ED no(a) REl - 0600803-21.2020.6.21.0007 - Voto Relator(a) - Sessão: 10/02/2022 às 10:00

VOTO

O recurso é regular, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, os embargos de declaração servem para afastar obscuridade, omissão, contradição ou erro material, nos termos do art. 275, incs. I e II, do Código Eleitoral e art. 1.022 do CPC.

Por sua vez, os embargantes DIVALDO VIEIRA LARA e OUTROS alegam, em síntese, obscuridade diante da falta de análise das preliminares alegadas na fase de saneamento processual e da necessidade de a Corte determinar a observância do art. 44 da Resolução TSE n. 23.608/19. Requerem o conhecimento e provimento do recurso.

Já o embargante CARLOS ADRIANO SILVEIRA CARNEIRO refere que houve omissão na decisão por não considerar matéria amplamente debatida nos autos, corroborada pelas provas colhidas, e por não ter analisado sua alegação de ilegitimidade para figurar no polo passivo da AIJE, arguida em contestação.

Adianto que não assiste razão aos embargantes.

A matéria referente à desnecessidade de formação de litisconsórcio necessário entre os candidatos beneficiários e os autores dos fatos tidos como ilícitos, no caso, foi analisada no voto condutor do julgado, de minha relatoria, nos seguintes termos:

(…)

Inicialmente, verifica-se que os fatos narrados são independentes entre si.

Assim, a controvérsia sobre a necessidade de litisconsórcio passivo entre o agente público responsável e o candidato beneficiado pelo ilícito, em sede de Ação de Investigação Judicial Eleitoral por abuso de poder político ou de autoridade e condutas vedadas, residiria apenas sobre os 3 primeiros fatos narrados, vinculados à publicidade institucional em período vedado.

No tocante aos demais fatos, todos os envolvidos integrariam o polo passivo da ação.

Nesse sentido, com base apenas nessa verificação, adianto que a extinção do feito na origem foi precipitada.

O litisconsórcio passivo necessário possui previsão no art. 114 do CPC, aplicável subsidiariamente à seara eleitoral:

Art. 114. O litisconsórcio será necessário por disposição de lei ou quando, pela natureza da relação jurídica controvertida, a eficácia da sentença depender da citação de todos que devam ser litisconsortes.

In casu, inexistindo previsão legal sobre a formação de litisconsórcio, importa determinar a natureza da relação jurídica controvertida e a decorrente necessidade de uniformidade na decisão.

Conforme se verifica nos autos, a sentença de extinção foi proferida após a apresentação das contrarrazões, sem que houvesse a instrução do processo.

Nesse caso, a aferição da existência/natureza da relação controvertida entre os Secretários Municipais e o Prefeito será realizada a partir das alegações e provas trazidas com a inicial e dos argumentos sustentados em contestação.

Na hipótese, não foi possível dissociar a possível atuação dos Secretários Municipais nas publicidades institucionais em período vedado, consistentes nos fatos 1, 2 e 3, e o Prefeito Divaldo Lara.

Por conseguinte, levando-se em consideração a competência do prefeito como chefe da Administração Pública municipal, e o que ordinariamente ocorre na administração de um município como Bagé, com pouco mais de 100.000 mil habitantes, resta evidente que a alegada atuação dos Secretários Municipais decorreu da própria gestão do chefe do Poder Executivo, atuando como longa manus deste.

Ainda, na contestação apresentada pelo Prefeito Divaldo Lara, o recorrido sequer conseguiu indicar de forma clara e objetiva qual Secretário Municipal seria o responsável pelas condutas descritas nos fatos 1, 2 e 3.

Assim, ao contrário do alegado nas contrarrazões, não é possível reconhecer a atuação isolada dos Secretários Municipais, à revelia do Prefeito de Bagé, presumindo o desconhecimento do chefe do Poder Executivo a respeito das publicidades institucionais espalhadas nas paradas de ônibus da cidade ou da frota de ônibus escolares expostos em via pública de uma das praças centrais do Município de Bagé, localizada a uma quadra da prefeitura e próxima ao comitê de campanha, durante a campanha para as eleições de 2020.

Tal tese até poderia ter algum peso, se estivéssemos falando de cidades de grande porte, como Porto Alegre, por exemplo.

Nesse sentido, partindo da premissa de que a atuação dos Secretários Municipais teria ocorrido, em tese, como mandatários do Prefeito, dispensável se mostra a formação de litisconsórcio passivo necessário, na linha da jurisprudência do TSE:

(…) "na espécie, referido agente público não agiu de forma autônoma e independente, mas, sim, em cumprimento da ordem de seu superior, ou seja, simplesmente como mandatário da administração municipal, cujo prefeito figurou como investigado", aplicável o entendimento do TSE de que "para os fins do art. 73, § 10, da Lei 9.504/97, há que se distinguir as situações em que o agente público que executa a conduta vedada atua com independência em relação ao candidato beneficiário, fazendo-se obrigatória a formação do litisconsórcio, e aquelas em que ele atua como simples mandatário, nas quais o litisconsórcio não é indispensável à validade do processo" (AgR-REspe nº 31108/PR, Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJE de 16/09/2014).

Ação de investigação judicial eleitoral. Prefeito e vice-prefeito. [...] Litisconsórcio passivo necessário. Secretários municipais. Meros mandatários. [...] Massiva contratação de servidores temporários no ano eleitoral. Grande número de contratações na véspera do início do período vedado. [...] 3. Na linha da jurisprudência deste Tribunal Superior, é desnecessária a formação de litisconsórcio entre candidato beneficiário e agente executor da conduta vedada, quando atua na qualidade de simples mandatário. Precedentes. 4. No caso dos autos, os Secretários Municipais [...] agiram na condição de longa manus na realização das contratações temporárias, sendo desnecessário que fossem chamados a compor o polo passivo da lide. [...]” (Ac. de 8.10.2019 no AgR-REspe nº 41514, rel. Min. Edson Fachin.)

Cumpre referir que, ainda que não fosse esse o entendimento, e se reconhecesse a atuação dos Secretários Municipais de forma independente, consoante nova jurisprudência do TSE assentada no RO n. 0603030-63/DF, aplicável a partir das eleições de 2018, houve a superação da jurisprudência firmada para as eleições de 2016, não sendo mais indispensável a formação de litisconsórcio passivo necessário entre candidato beneficiado e autor da conduta ilícita em Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE) por abuso do poder político.

Verifica-se que o acórdão tratou de forma expressa a desnecessidade do litisconsórcio passivo necessário que gerou a extinção da AIJE por decadência do direito de ação.

Assim, quanto ao ponto, o embargante CARLOS ADRIANO SILVEIRA CARNEIRO busca a rediscussão do assunto afeto ao acerto ou desacerto da decisão (mérito), pretensão que não se coaduna com a finalidade da via processual eleita.

Ressalto que a consequência jurídica da decisão embargada consistiu na cassação da sentença proferida para um novo julgamento da lide, precedido da abertura e conclusão da fase instrutória.

Nesse sentido, não prospera a alegação dos embargantes DIVALDO LARA E OUTROS a respeito da obscuridade pela falta de análise das preliminares alegadas na fase de saneamento processual e pela necessidade de a Corte determinar a observância do art. 44 da Resolução TSE n. 23.608/19.

Isso porque, primeiramente, a sentença não adentrou na análise das preliminares, extinguindo o feito sem resolução do mérito.

Segundo, porque, diante da imposição da reabertura da fase instrutória e de novo julgamento, ocorrerá a reanálise do caso pelo magistrado de primeiro grau.

Assim, não cabe à Corte se manifestar sobre preliminares que não foram objeto de decisão e que deverão, de antemão, ser examinadas na instância de origem, sob pena de supressão de instância.

Da mesma forma, não compete a este Regional frisar ao magistrado de primeiro grau a observância ao normativo eleitoral, pois isso é intrínseco à atividade judicante.

Destaco que o magistrado tem independência dentro da sua jurisdição para aplicar a legislação que entender cabível ao caso concreto, não sendo o caso dos autos a obrigatória vinculação à previsão contida em súmula vinculante, ou decisões de mérito do Supremo Tribunal Federal nas ações diretas de inconstitucionalidade e nas declaratórias de constitucionalidade, consoante art. 102, § 2º, e 103-A da CF, por exemplo.

Por derradeiro, no tocante à alegação do embargante CARLOS ADRIANO SILVEIRA CARNEIRO quanto à ausência de apreciação, no acórdão, da tese de ilegitimidade aventada em sede de contestação, igualmente está desprovida de fundamento.

Compulsando os autos, embora reconhecendo tratar-se de matéria de ordem pública que pode ser declarada de ofício, friso que esta não foi, sequer, objeto da sentença, do recurso ou das próprias contrarrazões ofertadas pelo embargante.

Nesse sentido, a tese de omissão no julgado sob este fundamento beira a má-fé processual, fato que não se coaduna com os deveres de partes e procuradores, nos termos do art. 77 do CPC.

Lembro que, se aquele interpuser recurso com o intuito manifestamente protelatório, será condenado à multa por litigância de má-fé, no valor de até 2 salários mínimos, consoante o art. 80, inc. VII, do CPC, c/c o 275, § 6º, do CE.

No tocante ao prequestionamento da matéria indicada nos embargos, para fins de interposição de recurso perante as instâncias superiores, ressalto que o primordial para o conhecimento dos recursos especial e extraordinário é o enfrentamento da questão jurídica discutida nos autos, o que ocorreu adequadamente no caso em tela.

Cumpre referir que o art. 1.025 do CPC adotou o prequestionamento ficto, tendo em vista que assim dispõe: "consideram-se incluídos no acórdão os elementos que a embargante suscitou, para fins de pré-questionamento, ainda que os embargos de declaração sejam inadmitidos ou rejeitados, caso o tribunal superior considere existentes erro, omissão, contradição ou obscuridade".

 

Ante o exposto, VOTO pela rejeição dos embargos de declaração.