de Dívida emitido no dia 22.09.2020, em nome de Ferrozo (Pedro Paulo dos Santos), no valor de R$ 2.874,00, pela MOVILAR – Comércio de Móveis MZ Ltda., e assinado por Angélica R. V. de Aguiar (ID 44837414, fl. 1 do PDF); cópia autenticada do Termo de Confissão de Dívida emitido no dia 01.10.2020, em nome de Paulo da Silva (Paulo Rosinei Dutra da Silva), no valor de R$ 1.966,00, pela MOVILAR, e assinado por Paulo da Silva (ID 44837414, fl. 2 do PDF); e o caderno de votação em que consta a assinatura do eleitor Paulo Rosinei Dutra da Silva (ID 44837510).

Como se vê, a prova da compra de votos é meramente testemunhal, sendo que aos testemunhos de acusação são contrapostos os testemunhos de defesa.

Em relação a todas as testemunhas há elementos para que suas declarações sejam recebidas com reservas. Em relação às testemunhas de defesa acima referidas, há o fato de serem fornecedores da Prefeitura, cujos gestores atuais são os investigados. Já no tocante às testemunhas de acusação, tem-se que estranha o fato de não haverem levado ao conhecimento das autoridades a denúncia de suposta compra de votos, mas, mais importante é o possível pagamento feito às testemunhas por parte do candidato da coligação investigante.

Neste ponto, houve confirmação quanto à autoria do áudio que foi trazido, em que Paulo Rosinei pede mais dinheiro para Celço, sendo que, como referido pela Magistrada, não é crível a versão da coação trazida para justificar o áudio.

[…]

E no confronto com a prova documental acostada é possível ver semelhança entre a assinatura aposta no Termo de Confissão de Dívida emitido no dia 01.10.2020, supostamente assinado por Paulo Rosinei Dutra da Silva, no valor de R$ 1.966,00, pela MOVILAR (ID 44837414, fl. 2 do PDF) e a assinatura de Paulo Rosinei no caderno de votação (ID 44837510). Veja-se que há semelhança na grafia das palavras “Paulo” e “Silva”, sendo que a única diferença é que, no caderno de votação, foram incluídas as iniciais maiúscula de Rosinei e Dutra, o que não constou no Termo de Confissão de Dívida. Nesse ponto, é normal que, em documentos oficiais, como é o caso do caderno de votação, a assinatura seja completa, o mesmo não ocorrendo em documento mais informais como é o referido termo.

Portanto, não se tem prova robusta da compra de votos. Restam dúvidas fundadas quanto à existência da captação ilícita de sufrágio no presente caso.

Assim, diante do princípio in dubio pro suffragium, aplicável para as ações desconstitutivas de diploma ou mandato, ante a dúvida fundada quanto à prática do ilícito eleitoral, a manutenção da sentença nesse ponto específico é medida que se impõe.

[…]

Inicialmente, verifica-se que os investigados não negam que a servidora Ana Paula Almeida de Lima teve sua remuneração aumentada no mês de outubro, decorrente do aumento de sua carga horária.

De pronto, é possível afastar-se a incidência de conduta vedada, vez que o aumento de carga horária em período eleitoral não encontra previsão de proibição no art. 73, inc. V, da Lei das Eleições, que elenca outras condutas proibidas relacionadas aos servidores públicos.

Vale destacar também que o aumento da carga horária da servidora Ana Paula, que, consequentemente, refletiu na sua remuneração no mês de outubro foi um caso isolado, não havendo em se falar em revisão geral da remuneração dos servidores municipais de Chiapetta, afastando-se também a conduta vedada prevista no inc. VIII do art. 73 da Lei das Eleições.

Sob o prisma do abuso de poder político, teria de haver prova de desvio de finalidade na prática do ato. É dizer, que houve o aumento da carga horária da servidora com finalidade eleitoral.

No entanto, os investigados comprovaram que o pagamento equivocado à servidora começou a ser apurada por meio de Sindicância instaurada pela Portaria nº 618, de 06 de novembro de 2020, subscrita pelo Prefeito Municipal EDER LUIS BOTH (ID 44837410, fl. 32 do PDF), ou seja, antes da data em que a coligação autora ajuizou a presente demanda.

Verifica-se do Relatório da Comissão de Sindicância, que foram constatadas falhas semelhantes em outros anos (2018 e 2019).

Ademais, foi acolhida a conclusão do relatório da Sindicância, tendo o Prefeito EDER assinado a Portaria nº 678/20, de 04 de dezembro de 2020, determinando a abertura de Processo Administrativo Especial – PAE (ID 44837410, fl. 1 do PDF), para assegurar o ressarcimento aos cofres públicos dos valores pagos.

Desta forma, não há comprovação do desvio de finalidade, podendo ter havido efetivamente equívoco já existente em anos anteriores e isso é reforçado por se tratar de fato isolado. De regra, quando ocorre aumento de carga horária e remuneração de servidores com finalidade eleitoral, isso não se dá com um único servidor.

[…]

Dentro desse contexto, em que pese a pequena diferença de 16 votos entre o candidato da situação EDER BOTH (PP), que foi eleito com 1.560 votos (50,26%) contra 1.544 votos (49,74%) obtidos pelo candidato Celço Beier (PSDB, que integrou a coligação autora), tem-se que não há provas robustas de que os investigados praticaram ou foram beneficiados por abuso de poder político e/ou conduta vedada aos agentes públicos.

Nesse sentido, a vontade do eleitor expressa nas urnas configura manifestação do princípio democrático, basilar na República Federativa do Brasil e pressuposto do Estado Democrático de Direito. Dessa forma, as sanções de cassação do diploma e inelegibilidade previstas no inc. XIV do art. 22 da LC 64/90 para os casos de abuso de poder devem consistir em exceção, ultima ratio no processo eleitoral, e somente diante da ocorrência de condutas graves, e plenamente comprovadas, viáveis a comprometer a normalidade e legitimidade do sufrágio.

Desse modo, por todos os fundamentos trazidos, a manutenção da sentença que julgou improcedente a presente ação de investigação judicial eleitoral é medida que se impõe. (Grifo nosso)

 

Assim, em relação ao 3º fato, ou seja, entrega de material de construção aos eleitores PEDRO PAULO DOS SANTOS e PAULO ROSINEI DUTRA DA SILVA em troca de voto, diante das contradições nos depoimentos prestados pelas testemunhas arroladas pela parte autora, bem como diante do depoimento das testemunhas Rosane e Jonas, da parte ré, as quais contrapõem o relatado pelas testemunhas Paulo e Pedro Paulo, tenho que a prova carreada ao feito não é suficiente para a condenação.

Do mesmo modo, no que refere ao 4º fato, aumento de 20 horas na carga horária e na remuneração da servidora ANA PAULA ALMEIDA DE LIMA, admitida no serviço público em decorrência da participação em processo seletivo, com a suposta intenção de cooptar seu voto e de sua família, o fato não se amolda aos tipos previstos como condutas vedadas e, ademais, não há demonstração de desvio de finalidade na conduta, sendo fato isolado, envolvendo uma única servidora.

Dessa forma, inexistindo prova dos ilícitos, deve ser mantida a sentença de improcedência, nos termos dos precedentes do TSE:

Eleições 2016. Representação. Captação ilícita de sufrágio. Art. 41-A da Lei 9.504/97. Candidato a vereador eleito. Condenação. Gravação ambiental. Prova robusta. Ausência.

1. A tese de ilicitude da prova, por impossibilidade de identificar se a gravação foi realizada em ambiente público, não foi expressamente examinada pelo Tribunal a quo, ainda que tenham sido opostos embargos de declaração pelo candidato a vereador. Nada obstante a ausência de enfrentamento do tema pela Corte de origem, não foi alegada ofensa ao art. 275 do Código, razão pela qual incide o óbice do verbete sumular 72 desta Corte Superior.

2. Para afastar a afirmação do Tribunal a quo no sentido de que o diálogo entabulado na gravação ambiental se deu entre o recorrente e envolvia efetivamente um eleitor, seria necessário o reexame do acervo fático-probatório, providência vedada nesta instância especial, a teor do verbete sumular 24 do TSE.

3. O TRE/MG concluiu pela configuração da prática de captação ilícita de sufrágio, embasando-se, além do depoimento pessoal do candidato ao reconhecer sua voz (mas negando a prática ilícita), em uma única prova consistente em gravação ambiental, sem efetivamente declinar as circunstâncias da produção desse elemento probatório e destacando pequeno trecho de diálogo, de teor vago sobre eventual cooptação de voto, do qual não é possível inferir, com segurança, a existência da conduta ilícita.

4. ‘A configuração da captação ilícita de votos possui como consequência inexorável a grave pena da cassação do diploma, pelo que se exige para o seu reconhecimento conjunto probatório robusto, apto a demonstrar, indene de dúvidas, a ocorrência do ilícito e a participação ou anuência dos candidatos beneficiários com a prática.’ (AgR-RO 2240-81, rel. Min. Rosa Weber, DJe de 6.8.2018).

Recurso especial provido.

(Recurso Especial Eleitoral n. 69233, Acórdão, Relator: Min. Admar Gonzaga, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônica, Data 28.05.2019.) (Grifo nosso)

 

ELEIÇÕES 2018. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ORDINÁRIO. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO. DEPUTADO FEDERAL. SUPOSTO ABUSO DE PODER ECONÔMICO. PROVA ROBUSTA E GRAVIDADE DOS FATOS. INEXISTÊNCIA. DESPROVIMENTO. 1. Inexiste ofensa ao art. 36, § 7º do RITSE, amparada a decisão na legislação aplicável à espécie e na jurisprudência deste Tribunal. 2. Imprescindível para a configuração do abuso de poder prova inconteste e contundente da ocorrência do ilícito eleitoral, inviabilizada qualquer pretensão articulada com respaldo em conjecturas e presunções. Precedentes. 3. Além disso, a quantia de R$ 10.300,00 (dez mil e trezentos reais), ainda que utilizada com o escopo de obter apoio político, é incapaz de afetar os bens jurídicos da normalidade e legitimidade, bem como da isonomia entre os candidatos, considerando o contexto de eleições gerais para o cargo de Deputado Federal, com abrangência em todo o estado da federação.4. Agravo Regimental desprovido.

(RO n. 060000603, Acórdão, Relator: Ministro ALEXANDRE DE MORAES, DJE de 02.02.2021.) (Grifo nosso)

 

Por esses motivos, na esteira do posicionamento da Procuradoria Regional Eleitoral, uma vez constatada a escassez e a precariedade dos elementos probatórios coligidos aos autos, deve ser mantido o juízo de improcedência da demanda com relação à prática de captação ilícita de sufrágio e abuso de poder econômico e político pelos demandados.

Ante o exposto, VOTO pela rejeição da matéria preliminar e, no mérito, pelo desprovimento do recurso.