REl - 0600457-43.2024.6.21.0100 - Voto Relator(a) - Sessão: 22/07/2025 às 16:00

VOTO

Ambos os recursos são tempestivos, razão pela qual deles conheço.

EVANIR WOLFF e RODINEI BRUEL (ID 45776444) sustentam, preliminarmente, cerceamento de defesa em face do indeferimento de produção de prova testemunhal, mesmo sendo oferecido o rol de testemunhas no momento oportuno.

Contudo, conforme o rito da AIJE, os momentos para apresentação do rol de testemunhas, sob pena de preclusão, são a inicial e a contestação.

Ao examinar a contestação dos ora recorrentes (ID 45776326), verifico que não foi apresentado o rol de testemunhas, de modo que operada a preclusão, devendo ser mantido integralmente o que constou na sentença de ID 45776434:

 

[...]

Trata-se de hipótese de julgamento antecipado, conforme prevê o art. 22, caput, da Lei Complementar n. 64/1990, que rege a Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE). O referido dispositivo exige, no momento do ajuizamento da ação, a apresentação de provas, indícios e circunstâncias que justifiquem a sua propositura.

No presente caso, a Coligação autora anexou documentos, fotos e vídeos para fundamentar seu pedido, além de formular um pedido genérico de produção de prova testemunhal. Os representados, por sua vez, juntaram provas documentais em suas defesas e requereram a produção de prova oral, mediante depoimentos pessoais.

No entanto, ao formularem seus pedidos sem a apresentação de um rol específico de testemunhas, restou inviabilizada a produção de prova testemunhal, dada a ausência de previsão de decisão de saneamento nesse rito. Assim, em razão da preclusão para a formulação de novos pedidos, passo ao julgamento do mérito, nos termos do art. 355, inciso I, do CPC.

 

Esse entendimento encontra-se sedimentado, de longa data, na jurisprudência do TSE, (AgRgRp n. 1176, Min. César Asfor Rocha, j. 22.03.2007): "[...] O rito da investigação judicial eleitoral, previsto no art. 22 da LC n º 64/90, impõe fases processuais bem marcadas, que, ultrapassadas, não poderão ser repetidas, sob pena de vulneração ao princípio do devido processo legal, entre as quais a apresentação, quando cabível, do rol de testemunhas, com a inicial, pela parte representante, e com a defesa, pela representada, estabelecendo o inciso V do citado dispositivo legal que as testemunhas comparecerão independentemente de intimação [...]."

Isso posto, rejeito a preliminar de cerceamento de defesa.

No mérito, a Ação de Investigação Judicial Eleitoral por abuso do poder econômico e político, uso indevido dos meios de comunicação e distribuição de bens foi julgada parcialmente procedente, reconhecendo como condutas vedadas os fatos 1, 2 e 3.

Tendo em vista a apresentação de recursos de ambas as partes, passo a examinar cada um dos fatos individualmente.

 

FATO 1 - Filiação de pessoas no Partido Progressistas, no interior do Gabinete do Prefeito, durante o ano eleitoral.

A inicial relatou que em abril de 2024, no Gabinete do então Prefeito Evanir Wolff, foram realizados atos de filiação ao Partido Progressistas, acostando fotografias divulgadas no site da Rádio Tapejara e no perfil do Partido Progressistas de Tapejara no Instagram, com a legenda: "(…) Lideranças Progressistas recebem novos filiados e Confirmam que o PP 11 é sim um partido Cheio de Jovens Talentos Tapejarenses (…)".

Como constou na sentença, restou demonstrado que houve, de forma inequívoca, o uso das dependências da Prefeitura (Gabinete do Prefeito) para promover filiações partidárias à agremiação da qual o candidato à reeleição pertencia, em afronta ao que dispõe o art. 73, inc. I, da Lei das Eleições, que apenas excepciona o uso de prédios públicos para a realização de convenção partidária:

Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:

 

I - ceder ou usar, em benefício de candidato, partido político ou coligação, bens móveis ou imóveis pertencentes à administração direta ou indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios, ressalvada a realização de convenção partidária;

Com efeito, não sendo o local de livre acesso aos demais concorrentes, caracterizado o rompimento da igualdade na disputa, justamente o bem jurídico tutelado pelas condutas vedadas.

Colho na sentença de ID 4576434:

[...]

No presente caso, as filiações ocorreram no Gabinete do Prefeito durante o ano eleitoral, em local que não é de livre acesso, tampouco enquadrado na exceção legal para uso de bens públicos.

A conduta de filiação partidária não é vedada; contudo, essa prática no gabinete do prefeito, candidato à reeleição, evidencia o uso indevido do bem público e em benefício dos candidatos, inclusive com desvio de finalidade, pois não é atribuição do gestor público realizar novas filiações partidárias, mormente em ano eleitoral.

Da análise das provas juntadas, verifica-se que as gravações e imagens foram realizadas em área interna da Prefeitura, de uso exclusivo dos servidores públicos. Não há indícios de que essas dependências poderiam ser acessadas por outros cidadãos ou candidatos não vinculados à Administração Pública Municipal.

Diante disso, resta configurada a conduta vedada prevista no art. 73, inciso I, da Lei n. 9.504/97, devido à utilização de bem público de acesso restrito em benefício da campanha eleitoral dos candidatos BIG e GIPE, que praticaram diretamente a conduta ilícita. (Grifo nosso)

A jurisprudência deste Tribunal é pacífica em relação ao tema, assim como o TSE:

[...] No caso dos candidatos, restou configurada a prática da conduta vedada prevista no art. 73, inc. I, da Lei das Eleições, consistente na veiculação de dois vídeos gravados nas dependências de prédios públicos da prefeitura e publicados nas redes sociais Facebook e Instagram. Incontroverso que os vídeos produzidos foram postados como peças de propaganda eleitoral, nos sítios de campanha dos candidatos, e realizados em móveis ou imóveis cujo acesso é restrito, como as dependências de gabinetes e espaços de uso exclusivo de servidores públicos, como cozinha e banheiro. Assim, impõe-se a reforma da sentença quanto ao ponto, em face da utilização de bem público de acesso restrito em benefício da campanha eleitoral dos candidatos, que realizaram a prática ilícita de modo direto [...]

(Recurso Eleitoral nº060023463, Acórdão, Des. VANDERLEI TERESINHA TREMEIA KUBIAK, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 29/11/2022)

[...] Configurada a prática da conduta vedada prevista no art. 73, inc. I, da Lei n. 9.504/97. Embora não seja vedada a utilização de bens públicos para a promoção de candidaturas, a jurisprudência do TSE é no sentido de que o local das filmagens seja de livre acesso a qualquer pessoa, o serviço não seja interrompido em razão das filmagens, o uso das dependências seja franqueado aos demais candidatos e que a utilização se restrinja à captação de imagens, sem encenação. Na espécie, ogabinete do prefeito não configura local de livre acesso aos demais candidatos, surgindo daí a quebra na isonomia e igualdade, bem jurídico protegido pelas condutas vedadas [...]

(Recurso Eleitoral nº060100359, Acórdão, Des. DES. FEDERAL LUÍS ALBERTO D`AZEVEDO AURVALLE, Publicação: PJE - Processo Judicial Eletrônico-PJE)

 

DIREITO ELEITORAL. REPRESENTAÇÃO. ELEIÇÕES 2014. CONDUTA VEDADA. ART. 73, I E III, DA LEI Nº 9.504/1997. BEM PÚBLICO. USO COMUM. CESSÃO OU USO. UNIDADE BÁSICA DE SAÚDE - UBS. VISTORIA DAS DEPENDÊNCIAS. GRAVAÇÃO DE PROGRAMA ELEITORAL. PRESENÇA DA PRESIDENTE DA REPÚBLICA CANDIDATA À REELEIÇÃO. CAPTAÇÃO DE IMAGENS. REUNIÃO E ENTREVISTA COM MÉDICOS. CONDUTA VEDADA CONFIGURADA. SERVIDOR PÚBLICO. CESSÃO OU USO DE SERVIÇOS. CORPO CLÍNICO DA UBS. MERA APRESENTAÇÃO DO LOCAL A AUTORIDADES E ENTREVISTA SOBRE COTIDIANO DE TRABALHO. MINISTRO DA SAÚDE. INAPLICABILIDADE DO CONCEITO DE HORÁRIO DEEXPEDIENTE. CONDUTA VEDADA NÃO CONFIGURADA. AUSÊNCIA DE IMPACTO E DE GRAVIDADE DO ILÍCITO RECONHECIDO. PROCEDÊNCIA PARCIAL DO PEDIDO. MULTA. APLICAÇÃO A CANDIDATO BENEFICIADO.

(...). 2. Gravação de propaganda eleitoral nas dependências de Unidade Básica de Saúde, com presença da Presidente da República e do Ministro da Saúde, captação de imagens e concessão de entrevista, por médicos. (...). III - Mérito 5. Para fins eleitorais, entendem-se como bens públicos de uso comum os assim definidos pelo Código Civil e também aqueles aos quais a população em geral tem acesso. Escolas e bibliotecas públicas também já foram consideradas bens públicos de uso comum, desde que: (i) o local das filmagens seja de acesso livre a qualquer pessoa; (ii) o uso das dependências seja igualmente possibilitado aos demais candidatos (AgR-RO nº 1379-94/RS, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. em 28.11.2016); (iii) a utilização do bem se restrinja à captação de imagens, verificada pela "ausência de interação direta entre os que são filmados e a câmera" e de encenação (RO nº 1960-83/AM, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. em 27.06.2017) e (iv) não haja interrupção da prestação do serviço ao público em virtude das filmagens. Precedentes. 6. Para que seja constatada a mera captação de imagens, é necessário que não haja a identificação expressa do estabelecimento público, servindo o local apenas como pano de fundo, a fim de ilustrar as propostas dos candidatos para as áreas relacionadas ao local das filmagens. 7. Art. 73, I, da Lei nº 9.504/1997. O conjunto probatório demonstra que a conduta dos representados extrapolou a mera captação de imagens, uma vez que: (i) medidas preparatórias para a visita foram adotadas ante a comunicação de que um representante do Ministério da Saúde realizaria uma visita técnica no local; (ii) a candidata circulou por áreas internas da UBS e realizou reunião em sala administrativa, espaços em relação aos quais não se pode presumir acesso do público em geral; (iii) as circunstâncias não permitem concluir que outros candidatos poderiam ter acesso idêntico. Assim, ficou configurado o uso de bem público em benefício da candidatura. (...). V - Conclusão 13. Agravo interno não conhecido. 14. Pedido julgado parcialmente procedente, para aplicar, a cada representado, multa de R$ 5.320,50.

(TSE, Representação n. 119878, Acórdão, Relator: MIN. LUÍS ROBERTO BARROSO, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Data 26.8.2020)

Dessa forma, diante da inequívoca violação à igualdade na disputa eleitoral, de rigor o reconhecimento da conduta vedada como o fez o juízo a quo.

 

Fato 2 - Utilização das cores do partido nos prédios públicos

A exordial imputou aos candidatos à reeleição Evanir Wolff e Rodinei Bruel a pintura de prédios públicos com as mesmas cores utilizadas na campanha (azul e verde), inclusive em novas construções e na ampliação da Escola Municipal de Ensino Fundamental Leonel de Moura Brizola.

A defesa sustentou que essas cores (azul e verde) já vinham sendo utilizadas em gestões anteriores. Contudo, não logrou demonstrar a alegação. Ao contrário, o que restou evidenciado é que vários prédios públicos foram pintados nas mesmas cores e tonalidades da campanha durante o processo eleitoral.

Reproduzo, no ponto, o que constou na sentença de ID 45776434:

 

[...]

Após análise das provas constantes dos autos, verifica-se que os prédios e logradouros públicos do Município de Tapejara-RS possuem, de fato, predominância das cores azul e verde. Ao associar diretamente as cores da campanha eleitoral àquelas utilizadas nos bens públicos, os investigados violaram os princípios constitucionais da impessoalidade e da moralidade administrativa, previstos no art. 37, caput, da Constituição Federal.

No que se refere às cores utilizadas pela administração municipal, não se sustenta o argumento defensivo de que essas cores vêm sendo usadas desde mandatos anteriores. As cores azul e verde possuem a mesma tonalidade das usadas na Campanha eleitoral, e ainda, coincidem com as cores do Partido Progressista que foram aplicadas em diversos prédios públicos, inclusive em novas construções e reformas, como é o caso da ampliação da Escola Municipal de Ensino Fundamental Leonel de Moura Brizola.

As cores azul e verde também foram identificadas na Escola Municipal de Ensino Fundamental Giocondo Canali, no Ginásio de Esportes Albino Sossela, no Centro Cultural - que anteriormente possuía predominantemente a cor amarela e foi repintado em azul -, e no pórtico do Parque Municipal Ângelo Eugênio Dametto, que inicialmente possuía as cores vermelho, branco e verde, correspondentes à bandeira do Município de Tapejara, mas que foram alteradas durante o mandato dos representados.

 

E, como bem anotado pelo juízo a quo, em um município pequeno do interior do Estado como Tapejara, a utilização das mesmas cores e tonalidades da campanha em prédios públicos tem a aptidão de gerar no eleitor uma predisposição a apoiar o candidato, diante da identidade visual com os logradouros públicos.

Confira-se, a propósito, a jurisprudência dos Regionais :

RECURSOS ELEITORAIS. REPRESENTAÇÃO. INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. CONDUTA VEDADA A AGENTE PÚBLICO . PREFEITO E VICE-PREFEITO. PINTURA DE BENS PÚBLICOS NAS CORES DO PARTIDO AO QUAL ESTÃO FILIADOS. PERÍODO ELEITORAL. PROIBIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 73, INCISO I DA LEI Nº 9 .504/97. PROCEDÊNCIA. DETERMINAÇÃO DE SUSPENSÃO DO ATO, REPINTURA DOS BENS E APLICAÇÃO DE MULTA. OBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE . MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. RECURSOS DESPROVIDOS.

 

(TRE-SP - RE: 0000535-53.2016 .6.26.0189 MONGAGUÁ - SP 53553, Relator.: André Guilherme Lemos Jorge, Data de Julgamento: 30/11/2016, Data de Publicação: 07/12/2016)

 

ELEIÇÕES 2020. RECURSO ELEITORAL. DECISÃO MONOCRÁTICA.PROVIMENTO AO RECURSO . AGRAVO INTERNO. NEGADO PROVIMENTO. APLICAÇÃO DA MULTA PREVISTA NO ART. 1 .021, § 4º, DO CPC, COMBINADA COM O ART. 275, § 6º, DO CÓDIGO ELEITORAL. 1.No período dos três meses anteriores ao pleito foi realizada, pela gestão municipal, a pintura de , nas canteiros e escolas da rede municipal de ensino cores vermelha e amarela, empregadas na campanha do segundo representado, pelo Partido Socialista Brasileiro, ao qual os representados/agravantes são filiados . 2. A desigualdade de oportunidades se revelou a partir do instante em que uma parte, se valeu de uma posição favorecida diante das circunstâncias fáticas (ser titular da administração local) e empreendeu atos inerentes à conduta de administrador público, para provocar distinta visibilidade de seu candidato em relação aos demais. 3. O Tribunal Superior Eleitoral entende que as condutas vedadas dispensam comprovação de dolo ou culpa do agente, sendo cláusulas de responsabilidade objetiva . Torna-se, portanto, desnecessária a análise da otencialidade lesiva para influenciar o pleito. 4. Manutenção da multa aplicada aos recorridos LUCRECIO JORGE GOMES PEREIRA DA SILVA e KLAUSTTERMAN WALLACE WEVERTON DOS SANTOS LIMA no valor mínimo de R$ 5.320,50 (cinco mil, trezentos e vinte reais e cinquenta centavos), de acordo com o art . 83, § 4º, da Resolução nº 23.610/2019 c/c art. 73, § 4º da Lei das Eleicoes. 5 . O presente agravo é manifestamente infundado e a presente votação foi unânime, portanto, deve ser aplicada a multa prevista no art. 1.021, § 4º, do CPC, combinada com o art. 275, § 6º, do Código Eleitoral . 6. Agravo interno a que se nega provimento, aplicando multa de 01 (um) salário mínimo à agravante.

 

(TRE-PE - RE: 060057958 ESCADA - PE, Relator.: CATIA LUCIENE LARANJEIRA DE SÁ, Data de Julgamento: 25/03/2021, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 71, Data 29/03/2021, Página 12-13)

 

Desse modo, nenhum reparo à sentença recorrida.

 

Fato 3 - Utilização de servidor público em horário de expediente para participação em atos de campanha

A inicial relatou que no dia 03 de setembro de 2024 o Procurador-Geral do Município, Leonardo Frigeri, durante seu horário de expediente, representou os candidatos Evanir e Rodinei, em reunião realizada na rádio Tapejara, para tratar de assunto exclusivo da campanha, qual seja, definir datas de debates entre candidatos.

A defesa sustentou que nesse dia (03.09.2024), Leonardo Frigeri estaria em gozo de folga compensatória concedida pelo ato acostado no ID 45776327.

Ao cotejar o conjunto probatório trazido pela exordial, consubstanciado em informações acerca da carga horária e da jornada de trabalho (40 h) do servidor, aliada à demonstração de que não se encontrava em gozo de férias ou licença e que sua assinatura constava na ata da reunião, conclui-se que efetivamente houve a violação ao que dispõe o art. 73, inc. III, da Lei 9.504/97:

Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:

[...]

III - ceder servidor público ou empregado da administração direta ou indireta federal, estadual ou municipal do Poder Executivo, ou usar de seus serviços, para comitês de campanha eleitoral de candidato, partido político ou coligação, durante o horário de expediente normal, salvo se o servidor ou empregado estiver licenciado;

 

Tenho que a portaria de ID 45776327 que teria concedido folga ao mencionado servidor não se presta a afastar a caracterização da conduta vedada, pois se trata de documento isolado, firmado pelo Secretário Municipal de Administração e Planejamento, Jocemir Bergamin, autoridade presente no evento descrito no Fato 1 destes autos. Ademais, apesar de a defesa afirmar que o servidor teria formalizado o pedido de folga naquele dia 02.9.2024, nenhuma comprovação foi apresentada.

Dessa forma, deve ser mantida integralmente também nesse ponto a sentença, pois em consonância com a jurisprudência deste Tribunal:

 

Demonstrada a prática de condutas que se amoldam ao disposto nos incs. I, II e III do art. 73 da Lei 9.504/97. Servidor que, valendo-se de cargo público, em horário normal de expediente, em período eleitoral, armazenou e editou,em computador da prefeitura, material de campanha de seu irmão, candidato eleito ao cargo de vereador no município nas eleições 2020. Comprovada a ocorrência da conduta vedada, independentemente da potencialidade ou gravidade do agir, resta configurado oilícito. O servidor foi o principal doador da campanha do irmão, além de com ele compartilhar a senha da "nuvem" em que se encontravam armazenados os documentos da campanha, fato admitido por ambos os recorrentes [...]

(Recurso Eleitoral nº 060031137, Acórdão, Des. DES. FEDERAL LUÍS ALBERTO D`AZEVEDO AURVALLE, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 27/07/2021)

 

Fato 4 - Captação ilícita de sufrágio mediante a distribuição de material de construção em troca de votos dos eleitores

Inicialmente, em relação à captação ilícita de sufrágio, essa somente se aperfeiçoa quando alguma das ações típicas elencadas no art. 41-A da Lei n. 9.504/97 (doar, oferecer, prometer ou entregar bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza a eleitor, ou, ainda, praticar violência ou grave ameaça ao eleitor), cometidas durante o período eleitoral, estiver, intrinsecamente, associada ao objetivo específico de agir do agente, consubstanciado na obtenção do voto do eleitor (GOMES, José Jairo. Direito Eleitoral. 12ª ed. São Paulo: Atlas, p. 725), sendo que a ausência de qualquer um desses vetores integrativos conduz, inevitavelmente, ao juízo de improcedência da demanda (TSE, AI n. 00018668420126130282/MG, Relator Ministro Gilmar Ferreira Mendes, DJE de 02.02.2017, pp. 394-395).

Transcrevo o dispositivo legal em tela:

 

Art. 41-A. Ressalvado o disposto no art. 26 e seus incisos, constitui captação de sufrágio, vedada por esta Lei, o candidato doar, oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição, inclusive, sob pena de multa de mil a cinquenta mil Ufir, e cassação do registro ou do diploma, observado o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar no 64, de 18 de maio de 1990. (Incluído pela Lei nº 9.840, de 1999)

§ 1º Para a caracterização da conduta ilícita, é desnecessário o pedido explícito de votos, bastando a evidência do dolo, consistente no especial fim de agir. (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)

§ 2º As sanções previstas no caput aplicam-se contra quem praticar atos de violência ou grave ameaça a pessoa, com o fim de obter-lhe o voto. (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)

§ 3º A representação contra as condutas vedadas no caput poderá ser ajuizada até a data da diplomação. (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)

§ 4º O prazo de recurso contra decisões proferidas com base neste artigo será de 3 (três) dias, a contar da data da publicação do julgamento no Diário Oficial. (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)

 

Na espécie, foi alegado que, entre os dias 09.9.2024 a 18.9.2024, a Prefeitura teria distribuído bens para vários moradores da cidade, na comunidade de Vila Campos, nos Bairros Real, Treze de Maio e São Paulo, para, por exemplo, os moradores Fábio Andrade, Ramaiana Chaves e José Pagno em troca de votos.

A análise da prova foi procedida de forma percuciente pelo juízo a quo, de modo que a reproduzo, incorporando-a como fundamentação deste voto, no sentido de que não demonstrada a mercancia do voto (ID 45776434):

 

[...]

A Coligação autora ainda afirmou a ocorrência de captação ilícita de sufrágio com distribuição de material de construção em troca dos votos dos eleitores.

Sobre tal conduta, o art. 41-A, da Lei nº 9.504/97, estabelece que "(….) Ressalvado o disposto no art. 26 e seus incisos, constitui captação de sufrágio, vedada por esta Lei, o candidato doar, oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição, inclusive, sob pena de multa de mil a cinqüenta mil Ufir, e cassação do registro ou do diploma, observado o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar no 64, de 18 de maio de 1990."

É cediço que para a procedência do pedido fundado em captação ilícita de sufrágio "é necessária a prova da autoria, participação (direta ou indireta) ou anuência do candidato, com a entrega da vantagem especificada na norma a algum (ns) eleitor (es) determinado (s), além da prova do elemento subjetivo (fim de obter o voto)"

Diga-se a propósito, que esta tem sido a interpretação do Tribunal Superior Eleitoral acerca da matéria em foco, conforme se depreende dos arestos que trago à colação:

 

"AGRAVO INTERNO. RECURSO ORDINÁRIO. ELEIÇÕES 2018. DEPUTADO ESTADUAL. REPRESENTAÇÃO. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. ART. 41-A DA LEI 9.504/97. PAGAMENTO EM TROCA DE VOTOS. TRANSPORTE DE ELEITORES. BOCA DE URNA. CASSAÇÃO DO DIPLOMA. MULTA.

[...]

7. Conforme jurisprudência desta Corte Superior, para se configurar a captação ilícita de sufrágio, é necessária a presença dos seguintes elementos: (a) prática de qualquer das condutas previstas no art. 41-A; (b) o dolo específico de obter o voto do eleitor; (c) ocorrência dos fatos entre a data do registro de candidatura e a eleição; e (d) a participação, direta ou indireta, do candidato beneficiado, concordância ou conhecimento dos fatos que caracterizam o ilícito.

[...]

16. Agravo interno a que se nega provimento e embargos de declaração não conhecidos. (TSE - RO-El - Embargos de Declaração no Recurso Ordinário Eleitoral nº 060186731 - Relator(a) Min. Luis Felipe Salomão, de 28.10.2021)"

 

No presente caso, as provas consistem em fotografias e vídeos anexados aos autos, sem a produção de prova oral. Todavia, as provas apresentadas, por si só, não demonstram a ocorrência de captação ilícita de sufrágio, mediante doação de materiais de construção a eleitores, em razão da absoluta insuficiência para fundamentar condenação de tamanha gravidade.

Não houve comprovação das condutas imputadas aos recorridos, uma vez que não se demonstrou que os candidatos tenham praticado ou autorizado qualquer das ações descritas no art. 41-A, nem mesmo por intermédio de terceiros, em troca de votos. Dessa forma, resta desautorizada a aplicação das sanções por captação ilícita de sufrágio. (Grifo nosso)

 

Fato 5 - Distribuição de brindes

O último fato a ser examinado consiste na imputação de distribuição de brindes pelos candidatos Evanir e Rodinei (canecas) aos eleitores, conduta expressamente proibida pelo art. 39, § 6º, da Lei n. 9.504/97:

 

Art. 39. A realização de qualquer ato de propaganda partidária ou eleitoral, em recinto aberto ou fechado, não depende de licença da polícia.

[...]

§ 6o É vedada na campanha eleitoral a confecção, utilização, distribuição por comitê, candidato, ou com a sua autorização, de camisetas, chaveiros, bonés, canetas, brindes, cestas básicas ou quaisquer outros bens ou materiais que possam proporcionar vantagem ao eleitor. (Incluído pela Lei nº 11.300, de 2006)

No ponto, como concluiu a magistrada de primeiro grau, não houve comprovação em relação ao momento e à origem dos bens (canecas), de modo que não se revela possível a caracterização do ilícito (ID 45776434):

[..]

No presente caso, não há comprovação acerca do momento em que os itens foram supostamente distribuídos, tampouco de sua origem, o que inviabiliza a análise de eventual prática de ilícito eleitoral. Ademais, embora o apoiador possa, individualmente, confeccionar e utilizar 'broches, dísticos, adesivos, camisetas e outros adornos semelhantes', a distribuição de material dessa natureza é expressamente proibida, evidenciando a necessidade de se diferenciar o comportamento individual da distribuição coletiva de materiais.

Assim, ausente comprovação de conduta ilícita pelos requeridos, de modo que não há fundamento para se impor a condenação.

Por derradeiro, irreparável as sanções impostas, nos moldes em que fixadas na sentença:

[...]

Embora as condutas sejam graves, não justificam a cassação do registro ou diploma dos candidatos recorrentes, sendo razoável a aplicação da multa prevista no § 4º do art. 73 da Lei n. 9.504/97.

As sanções estipuladas no art. 73, §§ 4º e 5º, da Lei n. 9.504/97, incluem suspensão da conduta e aplicação de multa, além da possibilidade de cassação. Contudo, o inciso XVI do art. 22 da LC n.º 64/90 determina que a gravidade das circunstâncias, e não a potencialidade de alterar o resultado da eleição, caracteriza o abuso.

Conforme lições de José Jairo Gomes, não é necessário provar que o ilícito afetou o resultado do pleito, mas sim que houve uma lesão à integridade e legitimidade do processo eleitoral, o que não se comprovou de forma suficientemente grave no presente caso.

Apesar da reprovabilidade das condutas, as sanções pecuniárias aplicadas são proporcionais. A cassação do diploma e a inelegibilidade dos recorrentes não se mostram razoáveis e proporcionais diante da gravidade das condutas. O art. 20, § 1º, da Res.-TSE n.º 23.735/2024 reforça que as condutas descritas no art. 73 da Lei n.º 9.504/97 são de natureza objetiva, dispensando a comprovação de potencialidade lesiva.

Para fixação do parâmetro da multa adoto o parâmetro da UFIR, que estabelece que "um mil UFIRs" corresponde ao valor de R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos).

Em relação à dosimetria das sanções, o Fato 1, que resultou na divulgação de fotos nas redes sociais, não afetou significativamente o funcionamento da administração pública. Por isso, é suficiente a imposição de multa de 5.000,00 UFIR a cada candidato representado, conforme o art. 73, § 4º, da Lei n. 9.504/97.

No Fato 2, referente à utilização das cores da campanha em obras públicas, a multa será de 10.000,00 UFIR a cada candidato, devido à maior gravidade da conduta, que vincula bens públicos a interesses eleitorais.

Quanto ao Fato 3, o uso de servidor público em favor da coligação e dos candidatos será penalizado com multa de 10.000,00 UFIR, aplicada a cada candidato.

Ainda, importante registrar que, na linha do quanto sustentado no parecer ministerial, as condutas vedadas reconhecidas não possuem gravidade suficiente a alterar o resultado da opção democrática dos eleitores, titulares da soberania popular expressa nos votos (ID 45949487):

[..]

Conquanto o magistrado de primeiro grau tenha afirmado a existência de "provas consistentes de abuso do poder político e econômico", o que se extrai dos autos, na verdade, são provas da prática de condutas vedadas, que, contudo, não possuem gravidade suficiente para se configurarem nos referidos abusos e, por consequência, resultar na pretendida cassação dos mandatos.

Na gradação entre a prática de condutas vedadas, previstas no art. 73 da Lei das Eleições, é preciso considerar que a AIJE, fundada no art. 22 da LC nº 64/90, "tem como finalidade impedir e apurar a prática de atos que possam afetar a igualdade de candidaturas em uma eleição nos casos de abuso do poder econômico, político ou de autoridade e utilização indevida dos meios de comunicação social.", distinguindo-se da representação por conduta vedada. Essas duas ações eleitorais (AIJE e representação por conduta vedada), costumam ser propostas de forma cumulada porque as mesmas condutas, a depender da gravidade e do impacto na legitimidade e isonomia das eleições, podem ou não configurar abuso do poder político ou econômico, e, por consequência, resultar na cassação do mandato. Não se pode desconsiderar no julgamento dessas causas que entre as consequências do acolhimento das AIJEs se encontra a cassação do registro ou do diploma do candidato beneficiado, que importam na alteração na opção do eleitores, titulares da soberania popular expressa nos votos. Situações irrelevantes ou de impacto menor não podem interferir substancialmente no resultado do pleito por ser este a expressão da soberania popular, princípio fundamental do nosso sistema democrático. Por isso, a gravidade da conduta abusiva é requisito essencial para que a AIJE seja acolhida. Somente atos capazes de comprometer significativamente a legitimidade do pleito e a manifestação livre e autêntica da vontade popular justificam a interferência da Justiça Eleitoral.

 

Nesse sentido a jurisprudência do TSE, colacionada no parecer ministerial:

ELEIÇÕES 2020. AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. VEREADOR. REELEIÇÃO. CONDUTA VEDADA. MULTA NO PATAMAR MÍNIMO. AUSÊNCIA DE GRAVIDADE. PROPORCIONALIDADE. ABUSO DE PODER POLÍTICO E ECONÔMICO. NÃO CARACTERIZAÇÃO. INCIDÊNCIA DAS SÚMULAS 24 E 30 DO TSE. NÃO IMPUGNAÇÃO DOS FUNDAMENTOS. SÚMULA 26 DO TSE. NÃO CONHECIMENTO. (...) b) incidência da Súmula 30 do TSE, tendo em vista que o entendimento do TRE/SP está em consonância com o desta Corte superior, no sentido de que as sanções pela prática de condutas vedadas a agentes públicos devem ser proporcionais à gravidade dos fatos, somente acarretando a cassação de diploma nas hipóteses em que tiverem o condão de abalar a normalidade e a legitimidade do pleito

(AgR-REspEl 0600828-36, rel. Min. Benedito Gonçalves, DJE de 1º.12.2023).

TSE. Agravo Regimental No Agravo Em Recurso Especial Eleitoral 060097506/SP, Relator(a) Min. Floriano De Azevedo Marques, Acórdão de 31/05/2024, Publicado no DJE 99, data 11/06/2024

 

(...) 4. Nos termos da jurisprudência desta Corte, o abuso de poder político configura-se quando a legitimidade das eleições é comprometida por condutas de agentes públicos que, valendo-se de sua condição funcional, beneficiam candidaturas mediante desvio de finalidade. Requer-se, ainda, nos termos do art. 22, XVI, da LC 64/90, a "gravidade das circunstâncias que o caracterizam", a ser aferida a partir de aspectos qualitativos e quantitativos do caso concreto. Precedentes.

TSE. Agravo Regimental No Agravo Em Recurso Especial Eleitoral 060072049/RJ, Relator(a) Min. Isabel Gallotti, Acórdão de 17/10/2024, Publicado no DJE 191, data 24/10/2024.

 

Assim, em se tratando de tão gravosa pena, que afastaria o resultado das urnas, impõe-se a manutenção da sentença que reconheceu as condutas vedadas perpetradas, sem a incidência da sanção de cassação dos diplomas, prestigiando, desse modo, o resultado republicano e democrático.

DIANTE DO EXPOSTO, VOTO pelo desprovimento dos recursos, mantendo a sentença recorrida.