REl - 0600344-64.2024.6.21.0076 - Voto Relator(a) - Sessão: 17/07/2025 00:00 a 18/07/2025 23:59

VOTO

Como relatado, cuida-se de examinar recurso eleitoral interposto por INES CAROLINE REICHERT, candidata eleita suplente de vereador nas Eleições Municipais de 2024 no Município de Novo Hamburgo, em face da sentença proferida pelo Juízo da 076ª Zona Eleitoral de Novo Hamburgo/RS (ID 45890290), que desaprovou a prestação de contas de campanha apresentada e determinou o recolhimento da quantia de R$ 4.703,02 ao Tesouro Nacional, devido à falta de comprovação de gastos com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC).

O parecer conclusivo (ID 45890286), que serviu de base à sentença, verificou as seguintes irregularidades (ID 45890286):

[..]

3.1. Contrato referente a Laudiceia de Abreu Viveiros: Há uma diferença entre o valor que deveria ser pago pelos dias trabalhados (Conforme acordado em contrato e verificado no ponto assinado) e o valor realmente pago (foi comprovando o pagamento a maior do que o acordado entre as partes), no total de R$ 4.545,28. Foram apresentados comprovantes de pagamentos de somam um total de R$10.000,00 (dez mil reais), porém, conforme verificado no ponto assinado pela contratada o valor que deveria ser, efetivamente pago é de R$ 5.454,72, equivalente a 36 dias trabalhados, pagos R$ 151,52 por dia, conforme estipulado em Contrato.

3.2. Contrato referente a Pedro Isac da Silva Cardoso: Há uma diferença entre o valor que deveria ser pago pelos dias trabalhados (Conforme acordado em contrato e verificado no ponto assinado) e o valor realmente pago (foi comprovando o pagamento a menor do que o acordado entre as partes), no total de R$ 157,74. Foi apresentado comprovante de pagamento de um total de R$1.500,00 (Hum mil e quinhentos reais), porém, conforme verificado no ponto assinado pelo contratado o valor que deveria ser, efetivamente pago é de R$ 1.657,74, equivalente a 21 dias trabalhados, pagos R$ 78,94 por dia, conforme estipulado em Contrato.

Assim, por não comprovação da origem dos recursos utilizados na campanha, de acordo com o acima descrito, considera-se irregular o montante de R$ 4.703,02 (quatro mil e setecentos e três reais e dois centavos), passível de recolhimento ao Tesouro Nacional, conforme o art. 14 e o art. 32 da Resolução TSE n. 23.607/2019.

 

A recorrente sustenta que houve erro material no valor consignado relativo ao valor do dia trabalhado (R$ 151,52), e que em vários períodos a prestadora de serviço laborou 8 horas diárias, e não somente 6 horas.

Pois bem.

Ao cotejar o contrato de prestação de serviços firmado com  Laudiceia de Abreu Viveiros (ID 45890256), constato que a cláusula nona estabeleceu a remuneração de R$ 2.400,00  - agosto, R$ 5.000,00 – setembro e R$ 2.600 – outubro, o que perfaz o montante de R$ 10.000,00, exatamente o valor pago à prestadora:

[...]

CLÁUSULA NONA - Pela prestação dos serviços ajustados neste instrumento, o CONTRATANTE pagará a CONTRATADA a quantia mensal R$ 2.400,00, referente ao mês de agosto, 5.000,00, referente ao mês de setembro e 2.600,00, referente ao mês de outubro de 2024, ao total de R$10.000,32, a serem pagos até o 5°(Quinto) dia útil do mês subsequente, perfazendo um total de R$ 151,52 por dia de trabalho.

 

Dessa forma, tenho que eventual divergência decorrente da multiplicação do valor dia trabalhado pelo número de dias constantes no ponto, não é causa hábil a determinar o recolhimento da importância, máxime porque a remuneração constante do contrato (R$ 10.000,00) é idêntica à que foi efetivamente paga à prestadora. Ademais, ao compulsar o cartão ponto da prestadora, é possível verificar que ela trabalhou em vários períodos uma jornada de 8 horas, circunstância que conforta o sustentado na defesa de que o valor dia seria superior ao constante no contrato de R$ 151,52.

Em relação ao prestador Pedro Isac da Silva Cardoso, a situação é idêntica, apenas o parecer conclusivo aponta que teria sido pago o valor de R$ 157,74 a menor. Ou seja, considerando o valor dia de trabalho (R$ 78,94) e o número de dias trabalhados (21), o montante devido seria de R$ 1.657,74, e foi pago R$ 1.500,00. Novamente me reporto ao próprio contrato de prestação de serviços (ID 45890251) que prevê na cláusula nona a remuneração de R$ 1.500,00, exatamente o valor que a prestadora adimpliu como pagamento:

 

[...]

CLÁUSULA NONA - Pela prestação dos serviços ajustados neste instrumento, o CONTRATANTE pagará ao CONTRATADO a quantia de R$1.500,00, referente ao trabalho realizado de 12 de setembro a 03 de outubro, a ser pago até o 03 de outubro, perfazendo um total de R$ 78,94 por dia de trabalho.

 

Assim, tenho que os  apontamentos levados a efeito no parecer não conduzem à glosa dos valores pagos a título de militância, pois as importâncias pagas correspondem exatamente aos valores contidos nos instrumentos de contrato constantes nos autos.

Aliás, a jurisprudência deste Tribunal tem considerado possível que a ausência do preenchimento integral de alguns requisitos nos contratos de prestação de serviços não possui o condão de, por si só, macular a regularidade das contas quando presentes outros elementos que permitam inferir tais informações, sem obstar a fiscalização da Justiça Eleitoral:

 

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATO. CARGO DE DEPUTADO FEDERAL. 2º SUPLENTE. GASTOS COM COMBUSTÍVEL OMITIDOS NA PRESTAÇÃO DE CONTAS. CARACTERIZADO RECEBIMENTO DE RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. FORNECEDORES SEM CNPJ NA RECEITA FEDERAL. AFASTAMENTO DA FALHA. AUSÊNCIA DE EXTRATOS BANCÁRIOS COM A MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA (FEFC). IMPULSIONAMENTO DE CONTEÚDOS. OMISSÃO DE DOCUMENTOS FISCAIS. UTILIZAÇÃO DE RECURSOS DO FEFC PARA CUSTEIO DE ATIVIDADE DE MILITÂNCIA E MOBILIZAÇÃO DE RUA. FALHA FORMAL. EXPEDIÇÃO DE OFÍCIO AO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL PARA APURAÇÃO DE POSSÍVEL FRAUDE NO RECEBIMENTO DE VERBA PÚBLICA. DETERMINADO O RECOLHIMENTO DE VALORES AO TESOURO NACIONAL. IRRISÓRIA REPRESENTATIVIDADE DAS FALHAS. PRECEDENTE DO TSE. APROVAÇÃO DAS CONTAS.

1. Prestação de contas apresentada por candidato, classificado como segundo suplente para o cargo de deputado federal, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos relativos às eleições gerais de 2022.

2. Gastos com combustível omitidos na prestação de contas, verificados quanto a três fornecedores que emitiram nota fiscal para o CNPJ da candidatura. Caracterizado o recebimento de recursos de origem não identificada, pois os valores utilizados para pagamento não estão escriturados e nem transitaram pela conta bancária de campanha. Determinado o recolhimento do montante respectivo ao Tesouro Nacional (art. 32, caput, da Resolução TSE n. 23.607/19).

3. Irregularidade quanto à três despesas realizadas com fornecedores que possuem CNPJ inexistente na base de dados da Receita Federal. Entretanto, o apontamento deve ser relevado porque as despesas estão devidamente escrituradas nas contas, tendo sido comprovadas por nota fiscal. Ademais, em consulta ao cadastro da Receita Federal é possível verificar os fornecedores com quais as despesas foram realizadas. Afastamento da falha.

4. Aplicação irregular de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC.

4.1. Ausência dos extratos bancários com a movimentação financeira do FEFC. Apresentados apenas os dados da conta “Outros Recursos”, e em duplicidade, não sendo possível averiguar a correta destinação de saldo existente na conta do recurso público. Determinado o recolhimento do montante respectivo ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 79, § 1°, da Resolução TSE n. 23.607/19. 4.2. Inconsistências quanto à omissão de documentos fiscais comprobatórios de despesas com impulsionamento de conteúdos, relativos a pagamentos realizados com recursos privados e do FEFC. O art. 35, § 2º, da Resolução TSE n. 23.607/19 dispõe que o contratante adquire créditos a serem utilizados durante a campanha, sendo considerados gastos de impulsionamento, apenas aqueles efetivamente utilizados, devendo ser devolvido os valores não utilizados até o final da campanha. Na hipótese, caracterizada falha parcial relativa à diferença de créditos não utilizados, a qual deve ser recolhida ao erário por se tratar de sobra (art. 35, § 2º, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19).

4.3. Apontada falha na utilização de recursos do FEFC para o custeio de atividade de militância e mobilização de rua, em que os documentos de comprovação não especificariam o local de trabalho, contrariando o previsto no § 12 do art. 35 da Resolução TSE 23.607/19, além de não ter sido apresentada a justificativa do preço contratado e a descrição detalhada das atividades executadas. Entretanto, tal detalhamento é desnecessário uma vez que as tarefas designadas aos prestadores de serviço nos contratos é “atividades de DIVULGAÇÃO para a campanha Eleitoral 2022”, tendo a unidade técnica considerado que tal trabalho seria equivalente ao serviço de panfletagem. Quanto ao local da atividade, os contratos glosados referem-se aos residentes na cidade, para os quais é despicienda a especificação de onde os prestadores de serviço exerceriam suas atividades, pois o domicílio de todos os pactuantes é o mesmo, bem como o foro eleito para dirimir controvérsias, não havendo motivos para se entender que o trabalho seria realizado em outra cidade. Valor pago com recurso do FEFC, para divulgação da campanha eleitoral do candidato, de acordo com a especificidade do trabalho exercido por prestadores. No mesmo sentido, entendimento deste Tribunal. A irregularidade deve ser motivo de ressalva nas contas, uma vez que não foram trazidos aos autos os dados exigidos no § 12 do art. 35 da Resolução TSE 23.607/19. Falha meramente formal que não impõe o recolhimento do valor ao erário.

5. Irregularidades remanescentes representam 0,14% do total das receitas financeiras, sendo adequado, razoável e proporcional o juízo de aprovação das contas sem ressalvas, em alinhamento à diretriz traçada recentemente pelo TSE no julgamento de aprovação integral da PCE n. 0601604-21.2022.6.00.0000, relativa às contas dos candidatos eleitos aos cargos de Presidente e Vice-Presidente da República, nas quais havia impropriedades de 0,14%, percentual idêntico ao destes autos. Expedido pela Procuradoria Regional Eleitoral ofício ao Ministério Público Federal, a fim de que sejam adotadas as medidas pertinentes quanto à possível fraude no recebimento de verba pública. Realizadas despesas com fornecedor cujo sócio ou administrador está inscrito em programa social, e também com empresa que possui indício de ausência de capacidade operacional por ter apenas um empregado.

6. Aprovação das contas. Determinado o recolhimento de valores ao Tesouro Nacional.

(PCE 0602453-56.2022.6.21.0000, Relatora Desembargadora Kalin Cogo Rodrigues, julgado em 13.12.2022) (Grifo nosso)

 

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATO NÃO EL EITO. DEPUTADO ESTADUAL. CONTRATAÇÃO DE PESSOAL. PANFLETAGEM. EQUIPE DE MOBILIZAÇÃO DE RUA. RECURSOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA (FEFC) E DO FUNDO PARTIDÁRIO (FP). FALTA DE DETALHAMENTO. INOBSERVÂNCIA DO ART. 35, § 12, DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.607/19. FALHA FORMAL. NÃO PREJUDICADA A FISCALIZAÇÃO DA JUSTIÇA ELEITORAL. PAGAMENTO DE GASTOS COM COMBUSTÍVEIS COM VERBA DO FUNDO PARTIDÁRIO. AUSENTE INSTRUMENTO DE CESSÃO DE VEÍCULO. IRREGULARIDADE CARACTERIZADA. DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO DE VALORES AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. Prestação de contas de candidato não eleito ao cargo de deputado estadual referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha nas eleições de 2022.

2. Inconsistências na contratação de pessoal (panfletagem e coordenação de equipe de mobilização de rua) custeada com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC e do Fundo Partidário, em razão do oferecimento de documentação que não indica a integralidade dos elementos mencionados no § 12 do art. 35 da Resolução TSE n. 23.607/19. Ausência de referência ao local de trabalho e juntada de contratos sem assinatura ou ilegíveis. Entretanto, é possível presumir que cada contratado exerceu as atividades no município de residência, o que, somado à diversidade de funções indicada nas pactuações, justifica as diferenças entre preços contratados, todos dentro da normalidade para a remuneração das atividades de militância e mobilização de rua. As diferentes atividades executadas também justificam remuneração em valores diversos repassados aos prestadores de serviço. Supridas as falhas relativas aos contratos sem assinatura ou ilegíveis com a apresentação das avenças de prestação de serviços, admitidas como provas no processo em prestígio da boa-fé, por não haver elemento que indique que sua confecção ocorreu em momento posterior à indicação das irregularidades no exame das contas. A ausência de indicação de todos os elementos necessários nos contratos configura impropriedade, mas não obstou a fiscalização da Justiça Eleitoral. Falha meramente formal. Afastada a necessidade de recolhimento de valores ao erário. Nesse sentido, precedente deste Tribunal.

3. Emprego de verbas do Fundo Partidário para pagamento de gastos com combustíveis sem o correspondente registro de locação, cessão de veículos, publicidade com carro de som ou despesa com geradores de energia. Descumprimento ao art. 35, § 11, da Resolução TSE n. 23.607/19. Documentos apresentados inábeis para comprovar a cessão temporária de veículos em favor do prestador, pois ausente o instrumento de cessão. Irregularidade caracterizada. Determinação de recolhimento dos valores irregulares ao Tesouro Nacional.

4. A irregularidade não superada representa 8,61% do total das receitas declaradas na campanha, sendo adequado, razoável e proporcional o juízo de aprovação das contas com ressalvas, na linha do que vem decidindo este Tribunal Regional e o Tribunal Superior Eleitoral.

5. Aprovação com ressalvas. Recolhimento ao Tesouro Nacional.

(PCE 0603030-34.2022.6.21.0000, julgado em  06.07.2023, Relator Des. Voltaire de Lima Moraes) (Grifo nosso)

 

Em relação ao juízo de mérito das contas, como há identidade de valores entre o que constou no contrato e o que foi efetivamente pago (R$ 10.000,00 e R$ 1.500,00) tenho que as contas merecem aprovação sem ressalvas.

Ante o exposto, VOTO pelo provimento do recurso para aprovar as contas de INES CAROLINE REICHERT, nos termos do art. 74, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19, com o afastamento do comando de recolhimento ao Tesouro Nacional da importância de R$ 4.703,02.