ED no(a) REl - 0600461-30.2020.6.21.0065 - Voto Relator(a) - Sessão: 09/02/2022 às 14:00

VOTO

O recurso é regular, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, os embargos de declaração servem para afastar obscuridade, omissão, contradição ou erro material, nos termos do art. 275, incs. I e II, do Código Eleitoral e art. 1.022 do CPC.

Por sua vez, o embargante sustenta, em síntese, que houve omissão no acórdão pela falta de análise adequada do art. 96 da Lei das Eleições e art. 17, § 1º, da CF.

Adianto que não assiste razão ao embargante.

A matéria foi analisada no voto condutor do julgado, de relatoria do Desembargador Eleitoral Miguel Antonio Silveira Ramos, nos seguintes termos:

(…)

Em manifestação (ID 44377033), o PP alega que o entendimento da Corte, caso seja mantido, viola tanto o art. 17, § 1º, da CF – redação dada pela EC n. 97/17 – como o art. 96 da LE, além de criar limitações acerca da legitimidade ativa para propositura de ação não prevista em lei. Assevera que, com o fim da possibilidade das coligações para os pleitos proporcionais, se impõe a alteração do entendimento jurisprudencial acerca da legitimidade ativa para as demandas eleitorais, uma vez que, sendo os partidos políticos obrigados a concorrer isoladamente na eleição proporcional, deverão ter legitimidade ativa de modo isolado para a propositura de representações durante o pleito. Sustenta que o simples fato de a representação abordar questão relacionada ao pleito majoritário não pode ser considerado um impeditivo para a legitimidade ativa da agremiação, pois, se a legislação assim não o prevê, não há porque o intérprete delimitar dessa forma, restringindo o direito de fiscalização do pleito. Colaciona jurisprudência do TSE autorizando candidato a cargo proporcional a impugnar registro de candidatura de candidato a cargo majoritário. Aduz que o caso em questão é análogo. Suscita a necessidade de coerência e integridade da jurisprudência, prevista expressamente no art. 926 do CPC. Defende que a única restrição à legitimidade para as ações eleitorais, no âmbito das instruções normativas que regeram as eleições municipais de 2020 – já na vigência da EC n. 97/17 –, deu-se no ambiente das pesquisas eleitorais. Alega a inaplicabilidade do art. 6º, § 4º, da LE ao presente caso, uma vez que se trata de norma específica que, com o advento da EC n. 97/17, é aplicável apenas aos pleitos majoritários. Afirma que o TSE, recentemente, entendeu pela possibilidade de coligação majoritária ser parte legítima para impugnar registro de candidatura formulado para disputa a cargo do sistema proporcional. Assim, sustenta que, por coerência, a legitimidade ativa seja reconhecida neste caso. Ao final, requer o reconhecimento da legitimidade do PROGRESSISTAS – PP – DIRETÓRIO MUNICIPAL DE GRAMADO para propor representação por propaganda irregular, ainda que tencione se insurgir contra questões do pleito majoritário.

(...)

Anoto que a presente representação diz respeito à suposta propaganda eleitoral negativa relacionada ao pleito majoritário, pois teria sido promovida pelo ora recorrente em desfavor do candidato a prefeito Nestor Tissot.

Restou constatado, de fato, após pesquisa realizada no sistema eletrônico do TSE de divulgação de candidaturas e contas eleitorais, https://divulgacandcontas.tse.jus.br/divulga/#/candidato/2020/2030402020/86819/210001145776, que o PROGRESSISTAS (PP) DE GRAMADO integrou a coligação UPG – União por Gramado (PP, PTB, PSC e PSL) para as eleições majoritárias do pleito de 2020.

Pois bem.

Adianto que as razões expostas pela agremiação em sua manifestação não são capazes de afastar a ilegitimidade aferida.

Isso porque a redação dada pela Emenda Constitucional n. 97/17 ao § 7º do art. 17 da CF somente vedou a realização de coligação pelos partidos políticos nas eleições proporcionais, mantendo-se íntegras as disposições legislativas acerca da possibilidade da sua constituição nas eleições majoritárias, consoante os §§ 1º e 4º do art. 6º da Lei n. 9.504/97.

Ainda, as jurisprudências colacionadas pelo partido em nada se assemelham ao caso em questão.

Dessa forma, a preliminar arguida merece acolhimento, uma vez que, nos termos do disposto no art. 6º, § 1º, da Lei n. 9.504/97, a coligação deve funcionar como um só partido no relacionamento com a Justiça Eleitoral e no trato dos interesses interpartidários, verbis:

 

Art. 6º É facultado aos partidos políticos, dentro da mesma circunscrição, celebrar coligações para eleição majoritária, proporcional, ou para ambas, podendo, neste último caso, formar-se mais de uma coligação para a eleição proporcional dentre os partidos que integram a coligação para o pleito majoritário.

§ 1º A coligação terá denominação própria, que poderá ser a junção de todas as siglas dos partidos que a integram, sendo a ela atribuídas as prerrogativas e obrigações de partido político no que se refere ao processo eleitoral, e devendo funcionar como um só partido no relacionamento com a Justiça Eleitoral e no trato dos interesses interpartidários.

 

O mesmo art. 6º, em seu § 4º, o qual foi incluído pela Lei n. 12.034/09, é expresso em determinar que, quando coligado, o partido político detém legitimidade para atuar de forma isolada perante a Justiça Eleitoral exclusivamente para questionar a validade da própria coligação:

 

Art 6º (...)

§ 4º O partido político coligado somente possui legitimidade para atuar de forma isolada no processo eleitoral quando questionar a validade da própria coligação, durante o período compreendido entre a data da convenção e o termo final do prazo para a impugnação do registro de candidatos.

 

Assim, como bem ressaltado pela Procuradoria Regional Eleitoral, apesar de o partido possuir legitimidade para tratar, isoladamente, das questões envolvendo a sua chapa proporcional, uma vez que, para tal, não está e nem pode estar submetido ao regime das coligações partidárias, percebe-se que, por estar coligado na chapa majoritária, não possui, por força dos dispositivos legais acima transcritos, qualquer legitimidade para atuar isoladamente no tocante às questões que envolvam as eleições majoritárias.

Destaco que a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral e desta Corte é uníssona no sentido de entender que partido político, quando coligado, não possui legitimidade para atuar isoladamente no processo eleitoral:

 

ELEIÇÕES 2016. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE REGISTRO DE CANDIDATURA (AIRC). PARTIDO POLÍTICO COLIGADO. ATUAÇÃO ISOLADA. ILEGITIMIDADE AD CAUSAM.

1. Inadmissível a inovação de teses no agravo regimental, ante a ocorrência de preclusão. Precedentes.

2. A teor do disposto no art. 6º, § 4º, da Lei nº 9.504/1997, o partido político coligado não tem legitimidade para atuar isoladamente no processo eleitoral, salvo se para questionar a validade da própria coligação. Precedentes.

3. O exame das matérias de ordem pública veiculadas em recurso especial não prescinde do requisito do prequestionamento. Precedentes.

Agravo regimental não conhecido.

(AgRRespe n. 3059, Relatora Min. Rosa weber, julgado em 23.11.2016)

 

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA ELEITORAL NEGATIVA. FACEBOOK E INSTAGRAM. INDEFERIMENTO. CONTRARRAZÕES. PRELIMINAR. ILEGITIMIDADE ATIVA. PARTIDO POLÍTICO COLIGADO. ATUAÇÃO ISOLADA. ACOLHIMENTO. EXTINÇÃO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO.

1. Inconformidade contra decisão que indeferiu a representação ao fundamento de que o pedido foi realizado de forma genérica, sem especificar o rito processual, e que não se trata de divulgação realizada no rádio ou na televisão após o início da propaganda eleitoral, nos termos dos arts. 322, 324 e 485, incs. I e IV, do CPC.

2. Preliminar de ilegitimidade ativa. Agremiação integrante de coligação. Nos termos do disposto no art. 6º, § 1º, da Lei n. 9.504/97, a coligação deve funcionar como um só partido no relacionamento com a Justiça Eleitoral e no trato dos interesses interpartidários. Em seu § 4º, o qual foi incluído pela Lei n. 12.034/09, é expresso em determinar que, quando coligado, o partido político detém legitimidade para atuar de forma isolada perante a Justiça Eleitoral exclusivamente para questionar a validade da própria coligação. A jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral e desta Corte é uníssona no sentido de entender que partido político, quando coligado, não possui legitimidade para atuar isoladamente no processo eleitoral. Sendo a demanda atinente à eleição majoritária, em que o partido se encontra coligado, é patente sua ilegitimidade ad causam, impondo-se a extinção do feito, sem julgamento do mérito.

3. Acolhida a preliminar. Extinção sem resolução do mérito, nos termos do art. 485, inc. VI, do CPC.

(TRE-RS, REl n. 0600346-45.2020.6.21.0150, Rel. Des. Eleitoral Silvio Ronaldo Santos de Moraes, julgado em 27.10.2020.) (Grifei.)

Relativamente às eleições de 2020, na mesma linha decidiram outros Tribunais Regionais:

 

ELEIÇÕES 2020. RECURSO ELEITORAL. REPRESENTAÇÃO. SUSPENSÃO DOS DIREITOS POLÍTICOS. PARTICIPAÇÃO ATIVA NO PROCESSO ELEITORAL. PROPAGANDA ELEITORAL. MATERIAL DE CAMPANHA. REPRESENTAÇÃO PROPOSTA POR PARTIDO ISOLADO. PARTIDO QUE INTEGRAVA UMA COLIGAÇÃO À ÉPOCA DA PROPOSITURA. AUSÊNCIA DE LEGITIMIDADE ATIVA DA AGREMIAÇÃO REPRESENTANTE. EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO. EXTINÇÃO DA AÇÃO DE TUTELA CAUTELAR ANTECEDENTE 0600374-64.2020.6.25.0000. 1. O art. 6º, § 4º, da Lei nº 9.504/1997 prescreve que o partido político coligado somente possui legitimidade para atuar de forma isolada no processo eleitoral quando questionar a validade da própria coligação, durante o período compreendido entre a data da convenção e o termo final do prazo para a impugnação do registro de candidatos. 2. No caso sob exame, considerando que se trata de pleito majoritário e que a representação eleitoral foi ajuizada em 29 de setembro do corrente ano e que, à época, a coligação entre o Partido Social Cristão - PSC, ora recorrido, e o Partido Liberal - PL já estava devidamente formada (coligação "Pra Continuar, Pra Avançar!"), conforme consulta pública do DivulgaCand, flagrante a ausência de legitimidade do Partido Social Cristão - PSC. 3. Extinção do feito, sem resolução do mérito, por ilegitimidade ativa e extinção da Ação de Tutela Cautelar Antecedente 0600374-64.2020.6.25.0000, por falta de interesse processual, ambos com fulcro no art. 485, VI, do Código de Processo Civil.

(TRE-SE - RE: 060036672 CAPELA - SE, Relator: EDIVALDO DOS SANTOS, Data de Julgamento: 03/11/2020, Data de Publicação: PSESS - Sessão Plenária, Data 03/11/2020.) (Grifei.)

 

RECURSO ELEITORAL. REPRESENTAÇÃO POR PROPAGANDA ELEITORAL IRREGULAR – ELEIÇÕES 2020

Ilegitimidade ativa de coligação majoritária para discutir questões envolvendo o pleito proporcional – Precedentes. Processo extinto, sem resolução do mérito, restando prejudicado o recurso da representada.

(TRE-SP, RECURSO ELEITORAL nº 060030077, Acórdão, Relator(a) Min. Afonso Celso da Silva, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data 13/11/2020.) (Grifei.)

 

RECURSO ELEITORAL. REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA ELEITORAL ANTECIPADA. IRREGULARIDADE EM PROPAGANDA ELEITORAL PARA O CARGO DE VEREADOR. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. ILEGITIMIDADE ATIVA DA COLIGAÇÃO FORMADA PARA A DISPUTA DO PLEITO MAJORITÁRIO PARA DISCUTIR PROPAGANDA ENVOLVENDO A ELEIÇÃO PROPORCIONAL. AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR. PRELIMINAR ACOLHIDA. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM A RESOLUÇÃO DO MÉRITO. RECURSO PREJUDICADO.

(TRE-SP, RECURSO ELEITORAL nº 060029251, Acórdão, Relator(a) Min. PAULO SERGIO BRANT DE CARVALHO GALIZIA, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data 04/11/2020.) (Grifei.)

 

ELEIÇÕES 2020 - RECURSO ELEITORAL - REPRESENTAÇÃO ELEITORAL - PRELIMINAR - ILEGITIMIDADE ATIVA DE PARTIDO ISOLADO EM RAZÃO DE TER SE COLIGADO EM ELEIÇÃO MAJORITÁRIA - IMPOSSIBILIDADE DE COLIGAÇÃO PARA ELEIÇÕES PROPORCIONAIS - REJEIÇÃO - MÉRITO - VEICULAÇÃO DE OUTDOORS - PUBLICIDADE DE COMÉRCIO DE PROPRIEDADE DE PRÉ-CANDIDATA - AUSÊNCIA DE CONTEÚDO ELEITORAL - INDIFERENTE ELEITORAL - RECURSO DESPROVIDO.

1. Na impossibilidade de celebração de coligações para o pleito proporcional municipal de 2020, em face da promulgação da Emenda Constitucional nº 97/2017, o partido político, isoladamente, passa a ser dotado de legitimação ativa para a propositura de Representações Eleitorais relacionadas às eleições proporcionais, ainda que tenha se coligado para as eleições majoritárias.

(...)

4. Recurso desprovido.

(TRE-PR, RECURSO ELEITORAL n 0600152-33.2020.6.16.0199, ACÓRDÃO n 56373 de 05/10/2020, Relator VITOR ROBERTO SILVA, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data 07/10/2020.) (Grifei.)

 

Portanto, sendo a demanda atinente à eleição majoritária, em que o partido se encontra coligado, é patente sua ilegitimidade ad causam, impondo-se a extinção do feito, sem julgamento do mérito.

Verifica-se de forma clara que todas as teses lançadas no presente recurso, sob a alegação de omissão, foram afastadas nos termos da fundamentação do acórdão recorrido.

O acórdão tratou expressamente sobre a legislação aplicável ao feito, no caso, o § 4º do art. 6º da Lei n. 9.504/97.

Assim, ao estabelecer a aplicabilidade do referido artigo, afastou, automaticamente, a incidência de qualquer outro, incluído ao art. 96 da mesma lei.

Cumpre referir que a regra contida no § 4º do art. 6º foi incluída pela Lei n. 12.034/09, portanto mais recente que a norma prevista no art. 96 da Lei das Eleições, vigente a partir de 30 de setembro de 1997, e que a matéria discutida se encontra pacificada pela jurisprudência desta Corte e do Tribunal Superior Eleitoral.

Assim, na verdade, o embargante busca a rediscussão do assunto afeto ao acerto ou desacerto da decisão (mérito), pretensão que não se coaduna à finalidade da via processual eleita.

Ainda, no tocante ao prequestionamento da matéria indicada nos embargos, para fins de interposição de recurso perante as instâncias superiores, ressalto que o primordial para o conhecimento dos recursos especial e extraordinário é o enfrentamento da questão jurídica discutida nos autos, o que ocorreu adequadamente no caso em tela.

Por fim, cumpre referir que o art. 1.025 do CPC adotou o prequestionamento ficto, tendo em vista que assim dispõe: "consideram-se incluídos no acórdão os elementos que a embargante suscitou, para fins de pré-questionamento, ainda que os embargos de declaração sejam inadmitidos ou rejeitados, caso o tribunal superior considere existentes erro, omissão, contradição ou obscuridade".

Ante o exposto, VOTO pela rejeição dos embargos de declaração.